Sophia

Fury parou em frente à sua mesa, as mãos apoiadas no tampo de vidro enquanto seu único olho me fitava de um modo indagador. Encolhi-me perante a questão levantada.

Meu maior medo? Talvez eu os tenha em tal quantidade, que citá-los seria um completo gasto de tempo.

Respirei fundo, tentando afastar a timidez inexorável.

– Eu não tenho certeza – respondi com sinceridade, dando de ombros. – Quero dizer... Tem tantas coisas. Antes de tudo isso começar, eu tive medo que minha avó morresse. Tive medo de continuar sozinha pelo restante da minha vida, fugindo da escola ou simplesmente me escondendo nos armários – o histerismo tomou conta de minha voz, e respirei fundo, querendo organizar minha linha de pensamento novamente. – Eu tive medo das pessoas, mas hoje eu vejo que temo mais pela vida delas do que pela minha. Acho que essa é a minha resposta, afinal.

– É bom que esteja tentando vencer sua timidez, Sophia – a professora de Literatura, a sra.Ferrars, exibe seu sorriso de orgulho.

Hoje participei da primeira aula do dia sem ficar invisível, e admito que esta atitude deu-me um grande e pavoroso medo. No entanto, tudo correu bem, e eu até li o trecho de um texto para o restante da classe.

– Obrigada, sra.Ferrars – agradeço, antes de sair da sala com os livros entre os braços.

Encontro Simon encostado na parede ao lado da porta. Trajando a jaqueta do time de futebol americano de NovaHead, os típicos jeans e os tênis All Star, tenho de admitir que ele está muito bonito.

Tal pensamento me deixa constrangida. Felizmente, Simon não parece perceber.

– Oi – Ele diz, ajeitando os óculos com as pontas dos dedos, um sorriso surgindo em seu rosto.

– Olá – o cumprimento com um mínimo sorriso.

Começamos a andar pelo corredor, por vezes recebendo olhares nada discretos do restante dos alunos. Respiro fundo, e tento permanecer firme.

– Como foi na aula de Literatura? – Simon se mostra curioso, e fico grata por ele iniciar uma conversa.

Parecendo uma criança contando os acontecimentos do dia, narro minha conquista pessoal, demonstrando quão feliz estou.

Simon ri, compartilhando da minha animação.

– Parabéns – paramos em frente ao meu armário. – Eu não esperava que avançasse um passo desses tão rapidamente.

– Eu também não. – confesso, enquanto pego meus livros. – E fico grata por você...

Antes que eu possa terminar a frase, uma ofegante Stella se aproxima de nós em uma corrida esbanjando desespero.

– Temos que ir – E pega nossas mãos, nos arrastando pelo corredor com sigo.

Simon para, puxando a Richard de volta bruscamente, de forma a quase me derrubar no chão.

– Ei! Para onde estamos indo? – Ele lhe questiona um tanto impaciente.

– É um... Probleminha – sussurra Stella olhando ao redor. – Que temos de resolver antes que a Clarissa chegue.

Encaro Simon, que parece tão confuso quanto eu. Stella não dá tempo para novas perguntas, e volta a nos arrastar para sabe-se lá onde.

(...)

– A Clarissa tem um irmão? – Ashley praticamente grita perplexa com a revelação.

James tinha levado (arrastado) Dylan, Zack, Aurora e a irmã para a biblioteca, que se encontrava completamente vazia. Por precaução, o Turner manteve qualquer mente do colégio, distraída o bastante para não entrar na sala de leitura.

– Agora entendo a preocupação de vocês dois – comenta Aurora, pensativa. – E o que vamos fazer com o Wayne? – Nos encara como se pudéssemos solucionar o problema.

Dylan, que traja a mesma jaqueta que Simon, não parece angustiado ou até mesmo interessado.

– Deixamos que eles se matem – Dá de ombros. – Simples.

E faz menção de ir embora, quando Aurora estica seu braço e o puxa de volta, quase o derrubando.

– Nem pense em ir embora, Allen – diz severamente, soltando-o e recuando seu braço. – A Clarissa pode não ser uma pessoa muito legal, piedosa, gentil...

– Feminina – acrescenta Ashley vagamente. Todos os olhares se voltam para ela, que encolhe os ombros em defesa. – Não me olhem assim. A Wayne mal sabe o significado de blush e pó de arroz na vida de uma mulher, meus amores.

Me contive em não perguntar o significado dessas duas coisas na vida de uma mulher, e resolvi me apegar a outros fatos.

– Por que o Charlie quer matar a Clarissa? – pergunto, percebendo James e Stella se entreolharem.

– Bom... – A Richard começa, mas o Turner a interrompe.

– Porque ela fincou uma seringa envenenada na nuca dele.

O silêncio arrebate nosso círculo de conversas, e Zack faz questão de quebrar o gelo quase um minuto depois.

