Entre Segredos e Bonecas escrita por Lize Parili


Capítulo 137
O que deu em você?




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# 02/04 #

— 16h00. — murmurou Melody ao olhar para o relógio de parede da sala do grêmio, sentada na cadeira do Nathaniel.

Melody só foi para aquela sala por saber que Nathaniel havia ido embora. Marietta a encontrou quando esta saía do banheiro após lavar o rosto, depois de ter ficado quase 2 horas escondida no ginásio, e lhe contou que o rapaz havia sido dispensado – pela primeira vez Mel não se preocupou com o loiro – aproveitando para pedir que ela colocasse umas planilhas de atividades dos clubes sobre a mesa do loiro para serem arquivados por ele posteriormente.

— Só mais meia hora e eu poderei ir para casa. — falou consigo mesma, tendo aproveitado a ausência do Nath para se esconder naquela sala impregnada dele.

Tudo naquele lugar a fazia lembrar do Nathaniel. A mobília organizada da forma mais funcional para ele, os arquivos organizados da forma mais funcional para ele, até os arquivos soltos estavam funcionalmente organizados em caixas de correspondência, cujas etiquetas coloridas identificavam o tipo de documento que elas recebiam.

— Sempre tão organizado. Chega a ser chato. — disse enquanto misturava os documentos nas caixas. Melody era organizada, mas não tanto quanto Nathaniel, que arrumava tudo de forma minuciosa. — Espero que você tenha dor de cabeça quando perceber que os documentos estão fora do lugar. E desta vez não terá a mim para organizá-los para você. — Mel sabia que misturar os documentos era infantil, mas só em saber que o presidente do grêmio se irritaria por ter que separar um por um novamente, o que atrasaria seu trabalho, já a satisfazia.

 

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17h42. Leigh, sozinho na loja, se irritou ao constatar a hora em seu relógio de bolso, – réplica dos modelos do século XIX – presente da sua avó por ter conquistado a bolsa de estudos integral ao final do 1º ano da Escola Técnica. Foi o último presente que ela lhe deu antes de falecer.

— Como eu posso dar conta do ateliê se o Lysandre não aparece para trabalhar!  — reclamou o estilista, que odiava quando o caçula se atrasava sem avisá-lo, principalmente quando tinha encomendas de roupas "sob medida". Ele já estava confeccionando as primeiras encomendas de vestidos de formatura e dependia do apoio do irmão no atendimento às clientes na loja. Rosa poderia cuidar disso, mas ela não era sua funcionária. Ela não tinha obrigação de ajudá-lo e ele não podia se garantir nela, apesar de sempre ajudá-lo. — Ele sabe que eu preciso dele na loja no horário e que for atrasar por algum motivo tem que me avisar!

Leigh se orgulhava de sempre ter cumprido seus prazos e com tempo de sobra para qualquer ajuste emergencial – mesmo ao custo das suas horas de sono.

— Ele não pode me deixar na mão desse jeito. Eu tenho prazos e ele sabe disso. — bateu a porta do armário ao lado da estante de tecidos depois de um frasco de álcool líquido e uma flanela, nervoso. Ele nem mesmo conseguia imaginar como seria atrasar alguma encomenda.

Rosa colocou uma das três cadeiras-bar que havia no ateliê diante da porta e sentou, com metade do corpo para dentro do ateliê e a outra metade para dentro da loja, atrás do balcão. Desta forma ela podia olhar a loja e conversar com Leigh, que embora tenha percebido a expressão de pesar na face da namorada e até perguntado o que havia acontecido, não deu atenção depois dela ter dito que estava preocupada com Emília. Ela já estava acostumado com o jeito do namorado, que embora fosse carinhoso e atencioso, não era de insistir em querer saber se estava realmente tudo bem, deixando que a pessoa decidisse por si só qual a hora de falar sobre o que lhe incomodava, até porque ele mesmo não gostava de expor o que sentia, sendo assim, respeitava isso nas outras pessoas.

