Sad Serenade provisório escrita por AmieMitie21


Capítulo 1
Capítulo 1


Notas iniciais do capítulo

A ideia para essa historia surgiu do nada e como havia gostado da ideia, resolvi escrever uma shortfic de 4 ou 5 capítulos. Espero que gostem ^^



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Pela sexta vez seguida, me vi parada em frente à enorme janela de meu apartamento. O vidro que Katie, a faxineira e amiga de minha família, limpara com todo o cuidado no dia anterior estava agora inteiramente embaçado devido à minha respiração quente e a sua superfície gélida, impedindo que meu rosto fosse refletido. Desde 3 meses atrás, todos os espelhos de minha residência foram retirados, ou melhor, quebrados e estraçalhados por minhas mãos. Elas faziam e ainda fazem sentir-me mal, pois não escondiam a verdade. Apesar de não refletir a minha alma, refletia o meu físico, o estado deplorável em que me encontrava. O rosto extremamente magro, a pele pálida e ressecada, as olheiras destacadas e os olhos opacos, sem o brilho que antes costumavam ter. Olhos sem vida.

Fitava com inveja todas as pessoas que passeavam pela rua. Os jovens que vagavam despreocupados na companhia de seus fones de ouvido, as crianças que tomavam seu chocolate quente enquanto a mãe segurava-lhe a mão de modo protetor e os casais que andavam de braços dados e sorriam bobamente.

Um casal em especial capturou minha atenção. A diferença de altura entre ambos era gritante. A garota não tinha mais do que 1 metro e 55 cm de altura, enquanto o garoto era, no mínimo, 25 centímetros mais alto que ela. Chamavam a atenção por onde passavam, mas isso não parecia incomodá-los nem um pouco. Aliás, os dois pareciam estar concentrados somente neles e em seus dedos que se entrelaçavam de modo carinhoso e protetor. Mesmo naquele frio cortante, era perceptível o suave rubor nas bochechas de ambos e o leve sorriso que brincava em seus lábios. Em um momento de distração, o vento forte soprou e levou consigo o cachecol que até pouco estava aquecendo a garota. O garoto, vendo que havia ficado preso entre os galhos da árvore mais alta do local, tirou o seu próprio cachecol e o enrolou protetoramente no pescoço de sua amada, enquanto a fitava com ternura. Esta o encarava com um misto de fascinação e felicidade. Ao se certificar que ela estava devidamente agasalhada, o garoto deu-lhe um sorriso e acariciou o topo de sua cabeça. A menina retribuiu o sorriso e logo depois ficou nas pontas dos pés e depositou um beijo suave na bochecha dele. Os dois só enxergavam um ao outro, envoltos e perdidos no mundo que pertencia só a eles e a mais ninguém.

A felicidade deles era uma coisa tão milagrosa e nostálgica para meu coração quebrado e sofrido que não pude evitar um sorriso. Desejei com todas as minhas forças para que não experimentassem a dor e o sofrimento pela qual estou passando. Desejei que esse amor entre eles nunca perdesse a intensidade. Desejei que ambos fossem felizes. Desejei que a moça não ficasse como eu. Desejei que o rapaz não ficasse como Nathan.

Nathan

- Nathan... – sussurrei.

A simples menção de seu nome fez com que uma tontura forte me atingisse pela terceira vez naquele dia. A fraqueza tomou conta de meu corpo e a tão conhecida escuridão começou a pintar em minha visão. Ah, não. Eu vou desmaiar novamente. Agarrei com força a mesa que havia ao meu lado para não ir de encontro ao chão. Respirei o mais fundo que pude e tentei me acalmar. Resolvi me concentrar em diminuir as batidas frenéticas de meu coração. Finalmente, a cada minuto que se passava, a escuridão sumia de minha visão e meu corpo recobrava as forças. Soltei as mãos da mesa em que estava agarrada e pisquei os olhos diversas vezes para que minha visão entrasse em foco.

Assim que tive certeza de estar melhor, fui à cozinha preparar meu chocolate quente, a única coisa que me acalmava após uma crise. Depois de pronto, segurei a caneca fumegante em minhas mãos e me acomodei no sofá. Liguei a televisão em um canal qualquer e tomei um grande gole de chocolate quente. O líquido passou queimando pela minha garganta, aquecendo o local e se dispersando para o resto do corpo, enquanto o sabor doce e delicioso do chocolate se espalhava em meu paladar. Esse era uma das poucas coisas que conseguiam me fazer esquecer do presente, porém era uma alegria momentânea. Em questão de minutos, a tristeza e mágoa voltavam a me dominar.

