One-shot — O Rei da Trapaça

Allen era muitas coisas. Dentre elas, trapaceiro. Mas, apesar disso, ele sempre era tratado como uma criança inocente onde quer que vá, e é por isso que, não raras vezes, quando se dão conta da verdade, já é tarde de mais. O albino já está rindo com o lucro coletado dos babacas que lhe deixaram jogar.

Mas, bem, quem desconfiaria de uma criança?

Porque Allen, apesar de toda sua habilidade, não passava dos 15 anos. Tinha uma boa aparência, certamente, mas era uma criança. De olhos prateados e cabelo branco, sua passagem não passava despercebida, e nem a chance de ganhar dinheiro fácil.

E era assim que geralmente Allen ficava rico e os outros... Bem, em ruínas.

Esperto é aquele que sente sem usar o coração, pois nesse caso não existe a chance de sair ferido.

Allen Walker. Um nome que não tem muito impacto em lugar algum — estudante mediano, garoto gentil, vida comum —, e, apesar de sua aparência ser um tanto impressionante (sendo albino e tudo mais), também não era alguém especialmente incrível.

Exceto para aqueles poucos que o reconheciam após serem levados à ruína.

Mas essa não era uma das noites em que Allen era reconhecido, então entrou no local com muita facilidade; e foi com igual facilidade que se juntou a um grupo de pôquer.

Era uma jogada “limpa”. Pelo menos de início. Mas, a partir da terceira ou quarta partida, de repente as bebidas estavam descendo com uma velocidade impressionante por sua garganta, e os lucros vinham em níveis altíssimos. Assim como os xingamentos e as educações.

— O que é isso? — perguntou uma voz aborrecida acompanhada de um moreno com feições fechadas. — Agressões contra jogadores vão contra as regras da casa.

A visão do moreno fez com que o velho que agarrara Allen pelo colarinho o soltasse com incrível velocidade.

— Perdoe-me senhor! — exclamou assustado, recuando para longe da mesa. — J-Já estou indo!

Tão logo o moreno lançou um olhar irritado em direção aos outros componentes da mesa, todos se afastaram a mil, e o deixaram a sós com o albino.

— Allen Walker. Achei que nunca fosse voltar a lhe ver. — comentou pausadamente, com um sorriso de canto de lábio. Seus olhos deslizaram pelo corpo pequeno do garoto. — Parece bem.

— Tyki Mikki. — cumprimentou Allen, percebendo que estava numa enrascada. — A que devo a honra? Tenho certeza de que gostaria muito se aqueles velhos decrépitos houvessem me surrado.

Tyki gargalhou.

— Pena que o que aconteceria seria o oposto, não é? — provocou. — Você poderia cuidar deles com muita facilidade, garoto.

Allen sorriu e voltou ao seu lugar na mesa, acenando para a cadeira oposta.

— Sente-se. Vamos resolver isso em uma jogada. — chamou passando os dedos pelos fios brancos, jogando-os pra trás.

Tyki fez como indicado, sentando-se em frente ao outro, ainda sorrindo. Fez um gesto para um garçom, que logo lhe entregava dois copos cheios de uísque.

— Tome. — ofereceu um dos copos ao albino. — Assim, quando você perder, não terá nenhum problema com a punição adequada.

Allen sorriu, os olhos cintilando com uma malícia que não combinava com suas feições. Aceitou o copo, entornando-o de uma vez só, deixando Tyki admirado com a imprudência e arrogância do outro ao responder:

— Ou talvez eu fique alto o suficiente para uma comemoração adequada à minha vitória. — riu.

Cansado dos joguinhos de provocação, Tyki acenou para alguém que logo se aproximou e cuidou do baralho.

O jogo começou com um equilíbrio. Havia sido decidido por uma melhor de três, e Allen esperava a hora certa para dar seu “jeitinho” de escapar daquela com facilidade.

Todos os seus movimentos eram observados por Tyki com muito cuidado, mas mesmo assim, conseguiu trapaceá-lo sem ser notado. Só quando a partida terminou — com um flush para Allen e um par para Tyki — que o moreno notou que perdeu o movimento.

