Accomplices escrita por larysavilela


Capítulo 6
Surprise




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Pov Daniel

Estávamos a mais de quatro horas jogando sinuca e bebendo. Parecíamos dois loucos. Todos do bar achavam graça de nós, menos os pinguços que só conseguiam olhar para a cachaça. Nós estávamos na parte de baixo do bar, era um porão que fedia a mofo, bebida e suor. Tinha quatro mesas de sinuca, a gente estava em uma e dois caras ocupavam a outra. Um deles usava um boné muito foda dos Yankees.

A Anne é muito competitiva e odeia perder. O que estava acontecendo direto já que eu sou muito melhor que ela em jogos desse tipo.

— Você ta roubando! Não é possível. Eu sou melhor que você. – ela disse depois que eu encaçapei mais uma bola.

— Querida, acho que você já passou da conta com a cerveja. Não existe nenhum jogo que você seja melhor que eu.

Anne veio correndo e se jogou em cima de mim. Eu cambaleei mas ela continuou apertando meu pescoço e se balançando nas minhas costas que nem um macaco.

— EU SOU SIM MELHOR QUE VOCÊ, TA BOM ? – ela gritava com uma voz de criança manhosa. Uma criança muito bebada.

— SAI PORRA!

— Não até você assumir que sou melhor que você.

Eu fazia força para puxar um dos braços dela para que ela ficasse na minha frente. Mas ela tava segurando muito forte. Entao eu me joguei na mesa, fazendo ela bater de costas e me largar. Me virei e agarrei os pulsos dela ficando por cima para não deixar ela fugir.

Ela gargalhava e eu também. A situaçao era engraçada.

— Garota, você é maluca.

Ela parou de se debater e olhou para mim.

— Sou menos que você. Até porque não fui eu quem resolveu transformar a mesa de sinuca em cama.

Eu não tinha percebido mas estava uma cena bem estranha. A Anne estava deitada na mesa e eu em cima dela. Seria bem sexy se não fosse ela ali.

Eu levantei e a puxei. Já era noite e tinhamos tomado algumas cervejas mas nada que tivesse tirado nosso juízo.

— Dan eu quero jogar só mais uma vez. Vamos lá por favor, quero provar como eu sou boa.

— Minha gata, acho que já está na hora de eu te levar em casa – já eram nove horas da noite e ninguém tinha ligado para ela. – Você deixou seu irmão sozinho.

— Você tem razão, eu deixo para acabar com você em um outro dia. – ela deu uma piscadinha, pegou a jaqueta e subiu as escadas do porão.

Eu guardei os tacos e reparei que os caras da outra mesa não estavam mais la.

Quando eu cheguei no andar de cima encontrei Anne mexendo no telefone com uma cara de cu, ela estava teclando tão forte que parecia que ia estuprar o telefone com os dedos.

— Ou ou, relaxa ai se não daqui a pouco vai atravessar ele. O que ta rolando?

— To tentando ligar ele para ver se ainda tem um restinho de carga – ela me entregou, bufando. – Preciso ir para casa, Vincet já deve estar chegando.

— Você já deu uma olhada na minha caminhonete? aquela porra voa, eu te deixo em casa antes dele chegar.

Ela deu um sorrisinho e me chamou de convencido.

— Mas tem uma condição – eu disse, apontando para o balcão. – Eu te levo em casa na velocidade da luz e você paga a rodada de hoje.

Ela me olhou com o olho arregalado.

— Duuuvido. Você me trouxe aqui contra a minha vontade, me embebedou e me fez comer tacos apimentados até não conseguir mais respirar. Essa conta é todinha sua – ela jogou o papel em cima de mim.  

— Mulheres e o dom para virar o jogo. – fui até o balcão ouvindo a risada dela atras de mim.

A garçonete curvada apareceu no balcão, pegou o dinheiro e foi atender os clientes que tinham acabado de chegar. O homem ao meu lado estava de cabeça baixa e resmungava alguma coisa que era quase impossível de entender. Eu estava saindo quando ele me chamou.

— Garoto – ele segurou meu braço e por insinto eu o puxei. – Você tem um carro muito bonito ali. Tome conta dele, aqui é o subúrbio.

