Seize The Day

Por Jinx

Capítulo Único

Ele a observava já fazia um tempo. Se tornara um hábito. Adorava quando ela jogava seus cachos dourados por cima do ombro. Ela gostava de se exibir, ele sabia disso. Ela não era a melhor carreirista do Distrito 1, mas de longe era a mais bonita. Todos os garotos a amavam e admiravam e ela adorava a atenção que recebia.

Ele soube que era paixão quando percebeu que suas pernas ficavam bambas, suas mãos suavam e seu coração saltava em seu peito apenas por ouvir o nome dela. Agora cá estão eles, a caminho dos Jogos Vorazes. Não temia o Jogos, muito pelo contrário, era um carreirista, fora treinado para tal, mas algo o intrigava: apenas um sobrevive, apenas um sai vivo e volta para casa. Essas são as regras, sempre foram, mas ele queria transgredi-las, queria voltar vitorioso, trazendo honra e fortuna para sua família juntamente com a sua Glimmer.

Sacudiu a cabeça levemente para afastar esses pensamentos. Desde quando a garota mais linda de seu distrito iria ficar com um cara como ele? Voltou a treinar. Jogou a lança que antes jazia em suas mãos e acertara o centro do alvo. Alguns tributos próximos pararam o que estavam fazendo pelo som que sobressaíra dos demais, o som oco do impacto da ponta afiada da arma na madeira.

Olhou para os lados para ver onde estava a sua parceira de distrito e a viu conversando com Cato, o carreirista do Distrito 2. Glimmer estava acariciando os músculos sobressalentes do rapaz enquanto o mesmo não dava a mínima atenção a loira. Se Cato não fosse seu aliado, Marvel o teria matado-o naquele instante.

Um barulho ao seu lado o fez desviar sua atenção dos dois e se virou. Uma garota baixinha e sardenta acabara de acertar uma de suas facas no alvo ao lado do seu. Mesmo pela altura, Marvel sabia que a garota tinha mais idade do que aparentava. Ela era do 2, o mesmo distrito do loiro aguado. Marvel tentou lembrar o seu nome... Carol? Callie?

- Clove - falou a garota parecendo que lera seus pensamentos só por sua expressão confusa.

- Sou Marvel.

- Eu sei - retrucou antes de atirar outra faca, um pouco maior e serrilhada que a anterior e acertando o alvo novamente - Somos aliados, lembra?

- Ah, sim - respondeu meio atordoado, se perguntando se era mesmo possível ter uma conversa decente enquanto se atira facas com precisão. Parece que a a resposta desta questão era afirmativa - Vejo que gosta de facas.

- Sim, é a arma que mais tenho facilidade de manusear. Elas parecem ser parte de mim enquanto treino - a morena disse com um sorriso que Marvel intitulou entre o sádico e o sonhador - Você é bom em que?

Ele realmente não sabia ao certo do porquê de estar dando trela para aquela conversa mole, afinal, eram os Jogos. Aquela garota sardenta era apenas mais um obstáculo que ele deveria superar para vencer, então não tinha motivos plausíveis de continuar ali. Mas, felizmente ou infelizmente, Clove, juntamente com Glimmer; Cato e a garota do 4, eram seus aliados. Deveria ficar alerta para tentar ao máximo descobrir suas fraquezas. Sabia que os tributos do 2 se aliaram a eles para terem um acordo de paz ou algo do gênero por ora, mas tinha conhecimento que o matariam quando fosse uma pedra em seus caminhos. Como era mesmo aquele ditado? "Mantenha seus amigos perto e seus inimigos mais perto ainda". Teria que fazer esse esforço por ora, mas, infelizmente, parecia que Marvel estava cercado de inimigos.

- Lanças - Marvel respondeu a pergunta que há tempos estava no ar, apenas esperando sua resposta.

- Entendi - então entraram em um silêncio desconfortável, que ora ou outra era quebrado pelo som das armas batendo nos alvos.

- Já tentei treinar com elas antes - continuou Clove referindo-se às lanças, depois de um tempo - Mas é necessário uma junção de habilidade física e massa corporal para manuseá-las com maestria, coisa que vejo que você dominou.

O garoto assentiu levemente, percebendo que Clove também estava interessada e desesperada em prolongar a conversa para saber mais sobre ele. Marvel permitiu-se a sorrir cinicamente. Por que não entrar naquela brincadeira tola?

- Hm... Talvez eu possa te ensinar, que tal?

Glimmer ajeitou sua franja para atrás da orelha e atirou a flecha, errando o centro do alvo por dois centímetros. Se tivesse atirado em alguém com certeza seria fatal, mas a loira não estava satisfeita com seu desempenho e queria aperfeiçoar sua técnica ao máximo antes dos Jogos. Teria que ser mais precisa.

Cansara de paquerar e jogar charme para cima do carreirista do 2 e foi treinar. Não gostava de ser ignorada, não mesmo. Parecia que outra garota já tinha chegado antes dela e conquistara o frio coração de Cato Ludwig.

Posicionou novamente outra flecha de prata em seu arco. Inspirou e expirou, seus olhos verdes concentrados no alvo em formato humano. Atirou e, dessa vez, conseguira cumprir o seu objetivo. Deu um um meio sorriso e procurou Marvel com os olhos e o viu posicionado atrás de Clove; juntos estavam segurando uma lança que, segundos depois se chocou com o alvo. Se qualquer pessoa além de Glimmer estivesse prestando atenção em tal cena acharia, no mínimo, bizarra. Clove era vinte e muitos centímetros mais baixa que Marvel, e com seus corpos tão colados dava para ter a noção de tanta diferença.

