Lis escrita por Nyuu D


Capítulo 1
único




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Desde o início de sua fragilidade, Unohana acabava por cuidar da saúde do rapaz por livre e espontânea vontade. Quando Ukitake se desculpava, a morena movia a cabeça suavemente e dizia não ser culpa dele. E que ademais, era um prazer cuidar dele. “Não que você estar doente seja bom”, completava em seguida, para evitar quaisquer tipos de mal-entendidos. Mas claro que sempre teve consciência que aquela mulher jamais lhe desejaria o mal por pura satisfação de ego.

Ela estava sempre tão bonita. Não podia resistir olhar para ela.

Naquele exato momento, estavam todos dispostos no pátio da Academia Shinigami. Kyouraku, como lhe era costume, cercava um grupo de garotas e deixava Ukitake para trás. O rapaz dos cabelos brancos, porém, não se importava. Até se divertia com as reações exageradas das meninas em relação ao outro rapaz.

Mais à frente, Unohana caminhava sozinha na direção de uma frondosa árvore. Seus cabelos negros ainda não eram tão longos quanto hoje, mas já formavam uma bela trança que descia em suas costas. Alguns fios despontavam para fora do penteado, dançando suavemente com o movimento de seus passos. Os braços iam à frente, provavelmente ela estava abraçada em seus livros.

Assim que achou um banco, Ukitake sentou-se e pousou o seu bentou ao lado. Abriu a garrafinha de chá e tomou um pequeno gole. Seus olhos castanhos ficaram concentrados nos cabelos escuros ali adiante, observando-os mover com o vento fraco da tarde, já que agora, ela já estava sentada.

De repente, sua concentração foi quebrada por Kyouraku, que se sentou – na verdade, ele se jogou ao lado do amigo. Juushirou então virou o rosto e o olhou, suspirando.

– Que está pensando, Ukitake?

– Nada. – Mentiu. Seus olhos retomaram o rumo de antes e Shunsui, esperto como era, o acompanhou, percebendo então que eles se direcionavam à Unohana.

Com um longo suspiro, o rapaz abriu um galante sorriso na direção de uma garota que passava e logo em seguida, concentrou-se no amigo dos cabelos prematuramente grisalhos. – Unohana-chan mudou de nome? – Atreveu-se, sem a menor discrição. Ele nunca foi do tipo, no final das contas. Ukitake sentiu o rosto esquentar e estreitou os olhos, sem ter coragem de negar.

Não era muito de mentir. Aliás, Kyouraku conseguiria ler através de sua mentira com facilidade demais para sequer tentar.

– Por que não diz a ela, meu amigo?

– Não sei o que dizer...

Ukitake já havia pensado nisso antes. Poderia dizer muitas coisas: “obrigada por se preocupar comigo”, mas soaria muito piegas. E falso. Como poderia expressar um sentimento tão grande através de gratidão por ela se preocupar com sua saúde? Não poderia, tampouco, dizer algo muito drástico como “eu te amo”. Sabia que sentia, mas simplesmente despejar uma coisa dessas nela poderia ser aterrorizante.

– Não diga.

– Então o que vou fazer? – Perguntou com um tom melancólico.

– Vá até ela e entregue uma flor.

– Flor?

– É, qualquer uma. Pegue uma do jardim. Sendo fresca e que a faça entender que te fez lembrar-se dela, é o bastante.

– Você faz tudo parecer tão simples...

Kyouraku tocou o amigo nas costas e o incentivou a levantar. Com um suspiro, após tomar um novo gole de chá e entregar a garrafinha ao amigo, Ukitake levantou e deu alguns passos lentos pelo pátio da Academia. Cumprimentou alguns colegas e logo, parava no canteiro do jardim, onde cresciam diversas espécies de flores.

Curvou-se um pouco para olhá-las e sorriu, admirando-as. Rosas, lírios, orquídeas, gérberas... Engraçado como todas cresciam e coexistiam em harmonia. Havia várias outras. Ele tinha que decidir por uma – apenas uma que pudesse ser delicada e bela o suficiente para presenteá-la. Como exprimiria seus sentimentos de forma muda, tinha que ser bem escolhida.

Por fim, decidiu por uma flor-de-lis. Tinha uma aparência delicada, suave, com curvas finas, porém, transmitia uma sensação de força que Unohana possuía sem tirar nem pôr. Era o que mais lhe fascinava. Ela conseguia ser tão doce, mas tão forte simultaneamente. Shunsui vivia dizendo o quanto ela podia ser assustadora. Ukitake riu com o pensamento.

