A Guardian's Diary 3 - Seasons of love escrita por Lino Linadoon


Capítulo 6
Capítulo 6 - Nomes


Notas iniciais do capítulo

04/03/2024 - CAPÍTULO REESCRITO!

Mais um capítulo quentinho do forno! :D
Espero que gostem! :D



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   Jack puxou as lapelas de seu terno, virando e examinando como a peça caia sobre sua forma magra. Ele já tinha experimentado aquela roupa várias vezes nesses últimos dias, desde a primeira versão – um “mockup” como Bloom chamava, mas Jack não entendia dessas coisas – até àquela que parecia quase completa, se não fosse pelos alfinetes cá e lá e pedaços não totalmente costurados.

   E, o rapaz tinha de admitir, ele gostava do que estava vendo.

   Por anos ele nunca mudou muito seu estilo. A calça que ele usava todo o santo dia era a mesma que ele usava quando humano, naquele fatídico dia e, honestamente? Ela ainda estava em boas condições e Jack não a trocaria por nenhum jeans novo! Mas ele tinha experimentado com algumas roupas diferentes cá e lá durante todos esses anos como um Espírito, mas ele sempre retornava para o básico: jaqueta e calça.

   Era estranho se ver usando um terno. Ele já tinha visto tantas pessoas usando tipos diferentes de ternos durante o passar dos séculos e tinha vez ou outra se imaginando usando as peças de roupa – mas elas pareciam tão desconfortáveis que ele decidiu que não valia à pena experimentar.

   E agora cá estava ele. O terno branco lhe cabia bem e, sendo mais apertado que a jaqueta que ele costumava usar, ele o fazia parecer ainda mais magro que o normal – com exceção daquele pequeno volume que estava começando a se formar em seu baixo ventre.

   Jack se perguntou o que Coelhão pensaria ao vê-lo usando aquilo e sentiu suas bochechas ficarem mais frias.

   “O que você acha?” Saori perguntou.

   “Eu nem sei o que dizer...” Jack sorriu para o reflexo da Jorogumo. “E nem está terminado, né?”

   “Ainda não.” Saori balançou a cabeça. “Você gostaria de mudar alguma coisa?”

   “Não, não. Está ótimo assim.” Jack disse, passando as mãos pela frente do terno. Ele realmente gostava do modo como tinha ficado. Não era o seu estilo, nem de longe! Mas ele gostava. Principalmente com os detalhes que Saoria tinha adicionado! “Você vai adicionar mais flocos de neve, né?”

   “Hai.” A aranha assentiu com um sorriso.

   “Legal.” Jack passou os dedos pelos flocos de neve bordados no tecido branco. Eles eram tão detalhados que o próprio Espírito do Inverno estava surpreso, era raro alguém conseguir capturar todos os detalhes de um floco de neve, mas de algum modo Saori tinha conseguido fazer aquilo com linhas brancas e azuis. “Eu adorei eles. Tão bonitos.”

   “Obrigada.” Saori agradeceu. “Eu aprendi a bordar com minha mãe.”

   Bloom riu baixinho e o sorriso de Saori se alargou um pouco mais. Jack olhou de uma para a outra, sem entender o que tinha acontecido ali, era como se tivesse perdido uma piada interna entre as duas garotas.

   “Então...” Bloom perguntou quando o garoto removeu o terno, tomando cuidado com os alfinetes ainda presos nele. “Como vai a gravidez?”

   “Tá tudo bem.” Jack disse simplesmente enquanto vestia sua confiável jaqueta azul.

   “Você ainda não tem barriga.” Bloom mencionou e Jack puxou a barra da jaqueta para baixo, escondendo totalmente o seu torso.

   Ainda era um tanto estranho conversar sobre aquilo com outros além de Coelhão. Não era como se ele sentisse que outros achassem aquilo estranho ou estivessem o julgado de qualquer modo, não, ele só... Achava estranho. Afinal, aquilo não era exatamente algo comum, não é?

   “É, é que ainda tá cedo.” Ele deu de ombros. “A Denti tá mostrando mais, já que ela vai ter dois.”

   “Eu podia jurar que você ia ter bem mais que ela.” Bloom riu, se colocando de ponta cabeça no divã de Saori, deixando os cabelos rosados caírem até o chão. Cabelos rosados queriam dizer que ela estava se divertindo. “Sabe, coelhos e tudo o mais.”

   “É, acho que todo mundo esperava isso...” Jack se lembrou de quando tinham feito um “ultrassom” pela primeira vez. Mesmo com Coelhão dizendo que ele não se importava se era só um ao invés de vários, ele ainda se perguntava se o Pooka não preferiria ter mais...

   “E você já pensou em nomes?” Saori perguntou enquanto movia o terno para o manequim que ela tinha feito de seda. Era praticamente idêntico ao rapaz, só sem cabeça, e Jack tinha se sentido um pouco desconfortável ao vê-lo pela primeira vez.

   O garoto piscou uma ou duas vezes, surpreso pela pergunta.

   “Não...” Ele admitiu.

   Pela Lua, essa era a primeira vez em que ele pensava nisso! A criança precisava de um nome e ele nem tinha uma ideia do que escolher! Mas não existia um método especifico para escolher, não é? Jack já tinha visto pessoas escolhendo o nome de seus personagens favoritos de filmes e livros – quantas pequenas Hermiones e Daenerys ele já tinha encontrado por aí... – ou então nomes de pessoas da família ou amigos, muitas vezes daqueles que já tinham passado... Alguns até procuravam nomes com significados específicos, não é?