Fui tirada de meus devaneios e pulei de susto quando o silêncio instalado no cômodo foi quebrado pelo meu celular que começou a berrar a música de Justin Timberlake, Mirrors. Pensei em desligar, porém descartei a ideia assim que vi o nome de Rachel piscando na tela do celular. Se eu desligasse o celular, ela com certeza me mataria.

- Alô?

- Oi puta.

Revirei os olhos e sorri levemente quando escutei a voz de Rachel me chamando de “puta”, o apelido carinhoso que ela me deu há anos atrás.

- Oi, meiguice de pessoa.

- Gostou do seu novo toque de celular? Fui eu que coloquei.

- Eu vou te matar, Ray. Já te disse que Justin Timberlake quebra com as minhas estruturas.

- Não tenho medo de você. Além do mais, aquele toque de piano estava me irritando. – Ray disse em deboche.

- Você cala essa sua boca, porque aquele toque é de uma música clássica. – falei, fingindo estar ofendida.

- Lottie, já te disse que você é brega?

- Já. Aliás, você disse isso da primeira vez em que nos conhecemos. – revirei os olhos novamente.

- Ah, é verdade. Mas enfim, tem certeza que não quer que eu vá ao hospital com você?

- Tenho sim. – me forcei a dizer essa frase.

- Mas Lottie, vai ser a primeira vez que você vai ao hospital desde que Liam-

- NÃO TERMINE A FRASE! – gritei ao celular, interrompendo Ray.

Ficamos em silêncio por vários minutos. Nenhuma das duas disse nada e até pensei que Ray tinha desligado quando ela tomou iniciativa.

- Me desculpa, Lottie. Sei que você não gosta quando falam isso.

- Eu que peço desculpas, não devia ter gritado com você.

Entramos em um silencio novamente, onde uma escutava somente a respiração da outra. Resolvi quebrar o silêncio desta vez.

- Mas olha, eu vou ficar bem. Preciso encarar isso sozinha, Ray. Não posso ficar fazendo manha para você toda hora. Você tem sua vida, suas preocupações e seus problemas. Não quero que você se prenda a mim. – disse com a maior calma que consegui reunir.

- Lottie, você sabe que eu não penso assim. Apesar de você ser um saco, eu não acho que você seja mais um dos problemas de minha vida. Eu te ajudo porque quero e jurei cuidar de você quando seus pais faleceram. Você é minha irmãzinha, mesmo que o sangue não seja o mesmo. E não ouse começar a chorar com o que eu disse.

Mas já era tarde demais. Lágrimas grossas começaram a cair de meus olhos e em pouco tempo já estava soluçando alto. Essa vagabunda! Ela sabe que eu sou sensível e fica falando uma coisa dessas.

- Lottie, para de ser uma bebê chorona e cala a boca. Você vai me fazer chorar também.

- Eu não me importo, é culpa sua eu estar chorando.

- Por que culpa minha?

- PORQUE VOCÊ SEMPRE ME FALA COISAS BONITAS SENDO QUE SABE QUE SOU MEGA SENSÍVEL. VOCÊ É UMA VADIA POR SER TÃO LEGAL E TER UM CORAÇÃO BOM. – berrei no celular e tenho certeza que ela teve de afastar seus ouvidos para não ficar surda.

- Espera aí, eu sou vadia por dizer coisas bonitas e sempre ser legal e boazinha com você, é isso?

- É isso aí.

- Lottie, vai se internar mulher. Você não está dizendo coisa com coisa. – Ray disse com falsa maldade na voz e eu sabia que ela estava sorrindo.

- Ai me deixa em paz moça. – disse, tentando controlar os soluços e secando os olhos com a manga de minha blusa.

- Vai se arrumar, Lottie. Você precisa ir logo ao hospital. – Ray disse em seu tom maternal que sempre usa quando eu choro.

- Estou indo. Mas é sério Ray, vou ficar bem.

-Tudo bem, confio em você. Mas se ficar muito difícil para você, não hesite em me ligar.

- Okay, lembrarei disso. Agora tchau, vou me arrumar. – falei enquanto levantava preguiçosamente do sofá.

- Tchau. Vê se passa uma maquiagem para disfarçar essa cara amassada e vermelha de choro. Vai assustar todo mundo se sair assim, do seu estado natural.

