~~~

A chuva caia lá fora, o barulho forte de um trovão e a sala caiu na escuridão. Tateou, procurando pelo chão, até que encontrou sua lanterna, ligando e a apontando a luz para o teto, o quarto se iluminou, mas não era o suficiente para o que fazia.

Encarou a folha em branco por um momento e desistiu, deitou-se no chão e fechou os olhos, ouvindo os sons produzidos pela chuva forte. Pode se lembrar do sonho, por mais belo que fosse, por mais que ao menos no sonho ela tivesse o que queria, a lembrança dele fazia seu peito doer.

Por que tinha de sentir aquilo? Sofrer uma única vez não fora o suficiente?

Queria gritar de raiva, de tristeza, não entendia o que se passava em sua cabeça, em seu coração, mas ele palpitava mais forte quando o via, quando tinha sua atenção. Mas não palpitava só de alegria, os sorrisos rapidamente murchavam quando parava para observar, tinha consciência que vendo as coisas de fora, poderia muito bem interpreta-las da maneira errada, mas ainda assim seguia a ideia errada e seu pequeno coração doía miseravelmente, pois via o interesse dele, mas não era pra ela, era pra outra. Mesmo que fossem somente brincadeiras, não tinha como ela saber, ela não queria saber de verdade.

A energia voltou e a garota tornou a se sentar, dando atenção ao lápis e ao papel.

"Essa história é para você, mas torço para que nunca chegue a ler."

Começou, mas tornou a por os objetos num canto e se deitar no chão. Não era a primeira vez que expunha seus sentimentos em palavras, mas por que dessa vez estava sendo tão difícil? Precisava extravasar, por aquilo para fora, mas por que estava sendo tão difícil? A resposta era simples, estava com vergonha, se sentia estúpida, uma piada.

Fechou os olhos, o sonho lhe apareceu, nitidamente.

–

Era um dia bonito, com clima ameno e nas idas e vindas da vida, eles se encontraram por aí e ela se sentia bem com ele, sorria abertamente exibindo as covinhas sem timidez. E então o tempo pareceu correr, estavam em outro lugar e num momento de coragem insana, ela se declarou e ele nada disse apenas beijou com carinho e aquele gesto fora suficiente.

–

Então abriu os olhos "só em sonho" pensou e repetiu para si mesma, várias e várias vezes.

Sempre taxada de coração de pedra, ou de gelo, entendia o porquê, não conseguia exprimir seus sentimentos, afeto ou carinho com facilidade, tinha medo da rejeição e por isso lhe doía tanto se apaixonar, na maioria das vezes não se permitia tão coisa.

"Coração de pedra... não, coração de vidro." Murmurou para si, de fato, como vidro, sentia-se quebrada. A situação fugiu de seu controle, se não era paixão o que sentia, sinceramente não sabia.

"Eu gosto de você, mas não só como amigo, me desculpe...”

Escreveu a segunda frase na folha, o texto lhe pareceu desconexo, mas ela estava assim, desconexa e confusa. Desconexa... Essa palavra existia mesmo? Não importa nada daquilo importava.

Sentia-se tão inferior ao garoto que gostava a ponto de enumerar seus defeitos próprios, pois os dele, ela aprendeu a gostar e aceitar.

"Que droga!" Pensou, se isso não significava estar 'apaixonada' então o que era?

"Essa história é para você, mas torço para que nunca chegue a ler. Gosto de você, não como amigo, mas sei que não é recíproco, então deixa assim, você me ignora e eu quebro como vidro."

Escreveu logo abaixo das outras frases e sorriu, um sorriso melancólico e vazio que contrastavam com as lágrimas que escaparam, deixando um rastro de tristeza em sua face. Sentia-se tão culpada e patética por se preocupar tanto com isso, tinha problemas piores para ocupar sua mente.

Mas ela estava quebrada, seu coração partiu-se em cacos de vidro que lhe feriam os dedos ao tentar juntar, e o que mais lhe doía era o fato de que ela mesma causou isso, mas preferia sofrer em silêncio a confirmar que seu medo não era em vão.

"Essa história é para você, mas torço do fundo de minha alma que nunca chegue a ler... ou não."

~~~