Let It Snow - Natal das Sagas escrita por River Herondale


Capítulo 3
Divergente


Notas iniciais do capítulo

Antes de ler, vou avisar coisinhas aqui:
1- É na perspectiva do amado Quatro no seu primeiro natal após se iniciar na Audácia (escolhi ele porque a Tris não teve tempo de passar nenhum natal na Audácia e eu imagino que o natal na Abnegação seja muito chata. Está tudo explicadinho na fic, ok?)
2- Eu amo os comentários de vocês, então, por favor, você fantasminha que lê, me mande uma mensagem, o que acha? Seria um grande presente, rsrs
3- Essa até agora é o meu conto favorito, espero que gostem dela tanto quanto eu :)



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Primeiro Natal na Audácia

Meu nome é Tobias Eaton, mas desde que me transferi para a Audácia me chamam de Quatro. Tenho dezessete anos e este é o meu primeiro natal longe da Abnegação.

Eu nunca me apeguei e esse tipo de datas. Nunca pude. Não ganhava presentes, apenas distribuía. Não podíamos ter um tipo de privilegio nessa data, a não ser que no Natal, todos nós nos reuníamos na rua, desejando “Feliz Natal” e esperávamos dar meia noite para vermos os fogos de artifícios.

Mas não hoje. Hoje eu vou estar em uma festa natalina dos membros da Audácia.

Quando mais novo, eu já havia notado eles comemorando. Eram eles que subiam até o grande prédio abandonado e nos presenteavam com seus fogos de artifícios. Os fogos eram coloridos, a maioria das vezes com as cores das Facções. Hoje eu estarei presenteando-os com os fogos, e isso apenas me deixa com extrema animação, por mais que eu não mostre.

Na hora da janta, sei que teremos alimentos especiais. Lauren me contou. Estou passando na frente da cozinha junto com alguns colegas que junto comigo ano passado fomos iniciados juntos. O cheiro faz com que meu estomago dê saltos. É maravilhoso, devo admitir. Imagino se hoje experimentarei as comidas tradicionais de natal que tanto já ouvi quando estava na escola.

– Hoje terá bolo de chocolate? – pergunta um dos meus colegas ao lado para ninguém em especial.

– Há alimentos mais especiais para essa data. Tipo rabanada. – Fala Zeke, que é um nascido da Audácia e está acostumado com isso.

Aos poucos vamos nos despedindo. Vejo Zeke indo ao encontro de sua família, e confesso que sinto uma pontada de tristeza misturada a inveja. Imagino como seria meu natal deste ano caso tivesse decidido ficar, ao lado de meu pai.

Onde estava tristeza e inveja, deu seu lugar a revolta. Não, eu não poderia ficar, o que eu fiz foi melhor para todos. Meu pai poderia sempre ter tido planos para mim na Abnegação, mas eu pertenço aqui, entre os corajosos.

Eu nunca mais o vi depois que me transferi. Confesso que parte de mim se sente aliviada, mas sua crueldade está em forma de cicatriz em mim. Cicatrizes físicas e psicológicas, incapazes de serem apagadas. O que sobrou foi apenas a minha promessa de poder ser feliz sem ele, com uma nova vida, protegendo vidas em meu uniforme negro da Audácia.

Entro no meu quarto, tirando minha camisa suja por conta do trabalho árduo de hoje. Minha mão cheira a pólvora, o que me faz ficar aturdido por um momento. Odeio os rastros de violência que a arma deixa em minha mão após portá-la. Tiro também a calça escura e vou até o banheiro, abrindo o chuveiro e deixando que a água refrescante caísse em minha costa pintada com formas negras, amolecendo meus músculos rígidos.

Eu amo tomar banho, pois eu consigo relaxar verdadeiramente, apenas eu e meu ser. Porém parte de mim odeia com todas as forças esse momento. Não pelo fato de que estou me lavando ou algo assim, mas sim pelo fato de que é nesse momento que meu cérebro é envolto de toneladas de pensamentos, tanto concretos quanto que eu mesmo invento, criando problemas e suposições que envenenam minha alma.

Um dos banhos passados que tive cheguei a conclusão de que ao mesmo tempo que o cérebro é o nosso maior aliado, ele também é o nosso maior inimigo.

Ou o coração. Podem dizer que não, mas o coração e o cérebro têm mais em comum do que imagino.

Fecho o chuveiro e pego a toalha, secando minha costa, meus ombros, meu cabelo e por fim enrolando-a em minha cintura.