   Jack nem sabia que nome ele gostaria de escolher, muito menos o que Coelhão preferiria.

   “A gente nem sabe o que é direito.” Jack admitiu no fim. Honestamente, depois de tantos anos aquele detalhe não fazia muita importância, mas em geral Jack achava que todo mundo devia ter um nome neutro pronto.

   “Pookas possuem tradição, né?” Saori tirou o Guardião da Diversão de seus pensamentos. “Pelo que me lembro...”

   “Ah, Coelhão não falou sobre isso...” Jack franziu o cenho. Tinha ainda muito que ele não sabia sobre Coelhão e a cultura Pookana e ele se sentia um tanto incomodado sabendo que uma Jorogumo que não tinha relação alguma com o Guardião da Esperança sabia mais daquilo do que ele.

   “Tá, tá, mas você não tem ideia nenhuma?” Bloom interrompeu os pensamentos do garoto como a outra tinha feito.

   Jack hesitou.

   Ele podia não ter pensado muito naquilo, mas não podia mentir: um nome especifico lhe veio à cabeça com aquela pergunta.

   “Na verdade...” Ele sentiu o coração apertar levemente, mas ele sorriu um pouco. “Talvez Flee.”

   “Flee?” Bloom repetiu a palavra.

   “É... Era o apelido da Emma. E dá pra qualquer um.” Jack deu de ombros. “Mas pode ser que a Emma ache estranho então... Eu sei lá.”

   Ele sorriu com a memória de sua irmã. Ele sempre ficaria grato à todos os poderes do universo por ter se reencontrado com Emma. E ele estava especialmente grato por Emma ter de algum modo retornado após sua vida humana como uma das fadinhas dos dentes; Jack se lembrava de como ela dizia que desejava poder voar como os pássaros e como ele as vezes a erguia nos braços ou nos ombros e os dois brincavam que ela voava.

   “Eu acho que é um garoto.” Bloom disse de repente.

   Jack piscou, se voltando para o Espírito da Primavera e ele não pôde deixar de rir.

   “Sério? Você acha que é um garoto?” Ele perguntou.

   “É? Por que essa cara?” Ironicamente Bloom fez uma careta.

   “Sei lá, pensei que você iria achar mais legal ser uma garota.” Jack disse simplesmente. Ele se lembrava de como Bloom tinha reclamado à um ponto, algumas décadas atras, sobre como era irritante que haviam tantos espíritos masculinos e tão poucos espíritos femininos relacionados às estações.

   “Sim, eu acharia legal. Mas talvez seja melhor um rapaz pra você e o Coelhão.” A garota deu de ombros e Jack não sabia bem o que ela queria dizer com aquilo.

   Mas ele não chegou a perguntar.

   “Eu diria que é uma garota.” Saori disse.

   “Sério?” Os espíritos das estações disseram ao mesmo tempo.

   “Hm.” Saori assentiu, inclinando a cabeça para o lado de um modo não muito natural. Jack tentou ignorar o que sentiu ao ver aquilo, principalmente com os olhos escuros da Jorogumo presos em sua barriga; ele puxou a jaqueta pra baixo mais uma vez. “Sim. Deve ser uma garota.”

   “Como você sabe?” Ele perguntou.

   “Eu só sei.” Saori disse simplesmente, sorrindo gentilmente.

   Jack ainda se sentia um tanto desconfortável, ele tinha que admitir...

   “Hum... Eu confio na Saori.” Bloom assentiu, erguendo o cajado e cutucando o rapaz. “É bom pensar em nomes femininos então.”

   “Tá, claro.” Jack assentiu, decidindo que ele já tinha passado tempo demais na companhia das duas. “Eu acho que isso é algo que só diz respeito a mim e Coelhão, obrigado.” Ele adicionou, lançando um olhar para Bloom que mostrou a língua para ele. “Aliás, eu tenho que ir. Coisas pra fazer e um Pooka para ver. Obrigado de novo, Saori.” Ele disse genuinamente.

   O trabalho de Saori era magnifico e ele sempre seria grato a ela por aceitar fazer seu terno, mesmo sem os dois se conhecer muito bem. Jack tinha certeza que o único motivo pelo qual Saori tinha aceitado fazer aquilo era por que Bloom tinha pedido, e era claro que as duas eram bem próximas.

   Bem próximas...

   “Seu terno ficará lindo.” Saori disse com um sorriso gentil. “Obrigada por me dar essa chance. Sempre adorei fazer roupas com temas de inverno.”

   Jack sorriu em resposta e pegou o cajado, acenando para as duas antes de voar para fora do jardim secreto em que o Espírito da Primavera vivia. Ele chamou pelo vento frio e se deixou levar para longe.

   Enquanto atravessava uma cidade, passando por arranha-céus altos e que cintilavam na luz do sol, ele parou frente às janelas de um deles, examinando seu reflexo.

   O fato dele sempre ter sido magro como um palito o ajudava a ver o que a gravidez estava fazendo com seu corpo e, embora ele não tivesse notado nada demais até ali, era claro que as coisas estavam começando a mudar.

   Sua cintura não era mais a mesma e, se ele levantasse sua blusa, era fácil notar que sua barriga, normalmente lisa, já apresentava uma curva que não estava lá antes.

   “Três meses...” Ele murmurou para si mesmo.

   Ele viu como Dentiana também tinha mudado um pouco, uma vez que ela tinha descoberto sua gravidez antes da dele, os deixando com algumas semanas de diferença. A barriga da fada já estava um pouco maior que a dele, mas era de se esperar uma vez que ela estava tendo gêmeos.

