Quando chove no mundo de alguém escrita por Tio Memphis


Capítulo 5
Capítulo 5 — Um lugar para uma mente inquieta.




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O rosto daquela garota ainda habitava em minha mente, a forma como ele mudava de forma e todas as pessoas que ele tinha se materializado. Podia sentir o calor acolhedor de todos que me consolaram, mas havia algo diferente em mim, desde que eu havia chegado naquele mundo branco, muitas coisas mudaram, e eu sabia que muitas coisas iriam acontecer.
O garotinho ainda estava lá, tinha adormecido ao meu lado enquanto eu refletia nas palavras da garota e na forma que eu havia agido naquele momento.
"Você nunca esteve sozinho", essas palavras ficaram se chocando em minha mente, se ligando a memórias e me fazendo pensar por tudo o que eu havia passado. Se realmente nunca estive sozinho, porque eu me sentia como se estivesse?
Tentei afastar as dúvidas e me concentrar nas pessoas que havia sentido a presença quando estava com a garota. Todos os rostos me transmitiam uma sensação de conforto e paz, todos faziam com que eu me sentisse bem por ser eu, todos faziam com que minha existência se tornasse mais confortável.

"Mas porque eu avancei daquela forma?" Na hora eu não havia pensado, eu apenas senti a vontade de proteger a garota, a explosão de sentimentos havia tomado conta do meu corpo. "Que sentimento familiar". Foi a única coisa que consegui pensar, embora isso só tornasse as coisas mais confusas.

Comecei a lembrar do meu passado, era como um filme passando na frente dos meus olhos, e algumas portas em minha mente foram se abrindo.

"No começo não havia ninguém", não, não estava me referindo ao lugar branco onde eu estava deitado com um pequeno garoto dormindo perto de mim. Desde o começo eu costumava a vagar sozinho pelos caminhos, apenas tentando ser mais uma parte da paisagem. Não ter nada, não ser nada, apenas passar pela vida sem deixar marcas, isso parecia ser uma ótima ideia, parecia ser o jeito certo, não ser marcado também me pouparia da dor de uma despedida. "Quando não se tem nada, não existe o medo de perder", eu costumava a pensar. Embora fosse uma perspectiva vazia, parecia ser um rumo fácil para se seguir.

"Você nunca esteve sozinho". O sorriso daquela garota passou pela minha mente, trazendo junto todas as lembranças e a sensação calorosa das pessoas que marcaram o que eu tentei a todo custo manter isolado de tudo e todos, minhas memórias.

Era como andar na escuridão, estar rodeado de nada além de trevas, caminhando sem direção, apenas esperando o fim, apenas para saber como iria acabar. Os dias se baseavam apenas em sobreviver, prazer era algo que costumava a ver apenas em livros , apenas histórias que iludiam as pessoas gradativamente até elas estarem convictas de que viver algo assim era possível.

"Então como tudo isso começou?", tive que me fazer essa pergunta, de alguma forma, lá no fundo da minha alma, eu sabia a resposta.

— Você simplesmente abriu as portas desse seu abismo para alguém entrar e te guiar — disse o pequeno garoto esfregando os olhos enquanto levantava.

— Como sabe disso garoto?

— Eu já disse, eu sou você, e se não acredita eu vou te mostrar, as vezes não importa o quanto eu explique, você só vai entender se eu te mostrar a verdade — disse o pequeno garoto enquanto estendia a mão para que eu a segurasse.

E quando percebi, já estava longe daquele mundo branco, agora estava no meio de rochas enormes, uma paisagem cinza, não havia vida lá, e se houvesse, não era nada que eu quisesse conhecer.

Um silêncio mórbido predominava naquele lugar, os únicos sons que podia ouvir era dos nossos passos. O pequeno garoto não dizia nenhuma palavra, apenas me guiava para o que parecia ser uma montanha.

Subimos por horas, horas de um silencio que já estava me destruindo, eu tinha dúvidas e sabia que ele tinha as respostas, mas não sabia se eu estava pronto para encontrá-las.

Quando chegamos ao topo tive uma pequena surpresa.

Esperava encontrar apenas rochas e uma imensidão cinza, assim como já havia visto no decorrer da subida, mas quando chegamos lá havia uma cerejeira, um banco, e uma fonte. O barulho da água era como música para meus ouvidos, era a certeza de que havia algo vivo lá. Era como se a vida tivesse voltado a correr pelo meu corpo depois de todo aquele silêncio.

Soltei a mão do garoto e me dirigi em direção a fonte, e quanto mais perto eu chegava, mais maravilhado eu me sentia com os detalhes, haviam pessoas entalhadas na pedra, animais, árvores, objetos e palavras que eu não conseguia ler.

Por um momento nada disso importava, tudo o que eu desejava era sentir a água fresca em meu rosto, e repousar no banco em frente a cerejeira. Não importava se eu estava perdido, não importava se nada fazia sentido, não importava se eu estava em um mundo branco, ou numa região morta, eu apenas queria descanso para meu corpo.

Olhei para trás e não vi o garoto, ele havia desaparecido, por um minuto eu senti algo dentro de mim dizendo que aquilo não estava certo, de alguma forma eu havia me acostumado com ele. Mas quando me virei para frente para voltar a correr o ar tremulou em minha frente novamente. E como um vulto fantasmagórico ele apareceu no meio do caminho da fonte. Havia algo estranho em seu olhar, eu não via mais o olhar inocente que eu havia visto mais cedo. Não havia vida naquele olhar, só um vazio assustador, ele me olhava com a cabeça quase deitada no próprio ombro e com uma expressão vazia.

Minhas pernas vacilaram e eu parei de correr, eu queria fugir de lá, independente do que estivesse acontecendo, eu sabia que não seria bom. Mas meu corpo não me respondia, eu não conseguia deixar de olhar para o garoto que me olhava estático, era como se eu olhasse para uma estátua de mármore. Eu precisava fugir de lá, mas as dúvidas não permitiam deixar ele para trás.

Quando finalmente arrumei coragem para falar, os olhos do garoto ficaram brancos e ele caiu inconsciente.

Embora estivesse assustado, corri para socorre-lo. Não podia simplesmente deixá-lo lá.

Peguei ele no colo e o deitei no banco, ele estava vivo, mas não parecia bem. Me dirigi em direção a fonte e percebi que havia uma pequena tigela de cobre com muitos desenhos e letras entalhados, sem pensar na minha própria sede, peguei um pouco de água e me dirigi em direção ao garoto. Havia muito tempo que eu não entrava em contato com esse meu lado, mas por um momento eu me peguei orando por ele. "Se existe algo me ouvindo nesse momento, se existe mesmo alguém que olha por nós, independente de quem seja, não deixe ele morrer, por favor."

Uma risada estridente me fez congelar no meio do caminho.

— Que piada, o que esse garoto significa pra você? — Mais uma risada diabólica — Ele não sabe de nada.

Quando me virei vi apenas um homem vestido em um terno preto, mas o que mais me assustava era a máscara que ele usava, uma máscara branca com a mesma expressão que o garoto tinha quando estava estático na minha frente.

Não sabia quem era esse homem, mas se ele tinha respostas eu não poderia hesitar. Tentei me manter firme enquanto ele se dirigia em minha direção.


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