Passo meu punho direito no espelho para tirar a bruma que embaçou a superfície. Me encaro por longos segundos, me encarando, tentando reconhecer a minha parte exterior.

Em menos de um ano na Audácia, as mudanças físicas em mim são aparentes. Garanto que muitos que me conheciam como Tobias Eaton não me reconheceriam agora como Quatro. Os que reconhecessem, porém, ficariam aturdidos. Minha voz está bem mais grave e impotente comparado com a voz passiva que eu portava na Abnegação. As tatuagens cobrem minha costa que recebeu músculo com o meu treinamento árduo da Audácia, deixando a parte entre as omoplatas maior do que antes. O mesmo vale para meus ombros e braços. Muitas vezes eu mesmo me assusto ao lembrar do Tobias pacifico vestido de cinza.

Não temos muitas variações de roupas, mas sinto na obrigação de me arrumar para esse natal. Sei que meus colegas estarão bem vestidos na hora do jantar e na hora que trocaremos presentes em uma tradição chamada “Amigo Secreto”. Acho divertido e fico imaginando se minha amiga secreta, Lauren, irá gostar do que comprei a ela.

Abro o guarda-roupa e pego a minha calça mais nova. É preta, naturalmente, mas seus bolsos são maiores e o caimento dela próximo a minha batata da perna é diferente. Também pego uma camiseta preta normal e uma jaqueta de couro grossa. Meu cabelo é curto, então quando vejo está quase seco. Coloco meu coturno e me apresso para sair, pegando o pacote com o meu presente.

Saio imaginando quem me pegou, mas afasto logo o pensamento. Não sou de me mostrar ansioso.

Vejo que o refeitório está cheio, por mais que eu tenha chegado adiantado. Olho para as pessoas ao meu redor, procurando a mesa em que algum colega meu pudesse estar sentado. O que mais me dói, por mais que recuse aceitar, é ver as famílias unidas. Meu pai dizia que no natal o importante era estar com a família e fazer o bem.

Hoje eu quero fazer o bem.

Sinto mãos encostando em meus ombros e me viro para ver quem poderia ser. Era Zeke, com a boca cheia de comida. Sorrio para ele e o cumprimento.

– Vai jantar com a gente? – pergunto, enquanto ele aponta para a mesa em que estão sentados dois meninos e uma menina. Nossos colegas.

– Prometi aos meus pais que no almoço amanhã a gente come juntos. Afinal, hoje é dia vinte e quatro. Natal é só amanhã.

Concordo com a cabeça enquanto me sento ao seu lado e coloco meu presente em cima da mesa. Meus colegas conversam entre si, rindo, e tento entrar na conversa também. Sem sucesso. É estranho o fato de estar entre tantas pessoas, mas continuar me sentindo sozinho. Sinto que sou um caso singular, com zero chance de socialização e empatia, pois até hoje nunca confiei em ninguém o suficiente a ponto de sentir um tipo de vontade ardente de tê-la ao meu lado em todos os momentos. É complicado dizer, mas eu sinto que não gosto das pessoas. Seus modos de pensar, de agir, suas prioridades e seus defeitos. Para mim é tudo tão fútil e desnecessário que muitas vezes me pergunto se o errado é eles ou eu.

Sempre me convenço que sou eu.

Leva uns quinze minutos para a nossa mesa encher e todos estarem presentes. Cumprimento todos com um sorriso e aperto de mão e juntos vamos buscar nossa janta.

Pegamos nossos pratos e confesso que meus olhos brilharam ao ver tanta comida. Tinha pernil, rabanada, vinho, peru e outras coisas cheirosas que fiz questão de experimentar. Voltamos à mesa e vi todos os olhares da mesa me observarem começar a comer, por mais que eu tenha imitado que não percebia. Ao encostar o alimento em minha língua, um grupo de sensações atingiu meu ser, um prazer extremo que provavelmente ficou aparente em minha expressão, pois todos meus colegas sorriram.

– Como é ter pela primeira vez um natal com um verdadeiro banquete? – perguntou para mim Zeke, sorrindo de bochecha a bochecha.

Enquanto eu mastigava, sorri, fazendo com que um pouco de farofa voasse de minha boca, o que arrancou risadas de alguns, inclusive de mim.

– É como se eu estivesse pulando pela primeira vez depois de me transferir. – confessei, não conseguindo parar de levar comida para minha boca. Todos os dias a comida é boa, mas hoje estava excepcional.