   Jack nem conseguia imaginar como ele iria ficar com uma barriga grande.

   Ele pousou a mão na barriga.

   E ele mal conseguia acreditar que tinha uma coisinha ali!

   Uma coisinha que iria nascer, crescer e se tornar uma pessoa. E uma pessoa precisava de um nome.

   Ele pensou de volta na conversa que teve com as garotas. Fora Flee, ele realmente nunca tinha pensado em qualquer outro nome, talvez só Emma, Jamie e Sophie – mas ele não sabia como os originários daqueles nomes iriam se sentir quanto àquilo, ou o que Coelhão iria pensar, mesmo tendo um ponto fraco pela jovem Sophie.

   De qualquer modo, era algo que ele tinha de conversar com Coelhão sobre. Mas talvez ele devesse ter uma conversadinha com Dentiana, afinal, ela também estava grávida, só para saber o que ela tinha a dizer sobre aquilo...

   O caminho para o palácio secreto de Punjam Hy Loo era interessante de tomar. Assim como Jack tinha tentando várias vezes entrar na oficina do Papai Noel, ele tinha tentado algumas vezes entrar no palácio da Fada dos Dentes, com ainda menos sucesso.

   Além da magia que escondia o palácio das fadas, o lugar era guardado por criaturas maiores e mais poderosas que os Yetis do Polo Norte, e Jack se lembrava bem do choque ao se deparar com um daqueles pela primeira vez. Afinal, quem sequer poderia imaginar gigantes elefantas com asas de borboletas?!

   Os elefantes nunca tinham sido violentos com ele, mas nunca o permitiram chegar muito perto. Eles podiam ser enormes e pesados como típicos elefantes terrestres, mas esses elefantes alados eram extremamente rápidos. Embora nunca tivesse desistido de tentar entrar em Punjam Hy Loo, Jack se focou mais na oficina do Papai Noel.

   Hoje em dia eles o deixavam passar sem problemas, o reconhecendo e as vezes dando um “olá” com as trombas longas.

   “Uou!” Jack riu quando uma fadinha passou do lado dele, rápida como uma bala. Ele deixou o vento o levar, acompanhando as fadinhas, sorrindo e acenando para aquelas que o notavam no caminho.

   E ele não estava nem um pouco surpreso ao pousar no saguão principal do palácio e encontrar a Fada dos Dentes trabalhando agitadamente como sempre. Ele sabia que caso Norte estivesse ali, ele estaria falando para sua noiva que ela precisava descansar.

   “Grupo do norte europeu em formação, muito bem! Muito bem! Sul europeu é sua vez!” Ele comandou sem pestanejar, completamente ignorando o visitante até que algumas fadas se aproximaram dela. “O que?” E ela finalmente se voltou para o garoto, que acenou. “Jack!”

   Jack já abriu os braços, mas ainda assim cambaleou quando a fada o abraçou. Ela rapidamente se afastou, arrumando as penas e a jaqueta do rapaz enquanto pedia desculpas.

   “Ah, Jack! Que bela surpresa!” Ela disse com um sorriso largo e um pouco apologético. “Que coisa, Emma acabou de voar para ajudar no sul da África! Mas logo, logo ela estará de volta!”

   “Tá tudo bem, eu queria ver você também, Denti.” Jack disse. “A não ser que esteja muito atarefada, por que daí eu passo outra hora...”

   “Ah, não, não! Está tudo em ordem! E minhas fadinhas podem me avisar caso haja algum problema, não é garotas?” O grupo de fadinhas que acompanhavam Dentiana assentiram. “Mas venha, venha!”

   Jack acompanhou a Fada dos Dentes até um dos jardins que cercavam o palácio. Ele sorriu para as pinturas nas pedras, se lembrando da pintura que tinha visto na primeira vez que esteve em Punjam Hy Loo, e do que tinha descoberto graças a ela.

   “Ah, e como vai você? E o bebê?” Ela hesitou, esperando por permissão. Jack assentiu, deixando que ela pousasse suas mãos sobre sua barriga. Ele corou, ainda não estava acostumado com aquilo.

   “Tudo bem. Nada fora do normal... Se é que isso aqui é normal, né?” Ele sorriu para a fada que riu baixinho. “E... Você?”

   “Oh, eu diria o mesmo.” Dentiana disse, também dando à Jack a permissão de tocar sua barriga.

   Exatamente como Jack se lembrava desde a última vez que tinha visto a fada, a barriga dessa estava bem mais curva que a dele. Jack tentava não pensar nas coisas pessoais de seus amigos, por que aquilo seria estranho, mas algumas coisas vinham à sua mente, algumas perguntas. E uma delas no momento era o quão grande aquelas crianças iam ser... Pelo bem de Dentiana ele esperava que elas fossem crianças pequenas.

   O rapaz de gelo foi tirado de seus pensamentos quando um grupo de fadinhas apareceu trazendo consigo duas xícaras e um bule. Jack nunca tinha sido muito fã de chá – não que ele tenha tomado muito – mas Coelhão tinha o ajudado a se acostumar a beber; de qualquer modo, Jack nunca diria “não” para um pouco de Chai de Punjam Hy Loo.

   “Você e Norte já pensaram sobre nomes...?” Jack perguntou, decidindo ir direto ao ponto de sua visita, se sentando à uma pequena mesinha redonda junto da fada.

   “Ah, já temos algumas ideias.” Dentiana disse com um sorriso, colocando um pouco de Chai numa das xícaras e a deslizando para Jack antes de encher a sua. “Já decidimos em um nome feminino: Wonder.”