Vez ou outra eles até conversavam sobre sentimentos, mas era sempre Rosa quem puxava o assunto e Leigh mais ouvia que falava, pois ele é do tipo que demonstra seus sentimentos com ações e não com palavras. Embora ela não quisesse contar a ele sobre o que lhe aconteceu naquele dia, ela gostaria de que ele insistisse, mesmo que um pouco, em saber o que estava acontecendo com ela, mas sabia que isso era muito improvável de acontecer, pois pelo que ela sabia, Leigh sempre foi daquele jeito, desde pequeno e com todo mundo, salvo com Lysandre. Com este sim ele insistia um pouco mais, porém não o forçava a dizer; ele respeitava o silêncio do irmão e, de tão acostumado com o mais novo, sabia quando o garoto estava pronto para conversar ou não, preferindo esperar por este momento para perguntar o que estava acontecendo com ele. Mas Leigh não se deixava enganar, ele sabia bem a diferença entre não expor sentimentos e mentir ou esconder fatos, e isso ele não fazia e não aceitava que fizessem com ele. Confiança era primordial na vida dele.

Rosalya estava mais sensível que o normal naquela 3ª feira. Sua TPM não era das mais fáceis de lidar e sua oscilação de humor era constante.

Enquanto observava o namorado passar a flanela embebida de álcool sobre a mesa de corte, como sempre fazia antes de colocar o tecido, ela se perguntou se caso Lysandre chegasse com cara de velório em casa o Leigh manteria seu silêncio ou iria até ele para ver o que havia acontecido.

"Na certa iria me largar aqui na loja e ir atrás dele." Pensou, tolamente enciumada, embora Leigh nunca tivesse negado atenção a ela. Mesmo no seu silêncio ele se mantinha por perto, demonstrando que se importava através do seu abraço, do seu afago, e até mesmo de alguns agradinhos, e sempre que se fazia necessário, dos seus conselhos, sendo que, por conta do trabalho, ele passava mais tempo com ela do que com o irmão, que por muitas vezes sentiu-se em segundo plano, apesar dele ter do irmão um tipo de amor que até aquele presente momento era superior ao que este tinha pela namorada.

— Merda! — Xingou o estilista ao esbarrar na garrafa de álcool, virando-a sobre a mesa, ainda irritado por causa do atraso do irmão, "quebrando" o pensamento da namorada. Assim como Lys, Leigh não tinha um linguajar chulo, sendo esta e outras palavras similares o mais próximo de uma palavra de baixo calão no seu vocabulário. Lys tinha um vocabulário mais extenso, mas nada que se comparasse ao do seu melhor amigo e muito raramente, quase nunca, proferia algum palavrão . Ele tinha que estar muito irritado, fora do seu normal.

— É bom ele ter uma boa justificativa! — proferiu, limpando a mesa com a flanela.

Rosa não sabia que Lys havia voltado para casa depois do almoço, acreditando que ele estava na detenção. Ela preferiu não dizer nada ao namorado, pois apesar de estar chateada com o cunhado e até com vontade de que Leigh o repreendesse pelo que fez a ela, cabia ao próprio Lysandre contar ao irmão os motivos da sua detenção.

— Calma, Leigh. O Lys deve ter tido um bom motivo para o atraso. Deve ter acontecido alguma coisa e ele não conseguiu te avisar.

— Você tem razão, Rosa. Ele me ligou mais cedo, mas a ligação caiu e eu não consegui ligar de volta. O celular dele ficou indisponível. — falou, guardando o álcool e a flanela de volta no armário. — Provavelmente devia ser para me avisar do atraso. Ele sempre me avisa quando alguma acontece.

— É verdade. O Lys sempre te diz aonde está ou para onde vai, apesar da maioria dos garotos da nossa idade não fazer isso nem com os pais. Eu mesma raramente faço isso. — comentou ela. — Até porque eles sabem que estou sempre com você.

— Nem se atreva a questionar sobre isso com ele, Rosa. Deixe as coisas como são. Eu prefiro assim. — pediu ele, enquanto desmanchava o enfesto de uma metragem longa de tecido que estava sobre a base inferior da mesa de corte há alguns dias. — Sei que o Lysandre já é bem grandinho, mas a nossa relação é assim. Ele sabe que eu me preocupo e saber onde ele está me deixa mais tranquilo. Eu não o proíbo de nada, em troca ele não faz nada de errado, me diz onde vai e me dá satisfação de tudo o que nós consideramos importante eu saber.

