San Ricardo é uma vila pequena, isolada e com a pior fama da região. A sua volta, há uma floresta sombria que, pelo o que os humanos sabiam, era inabitada.  Era pra essa vila que Laican e Lilith haviam se dirigido, mais precisamente, para a taberna da cidade. Era um lugar podre e fétido, com humanos igualmente desagradáveis.

— Então Belatriz, como está sua vida aqui na terra? — perguntou Laican enquanto bebia.

— Não muito interessante, na verdade, a sua esfera da ira foi a coisa mais intrigante que vi por aqui nesses dias. O mundo humano mudou bastante, mas os humanos continuam estúpidos... Seres ridículos. — Ela respondeu mais relaxada naquele ambiente.

Nenhum dos dois havia notado a presença de um observador que, coincidentemente, também havia parado sua busca naquela taberna. Ele vestia roupas brancas e uma capa da mesma cor, além de um tapa olho simples e preto no olho direito. Sua íris era de cor tão vermelha quanto os seus cabelos curtos e arrepiados e possuía uma tatuagem tribal simples e preta do lado esquerdo do rosto. No momento em que ele entrara, duas pessoas chamaram sua atenção, ou melhor, dois demônios chamaram a atenção do olho restante dele. Seu olhar continha o poder de revelar a verdadeira identidade de qualquer um, seja humano, demônio, monstro, ou até anjo. "Quem diria que eu iria encontrar um Príncipe Infernal em um lugar assim.", pensou.

 — Estes objetos são almas aprisionadas pelos seus pecados, temos que achar todas as sete referentes aos pecados capitais. — disse o meio-demônio à Lilith. — Por isso me disfarcei de caçador de recompensas, para encontrá-las e aprisioná-las com o ritual que lhe disse antes. Também descobri que há uma criatura muito extravagante por essas redondezas e ele pode ser a próxima alma.

— Então você realmente estava fazendo algo de útil durante o tempo que me ausentei. — disse ela enquanto mexia em seu cabelo ruivo. — Essa esfera exala uma aura maior que de qualquer humano, será fácil de achar para mim. — e sorriu. — Mas uma aura diferente neste lugar está começando a me incomodar.

O observador teve tempo de prestar uma atenção maior nos demônios: "A acompanhante de Laican é a Guardiã dos portões infernais. Eles parecem estar falando de um tipo de esfera. Ela aparenta ser muito poderosa e se eles dois estão interessados em algo desse tipo, deve realmente ter um poder inigualável. Seja lá o que eles queiram, não deve ser nada bom. Melhor observar mais um pouco. Talvez Lilith já até tenha me percebido", ele continuava a analisar com atenção

Nesse tempo, um jovem de pele branca como uma vela e cabelos negros e curtos entra na taberna. Seu nome era Brown, mas não possuía sobrenome. Ele usava algo no pescoço similar a uma coleira com espinhos, uma camisa branca e uma calça escura cobertas por uma longa capa preta. Também tinha uma marca vermelha que cruzava sua testa como uma faixa e terminava com duas pontas para baixo do lado dos olhos.  Ele observou o lugar e avistou algumas pessoas bem diferentes. Decidiu chegar e perguntar a eles se sabiam de algum incidente com feiticeiras ou bruxas por aquela região. Mas acabou por falar algo totalmente diferente:

 — Tem algo estranho aqui, não acham? Tem um cheiro de coisa podre e queimada também.  — Um comentário sem sorte do jovem.

— Quem é você e o que quer aqui? — Disse Laican encarando o rapaz que acabara de aparecer — Belatriz, acho melhor a gente sair. — completou.

A mulher não havia notado aquela chegada, estava preocupada com a tal aura que a incomodou, mas virou ao ouvir o demônio. E percebeu logo do que se tratava.

— Acalme-se Miguel, ele só tem um faro bom, não parece querer briga. — E, virando para Brown, disse séria. — Se você queria um lugar sem tais características não devia ter vindo até aqui.

De longe, o observador continuava a tentar entender tudo. "Parece até uma reunião! Agora chegou um lobisomem, mas eles não parecem estar se dando bem. Será que ele também está envolvido no plano dessas esferas?” Toda a sua atenção estava voltada para eles. “Cansei de vigiar, vamos ver no que isso vai dar."

Com a aproximação dele, Lilith percebe de onde vinha o seu incômodo. "Um Anjo!", pensou ela estupefata. Então se vira a tempo de vê-lo se aproximando: um tapa olho, cabelos vermelhos, e aquele olhar arrogante. “Desgraça, mais um para importunar.”

— Algum de vocês viu um demônio, um mestiço e um lobisomem pelas redondezas? — perguntou o Anjo ao chegar na mesa.

— Quem é você e porque está perguntando isso?! — Brown falou logo em seguida, sem conseguir a atenção do recém-chegado.

Laican percebe a expressão de Lilith. “Esse cara é perigoso.”, deduziu o mestiço. Ele se levantou e o encarou, só então notou que era um anjo.

— O que você quer aqui? — a pergunta saiu logo em seguida, mas foi igualmente ignorada.

 — Spark, estava ouvindo nosso conversa esse tempo todo? Você realmente não muda. — diz Lilith de forma zombeteira —  O que quer aqui seu anjo arrogante? — ela pôs força em sua voz.

— Antes de começar uma briga, quero me apresentar pros que não me conhecem. — Spark fita rapidamente Laican — Sou Spark, um anjo sim. Mas como não sou muito chegado a regras, então pode-se dizer que agora eu faço meu próprio caminho. Como por destino, encontro vocês aqui: a Guardiã e um Príncipe Infernal, ora ora... E ouvi vocês falando sobre essas esferas! Elas são poderosas, não estou certo? — disse o Anjo

O meio-lobo percebe que acabou de se meter entre seres, aos quais não deveria. Ao ouvir a identidade daqueles que lhe cercavam, seu choque é tão grande que não lhe permite falar mais.

— Spark, hein. Acho que já ouvi falar de você, mas de que esferas estão falando? — disse o mestiço lançando um olhar sarcástico.

Naquele momento Lilith decidiu acabar com aquela situação, então elevou sua voz:

 — Já chega! Lobisomem, não se intrometa ou irei facilmente matá-lo! Spark, apesar de preferir você aos outros da sua laia, ainda odeio qualquer anjo! Sei que não vai ajudar então fique na sua jornada insignificante para mim! Quer mesmo perder tempo com esses dois, Laican? — disse com olhar flamejante e se dirigiu a porta.

Os demônios já estavam do lado de fora da taberna, quando Spark decidiu ir atrás dos dois. O lobisomem continuava perdido em seus pensamentos, pensava em ajudar o anjo. Será que eu seria útil? “Melhor dois do que um de qualquer maneira”, lhe veio o pensamento. Então também seguiu para fora do lugar e logo viu que o anjo já estava preparado para a batalha a gritava:

 — Hey vocês dois, esperem! Se o que eu imagino for verdade, vocês querem um mundo dominado por demônios. Isso não é nada bom para mim, acham mesmo que eu vou deixar vocês saírem daqui assim?! — e partiu pra ação.