   “Sério? Não me diga, foi o Norte que teve a ideia?” Jack riu.

   “Na verdade fui eu.” A fada riu também, suas penas se eriçando.

   “Ah.” Jack murmurou contra a borda da xícara. “E nomes masculinos?”

   “Ainda estamos pensando...” E, dizendo isso, a expressão de Dentiana se tornou um tanto pensativa, seus olhos cor de ametista ficando distantes.

   Jack não sabia o que aquilo queria dizer, mas, por algum motivo ele reconhecia aquele olhar... Ele tinha quase certeza de que tinha visto aquele mesmo olhar nos olhos verdes de Coelhão...

   “E você? Já decidiu algum nome com o Coelhão?” Dentiana perguntou, se voltando para o garoto e sorrindo como se nada tivesse acontecido.

   “Ah... Ainda não...” O garoto disse, um pouco surpreso com a repentina mudança. “Eu nem tinha pensado nisso, honestamente...”

   “Ora, Jack...” Dentiana disse em um tom de repreensão falsa, mas então riu. “Mas nenhuma preferência mesmo?”

   “Preferência?”

   “É, você não prefere algum nome?” A fada explicou.

   “Só Flee...” Ele contou, como tinha contado para Bloom e Saori.

   “Ah, sim, Flee.” Dentiana assentiu e sua pequena mão pousou em cima da de Jack. O garoto soltou uma risada suave, então Dentiana sabia sobre o apelido de Emma. “É um nome bom.”

   “É um nome bobo.” Jack balançou a cabeça, ainda sorrindo. Era um apelido tão antigo, tão bobo, dado para sua irmã por que ela sempre estava correndo por aí; Jack era ainda novo quando ele caiu no rio, mas até mesmo ele as vezes se cansava de correr atrás de Emma.

   “Não, é um nome bom.” Dentiana retrucou, seu tom de voz um pouco mais sério, embora ela ainda sorrisse. Sua atenção se voltou para a rainha das fadas, encontrando aqueles olhos brilhantes e arroxeados focados nele. “É um nome com significado e com história. É um nome perfeito.”

   O Guardião da Diversão processou aquilo.

   Sim, Dentiana tinha razão. Por tanto tempo Jack não tinha sido incapaz de se lembrar de sua vida passada e ele teria ficado assim por tanto tempo caso as coisas não tivessem acontecido como tinham acontecido. Ele ainda se sentia desconectado de seu passado, mesmo com suas memórias de volta em suas mãos. Às vezes ele até se perguntava se o Coelhão sentia o mesmo em relação a seu passado...

   “É...” Jack assentiu, sentindo um leve gelo colorir suas bochechas. “Só tenho que ver com a Emma, saber se ela não se importa com isso...”

   No mesmo instante um guincho familiar interrompeu o garoto.

   “Ah, eu acho que ela não se importa.” Dentiana riu.

   E Jack sentiu quando algo pequeno se emaranhou em seus cabelos, soltando guinchos de alegria e ele teve de rir também, balançando a cabeça para afastar a irmã contente.

—G-

   Jack parou ao lado das tulipas coloridas, observando seu noivo.

   Coelhão não tinha trabalho para fazer agora que a Páscoa tinha passado, mas ele ainda assim sempre encontrava modos de ficar ocupado e, é claro, era de se esperar que algo que ele gostava de fazer era pintar.

   Sentado frente a um pequeno cavalete, o Pooka recriava na tela – também pequena – um dos ovos guardiões descansando entre flores coloridas; e, mesmo de longe, Jack podia ver até mesmo as borboletas que Coelhão tinha adicionado à imagem. Era uma quase perfeita recriação daquele canto da Toca.

   “Se eu pedir para você me desenhar como uma das suas garotas Pooka, você desenha?” O garoto teve de fazer piada.

   As orelhas de Coelhão tremeram e Jack o ouviu rindo, sem parar de trabalhar em sua pintura por um momento sequer.

   “E o que eu ganho com isso, Frostbite?” Ele perguntou.

   “A chance de me ver pelado.” Jack respondeu.

   “Ah, uma boa troca.” Coelhão disse, sua voz um pouco mais grave que o normal, e o garoto sentiu seu rosto congelar.

   Finalmente, o Guardião da Esperança deixou seu pincel e seu quadro de lado, se voltando para o outro com um sorrio.

   Com um giro de seu cajado, Jack pulou por cima das tulipas coloridas e pousou silenciosamente ao lado do outro, se inclinando contra o corpo felpudo quando dois braços longos e felpudos o envolveram em um abraço. Coelhão tremeu e então riu ao sentir o frio do rapaz o tocar, enquanto isso, Jack se sentiu praticamente derreter com o calor do Pooka.

   “Ei...” Ele murmurou contra o pelo de Coelhão, se aconchegando ao seu lado.

   “Está tudo bem?” Coelhão perguntou, erguendo uma pata para afastar a franja branca do menor.

   Jack balançou a cabeça com uma risada baixa; é claro que Coelhão iria notar quando ele estava com muita coisa na cabeça, ele sempre parecia notar esse tipo de coisa.

   “Sim.” Ele disse sem levantar o rosto do lado felpudo do Pooka. “A Saori me mostrou como está ficando o terno.” Parte dele queria contar para Coelhão sobre seu terno, queria saber qual seria a opinião do seu noivo, mas outra parte dele queria fazer o outro esperar, assim como ele estava fazendo. “Eu gostei.”

   “Que bom.” Coelhão assentiu.

