Entre Segredos e Bonecas escrita por Lize Parili


Capítulo 43
Amigos acima de tudo




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# 12/03 #

Castiel saiu bem mais cedo para a escola naquela segunda 3ª feira de março. A manhã estava nublada e gelada e ele se viu obrigado a colocar uma jaqueta maior e tirar o cachecol da gaveta, acessório que ele não gostava muito. Ele usaria uma cacharrel, mas era calorento demais e se o tempo esquentasse um pouco ele ficaria suado e irritado. Seu Gibson velho de guerra lhe fez companhia naquele dia, protegido do sereno por uma capa de couro preta.

Ele estava agitado, ou melhor, entusiasmado. Seu sono tinha sido tranquilo e produtivo. Enquanto dormia, sua mente, em meio a seus sonhos com notas e acordes musicais, havia finalmente conseguido compor a melodia para a última letra composta por Lysandre. Ainda era madrugada quando ele despertou, praticamente com uma mão no braço do violão e a outra na maçaneta da gaveta do criado mudo onde guardava seu pequeno gravador digital. Num instante ele estava sentado na cama, com as costas na cabeceira, dedilhando as cordas do violão e com o gravador preso entre as coxas, num ímpeto de registrar aquela melodia antes que ela desaparecesse de sua mente. Por quase uma hora ele tocou, gravou e regravou, até conseguir as notas perfeitas.

Naquela manhã ele nem tomou seu banho matinal, pois a pressa de mostrar ao amigo era maior que sua necessidade de tirar o suor do corpo, que por sinal, nem teve tempo de suar naquela noite, que foi de fresca a gelada na madrugada.

No meio do caminho ele desceu do ônibus, que não ia até a rua do amigo, e caminhou até o seu destino. Ele ligou para o celular do Lys, para avisar que estava indo para lá, mas deu na caixa postal.

— Caralho, Lysandre. De que adianta você ter um celular bom se o mantém descarregado! — resmungou, guardando seu velho - e acabadinho - aparelho. — Cabeça de vento!

Ao chegar na casa ele olhou para a campainha, crispou a sobrancelha, pensou, deu um sorrisinho de lado e foi para frente da loja. Ainda era cedo e se ele apertasse o interfone para chamar o Lysandre, Leigh acordaria estressado e além dele não querer incomodá-lo, não seria uma boa ideia estressá-lo.

— É o jeito! — disse ele, com cara de quem ia aprontar uma travessura, subindo no portão de grade que fechava o estacionamento da loja, na lateral do prédio. Ele adorava quando tinha uma desculpa para entrar pela janela e surpreender o amigo. 

Da grade ele segurou firme na estreita laje sobre a vitrine da Lemaitre e impulsionou seu corpo para cima, subindo nela, entrando na sacada do quarto do platinado, que tinha o péssimo hábito de dormir de janela aberta, um dos poucos motivos que levava Leigh a brigar com ele.

Não era a primeira vez que o ruivo entrava daquela forma no quarto do amigo e até os vizinhos - de comércio -, que já o conheciam, achavam graça. Até de Romeu ele já foi chamado. Lys é que não curtia muito o apelido de Julieta.

Por ter o sono leve, Lysandre sempre despertava antes mesmo do amigo atravessar as cortinas. Mas naquele início de manhã foi diferente, Lys dormia pesado, de lado, abraçado ao travesseiro - ele tinha dois -, pois o sono demorou para lhe agraciar e seus pensamentos conflituosos e confusos não lhe deixaram em paz, mesmo em seu sono.

Castiel foi até o banheiro do quarto e pegou o tubo de creme dental, depois, com o máximo de cuidado, segurando-se para não rir, espremeu uma porção generosa envolta da orelha do amigo, sujando seu cabelo e cobrindo suas pequenas e tão bem feitas costeletas, depois ficou cutucado o ouvido dele com a caneta, até que o anjo adormecido, meio atordoado com o sono, deu-se um tapa, espalhando aquele creme bicolor com cheiro de canela mentolada. O ruivo sentou no chão para rir do amigo, que apesar de bêbado de sono, sentou na cama e olhou para Cast sentado a sua frente. A cara de "não estou entendendo nada" do Lys fez o ruivo rir mais ainda, ao ponto dele apertar a costela, que doía mais pelo riso do que pelas cotoveladas do Nathaniel.

Lysandre levantou e passou pelo amigo caído às gargalhadas, pois precisava de um banho, mas antes de entrar no banheiro, voltou-se rápido e sem que o ruivo pudesse reagir, pela surpresa e pela fraqueza gerada por seu riso desenfreado, esvaziou o tubo do creme no cabelo dele, que parou de rir na mesma hora. Castiel cometeu um erro, deixou a pasta sobre a cama enquanto cutucava o ouvido do platinado.

