Lonely Hearts Club LHC escrita por Noel


Capítulo 6
Adam




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Lá estava Adam em uma de suas viagens durante a aula. Estava bem distante de tudo aquilo, nem sequer ouvia os ruídos ao seu redor. Nessas horas ele se sentia flutuando no espaço, sem um destino definido. Qualquer coisa podia acontecer a qualquer momento. De repente, a gravidade do planeta Terra o puxou do espaço, e agora ele estava fazendo uma prova. A última prova do ano.

Antes de toda essa viagem, ele já havia quase terminado. Para ele, era fácil demais. Faltava apenas uma questão. Quando já ia deslizar a caneta para escrever a resposta final, alguém jogou uma bolinha minúscula de papel em sua mesa. Era um pedido de ajuda, de alguém sentado lá do outro lado da sala. Adam o desprezou e preferiu terminar sua avaliação.

Ainda havia muito tempo para esperar ali dentro. Então Adam olhou novamente o papelzinho e resolveu ajudar. Jogou de volta com a resposta. Do outro lado, veio um sorriso de agradecimento, bem sofrido. Adam imaginou que aquela pessoa realmente estava precisando passar de ano.

Os outros alunos provavelmente perceberam o que ele fizera, porque todos começaram a cochichar para ele, mandar borrachas, papéis e outros modos de pedir socorro. Adam era habilidoso, porque conseguiu realizar várias necessidades dos outros ao mesmo tempo. Ao terminar, percebeu que todos estavam mais aliviados, e muitos lhe agradeceram. Era assim que ele conquistava aliados.

No intervalo, porém, todos agiam como se o mundo lá fora fosse outra coisa. Nem parecia que tinham acabado de fazer uma prova final. E ninguém mais parecia lembrar que Adam existia. Mas isso não o atingia. Ele fizera o bem para todos. Isso era o que importava. Ainda assim, considerava que aqueles talvez fossem seus amigos.

Foi embora para casa, e chegando viu suas mães trabalharem exaustivamente. As duas trabalhavam com relações internacionais, por isso raramente estavam em casa. Quando se aproximou, escutava as conversas em italiano e coreano, uma mãe lhe deu um aceno mão rápido e a outra uma piscadela. Entrou no quarto e relaxou. Mais uma vez flutuando no espaço.

Com o barulho da porta abrindo, Adam caiu em queda livre e sua mãe pediu para que fosse ao mercado, ao petshop, à cafeteria, ao correio e à farmácia. Jogou-lhe a chave do carro e pediu-lhe para ter cuidado. O fato era que Adam ainda não tinha carteira de motorista, mas mesmo assim já dirigia. Realmente era muita coisa para fazer. Suas mães estavam tão ocupadas que nunca nem tinham pensado em contratar alguém para realizar essas e outras tarefas. E eram avarentas também. Se soubessem que Adam gastara fora do “necessário”, mesmo que fosse um pouco para dar a um necessitado, elas parariam todo o trabalho para gritar mil coisas para rebaixa-lo. Mas elas não tinham culpa. O trabalho delas era realmente estressante. Adam devia compreendê-las.

Depois de fazer tudo aquilo, chegou em casa e percebeu que elas estavam prontas para ir embora. Uma ia para Singapura e a outra para Noruega. Sem querer, Adam deixou uma lágrima cair, mas ele conseguiu disfarça-la antes que elas pudessem ver. Entregou o café, o chá, as torradas, o croissant, o gato, os remédios e todos os suprimentos necessários para a viagem. Elas se despediram dele com um abraço em grupo. Adam sentiu uma estranha dificuldade em respirar. Eles se soltaram, e então Adam observou as duas entrarem no táxi e irem em direção ao aeroporto.

Adam não estava entendendo porque estava tão angustiado. Já passara por aquela situação muitas e muitas vezes. Sentia um pesar enorme em seu peito, e começou a chorar. Estranho. Muito estranho. Queria alcançar novamente o espaço, queria flutuar. Porém, parecia que estava muito longe e pesado demais. Estava caindo, e então ele chocou-se contra o chão. Lá fora chovia.

Chuva. Precisava ir lá fora. Sentir as gotas na pele. Lavar-se. Não literalmente, pelado e usando sabão e tudo mais. Mas tinha que tirar esse peso de dentro de si. Tornar-se leve. E depois flutuar novamente. E foi isso que ele fez. No entanto, dessa vez a chuva não o consolara. Parecia que ela o acolhera, como se ela se sentisse do mesmo modo que ele, e os dois choravam juntos. Adam nem quis andar um pouco ou ir até o parque próximo de sua casa. Ficou ali na frente de seu lar. Mas ele se sentia distante daquilo. Sentia-se sozinho. Mas não sabia por quê.

Alguém numa capa de chuva amarela fluorescente correu pela rua até chegar ali onde ele estava. Sentou-se no meio-fio e balançava a cabeça de um lado para o outro, como se estivesse com uma melodia em mente. Adam nem ligou para quem quer que fosse essa pessoa. Quando já estava entrando de volta para casa, uma pedra acertou-lhe a cabeça e ele se virou meio bravo. E se assustou quando esbarrou numa menina de botas de chuva laranja, usando a mesma capa de chuva que aquela pessoa sentada no meio-fio.

– Ande comigo! – disse ela sorridente.

Adam franziu o cenho, e foi surpreendido quando ela o puxou. Percebeu que estava descalço, e até tentou voltar para casa, mas a garota o impediu. Andavam por uma rua cheia de comércios. Ela estava calada, sorrindo e olhando para frente. Adam a encarava. Quando ela virou o rosto, provavelmente percebendo que ele olhava muito para ela, ele virou o rosto subitamente tentando esconder sua curiosidade quanto ao rosto dela. Ela deu uma risadinha. Ele enrubesceu.

– Tchau! – disse ela.

– Hã? – ele.

Dessa vez Adam caiu de verdade. Levantando-se, viu uma porta se fechando. Antes de estar totalmente fechada, viu aquela menina acenando para ele. Tudo se escureceu. Estava frio, e sob os seus pés o chão era todo de areia de cor sem vida. O horizonte que ali se estendia estava cinzento, não como o céu nublado do lado que imaginava ser o de fora. Mas assim como o céu do lado de fora, parecia estar pesado e melancólico, acolhendo Adam com empatia, como um velho amigo.


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