Leigh não era de controlar os passos do irmão ou impor sua vontade a ele, mas cobrava dele algumas posturas, que serviam não só para ele se tornar um adulto responsável, ético e de bom caráter, como para eles viverem bem juntos e sozinhos.

— Você fala como se fosse o pai dele. — ela manteve os olhos voltados para porta da loja, para ver se alguém entrava e ao mesmo tempo, fugir do olhar do namorado. — Toda essa responsabilidade não te pesa, vida? O Lys aceita isso tranquilamente, sem questionar? Afinal ele é apenas 2 anos mais novo que você. — a mágoa de Rosa por Lysandre a estava fazendo, sem se dar conta disso, questionar a forma que Leigh tratava o caçula.

— O que deu em você, Rosa? Sabes muito bem que tipo de relação Lysandre e eu temos. Eu não me importo em ser responsável pelo meu irmão. Eu sempre zelei por ele e não é porque crescemos que isso ia mudar. Eu sei que hoje ele não é mais tão bobo, nem tão frágil quanto na época em que éramos crianças, mas ainda assim, eu me preocupo com ele. O Lysandre pode não demonstrar, mas ainda tem muito daquele garotinho que se perdia só por eu me afastar dele por alguns minutos e que sofria intensamente a cada vez que descobria a traição de alguém que confiava.

— Mas você não se cansa de ser responsável por ele? Nunca pensou em como seria se não tivesse que ser assim? Sem a necessidade de trabalhar tanto e nem com a preocupação se ele esqueceu a janela aberta, as chaves na fechadura do portão ou se ele esta demorando a chegar porque se perdeu? — perguntou, voltando o olhar para o namorado, que se incomodou com o tipo de indagação.

— Por que você está me perguntando isso, Rosa? — estranhou, visto que Rosa raramente falava algo contra o Lysandre. — Eu não estou te entendendo. — aproximando-se dela. — Estou começando a achar que esse peso no seu semblante tem a ver com o Lysandre e não com sua amiga ter se machucado na escola como você me falou assim que chegou na loja.

— É c-claro que não vida. Eu realmente estou preocupada com a Sol. — Ela evitou olhar diretamente nos olhos dele, não por suas indagações, mas por medo dele perceber que andou chorando e que escondeu as olheiras – e o vermelho dos tapas de Charlotte – com maquiagem. Leigh não perguntar não significava que não tinha percebido.

— Foi minha culpa ela ter escorregado no vestiário. — contou, omitindo a briga com Charlotte, pois Leigh odiava esse tipo de comportamento numa garota. Na verdade o verdadeiro motivo dela não ter contado ao estilista sobre o que Lys lhe fizera foi sua briga com a colega de classe. Apesar dela achar que o cunhado merecia uma bronca e dela estar magoada, triste e do Leigh ser seu namorado, não podia simplesmente desaguar em seus braços e dizer como se sentia com tudo aquilo, querendo um amparo, sem contar o que havia acontecido entre Charlotte e ela.

— Então por que todo este questionamento sobre minha relação com o Lysandre? Você não está com ciúmes dele, está? — perguntou, achando graça ao pensar nela com ciúme do platinado. — Eu posso até suportar o seu ciúme das garotas, mas do meu irmão seria demais, Rosa. — comentou, ainda rindo um pouco, mas falando sério, retornando para a mesa de corte.

— Não estou com ciúme do Lys, vida. É que às vezes eu te vejo tão cansado e bravo com o Lys que me pergunto se você nunca se arrependeu de trazê-lo para cá. Eu só fiquei curiosa em saber como você se sente em relação a isso. — explicou-se.

Na verdade ela tinha um pouco de ciúme dele sim, mas nada que abalasse a relação dos 3, tudo dentro da normalidade, até porque ela adorava o cunhado, achava-o fofo em todos os sentidos, mas isso não mudava o fato dela achar que Leigh dava atenção demasiada a ele, sendo Lys quase um homem.