   “E quanto ao seu robe...?” Jack começou a perguntar, só pra ver se iria conseguir alguma coisa.

   “Não.”

   “Blé.” Jack mostrou a língua para o Pooka, se afastando dele com um frio gelado que fez Coelhão se arrepiar e revirar os olhos com um sorriso.

   “Mas tem mais alguma coisa nessa cabecinha sua, não tem?” Coelhão disse, seus olhos e sua voz mais gentis dessa vez.

   “Talvez...” O rapaz deu de ombros, congelando um filete de grama e o arrancando do chão.

   Houve um momento de silêncio. Ele queria falar com Coelhão sobre a conversa de antes, queria discutir com ele a ideia de nomes, mas ao mesmo tempo ele não tinha muita certeza de como abordar aquilo do modo que ele queria. A conversa com Dentiana ficou presa em sua mente, junto com as palavras de Saori, e ele não conseguia parar de pensar sobre aquilo; não sobre que nome escolher exatamente, mas o que aquilo podia significar para Coelhão...

   “Que tal uma mudança de ares, hum?” Coelhão disse de repente. O Pooka tinha se levantado, esticando uma mão para o garoto. “Talvez te faça melhor.”

   Eles raramente saiam da Toca, e a maior parte das vezes quando faziam isso era a pedidos de Jack – ou não a pedidos, mas sim puxões -, mas dessa vez foi Coelhão quem chamou Jack para subir por um túnel mágico com ele.

   E logo os dois estavam sentados na relva verde da ilha de Páscoa em um lugar sem poluição luminosa, permitindo a eles ver o céu escuro da noite e as milhares de estrelas que compunham a Via Láctea sem problema algum.

   Jack sempre tinha adorado as estrelas e o modo como elas iluminavam a escuridão da noite como flocos miúdos de neve. Ele tinha aprendido a ler as diferentes constelações e se guiar pelo céu com elas, além de ter visto como as estrelas que faziam parte delas mudaram em 300 anos. E ele, assim como os humanos, se perguntou se havia outros lá fora; afinal, se existia um Homem na lua, por que não haveriam outras pessoas em outros planetas, em outras luas?

   Mas agora as estrelas e o espaço lá fora tinham um outro significado para Jack. Aquilo agora fazia parte da história de Coelhão, primeiro um companheiro Guardião, depois amigo, depois namorado e agora noivo... Futuro pai de seu bebê.

   (Jack às vezes se sentia bobo e incomodado com o quão meloso ele tinha se tornado...)

   Ainda havia tanto que ele queria perguntar para o Pooka, sobre o espaço lá fora, se ele já tinha viajado entre planetas, se ele sabia de onde seu povo tinha vindo... Mas ele ainda hesitava, tentando ter um pouco de cuidado com o que falava e fazia.

   O bom era que, falar com Coelhão era fácil – ou pelo menos era agora, Jack se lembrava de quando o único jeito dele ter uma conversa com o Guardião da Esperança era o incomodando e o antagonizando. Jack gostava de dizer que incomodar outras pessoas era seu jeito de mostrar que gostava delas, e ele não estava mentindo, principalmente em relação à Coelhão.

   As conversas fluíam com naturalidade, e até mesmo começar as conversas era mais fácil com Coelhão do que com outros, na opinião de Jack – não que ele soubesse muito dessas coisas, ele podia ser brincalhão e falar e rir alto, fazendo amigos com facilidade, mas lá dentro ele sempre tinha sido mais um introvertido.

   “A Bloom acha que a gente vai ter um garoto.” Jack mencionou, mordiscando o doce que Coelhão tinha feito e que eles tinham trazido para o piquenique em baixo das estrelas.

   “É mesmo?” Coelhão fez um som baixo, sem desviar os olhos das estrelas.

   “É, mas a Saori disse que é uma garota.” Jack adicionou.

   O Pooka não reagiu de imediato e o Espírito do Inverno notou como as orelhas grandes tremeram levemente. Os olhos verdes do Pooka, que Jack podia ver graças à luz prateada da lua, ficaram momentaneamente vagos, embora as sobrancelhas estivessem franzidas.

   “Ah...” Foi só o que Coelhão disse.

   Jack esperou por mais alguma coisa, mas tudo o que o outro Guardião fez foi mordiscar a fruta que comia.

   “Você acha que ela está certa?” Ele pressionou.

   As sobrancelhas grossas de Coelhão se apertaram mais uma vez e ele balançou a cabeça de um modo estranho, que não era nem afirmativo nem negativo.

   “Jorogumos são criaturas... Interessantes.” Ele disse ao engolir o que tinha na boca, e seus olhos se voltaram para o rapaz, parecendo mais sérios do que o necessário. “O único motivo pelo qual eu fico confortável com você visitando uma delas é porque ela e Bloom são amigas.”

   “Tá bom...?” Jack não sabia muito sobre Jorogumos, fora as lendas de como elas devoravam pessoas, em sua maioria homens. Mas até agora Saori não tinha demostrado nenhuma intenção de devorar tanto Jack quanto Bloom. Então, por que se preocupar? “E essa conversa levou ao tema sobre nomes...”

   “Ah, sim.” Coelhão disse e dessa vez ele estava sorrindo, o que fez Jack sorrir também, um leve azulado pintando suas bochechas. Qual é? O noivo dele era bonito sorrindo!

   “Saori disse que Pookas tem uma tradição sobre isso.” Jack perguntou, tomando aquela chance para descobrir um pouco mais sobre o outro.