— O que você faz aqui, Castiel? Não são nem 7h00 ainda! — perguntou Lys embaixo do chuveiro, enquanto Cast o apressava, encostado no batente da porta. Ele também queria tomar banho, pois além de se sentir suado pelo esforço da escalada, estava com o cabelo tomado pelo creme branco e vermelho. O vidro do box era espelhado, então apenas Lys via o ruivo, que só via seu próprio reflexo. — Você não dorme, não?

— Você é quem tá com cara de quem não dormiu direito esta noite! — debochou, — Teve um sonho erótico por acaso? — rindo do platinado por ele ter dormido abraçado a um travesseiro, e tirando sarro por ele ter diversos cosméticos no banheiro, de hidratantes para mãos, corpo e pés a loção pós depilação, já que Lys não curtia pêlos em determinadas partes do seu corpo, eliminando-os na lâmina e no aparelho elétrico. Ele já havia depilado na cera, mas não foi uma experiência muito interessante e "certas partes" do seu corpo eram sensíveis demais para certas dores.

Ao terminar, Lys se secou ainda no boxe, enrolou a toalha na cintura e saiu e enquanto ele se trocava Cast tomava banho, rindo ainda mais ao encontrar os diversos produtos de duas marcas famosas e caras de cosméticos no boxe, desde do gel de banho[1] a máscaras capilares, inclusive alguns da linha feminina.

— Você leva isso de metrossexual a risca mesmo, em Lysandre! — comentou, tirando onda do amigo, que por já estar acostumado com a tiração de sarro do ruivo, não ligou. Na verdade, ver Castiel no seu quarto zoando com ele lhe tirou um peso dos ombros. Aquilo significava que não havia nenhum sentimento ruim em relação a ele por parte do ruivo, que não era do tipo que perdoava ou esquecia uma pisada de bola, por menor que fosse. — Depois não quer que as garotas te achem "viadinho". — comentou, recebendo sobre a cabeça a sua camiseta vermelha da Winged Skull.

— Porra, Lysandre! Ai já é vacilo. Eu não vou em casa pegar outra camiseta e nem vou usar uma das suas! Você vai secar essa merda! — reclamou jogando a camiseta molhada sobre o amigo, saindo do boxe, nu e molhado. Ele usaria uma camiseta do Lys se fosse preciso, até porque, o rapaz que tinha poucas camisetas por preferir camisas, tinha umas legais, embora usasse mais para ficar em casa e para as aulas de Educação Física.

— Faz o favor de se secar ainda dentro do banheiro! Se vier para o quarto, pingando vai secar o chão! — avisou Lys, jogando uma toalha seca para Cast, que se secou e pendurou a toalha esticadinha. O ruivo só era desleixado com alguma coisa na casa dele e apenas quando estava irritado, pois aprendeu a duras penas que manter arrumado era mais prático que arrumar tudo depois.

Depois que o Castiel se vestiu, colocando uma camiseta preta e lisa do Lys, os dois foram para a cozinha tomar café, e enquanto o ruivo preparava o desjejum Lysandre desceu até a lavanderia e colocou a camisa dele na secadora, subindo em seguida.

Enquanto comiam o ruivo contou ao Lys que conseguira compor a melodia para a letra da música que este havia escrito há um tempo, entusiasmando-o, querendo ouvi-la. Cast pegou o fone de ouvido e encaixou no gravador, entregando-o para Lysandre, que adorou ficando mais empolgado. Ele voltou a melodia, entregou o fone direito para o Cast, pois queria que ele o acompanha-se. Lys esqueceu da hora e começou a cantar, levado pela melodia de Castiel, que em alguns momentos fez a 2ª voz.

— Posso saber que zona é essa? — questionou Leigh que acordou com o barulho dos dois cantando na cozinha. — São 7h30! — bêbado de sono, apontando para o relógio de parede. Ele odiava acordar mais cedo do que o necessário, já que quase todos os dias ia dormir tarde devido o trabalho na confecção. — E eu não sou obrigado a acordar a esta hora como vocês dois! — despertando totalmente ao se dar conta que Castiel estava na cozinha.

— Castiel! O que você faz aqui? — perguntou, confuso. — Eu não ouvi a campainha do interfone tocar! — mencionou. A dupla de músicos olhou um para o outro, com cara de bunda, pois sabiam que ali vinha bronca, e das pesadas. — Você entrou pela janela de novo, não foi? — perguntou, já sabendo a resposta, pois Cast fazia aquilo sempre que tinha oportunidade.

O clima fechou.

 

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Notas finais do capítulo

[1] Gel de banho é um tipo de sabonete líquido para pele e cabelo que além de limpar, tonifica e hidrata, além de dar a sensação de um leve frescor.

Mulher na TPM e Leigh cansado e com sono são exatamente a mesma coisa, então...