— Tolices, Rosa. Lysandre e eu sempre estivemos juntos, mesmo quando separados. Eu sei que ele viveu a própria vida durante o tempo que estive na Escola Técnica, assim como eu, mas nós sempre tivemos a certeza que moraríamos juntos novamente. Essa foi uma promessa que fiz a minha avó, a mim mesmo e a ele, e você sabe disso. — disse a ela, passando o tecido com cuidado para a parte de cima da mesa, abrindo-o e alisando-o com as mãos para não ficar com nenhuma dobrinha, preparando-o para receber o molde do vestido de uma das formandas.

— Eu sempre comentei com você que assim que eu completasse a maioridade iria trazê-lo para viver comigo. Por conta de uns problemas na fazenda ele veio antes, mas isso não mudou nada, pelo contrário, eu fiquei feliz por ele vir antes. — esboçou um leve sorriso ao dizer aquilo, pegando um dos envelopes tamanho A1, feito por ele mesmo, que estava numa das duas estreitas gavetas que ficam embaixo da mesa. — Eu sei que para você e até para outras pessoas, eu ser responsável pelo Lysandre, ele sendo apenas 2 anos mais novo que eu, é um fardo para mim, mas não é assim. Eu amo o meu irmão e zelar por ele, de certa forma, me completa. Acho que mesmo que ele fizesse algo de muito ruim, eu ficaria ao lado dele, o protegeria. É difícil de explicar e talvez você nunca venha a entender. Sei lá. Às vezes eu acho que fui pai dele numa outra vida. — sorriu mais expressivamente, colocando as peças do molde que estavam dentro do envelope sobre o tecido para depois encaixá-las no lugar certo.

A ligação daqueles dois irmãos era quase que umbilical, um amor fraternal muito forte e que Rosa achava lindo, embora sentisse umas pontadinhas de ciúmes de vez em quanto, principalmente porque Leigh nunca fazia planos sem pensar no irmão antes. Enquanto ouvia o que o namorado dizia ela se perguntava caso ela lhe contasse a verdade se ele tomaria suas dores ou apoiaria o Lysandre. Ela não queria competir com o cunhado, mas lhe incomodava pensar que o Lys sempre estaria entre eles dois – na visão dela – e que provavelmente ocupava um espaço maior no coração de Leigh.

Provavelmente, se o Lysandre não tivesse agido da forma que agiu com a Rosalya, aquele tipo de pensamento não tomaria conta dos pensamentos dela, mas saber que o platinado não a considerava parte da família lhe causou uma dor enorme, pois para ela, Lys era seu irmão mais velho, e essa dor fez nascer nela o medo de que Leigh pensasse da mesma forma, vendo-a apenas como uma namoradinha de juventude.

Se em dias normais Rosa já se melindraria com as palavras de Lys para ela, naquele tudo teve um peso maior; sua TPM deixava seus hormônios em polvorosa.

— Ele é esquecido, distraído, presta mais atenção nos pensamentos dele que nas obrigações, faz manha quando está doente só para ter a minha atenção, se cala e se isola quando está irritado ou chateado com alguma coisa, e é ciumento apesar de tentar a todo custo esconder isso. Ele me deixa louco às vezes, com vontade de esganá-lo por seus devaneios na hora errada e por seus esquecimentos, e até por aprontar alguma, principalmente quando está com aquele ruivo desmiolado; mas ele é meu irmãozinho e isso nunca vai mudar, não importa que ele tenha 16, 20 ou 40 anos. Nossa relação vai ficar diferente, eu sei, mas eu sempre vou estar por perto para caso ele precise de mim. — falou olhando para o nada ao invés de alfinetar uma das peças do molde no corte de seda prata, voltando os olhos para o tecido assim que se deu conta que estava se expondo, corando-se, furando o dedo com o alfinete, levando-o a boca. Falar sobre seus sentimentos de forma tão aberta o fazia se sentir nu e era uma sensação estranha. Apenas com Lysandre ele se sentia à vontade para se expor e ainda assim, apenas quando um ou outro se sentia sufocado demais para continuar guardando "aquilo" para si.

— Você o mima demais, isso sim. Por isso que ele é do jeito que é. — pensou Rosa, alto, achando que Leigh não ouviria, mas ouviu.