   “Depende muito do clã.” Coelhão deu de ombros, mas não elaborou.

   “Sei...” Jack revirou os olhos, se inclinando mais na direção do Pooka. “O seu tinha?”

   “De um modo ou de outro.” Coelhão repetiu o movimento anterior e Jack grunhiu de modo exagerado.

   “Dá pra parar de ser enigmático e me responder de vez?” Ele reclamou, mas viu que o sorriso de Coelhão tinha se alargado novamente. É claro, Jack não era o único que gostava de irritar aqueles de quem ele gostava.

   “Sim. Nós tínhamos.” O Guardião da Esperança admitiu. “Mas nem todos seguiam a tradição.” Ele lançou um olhar de irritação falsa para o rapaz de gelo. “Feliz?”

   “Sim, obrigado.” Jack assentiu com um sorriso bobo que fez o outro revirar os olhos. Ele se ajeitou onde sentava, ficando voltado para o Pooka. “E então, qual é essa tradição?”

   “Nós não precisamos usar ela.” Coelhão disse simplesmente.

   “Tá, mas e se a gente quiser?” Jack perguntou.

   “Aí a gente usa.” Coelhão respondeu.

   O garoto revirou os olhos com um suspiro exasperado, antes de parar para pensar. E se... Tivesse algum motivo para Coelhão não querer fazer aquilo...?

   “Você usou alguma vez?” Jack perguntou mais uma vez.

   “Sim.” Coelhão disse, e soltou uma risada baixa, daquele tipo que a gente dá ao pensar em uma memória engraçada de muito tempo atrás. Jack sentiu seu coração pular com o som. “Várias vezes.”

   Jack hesitou.

   Talvez Coelhão não quisesse dividir aquilo com ele por que era alguma coisa para ser dividido só entre Pookas? Mas não havia mais nenhum Pooka no universo a não ser ele! E até ali, Coelhão não tinha hesitado em compartilhar partes da sua cultura com Jack, além de permitir ao rapaz fazer parte dela, de um modo ou de outro!

   Ou, quem sabe, ele só estava sendo misterioso pelo prazer de ser misterioso, só para atiçar o garoto? Não seria a primeira vez que ele fazia uma coisa similar.

   Ou talvez fosse um tipo de tradição que era feita depois do nascimento do bebê. Ou depois do casamento...?

   Se bem que, Coelhão tinha dito que a ideia de casamento entre Pookas era o mesmo que: mudar para a mesma toca juntos. Sem cerimônias a não ser que o casal quisesse ter tal coisa.

   E Jack novamente se encontrou pensando no casamento...

   O garoto quase pulou ao sentir um dedo felpudo cutucar sua testa. Ele piscou, virando o olhar para Coelhão.

   “Eu sempre me preocupo quando você fica quieto desse jeito.” Coelhão disse com um sorriso torto, brincalhão, mas ainda com um tom gentil em sua voz, como que para mostrar que ele levaria aquilo à sério se fosse um tema sério para o rapaz. “Sem saber o que se passa nessa cachola...”

   Jack bufou e afastou a pata grande que brincou com seus cabelos, os desarrumando.

   “Só pensando no casamento, seu chato!” Ele respondeu, mostrando a língua para o Pooka que respondeu mostrando a língua também, o que arrancou uma risada do rapaz.

   “Mudando de ideia, moleque?” Coelhão perguntou.

   “Ha! Não!” Jack lançou um olhar para o outro, ao mesmo tempo brincalhão e sedutor e, embora não desse para ver em baixo do pelo, ele sabia que Coelhão tinha corado. “Você não vai conseguir se livrar de mim assim tão fácil~” Ele esticou a mão e apertou o dedo contra o focinho do Pooka, que tremeu em baixo de seu toque.

   Os olhos de Coelhão de repente se alargaram e ele se afastou, limpando o focinho no pelo.

   “Limpe os dedos, Jack, francamente...” Ele reclamou e Jack notou que ainda tinha chocolate em seus dedos.

   Jack revirou os olhos, enfiando os dedos na boca. Ele manteve os olhos presos em seu noivo enquanto fazia isso. As pupilas de Coelhão se alargaram consideravelmente, observando o rapaz e o que ele fazia. Jack sorriu em volta de um dos dedos antes de lamber de modo lento e sugestivo.

   “Ora, seu moleque...!” Coelhão sibilou por entre os dentes, antes de agarrar os pulsos do rapaz, o jogando na grama. A risada alta de Jack, que soava como sinos de vento, foi interrompida pelos lábios quentes de Coelhão nos seus.

—G-

   Jack apertou o corpo contra o de Coelhão, como se tentasse se tornar um com o outro; ele adorava sentir o pelo suave do Pooka contra sua pele nua.

   “Então...”

   “Hm?” Coelhão perguntou, movendo a cabeça um pouco para ver melhor o rapaz, embora esse escondesse o rosto ainda levemente suado contra seu peito felpudo. 

   “Você disse que Pookas normalmente não tem casamentos e que vocês só decidem ficar juntos, né?” Jack perguntou, a voz agora um tanto rouca, sendo abafada no pelo do outro.

   “Você ainda está pensando nisso?” Coelhão bufou.

   “Tô sim!” Jack retrucou e Coelhão bufou mais uma vez. Ele abaixou a cabeça, brincando com o pelo azul-acinzentado de seu noivo; em resposta a esse toque, uma das patas de Coelhão começou a gentilmente afagar sua pele pálida, o toque tão gentil que ele quase tremeu. “Me diz... Foi assim, sabe, com os seus outros relacionamentos?”