Cortou o caule da flor com os dedos, num tamanho suficiente para segurá-la sem problemas. Após isso, caminhou um pouco para ir à direção de Retsu.

Chegando lá, Ukitake apenas pôs-se ajoelhado na grama, ao lado dela. A morena o olhou com sua expressão calma e sorriu em seguida. Quando ela estava para se manifestar, Juushirou ergueu a mão que acomodava a flor e ofereceu a ela. Seus olhos se perderam naquele instante e ele baixou-os para um ponto qualquer. Sentiu-se ridículo, mas não podia evitar.

Ela pegou a flor-de-lis vermelha, abrindo um sorriso logo em seguida. Aquele sorriso tão calmo que, ao invés de fazer o mesmo ao coração do rapaz, acabava por ajudar a acelerá-lo. Nesse momento foi que Ukitake ergueu a cabeça para olhá-la. Unohana nada disse. Apenas sorriu. Para ele, foi o bastante.

 

(...)

 

O clima de primavera da Soul Society inspirava paz. Ukitake, após sair do 13º Esquadrão, já estava em sua casa, descansando em seu quarto e olhando para o jardim.

Num dos canteiros, várias flores-de-lis cresciam vistosas, com pétalas vermelhas, lilás, alaranjadas... Ele sorriu observando as plantinhas. Depois de dormir um pouco e descansar seu corpo, faria o que havia prometido a si mesmo há muitos meses. Levaria uma das flores a ela.

E assim fez. Foi até o jardim e cortou uma delas – vermelha, como foi no passado, e assim, na mão mesmo, fresca, sem preocupar-se com o corte irregular. Depois disso, tomou seu rumo até a residência da capitã do 4º Esquadrão. Quando chegou lá, foi logo recepcionado com um sorriso hospitaleiro, que ao contrário da sensação de maternidade que passava a qualquer outro, a Ukitake, dava um ligeiro frio no estômago.

Pôs os pés para dentro do terreno, ainda no jardim, e esperou que Unohana fechasse a porta. Assim que ela o fez, ele tirou a mão das costas e lhe entregou a flor, desta vez, de forma mais confiante do que antes. Sustentou o olhar e aguardou uma reação.

Surpresa, a Shinigami pegou a planta e olhou-a com carinho, deixando que um sorriso lhe curvasse os lábios.

– Ukitake-taichou...

– Sim?

– Por acaso já contei a você o motivo de eu ter me tornado uma Shinigami médica?

O sorriso que havia no rosto de Juushirou desapareceu – não por decepção, mas surpresa. Apesar do semblante sério, seus olhos gritavam a sensação que lhe invadiu o peito. Brilhavam loucamente, vidrados no rosto doce de Retsu.

Tomando isto como um “não”, a capitã sorriu.

– Você precisa de mim.

O rosto de Ukitake voltou a exibir um sorriso. Não muito largo, sutil, mas extremamente contente. Sem conter seus ímpetos, tomou a mão livre da morena entre as suas e passou os dedos entre as fendas dos dela, entrelaçando-os em seguida. Deu um passo à frente e tocou o corpo no dela. Moveu o outro braço até alcançar as costas da morena, num abraço calmo. Como ambos eram.

– Sim... Eu preciso... – Confessou. Com a testa no peito do capitão, Unohana sorriu. Era o que ela sempre quis ouvir, mas nunca pôde porque quando devia ter dito, Ukitake preferiu manter-se nos gestos... Era significativo, é claro. Mas como poderia ter certeza?

Ouvindo assim, não havia dúvidas.

– Eu também. Por isso não posso correr o risco de te perder. Nem vou. Então sempre vou cuidar de você.

Juushirou afastou um pouco a cabeça, fazendo-a assim erguê-la um tanto também. Olharam-se por um instante e diante daquele sorriso que ele tanto gostava, Ukitake não se reprimiu a apenas contemplá-lo. Tomou-o para si num beijo urgente, que nem condizia com sua personalidade tão pacífica. Unohana ficou desconcertada nos primeiros cinco segundos, mas depois, já estava completamente envolvida.

Falando francamente, já estava envolvida muito antes de ser beijada. Sempre esteve. Mesmo quando recebeu aquela flor-de-lis, lá, há pouco mais de uma centena de anos... E agora, a outra, e junto com ela aquele que originalmente a tinha.

E Ukitake recebia em troca algo que ultrapassava os limites da simbologia de uma flor. O amor que nela continha.


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