— Eu não estou gostando do rumo desta conversa. O que você quer dizer com isso, Rosa? — questionou com rispidez, virando-se para ela, parando de alfinetar o molde. — E não vem com essa de que não é nada. Você e o Lysandre ainda estão de picuinha? Eu vou mesmo ser obrigado a me meter nisso?

Ao ser pressionada por Leigh Rosa acabou chorando e ele se aproximou dela novamente, envolvendo-a em seus braços de forma acolhedora. Ele já estava desconfortável com aquela situação, com as duas pessoas que ele amava de rusga, e este sentimento o fez perguntar novamente o que estava acontecendo entre ela e o irmão dele.

— V-Você me ama, Leigh? — perguntou ela ao invés de contar o que lhe afligia, respirando fundo para parar de chorar, com a cabeça recostada em seu peito, ainda sentada na cadeira de mogno de 110 cm de altura. Ela só queria se sentir importante, a mais importante na vida do estilista. Ela queria se sentir parte daquela família.

— Que pergunta tola, Rosa. Por que isso agora? — questionou ao invés de dizer apenas "sim, eu te amo", como ela queria ouvir. Ao contrário de Lysandre – galanteador por natureza –, Leigh não conseguia demonstrar seus sentimentos por ela com palavras. Ele amava Rosa, mas pouco dizia. Nem mesmo nos cartões que ele escrevia para ela seus sentimentos eram expostos com as palavras dele, sendo sempre o caçula quem lhe "emprestava" as palavras – que representavam seus sentimentos por ela perfeitamente.

Rosa entendia o namorado, sabia que ele era reservado e que tinha muita dificuldade em demonstrar seus sentimentos, mas às vezes não tinha como ela não se melindrar e desejar ouvi-lo dizer que a amava, pois a mesma dificuldade que Leigh tinha em dizer que a amava parecia não afetá-lo em relação ao Lysandre.

— E-Eu não acho uma pergunta tola. Você não parou de dizer o quanto ama o Lys, mas quando eu pergunto se você me ama eu sou tola. — comentou, chateada, deixando os braços dele, cabisbaixa. — Às vezes eu acho que se um dia você tiver que escolher entre nós dois, o escolherá ao invés de mim.

Leigh já estava acostumado com os melindres da namorada em relação ao que ele sentia por ela. Não era a primeira vez. Todo mês ele passava por aquilo, bastava chegar o começo do mês, que trazia de brinde a TPM. Mas aquela foi a primeira vez que ela fez aquele tipo de comentário. “Como assim escolher entre um dos dois?” foi o pensamento dele.

— Eu não acredito que você disse isso, Rosalya. — além de desapontado, Leigh ficou bem nervoso com aquele comentário. — Como assim escolher entre você e meu irmão? Que loucura é essa agora? Que bicho te mordeu afinal de contas? Até ontem estava toda feliz por eu ter decidido ir para Paris com você apesar da “dor de cabeça” que isso vai me gerar, e agora isso? O que você quer mais? — questionou, segurando-se para não brigar com ela.

— Humpf. — bufou a garota e Leigh não gostou nadinha. Para ele foi como se ela estivesse indiferente ao que lhe dissera, ainda mais por ela ter virado o corpo, ficando quase que de costas para ele, olhando para dentro da loja, fugindo-lhe o olhar, continuando com seu melindre.

— Eu só que...

— Chega! Para! — pediu, afastando-se dela, interrompendo-a antes que ela terminasse aquele questionamento, pois sabia bem qual era e ele já estava cansado de ouvi-la dizer, em suas crises de TPM, que Lysandre era 1º plano em sua vida, enquanto ela era o 3º, depois do trabalho.

Lys achava que o trabalho era 1º plano na vida do irmão e que Rosa e ele dividiam o 2º. Leigh não achava nada, só vivia sua vida como achava que tinha que viver.

— O que você quer? Que eu “apague” o Lysandre da minha vida? — indagou retoricamente, nervoso. Ele respirou fundo, fechou os olhos e levou a mão a testa, puxando o cabelo para trás, coçando a cabeça, pendendo-a para o lado. Ele não ia brigar com ela, literalmente, não ia. — Eu vou fazer um chá. — disse ao passar por ela e sair do ateliê, indo na direção da passaderia, querendo ir até a copa cuja passagem era por aquela pequena sala.