– O papo estava super interessante e produtivo, mas tenho um encontro com uma líder de torcida à noite e preciso preparar meu repertório de cantadas – Dá uns tapinhas nas costas de Dylan. – Como o Allen aqui mesmo disse, espero que os irmãos Wayne se matem.

– Zack Patrick Oliver! – Aurora leva as mãos à cintura, demonstrando sua postura autoritária. Zack se vira para ela, com o cenho levemente franzido. – Você não vai a lugar nenhum!

Ele suspira pesadamente, e meneia a cabeça de um lado a outro.

– O James mesmo disse que a Clarissa quase matou o próprio irmão! Imagina o que vai fazer com a gente caso descubra que ele está na cidade!

Simon cruza os braços, enquanto uma risada escapa de sua garganta.

– Você está com medo – constata, de modo astuto e debochado. – Entendi.

Aurora se encosta a uma mesa, um suspiro de cansaço deixando seus lábios.

– Se o Charlie resolver matar a Clarissa, isso pode nos afetar. E muito – acrescenta, sob o olhar de descrença dos meninos (exceto James, que parece imparcial no momento).

– De que forma? – Dylan solta uma risada cética.

Aurora cruza os braços, hesitante.

– Bom, ela pode nos ajudar com suas habilidades, e sua frieza é útil caso precisemos torturar alguém. – acrescenta rapidamente.

– Isso meu irmãozinho pode fazer – ironiza Ashley, mas James não se abala nem um pouco.

– Aurora tem razão – digo, recebendo um sorriso de gratidão da Clarkson. – Temos de encontrar o Charlie e negociarmos pela vida da Clarissa.

Ashley exibe um sorriso.

– Oh, a Thompson é inteligente – ironiza, e me retraio. Simon se mostra repentinamente irritado.

– Quer calar essa boca, Ash? – É visível a surpresa na face da Turner. – Você tem que parar de falar tanta merda!

– Simon – digo, encarando Ashley de soslaio.

Mesmo que a intenção dele seja boa, as palavras dele definitivamente não são legais de serem ouvidas.

– Estamos perdendo o foco! – Stella se interpõe, e agradeço mentalmente por isso. Ashley me encara, um olhar de indefinida raiva ou ódio lançado especialmente para mim. – Charlie está na cidade, a Clarissa sumiu e ainda temos os problemas com os vilões!

James para de embaralhar suas cartas, e arqueia uma das sobrancelhas teatralmente.

– Que tal colocar no jornal da escola, Stella?

Dylan descruza seus braços, exibindo uma postura decidida.

– Não vou me meter nisso. A Clarissa é uma vadia e eu acharia ótimo se o irmão dela a matasse! Pelo menos estaríamos livres daquela praga!

– É melhor a gente se preocupar com outras coisas – diz Zack, com veemência. – Uma temporada de provas está vindo por aí, junto com o campeonato do time de futebol americano e os bailes frufrus – Ele gesticula com as mãos, impaciente. – A Clarissa é nosso menor problema!

Aurora se coloca de frente ao Oliver, desafiando-o.

– Faça o que bem entender, Zack – Bate o dedo indicador contra o peito do garoto. – Mas não vou deixar a Clarissa na mão, mesmo que ela seja a pior pessoa do mundo! Fury nos colocou em equipes para defendermos uns aos outros, e não sei você, mas prometi dar minha vida por essa merda se for necessário!

O loiro embica os lábios, mas depois dessa é obrigado a concordar. Todos nós aceitamos essa nova vida, e fizemos promessas que teremos de cumprir.

– Tudo bem – Zack mexe em seus cabelos, frustrado. – O que vamos fazer? Entregar a Clarissa para o Charlie?

– Não! – Stella exclama os olhos levemente arregalados. – Tenho certeza de que a Clar não fez isso!

– Ela não mataria o mordomo do nada – acrescenta James, aparentemente incomodado. – Seria mais fácil ela pegar o Charlie de uma vez, ou fazer uma chacina!

Dylan arqueia uma das sobrancelhas, pouco convencido.

– Como você pode ter tanta certeza?

O Turner permanece tranquilo ao responder.

– Porque eu cresci ao lado da Clarissa, e sei de todos os seus métodos – Para de mexer em suas cartas. – Primeiro, a Clarissa nunca usa a mesma arma em dois assassinatos. Ela costuma se livrar da prova do crime e encomendar outra arma. Segundo, a Clarissa detesta mortes pouco originais. Ela gosta de inovar em cada homicídio seu. E em terceiro lugar, a Clarissa nunca mataria alguém com mais de 50 anos, a menos que tenha uma vida tão podre quanto a dela. – Sob nossos olhares de surpresa, James sorri de canto. – Acreditem quando digo que a conheço.

– Mas se não foi a Clarissa – finalmente me pronuncio, encarando os outros. – Onde ela está? E quem mataria o Alfred?

Aurora balança a cabeça negativamente, nos encarando mais uma vez.

– Isso é o que temos de descobrir.