Você era aquele alguém. Talvez nós tivéssemos um laço que apenas uma em cada cinqüenta pessoas consegue ter com outra pessoa. Todos os dias, ao mesmo tempo em que percebia o quanto o adorava, também notava o quanto você era incrivelmente humano, com todos aqueles defeitos irritantes que se revelavam diariamente. Que, mesmo sendo defeitos, traziam coisas boas. Porque sem eles eu não valorizaria suas inúmeras qualidades. Mulherengo, mas carinhoso. Inconveniente, mas divertido. Trambiqueiro, mas inteligente.

            O jeito com que me abraçava, justo quando precisava de alguém, como se adivinhasse meus pensamentos. Seu sempre caloroso sorriso ao me ver. Suas cantadas baratas. Os olhos azul-escuros, sempre alertas. O apoio que sempre me dava. O jeito como conseguia me irritar até a loucura. Com a convivência, não é difícil se apaixonar.

            E foi o que aconteceu.

            Não sei ao certo se foi aquela coisa de “amor à primeira vista” naquele dia, quando me dei conta de que Naraku tinha matado toda a minha família, ou se você foi aos poucos se instalando no meu coração. Só sei de que, quando me dei conta, estava amando o monge pervertido e mulherengo que nos acompanhava em nossa jornada... Eu fiquei tão irritada comigo mesma ao perceber que havia me deixado levar... Mas quem diria que aquelas cantadas baratas tinham um fundo de verdade, hein? Você me amava também, como eu pude finalmente confirmar naquele dia... Não imagina o quanto fiquei feliz...

            Mas às vezes me magoava tanto... e só se dava conta disso tarde demais... Mas eu continuava ali, apaixonada. E de alguma maneira, sempre aceitando perdão.

            Eu sabia que você não tinha muito tempo neste mundo, por causa da maldição. Talvez ela tenha tido seu lado bom, já que eu pude te conhecer. Mas eu não tinha me dado conta de que você poderia ir antes de nós derrotarmos o Naraku.

            Por que não esperou, meu querido Miroku? Por que teve de ser engolido pelo Kazaana apenas para me salvar? Isso me deixou mais triste do que qualquer cantada em outra mulher. Me magoou demais. E você devia saber disso.

            Mas estava sorrindo.

            Qual era o significado daquele sorriso? Era porque eu ainda estava viva? Porque você estava me vendo nos últimos momentos? Porque sabia que derrotaríamos Naraku no final? Se for, você estava certo. O maldito morreu, e eu recuperei meu irmão. Você ficaria tão feliz... Teria sua maldição acabada, e talvez eu pudesse lhe dar um dos filhos que você tanto desejava.

            Mas apesar de tudo, tudo o que consigo no momento é chorar. Estou exausta, mas não consigo dormir. Queria adormecer e não acordar mais.

            Era isso que você queria? Acho que não... Senão, não estaria sorrindo. Talvez você queira que eu viva... É... Vou viver... Tenho meu irmão e meus amigos. E a sua memória, que pra mim sempre vai ser viva.

            As lágrimas estão parando de cair. Agora quem vem é o sono. Se eu fechar os olhos, acho que durmo num instante.

            Promete que me acorda com um beijo?