Lauren pegou sua taça de vinho e levantou. Todos fizeram o mesmo, sorrindo, enquanto eu comia. Olhei assustado a eles, sem entender. Ela disse:

– Levante sua taça também, Quatro, e vamos fazer um brinde ao nosso maravilhoso natal, que para muitos aqui é o primeiro na Audácia, principalmente para você, Careta. – eu sorri e brindamos, encostando nossas taças no centro da mesa e comemorando.

Quando terminamos de comer, pegamos nossos presentes para começar a trocar. Foi divertido, todos nós estávamos a vontade e unidos, como se não houvesse nenhum mal na terra. Adorei quando Zeke revelou que fora ele que havia pego meu nome no sorteio do Amigo Secreto e Lauren ficou tão agradecida com meu presente que me deu um abraço apertado, algo que eu não recebia fazia muito tempo. Na verdade, nem me lembro do meu último abraço, pois na Abnegação é proibido, mas aqui não, mesmo que isso não tenha me impedido de continuar estranhando com intimidade demais. Não me intimido, não tenho receio de meu corpo, mas o problema para mim não é ter meu corpo encostando o de alguém. O problema é o que provavelmente a pessoa está pensando no momento. Não gosto de imaginar que as pessoas abraçam por obrigação. Eu prefiro abraços raros, porém verdadeiros.

Então fico imaginando se o abraço de Lauren tenha tido algum significado relevante a ela, porque para mim teve.

Onze horas da noite, meus colegas se levantam da mesa após muitas conversas para irmos buscar os fogos de artificio e levar para a cidade, fazer nosso pequeno show e presentear as outras Facções e Sem-Facções.

Chegamos vinte minutos adiantados no topo do edifício. Os olhares das crianças das outras Facções enquanto passávamos com os fogos gigantescos em nossos braços eram encantadores. Sentia que estaria fazendo-as felizes quando à meia-noite notassem que o céu escuro receberia um pouco de cor. Eu quando era pequeno me encantava com isso.

Subir pelo lado externo do edifício me amedrontou um pouco, mesmo que eu não possa dizer isso. É anti-Audácia da minha parte, mas preciso confessar que o fato de você subir em um edifício pelo lado externo ao invés de usar escadas não te faz mais corajoso que os outros. Não é isso que mede coragem. Eu não questionava, pelo menos não com alguém. Sei que ninguém me entenderia.

Fico de pé sozinho, observando o céu do alto. Estava frio e no céu eu podia ver flocos de neve caindo delicadamente na terra. Levantei minha mão que estava protegida por luvas grossas e pude ver os pequenos flocos pousarem nelas.

Faltava apenas dois minutos para finalmente fazermos nosso pequeno show. Fui ajudar meus amigos a posicionar melhor os fogos. Vi uma das garotas que estava conosco subir novamente para nos avisar que havia muitas pessoas na rua para assistirem a queima. Me inclinei na ponta do terraço do edifico e pude ver um grupo gigante de Abnegados e fiquei me perguntando se meus antigos colegas de classe estavam misturados por lá.

Fiquei me perguntando se meu pai estaria entre esse grupo, e se no momento em que ele vesse a queima, pensaria na probabilidade de seu filho estar naquele edifício provocando os fogos.

A contagem regressiva começou. Eu e meus amigos seguramos os fogos e quando deu “zero”, soltamos, deixando que eles fizessem seu espetáculo sozinhos, colorindo o céu. Imaginei as crianças encantadas, assistindo com seus pais e irmãos. Imaginei se alguém havia batido palmas, porque eu sempre batia.

Imagino se no natal que vem eu consiga além de fazer o bem, consiga estar com uma família.

Imagino se um dia serei a família de alguém.


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Notas finais do capítulo

E aí pessoal, o que acharam?
Não sei se vocês pegaram umas referencias aí no conto, principalmente na última frase, hehe (Fourtris)
Confesso que esse conto foi o mais fácil de escrever, mas ao mesmo tempo o mais intenso. Eu amo o Quatro porque ele é... diferente. Ele tem um poder nele incrível, e eu imagino que ele deve ter um excesso de pensamentos sobre o mundo que seria fascinante e assustador conhecer sua mente. Enfim, como eu sei que ele é recatado, quis dar essa fragilidade a ele, mesmo que ele seja todo "badass".
Não acontece muita coisa na fic, desculpe, mas eu não queria aventuras porque ele já faz isso muito nos livros, haha, queria que fosse algo singelo e que a graça do conto ficasse nos pensamentos dele sobre o Natal. E aí gente, mereço reviews? Obrigada e até mais



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