Aquele homem era assustador. O sorriso dele mostrava que os poucos dentes que restavam estavam podres. Sai dali puxando Anne pelo braço, eu não tinha medo daquele lugar mas preferia não arriscar.

Empurrei Anne para dentro do carro e o liguei rapidamente. Ela sentiu que eu estava tenso e antes que ela perguntasse o que tinha acontecido eu já disse.

— To com medo de ser roubado.

Eu estava concentrado dando a ré no carro e tentando não ter problemas com a neve caída no chão. Mas tive que parar tudo o que eu estava fazendo por causa da risada ridicularmente alta vindo daquela criatura. Eu tentei ser paciente para não dar um soco na cara dela.

— Eu posso saber o caralho do motivo da risada ? – eu olhei sério para ela.

Ela riu ainda mais colocando a mão na barriga, já estava ficando vermelha.

— Você é uma comédia. Decide pagar de fodão e vem para um lugar desse para depois dizer que esta com medo de ser assaltado ? – ela voltou a rir da minha cara, o que me deixou ainda mais puto.

— Isso não tem a menor graça porra, se alguem vier me roubar eu mando levar você em vez do carro.

Isso fez com que ela calasse a boca e eu conseguisse voltar a dirigir. Eu não estava mais preocupado já que estava deixando a parte mais perigosa de Nova york para trás. A neve não caía mais e eu precisava deixar logo ela em casa. Evitei as avenidas principais por causa do trânsito. Cheguei a uma rua estreita em que a neve estava acumulada no chão e uma das lixeiras enormes da rua estava caida atrapalhando a passagem.

Mandei ela esperar dentro do carro e fui liberar o caminho.

Nego derruba as coisas na rua e não tem nem a capacidade de ir arrumar. Essa cidade é nojenta.

Coloquei a lixeira na calçada e tentei bater as luvas para limpar um pouco. A iluminação estava fraca e eu não conseguia ver se estavam muito sujas. Estava distráido até que senti alguma coisa pontuda nas minhas costas. Eu tentei virar mas ouvi uma voz que me fez gelar.

— Se você se mexer eu te mato. E mato a sua amiguinha também. Não olha pra mim, entendeu porra? Não olha pra mim.

Eu estava paralisado, levantei as mãos para o alto e deitei no chão que nem ele mandou fazer. Ele parecia descontrolado e isso me deixou ainda mais nervoso.

Ouvi barulho de passos se afastando e então ouvi o choro da Anne. Por puro instinto levantei o rosto e quis procurar por ela mas a única coisa que eu vi foi um boné dos Yakees e logo depois uma dor aguda me atingiu. Ele tinha me acertado um soco no nariz. Eu senti o sangue começando a escorrer, mas antes que eu pudesse colocar a mão para ver como estava, recebi um chute na barriga. Eu já estava no estirrado no chão. Achei que ele fosse me matar mas o parceiro dele não deixou.

Ouvi quando ele o chamou de idiota e o mandou pegar meu casado e entrar no carro. Eu não conseguia protestar. Ele tirou meu casado mas antes disso enfiou algo em mim. A dor que eu senti foi tão forte que eu achei que não aguentaria, nunca tinha sentido aquilo na minha vida. Estava tudo girando, e meu corpo parecia arder. Ele estava rindo de mim.

O filho da puta tinha me esfaqueado.

— Toma ai o que você merece seu playboyzinho de merda.

Ouvi o barulho do carro acelerando e depois disso a única coisa que eu lembro é de gritar pela Anne e vê-la correndo na minha direção.

Acordei pouco tempo depois. Anne estava chorando e me abraçando, ela estava desesperada e implorava para que eu ficasse com ela.

— Ei, eu não vou a lugar algum.

Ela levantou o rosto e me olhou com uma expressão de desespero.

— Por favor não faz mais isso comigo. Não se atreva a fechar mais esses olhos entendeu? – teria sido engraçado se eu não estivesse sentindo tanta dor. Ela estava com o rosto molhado de lágrimas e havia me coberto com o casaco dela. Eu não queria aceitar mas não conseguia me mexer.

Pela primeira vez vi como eu estava, embaixo do poste consegui ver que a minha blusa branca estava coberta de sangue. O formigamento na minha pele continuava e meu corpo inteiro latejava. Eu estava perdendo muito sangue.