— Depois não quer que eu ache que você gosta mais dele que de mim. — resmungou a albina baixinho. Leigh não ouviu o que ela disse, mas ouviu o murmuro e isso o irritou. Ele amava aquela albina – mesmo que não dissesse –, mas se tinha uma coisa que o enlouquecia nela era sua incapacidade de saber quando parar.

— CHEGA, ROSALYA! — bradou, fazendo-a se calar e fechar a cara, cujos olhos arderam e lagrimejaram. — Pelo amor de Deus. Você não sabe quando parar?! — repreendeu-a, fazendo-a desaguar em lágrimas e entrar no ateliê.

Leigh odiava brigar com Rosa, mas tinha horas que ela o tirava do sério. Todo início de mês era a mesma coisa, ela se melindrava com alguma coisa e ele perdia a paciência. Ele sabia que era por causa da maldita TPM, mas por mais que ele tentasse fugir da discussão ela não deixava, pois ao invés de parar com suas reclamações ela insistia na tecla e ele se via obrigado a levá-la para casa mais cedo para evitar uma briga por besteira. Mas daquela vez seria diferente. Leigh respirou fundo, pegou uma bebida na sua Freestyle, deixando o chá quente de lado, sentou na poltrona que ficava embaixo do ar condicionado e deu um gole grande na bebida, como se quisesse tomá-la de uma vez. Ele queria se acalmar para poder ir até a namorada e resolver aquilo da melhor maneira, mas por mais que tentasse relaxar não conseguia. Tinha algo de muito errado acontecendo entre "dois membros daquela família” às costas dele e que já estava passando da hora de ser resolvido.

Depois de mais um gole ele deixou o copo sobre o balcão da loja e entrou no ateliê.

Vê-la chorando de soluçar com a cabeça recostada na mesa de corte, – ela afastou um pouco o tecido para não deitar a cabeça sobre ele – fez o coração do estilista apertar. Ele estava acostumado com a choradeira dela na TPM, mas daquela vez ela parecia sentida, magoada demais.

— Rosa. — chamou-a, aproximando-se dela. — Desculpe-me. Eu não devia ter gritado com você. — acariciando-lhe a cabeça, tirando suas madeixas brancas do rosto, descobrindo-o. Ela virou o rosto para o outro lado, pois não queria olhar para ele. Ela estava triste e zangada. Como se não bastasse o Lysandre tê-la destratado na frente de boa parte dos alunos do S.A., Leigh se zangou só porque ela perguntou se ele a amava – eis a fase do ninguém me ama, ninguém me quer.

Ao que parecia, naquele dia outro copo transbordou e foi o da albina.

Leigh sentou ao lado dela e continuou acariciando sua cabeça, querendo com aquele cafuné que ela o perdoasse. Seria tudo mais fácil se ele apenas dissesse "Eu te amo" todos os dias, mas nem ele entendia o porquê isso era tão difícil para ele. Com Lysandre era diferente porque sempre foram muito ligados desde pequenos – e mesmo assim não era tão fácil como deveria, mas os dois entendiam os sinais que enviavam um ao outro, indicando quando estavam prontos para falar e ouvir.

— Tente me entender, amor.

Rosa odiava o fato de Leigh só a chamar de amor e dizer que gostava dela quando eles brigavam, – só assim para ele se expor um pouco – salvo algumas raras vezes, mas ao mesmo tempo gostava de ouvir tal palavra pronunciada com tamanha naturalidade e sem ela pedir.

— E-Eu sei que não digo o quanto gosto de você como deveria, mas isso não significa que eu não te ame. — O coração dele batia forte, embora fosse difícil se expor, não era ruim, apenas desconfortável. — E é por te amar tanto que só a ideia do Lyandre e você de inimizade me tira do sério. — expôs-se. Rosa gostou do que ouviu, mas continuou de costas, por birra. — O fato de eu não falar nada não quer dizer que eu não saiba que tem alguma coisa errada entre vocês dois, e não é pouca coisa.

Rosa deu um suspiro longo, limpou os olhos e continuou com a face voltada para o outro lado, ignorando-o.