   “Sim, menos um.” Coelhão assentiu. “Meu segundo relacionamento teve uma festa de união e em parte foi só para alegrar os filhotes.”

   “Os seus filhotes?” Jack inclinou a cabeça para trás para poder ver melhor o rosto do Pooka.

   “Os filhotes do clã dela, os meus já estavam mais crescidos.” Coelhão esclareceu, recebendo um suave “ah” do rapaz. Ele manteve os olhos presos nas estrelas enquanto o silêncio se esticou, até que ele decidiu que estava silencioso demais. “Jack?” Ele abaixou o olhar, encontrando Jack ainda o encarando.

   “Você tem tanta experiência com tudo isso.” O Guardião da Diversão disse, encarando o outro Guardião com interesse. Coelhão notou o modo com os olhos azuis brilhavam na luz da lua. “Quero dizer, relacionamentos, ser um pai... E eu não sei de nada.” Dizendo isso, Jack deu de ombros, parecendo um tanto desapontado.

   “É, e eu já estive no mesmo barco.” Coelhão deu de ombros também, embora fosse difícil com o rapaz se agarrando a ele como um coala. “A gente aprende com o tempo.” Ele disse no que esperava ser um tom encorajador, com um sorriso no rosto.

   “Hm...” Jack assentiu, mas não parecia muito convencido.

   “Isso te deixa nervoso, não é?” Coelhão afagou suavemente o braço pálido do rapaz.

   “Como não deixaria?” Jack bufou, de repente lutando contra os braços do Pooka. Coelhão o deixou ir, observando enquanto o garoto se colocava sentado, precisando de mais espaço para respirar. “Eu disse que nunca pensei nisso! E de repente, tchans! Eu vou ser pai!” Ele desviou os olhos para sua barriga, ainda tão pequena, nada mais que uma curva simples, o que o deixou mais nervoso ainda. “Eu não tenho a mínima ideia do que eu estou fazendo e depois que essa coisinha nascer eu vou continuar sem a mínima ideia!”

   “Não vai, não.” Coelhão se sentou também, ainda mantendo uma distância confortável do rapaz. “Você vai aprender e eu vou te ajudar com isso.” E ele sorriu torto quando dois olhos azuis e ansiosos se voltaram para ele. “Assim como eu te ajudei a se tornar uma pessoa mais respeitável, seu moleque.”

   “Ah, tá!” Jack revirou os olhos, empurrando o ombro de Coelhão.

   Os dois riram juntos em baixo da luz das estrelas.

   Coelhão sorriu para Jack e o garoto sentiu seu rosto ficar mais frio em baixo do olhar do outro. Não era intenso, ao contrário, era gentil, doce, caindo sobre ele com um ar de adoração que Jack não acreditava que ele merecia, mas ainda assim, lá estava ele...

   “Mas sério, Jack...” O Pooka estendeu uma pata para o Espírito do Inverno. Jack não hesitou em toma-la em sua mão, deixando que os grandes dedos felpudos a envolvessem por completo. “O que você precisar, Frostbite, eu vou estar aqui pra te ajudar.”

   “Eu sei...” Jack assentiu e suspirou, inclinando-se contra o ombro do Pooka. Ele sentiu lábios tocarem o topo de sua cabeça e ele sorriu. E, por um momento, Jack imaginou se Coelhão já tinha feito aquilo com seus outros companheiros, e mais, se ele tinha beijado seus filhotes na cabeça daquele mesmo modo gentil e reconfortante... “Qual era o nome dos seus filhotes...?”

   “Da primeira ninhada, Hortênsia, Rosália, Íris Soturna e Jacinto. Da segunda Perpétua e Bun-d’oro.” Coelhão disse e Jack notou a leve mudança em seu tom de voz. Não era triste, ao contrário, tinha um ar contente, mas ainda assim uma leve onda de melancolia era fácil de notar. “E na terceira teve a Lavanda, Lebrério, Antúrio, Cravo-Camelo, Harey Ciclame e Prímula Coelhina.”

   “Uau... Nomes... Interessantes...” Jack disse, tentando não rir. “Tudo nome de flores e coisa assim?” Ele tinha aprendido várias coisas sobre a Primavera com o Guardião da Esperança, entre elas o nome de várias flores diferentes, além de seus significados – embora ele não se lembrasse muito bem delas.

   Coelhão não respondeu imediatamente e Jack ergueu o olhar para ele, encontrando o Pooka o lançando um olhar com uma sobrancelha erguida.

   “Ah, tá! Essa é a tradição!” O rapaz entendeu e parou para pensar um pouco. “Hm... O seu nome do meio é Áster, você me disse. Pelo menos isso, né?” Ele lançou um olhar pro Coelhão que só revirou os olhos. “É outra flor... O nosso bebê vai precisar de um nome de flor?” Ele perguntou com interesse.

   “Como eu disse: não, se você não quiser.” Coelhão deu de ombros. “Eu nunca dei muita importância a isso.”

   “Você se chama Coelhão. Eu notei alguns nomes, uh... Prímula Coelhina?”

   “Lebrério, Harey, sim... Também era comum.” Coelhão assentiu.

   Jack encarou seu noivo por um momento, processando toda aquela informação. Coelhão esperou pelo veredicto com um olhar relaxado.

   “... Áster é o seu último nome, não é?” Jack deduziu.

   O Pooka sorriu.

   “Não.” Ele disse simplesmente.

   Jack grunhiu exageradamente, escondendo o rosto contra o ombro do outro.

   “Droga, quando é que você vai me dizer o seu último nome?!” Ele reclamou.