Bem, para a loira, aquela cena fora tudo menos bizarra. Sentiu seu sangue ferver e ficou com um pouco de tontura, como se estivesse de cabeça para baixo e tivesse se virado rápido demais.

O resto do tempo de treinamento fora um desperdício de tempo, pois ela não conseguira mais se concentrar.

Horas depois, no jantar, Glimmer mal encarava o seu parceiro de distrito, que estranhou o fato de ela estar tão calada. Só as vozes da acompanhante e dos estilistas era ouvida do início ao fim da refeição.

Logo após, o garoto, que juntara forças de Deus sabe onde, meio relutante, procurou a loira antes da mesma se retirar aos seus aposentos, para pedir-lhes explicações.

- O que houve?

- Desde quando você se importa? - a mesma parou de andar pelo longo corredor onde se localizava os quartos.

- Hm, o que você quer dizer com isso?

- Ah, eu não sei! - exclamou - Fique a vontade para perguntar à sua amiguinha Clove, a garota das facas - ironizou, revirando as orbes verdes.

Marvel ficara imóvel enquanto encarava a parceira de distrito. Não estava entendendo mais nada.

- É só por isso que você está assim?

- Como assim "só por isso"?

- Entenda - deu um suspiro pesaroso - Não são todos os garotos que devem ficar aos seus pés. Eu estive ao seu lado todo esse tempo e você nunca demonstrou nada em relação a mim.

- Marvel...

O mesmo fez um sinal com a mão a interrompendo, como se pedisse que ela se calasse para ele continuar.

- Até achava que você nem ligava para mim e vivi conformado com isso e então puf, do nada você começa com esse ciúmes idiota como se eu lhe devesse explicações ou algo do gênero.

- Mas...

- Glimmer, esquece... Eu só... Que merda, você não entende - o garoto deu às costas a ela e fora para seu quarto, sem antes murmurar - Você nunca vai entender.

Ela ficara lá, extasiada em emoções, até a porta do quarto de Marvel se fechar ruidosamente. O mesmo estava assustado e muito frustrado. Sempre tivera vergonha de lhe dirigir a palavra, mas nunca imaginou "discutir" com Glimmer.

A loira fez o mesmo, foi pra o quarto com lágrimas brotando nos cantos dos olhos, ameaçando rolar por seu belo rosto. Bateu a porta e pulou na cama macia, socando os travesseiros.

Por que eu tenho que ser tão estúpida? Preciso compreender que o mundo não gira ao meu redor, pensou consigo mesma.

Mesmo não demonstrando, ela o amava. No começo não aceitara o sentimento muito bem, como ela poderia ter se... apaixonado por um garoto tão sem graça como Marvel? Tudo bem que ele não era como os demais garotos, nunca tinha lhe dado uma cantada barata e coisa do tipo, a tratava como uma pessoa qualquer. Muitos a endeusavam por Glimmer ser a arrasa corações do distrito, mas ele não. Talvez esse jeito tímido e acanhado do moreno a cativara desde o início.

Não queria ficar brigada com o rapaz. Ficou indecisa entre se desculpar ou deixar as coisas como estavam, mas logo tratou-se de lembrar que dali três dias os dois seriam jogados em uma arena com mais vinte e dois jovens com o objetivo de se matarem. Com certeza esse não era um lugar apropriado para pedir desculpas. Respirou fundo e se sentou na cama bagunçada. Depois de uma pequena confusão mental, decidiu o que faria. O que ela tinha a perder, afinal?

Antes mesmo de se levantar, ouviu três batidinhas tímidas na porta. A loira foi até a mesma e a abriu, encontrando um Marvel um tanto corado e relutante.

- Marvel, me desculpe... Não sei o que deu em mim, eu... - suspirou baixinho. Por que era tão difícil formular algo concreto e plausível quando ele estava por perto? - Fui uma idiota, me perdoe.

Em resposta, com um sorriso acanhado no rosto, ele a beijou. Sim, a beijou. Até Glimmer ficara assustada pelo rapaz ter dado o primeiro passo pois, convenhamos, Marvel é meio lento quando se trata de coisas que envolvem o coração.

Ela correspondeu e nunca se sentira tão completa. Ao contrário da cena mas cedo de Marvel e Clove, os dois pareciam ter nascido um para o outros, se encaixavam perfeitamente.

Quando o beijo cessou, o garoto pegou a companheira no colo e a colocou na cama, deitando ao seu lado em seguida. Glimmer adorava esse jeito delicado do rapaz. Não se lembrava de quando se sentira tão feliz quanto naquele momento. Sabia que Marvel a amava verdadeiramente, não a Glimmer exterior por sua beleza ou até mesmo pelo sobrenome de peso, e sim inteiramente. Porque ele não se importava se seu cabelo loiro estava bagunçado, se seus olhos estavam vermelhos ou se sua maquiagem estava borrada, porque nada naquele mundo poderia estragar aquilo que tinham.

Ambos ficaram se encarando com sorrisos bobos nos lábios até adormecerem. Estavam apenas vivendo o momento, um dos últimos que lhes restaram, antes que tudo comece. Antes do massacre. Antes da matança. Antes da morte.