Franzindo o cenho, o moreno aumentou a aposta e mandou recomeçar.

— Tão mal perdedor, né Tyki? — arrastou o nome do outro, lambendo os lábios. — Não se preocupe. Você não será punido após sua derrota...

Um bufar e outra leva de cartas. Dessa vez, prestou ainda mais atenção às mãos do garoto, certo de que veria quando esse trapaceasse.

Mas, para sua surpresa, ele perdeu. Allen fez apenas uma trinca — totalmente plausível, pelo que notou — e o moreno conseguiu fazer um full house, com certa troca de cartas.

— Trapaceando? Que coisa feia! — riu o albino se inclinando para frente. — Se quer saber, eu enxerguei perfeitamente seus movimentos. Acho que não se pode dizer o mesmo de você, não é?

Recostou-se à cadeira, ainda sorrindo torto, e pediu outra bebida, que chegou sem nenhuma demora.

— Ainda tem mais uma jogada, garoto. Eu ainda vou te ganhar. — provocou observando o movimento gracioso com que o albino sorvia seu copo. — Aí você será finalmente punido.

Um estalar de língua. Allen sacudiu a cabeça e pediu para a partida começar logo. Claramente se divertia, deslizando as cartas de sua mão, observando o outro com curiosidade. Trapaceou, como sempre fazia, e começou a assobiar enquanto esperava.

Quando enfim as mãos foram abaixados, pode sorrir e se inclinar para sussurrar contra o rosto do moreno:

— Royal. Straight. Flush. — riu e lambeu os lábios. — É sempre um prazer jogar com você, Tyki Mikki. — deslizou um dedo pela gola da blusa meio aberta do outro e se afastou. — Minha vitória.

Tyki trincou os dentes, irritado por não ter conseguido ver os movimentos da criança. Aquele maldito trapaceiro. Praguejou baixinho, entregando seu dinheiro e pedindo outro copo de uísque.

— O que está fazendo? — perguntou Allen rindo. — Eu falei. Vamos comemorar minha vitória. Levanta a bunda daí, preguiçoso.

Tyki virou a cabeça, observando o albino catar todo o dinheiro e estender-lhe uma mão para ajudá-lo a se levantar.

Mesmo após todos os copos de uísque (pois já havia tomado uns bons cinco antes da chegada de Tyki), era impressionante como Allen ainda se mantinha sóbrio. Ou aparentemente sóbrio, ao menos.

Tomou-lhe a mão e se ergueu, seguindo-o para um dos quartos no andar superior de seu bar. Entraram no quarto já com uma garrafa de uísque — adquirida em uma parada rápida no bar — e dois copos. E, tão logo trancaram a porta, o dinheiro foi jogado em algum canto e Allen puxou o mais alto pela blusa.

— É bom me deixar aproveitar a noite, Tyki. — sorriu com a mão enrolada na frente da blusa e os rostos separados por poucos centímetros. — Prometo que não vai desgostar nem um pouco.

O sorriso em seus lábios era cheio de segundas e terceiras intenções, e Tyki não teve nenhum problema em acabar com aquela distância, tomando-lhe os lábios com seus próprios.

O beijo foi faminto e urgente. O gosto predominante era o de uísque, mas também havia um leve sabor de menta e doces. As línguas se chocaram, e qualquer coisa que ainda restasse em mãos foi depositada em algum lugar, com ambos os corpos se juntando o máximo possível.

Não era amor. Allen era esperto. Assim como Tyki. Nenhum dos dois estava apaixonado; talvez interessados, com certeza com desejo... Mas não amor. Amor é algo desnecessário para eles.

Allen era o rei da trapaça. E Tyki era sua vítima favorita. Não era necessário nada mais que isso. Não enquanto comemoravam, não enquanto se puniam.

Não para eles.

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Ordem das jogadas de poker (da menor à maior):

Par —> Dois Pares —> Trinca —> Straight (Sequência) —> Flush —> Full House —> Quadra —> Straight Flush —> Royal Straight Flush