— Aquele filho da puta… FILHO DA PUTA! – eu gritei e todo o meu corpo sentiu de novo a dor aguda da facada. Eu grunhi. Lamentei estar sem meu carro, sem um celular, lamentei ter sido esfaqueado e principalmente lamentei não ter conseguido cuidar da Anne.

Olhei para ela, que se encolhia em um canto na parede e chorava baixinho. Ela estava assustada. Tinha sido tudo tão rápido, eu nem tinha visto aquele idiota se aproximar. Eu deveria ter reagido, ter gritado, socado o cara, não sei… eu deveria ter feito algo.

A neve voltou a cair e o frio que já estava grande piorou. Ela começou a tremer, e eu pedi que ela se aproximasse de mim. A abracei com a pouca força que eu ainda tinha. E ficamos assim por um tempo ate que eu sussurrei:

— Me desculpa.

Ela me olhou pasma.

— Te desculpar? Você não tem pelo que pedir desculpa. Se tem alguém que tem culpa aqui são aqueles canalhas.

— Não.. eu te levei para isso. Você está aqui por que eu te obriguei, se eu não tivesse.. – eu balancei meu rosto. Estava envergonhado.

— Para! Já chega. – ela estava achando um absurdo tudo o que eu dizia.

— Eu não consegui te proteger. Você é a pessoa mais importante para mim e eu não consegui cuidar de você. Eu sou um merda.

Ela balançou a cabeça rápido e como um reflexo me abraçou. Ela encostou a testa dela na minha e olhou meus olhos.

— Por favor.. Você acha mesmo que não me protegeu? tomou uma facada por mim. Eles levaram seu carro, só isso. Depois você compra outro. O que importa é que ainda estamos juntos. Você vai ficar bem. Tudo vai dar certo. As coisas não acontecem por acaso, eu precisava estar aqui. Eu tenho que cuidar de você que nem você cuidou de mim. É meu dever entende? – ela colocou a mão no meu rosto e beijou minha bochecha. – Você é o melhor de todos e não importa o que aconteça, vai continuar sendo. Tudo vai ficar bem..

Essa foi a última coisa que ouvi antes dos meus olhos se fecharem e eu enxergar uma imensidão de nada.

Acordei ouvindo um “bip” extremamente irritante. Meus olhos estavam pesados, olhei em volta com dificuldade. A claridade incomodava e tudo o que consegui ver foram coisas brancas. Eu não sabia como, mas estava em um hospital.

Uma enfermeira entrou no quarto e ficou surpresa por me ver acordado.

— Anne – eu sussurrei com muita dificuldade. A enfermeira não me deu muita atenção. – Onde esta a Anne?

Ela sorriu e disse para eu não me preocupar. Eu não estava mais sentindo dor, nem frio. Mas não tinha como eu não me preocupar. Antes que eu pudesse a questionar novamente, meus olhos se fecharam e eu voltei a dormir.

Acordei sentindo meu corpo dormente, olhei em volta mas não havia ninguém ali. Minha cabeça latejava e minha garganta queimava de tão seca. Eu estava prestes a apertar o botão vermelho da minha cama onde estava escrito “enfermagem”, quando a porta se abriu. Eu achei que fosse a enfermeira, mas quem entrou foi Vincet. Tinha me esquecido completamente dele.

— Sabe a vontade que eu tenho agora? Te socar até esses aparelhos apitarem e alguém vir aqui me tirar do quarto – eu arregalei os olhos. – Mas eu não vou fazer isso por que você já ta ferrado demais. Então presta atenção mocinho, assim que você tiver alta vai morar comigo. Até que melhore completamente eu vou ficar de olho em cada passo que você der. Você me entendeu?

Assenti.

— Cadê a Anne? – eu disse bem baixinho.

— Ela está bem. Não saiu daqui desde a hora em que você entrou na sala de cirurgia, eu a convenci a ir para casa tomar um banho e se alimentar. Mais tarde ela volta – ele colocou a mão por cima da minha. – Descansa garoto.

À tarde a enfermeira levou meu almoço. Era uma sopa com uma cara nada apetitosa e um cheiro muito nojento. Ela também me deu alguns remédios antes de me deixar novamente sozinho.