- Tá bom, eu entendi. Agora tchau.

- ESPERA! Não esquece de se agasalhar bem porque está um frio cortante. E se você ficar doente, quem sobra para cuidar de você sou eu.

- Aham. Agora vou desligar. – eu disse impaciente.

- ESPERA AÍ!

- O QUE É DESSA VEZ MULHER?

- Fala para o... Diz para ele que estou com saudades e que o amo.

- Pode deixar, Ray. Eu falo sim. Posso desligar agora?

- Não, tenho mais uma coisa para te dizer.

- O que é? Larga de ser chata e fala logo. Preciso me arrumar assim como você me recomendou. – bufei em impaciência.

- Seja forte, Lottie. Eu sei que você vai conseguir encarar isso sozinha. E eu amo você. – Ray disse em tom baixo, deixando transparecer sua leve preocupação comigo.

- Obrigada por se importar tanto comigo, Ray. E pela milésima vez, eu vou ficar bem. E eu também amo você, demais. – disse em tom sereno, tentando acalmá-la.

- Ai chega de melação, isso está me dando náuseas. Tchau Lottie, me liga assim que chegar em casa.

- Ligo sim. Tchau Ray! – desliguei o celular.

Ray sempre fora minha melhor amiga e nos conhecemos desde que éramos crianças. Nossos pais eram amigos e por isso passamos a infância juntas. Eu sempre a vi e a amei como uma irmã mais velha. Isso se intensificou quando meus pais morreram em um trágico acidente de carro e meu irmão mais velho me abandonou. Esse dia foi um dos piores da minha vida. Fiquei completamente sem rumo e nunca havia me sentindo tão sozinha. A solidão não era desconhecida por mim. Meus pais sempre foram ocupados e nunca tiveram muito tempo para ficar comigo e com meu irmão. E por causa disso, Alex (meu irmão) cresceu sendo uma pessoa amargurada e com muitas cicatrizes no coração. Cicatrizes tão profundas que nem eu, a irmãzinha que ele tanto amava e cuidava, fui capaz de curar. Mesmo estando na mesma casa, ele não falava mais comigo. E quando eu tentava estabelecer algum diálogo agradável, acabava sendo machucada pelas suas palavras frias e rudes. Mas eu não o culpava. Aliás, eu não culpava ninguém. Só queria que as coisas voltassem a ser do jeito que eram. Mas aquele dia do acidente foi diferente. Além dos meus pais, eu perdi também o meu irmão. Perdi minha família. A solidão e a dor foram as únicas que não me abandonaram e continuaram ao meu lado. E foi nesse momento de maior sofrimento que Rachel e sua família apareceram. Foram as pessoas que me acolheram depois de toda essa confusão. Houve uma vez, aos 12 anos de idade, quando disse que sentia falta de Alex, Rachel me abraçou e disse que ela era a minha irmã mais velha e jurou cuidar e me proteger de tudo. A partir daí nos tornamos inseparáveis.

Balancei a cabeça a fim de parar de pensar no passado. Assim que terminei de me arrumar, fui à sala pegar minha bolsa. Carteira, dinheiro, celular, lencinho de papel, meu gloss labial e meu livro. Certifiquei que esses itens não faltassem em minha bolsa e rumei à porta do apartamento. Coloquei o casaco mais grosso que tinha e fechei todos os botões. Enrolei meu cachecol no pescoço, escondendo meus lábios e deixando à mostra o nariz. Por fim, vesti meu gorrinho de urso que havia ganhado de... Nathan. Respirei fundo e fechei os olhos. Comecei a murmurar frases de incentivo para que o medo escondido em meu corpo sumisse. Reuni o máximo de coragem que ainda me restava e abri os olhos. Eu precisava fazer isso sozinha, lidar e encarar essa situação sozinha. Soltei o ar que estava preso em meus pulmões. Coloquei as mãos na maçaneta abri a porta, me pondo para fora o mais rápido possível. Se demorasse, eu sabia que o medo e o terror me preencheriam novamente. Agora que estou aqui fora, no corredor do prédio, com a porta devidamente trancada, não teria como voltar para trás.


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Notas finais do capítulo

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Se puder, por favor, deixem um comentário. Ou falem comigo pelo twitter, @breathbyun, sempre estou por lá.
Obrigada por ler e até a próxima atualização ^^



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