Narrador um: A Garota.

Uma vez eu estava andando sobre uma floresta na calada da noite... Era dia de lua cheia, e justamente por isso eu fui ate lá. Para observa-la: a lua. Entretanto, quando perto do topo de uma montanha cheguei, ouvi um uivado triste e senti uma brisa fria que o acompanhava vir de encontro a mim e ao resto da floresta.

Um lobisomem... Eu nunca tinha visto um até aquele momento. Pensava que era apenas um mito, entretanto... Lá estava um bem na minha frente, chorando para a lua.

Sim. Chorando. Aquilo não era apenas um uivo, mas um desabafo. Um desabafo a qual eu não conseguia traduzir, mas mesmo assim sentir: ele estava deprimido.

Eu fiquei ali parada observando ele uivar por horas e horas até cair e não ser mais capaz de fazê-lo. Logo que caiu, fui ao seu encontro.

Era um jovem, dezesseis anos no máximo, loiro de olhos azuis e roupa rasgada. Tinha aparência... Tão frágil. Suas orelhas, unhas, pés e cauda de lobo ainda estavam ali, mas boa parte dos pelos havia sumido.

Por pura curiosidade toquei suas orelhas... Eram tão belas e macias que eu simplesmente não pude evitar. Aah... Eu não podia acreditar no que via. Tão... Esplêndido. Belo... Sublime.

Peguei sua mão com cuidado. Sua pele era... Tão clara. Brilhava como a lua. Ele parecia um humano metade cão. Tinha até mesmo caninos. Entrelacei seus dedos nos meus.

Narrador dois: O Garoto.

Abri meus olhos aos poucos e enxerguei alguém de cabelos claros e olhos tão azuis quanto os meus. Segurava minha mão com seus dedos entrelaçados aos meus e admirava aquilo. Eu não entendia o que exatamente ela estava tanto admirando, mas... Era tão linda.

Olhou para mim e tomou um susto. Soltou minha mão no mesmo momento. Acho... Que eu deveria ter previsto isso.

— Você está bem? —Perguntou-me.

Bem? Por que esta pergunta? Podia ter dito qualquer outra coisa. “Socorro!”, “Lobisomem!”, “Senhor Deus!”, porém...

— Eu ouvi você chorando...

Meus olhos se arregalaram por um segundo.

— Como sabe... Que eu estava chorando?

— Bem... Você... Uivou.

Sua voz soava tão... Suave. Seus cabelos debaixo daquele capuz... Dançavam com o vento. Senti minhas feições regressarem completamente ao estado humano novamente naquele instante.

— Você... Entendeu meu uivo?

— Sim... Era um uivo triste.

Ergui-me e sentei na grama.

— Desculpe-me... — Pedi de cabeça baixa, comprimindo minhas mãos sobre a calça rasgada.

Sua expressão parecia desentendida.

— Por que pede desculpas? — Indagou.

— Eu... Com certeza devo ter lhe assustado enquanto era lobo. Desculpe-me.

— Não. — Respondeu de imediato.

Ergui minha cabeça de súbito e engoli em seco.

— Você não me assustou. — Afirmou olhando diretamente nos meus olhos.

— Como não...? — Sussurrei sem poder acreditar.

Meu peito de repente ficou apertado e lágrimas quentes desceram do meu rosto.

— Eu... Sou um monstro! Com garras, pêlos, dentes mortíferos e...!

—Não. — Ela negou sobrepondo sua mão em meu rosto. — Você não é.

Ela me surpreendia a cada momento... Meus olhos estavam paralisados. “Como ela podia...?”. Ela acariciou minha face.

— É a criatura mais bela que já vi. —Disse e sorriu ternamente.

Deitei meu rosto sobre suas mãos e deixei que minhas lágrimas caíssem. Repentinamente uivei como que por instinto com aquela mão quente sobre meu rosto.