Me sentia perdido ali, só tinha visto o Vincet e a enfermeira. Não sabia nem quem estava sabendo da minha situação. Talvez meus pais, ou meus amigos.. também não fazia ideia se alguém já tinha dado parte na polícia, nem como estava meu quadro no hospital. E principalmente, ainda não tinha visto a Anne.

Os remédios que a enfermeira me deu estavam fazendo efeito já que eu estava começando a ficar meio grogue. Acordei de repente, no que pareceu ser alguns minutos depois. E tinha alguém me observando.

Alguém que eu estava precisando muito ver. Anne sorriu e me abraçou, um abraço que eu ainda não tinha ganhado.

— Anne eu sei que eu to banhado na morfina mas não exagera.

Ela riu.

— Me desculpa. Você não tem noção do quanto fiquei preocupada com você. Queria ter sido a primeira pessoa que você viu quando acordou, mas Vinc me obrigou a ir em casa um pouco. Nâo achei que você fosse acordar tão rápido.

— Como você esta? – eu perguntei e segurei a mão dela.

— Eu estou bem. O doente aqui é você sabia? Para de perguntar se eu to bem, é você que está em uma maca.

Eu sorri.

­– E a polícia?

— Relaxa, Vincet esta vendo tudo isso. 

— Anne, eu não sei como você conseguiu me trazer para cá. Mas obrigada, eu sempre te achei foda mas agora você se superou.

— Ah valeu. Mas isso não foi nada. Foda mesmo foi o que eu trouxe pra você. – ela pegou uma sacola que estava no chão do quarto e tirou de lá uma mini caminhonete preta. Ela sorriu e me entregou. – Eu não posso te dar uma em tamanho real mas posso te dar essa.

Era realmente era foda. Aquela menina era perfeita, eu tinha muita sorte de ter ela na minha vida.

— Obrigada. – meus olhos se encheram d’água.

— Você esta chorando?! Que isso.. não acredito – ela estava zombando de mim.

— Não é choro, é suor masculino.

Ela riu e me abraço de novo, dessa vez deitando-se ao meu lado na maca.

 – Eu não tenho certeza se isso é permitido.

— Eu não me importo se é ou não. Eu fiquei dois dias tendo que ficar longe de você. Podem trazer o Papa para me tirar daqui que eu não saio. – ela disse, se aconchegando e puxando o lençol fino para cima da gente.

— Todo mundo deveria ter você como amiga, sabia? Se bem que ai eu ficaria louco de ciúmes.. melhor deixar assim. – Ela me deu um leve tapa no ombro. – Espera um minuto, você disse dois dias?!  

— Sim, você dormiu esse tempo todo e me deixou maluca la fora. Fiz tanto barraco nesse hospital porque eles não me deixaram ficar aqui dentro, segundo aquela enfermeira cabeçuda “só pode ficar quem é da família”. Quase dei na cara dela, onde já se ..

Anne tava descontrolada mas eu não me importei. Ela continuava reclamando mas eu parei de prestar atenção quando ela mencionou minha família. Eu precisava perguntar se eles sabiam como eu estava, mas tinha muito medo da resposta.

— Dan, você se desligou total ai. Será que é efeito dos remédios? – ela balançava a mão na frente do meu rosto sem parar.

— Anne, você contou para os meus pais que eu to aqui?

Ela abaixou a mão na mesma hora e me olhou séria. Depois passou a encarar as mãos.

— Me desculpa, eu não falei. Me esqueci completamente.

Ela se recusava a olhar nos meus olhos. Ela devia estar muito envergonhada, até porque ela sabe o quanto isso é importante pra mim.

— Ei, relaxa gata. Não tem problema. Depois eu ligo mesmo pra eles. Nem sei em que país eles estão agora, mas não deve demorar tanto assim pra voltar.

Ela assentiu e me deu um beijo na bochecha.

— Depois a gente pensa nisso, Ok? Agora você precisa ficar bom e enquanto eles não chegam você vai morar comigo. – Ela fazia cafuné na minha cabeça e eu mais uma vez apaguei, pela décima quinta vez naquele dia. Mas dessa vez eu tava feliz porque sabia que ela ia estar ali quando eu acordasse.


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