— Você sabe o quanto eu respeito a privacidade de vocês e que não gosto de me meter, mas essa situação já está passando do limite e eu estou começando a achar que vocês estão me escondendo alguma coisa. — ele esperou ela dizer alguma coisa, mas como se manteve calada, ele pediu que olhasse para ele, afavelmente, mas ela não atendeu.

Rosa estava passando pelo 4º estágio da sua oscilação de humor naquele dia. Ela teve seu momento de ira com Charlotte, seu momento de silêncio na sala de aula, o de melindre com Leigh e naquele instante vivia seu momento de birra. Como Leigh já estava acostumado com aquilo sabia que se a deixasse se acalmar sozinha ou se insistisse em resolver aquilo ia dar no mesmo, ela ia viver o momento "ninguém me ama, ninguém me quer" de qualquer jeito e a choradeira era inevitável. Se ele não quisesse muito por um ponto final naquela situação a teria levado para casa só para evitar passar o resto do dia ouvindo-a perguntar sem parar se ele a amava, entre um choramingo e outro, uma reclamação e outra.

— Tudo bem, Rosa. Você não quer conversar e eu compreendo. — disse ele levantando da cadeira. — Mas fique sabendo que assim que o Lysandre chegar nós três vamos resolver isso. Chega dessa picuinha de vocês dois, "nós somos uma família" e isso acaba hoje!

— M-Mas, Leigh... — Rosa levantou o rosto e o fitou. Pensar nele se metendo naquela rusga a fez parar com a birra rapidinho. Ela sabia que assim que Leigh soubesse de tudo o que aconteceu na escola naquela 3ª feira a “casa ia cair”, tanto para o Lysandre quanto para ela, pois se atracar com Charlotte no vestiário não foi muito elegante da parte dela – para não dizer que foi coisa de, no mínimo, chahut[1]. — E-Eu... o L-Lys... — ela estava com medo das coisas piorarem ao invés de melhorarem. Ela não contaria nada, mas sabia que assim que Leigh pressionasse o irmão ele ia contar, pois Lys não mentia para ele. — Você v-vai se zangar... — ela estava com medo do Leigh desistir da viagem por causa do caçula. Ela voltou a chorar.

— E por que eu me zangaria? — indagou, desconfiado. — Por acaso o Lysandre te fez alguma grosseria? Ele te faltou com o respeito? — enervando-se. Leigh sabia que o irmão não era do tipo que fazia grosserias, muito menos que faltava com o respeito com alguém, ainda mais uma mulher, mas ele também sabia que o caçula, no seu limite, se fosse conflitado de alguma forma, podia dizer coisas que magoavam, e ele conhecia bem a namorada para saber que na certa ela não soube quando parar, ainda mais na TPM, e se não deu espaço ao platinado num momento atípico deste, pode ter invadido uma zona perigosa e sido, sutilmente, destratada. Ele até entendia o irmão, mas não toleraria falta de respeito com sua namorada.

Rosa não disse nada. Ela preferiu baixar o olhar e num suspiro choroso e longo, guardar silêncio.

— Já que você prefere o silêncio, que assim seja. Quando o Lysandre chegar nós resolveremos isso. Já que vocês dois não foram maduros o suficiente para resolver essa questão sozinhos, eu mesmo farei isso. E eu realmente espero que seja só uma picuinha! — deixou claro, voltando para a loja. Alguma cliente havia entrado, ou então Lysandre, pois a campainha musical que acionava sempre que a porta se abria tocou.

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Notas finais do capítulo

[1] Chahut (inventada para a fanfic, de Chahuteur): pessoa que faz alvoroço, barulhenta, chabuseira, barraqueira.Mágoa, um sentimento curioso, nos faz agir como tolos muitas vezes.

Mágoa, um sentimento curioso, nos faz agir como tolos muitas vezes.
TPM. Só quem tem sabe o que é. Melindres, choros, gritos e manhas... Há mulheres que precisam fazer uso de medicação neste período de tão forte que é sua TPM...
Eu tenho uma TPM infernal, brigar e chorar é comigo mesmo. Até eu me irrito comigo....rsrsrsrs



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