   “Mais tarde, moleque impaciente.” Coelhão reclamou e teve de rir quando Jack ergueu o rosto, o lançando uma careta irritada com um bico exagerado.

   “Hm... Isso não ajuda muito a gente decidir num nome... Se eu soubesse seu sobrenome, talvez fosse mais fácil decidir.” Em resposta a isso, Coelhão só riu e balançou a cabeça negativamente. O rapaz revirou os olhos, antes de deixar que eles descessem até a pata do Pooka, que ele ainda segurava em sua mão. “... Então, você teve três ninhadas. Foi só com um outro Pooka, ou...?

   “Três.” Coelhão esclareceu.

   “É, você mencionou que teve mais de um...” Jack assentiu. Ele não podia mentir, só pensar em Coelhão com outro alguém, ainda mais três outros, o deixava com um pouco de ciúme, mesmo ele sabendo o quão irracional aquele pensamento era.

   “Sim.” Coelhão assentiu. Ele observou enquanto Jack levava sua pata até a barriga levemente curvada desse, assim como o Pooka tinha feito antes, logo depois de arrancar a blusa do rapaz. “Você quer saber...?”

   “Por que não?” Jack deu de ombros e sorriu, antes de adicionar. “A não ser que você não queira falar sobre eles. Mas você sabe que eu sou curioso.”

   “Oh, como sei.” Coelhão riu e o rapaz sorriu ao seu lado, olhos azuis e brilhantes totalmente focados nele. “Eu tive mais amantes do que esses três, mas foi só com eles que eu vi um futuro. Dedaleira foi a primeira, Pooka das Planícies por lado de pai, Pooka dos Campos por lado de mãe; heh, ela era uma figura.” Coelhão contou, sorrindo com as lembranças daquela época. “Anos mais tarde eu conheci Margarida. Dos Campos também... Nós costumávamos correr juntos.” Suas orelhas curvaram levemente, do modo que ele sabia Jack reconhecia como um ato de acanhamento. Jack só continuou sorrindo ao seu lado, afagando a pata ainda em sua barriga. Aquilo lembrou Coelhão de outro que tinha feito o mesmo. “E por último teve o Alstroméria.”

   “‘O’ Alstroméria?” Jack repetiu.

   “Sim, Alstroméria Lebreão. Um Pooka do Deserto.” Coelhão esclareceu. “Todos acharam estranho ele acabar com um Pooka dos Campos.”

   “Ele ficou grávido?” Jack piscou, surpreso.

   “Sim.”

   Uma pausa.

   “Ah... Isso era comum então?” Jack sentiu suas bochechas ficarem azuis, sem saber o exato porquê.

   “Não exatamente comum, mas também não era incomum.” Coelhão deu de ombros, como se não fosse grande coisa.

   “Magia Pookana?” O rapaz adivinhou.

   “Sim.”

   “Por isso você achou que você tinha feito eu ficar grávido sem querer...?” Jack se lembrava bem daquela conversa e não pôde deixar de sorrir um pouco ao ver as orelhas longas do Pooka abaixarem consideravelmente.

   “Praticamente. Até você me contar de seu desejo.” Ele disse quase sem jeito.

   “Huh... Então isso não é estranho pra você.” Jack assentiu.

   E de repente os olhos verdes de Coelhão se tonaram sérios. Ele ergueu a pata livre, agarrando o queixo do rapaz, forçando Jack a encará-lo nos olhos.

   “Isso é uma gravidez, Jack. Simples assim. Nada demais.” Ele disse, de modo decisivo, mesmo que ainda gentil e Jack sentiu seu rosto esfriar, enquanto seu corpo inteiro parecia derreter por um momento.

   Ele só assentiu em resposta, sentindo borboletas no estômago.

   Aos poucos, os olhos sérios de Coelhão se suavizaram, e ele acariciou gentilmente a pele pálida de seu noivo com os polegares. Ele desviou o olhar para a barriga do Espírito do Inverno, antes de o erguer para o rosto ainda azulado desse, encontrando olhos também azuis o observando com interesse. A lua brilhava neles.

   “Você disse que não sabe de muito nem teve muitas experiências...” Ele começou, decidindo que era hora dele fazer suas perguntas. “Então nunca teve ninguém antes de mim?”

   Jack balançou a cabeça e deu de ombros.

   “Não... Pelo menos, não que eu me lembre.” Seu rosto ficou ainda mais azul. Ele ainda não estava totalmente acostumado a falar muito sobre si mesmo. E, por causa disso, ele muitas vezes não pensava muito sobre o que tinha feito em sua vida imortal... “Ah, não, teve sim...” Ele sentiu o gelo se espalhar até as suas orelhas ao se lembrar daquilo, daquela pessoa e do que tinha sentido. “Mas foi só uma paixonite. Ele não tinha interesse em mim, ele tinha os olhos em outra...” Ele hesitou, fazendo uma careta. “Pessoa...”

  “Sei.” Coelhão assentiu.

  Jack se voltou para ele, encontrando Coelhão sorrindo daquele modo doce e compreensivo dele. Sua pata grande ainda acariciava a barriga curvada do rapaz. Jack gostava daquilo, era como se ele já pudesse sentir todo o amor que Coelhão iria dar para aquela criança antes mesmo dela estar totalmente formada, além do amor que ele sabia que o Pooka continuaria dando para ele.

   Ele se inclinou contra o calor confortável do outro mais uma vez.

   “Me conte mais sobre seus filhotes.”

   Coelhão sorriu e começou a contar.


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