Inesperado escrita por Rocker


Capítulo 12
Capítulo 11




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Capítulo 11

“Por razões além da minha compreensão, aceitamos o conselho de um louco senil que não se barbeia e desfila por aí numa camisola. Portanto voltamos à esta banheira e estamos perdidos numa tempestade. Sensacional. Catorze dias sendo virados como panquecas sem o menor sinal de terra. O único consolo é que estão quase todos finalmente tão infelizes como eu. Menos aquele rato metido e falante, ele é o daqueles meio chatos, pra aqueles que o copo está sempre cheio. E tem aquela menina também. Silene, ou alguma coisa assim. Passa cada segundo apertando aquela pedra horroroso no pescoço como se fosse seu salva-vidas. É deprimente.”

Tempestade, falta de alimento, noites mal-dormidas e marinheiros infelizes; este era o resumo do tempo que passaram ao mar após a saída da Ilha das Vozes, como chamaram o lar de Coriakin. Numa tarde, Caspian, Drinian e Edmundo estava reunidos no camarote do capitão, discutindo os próximos passos, as próximas decisões.

– Estamos presos aqui - disse Drinian, demarcando o local num mapa sobre a mesa, com uma peça redonda e entalhada. - com meias porções diárias. Água e comida para duas semanas no máximo. Essa é a única chance de voltarem, Majestades.

Caspian e Edmundo se entreolharam. Podiam estar preocupados, mas não podiam recuar depois de terem ido tão longe.

– Ninguém garante que vamos avistar a estrela azul tão cedo - continuou Drinian - Não nesta tempestade. É uma agulha no palheiro, esse lugar chamado Ramandu. Passaríamos direto por ele até cair na beira do mundo.

– Ou ser devorados por uma serpente? - perguntou Edmundo, estressado e frustrado.

– Só estou avisando que os homens estão nervosos. Estamos navegando em mar estranho. De um tipo que eu nunca vi na vida.

Caspian se levantou de onde estava. - Então quem sabe capitão, o senhor não quer explicar ao senhor Rince por que vamos abandonar a busca pela família dele?

– E pelo pai de Selena. - completou Edmundo. - Ela conta com essa busca.

Drinian ficou momentaneamente sem palavras, até que assentiu e disse. - Vou voltar ao meu posto. - ele pegou a capa e a colocou. - Mas quem avisa amigo é. O mar prega peças malvadas na mente da tripulação. Bem malvadas. - colocou o capuz e se foi.

Quando Drinian saiu, Caspian e Edmundo ficaram em um silêncio desconfortável. Até que Edmundo percebeu que algo inquietava o amigo e disse.

– Fale.

Caspian o olhou confuso. - O quê?

– Eu sei que você quer dizer alguma coisa. - Edmundo se sentou sobre a cama.

– É sobre a Selena. - disse Caspian, seu tom de voz indiferente tentando disfarçar sua preocupação.

Edmundo ficou momentaneamente com a respiração travada, mas então a soltou lentamente, coçando a nuca nervosamente. O que será que Caspian queria dizer?

– E o que tem ela? - ele perguntou, tentando não demonstrar o quão nervoso estava.

– Eu estou preocupado com o estado emocional dela. - Caspian respondeu por fim. - Ela perdeu as esperanças de que o pai dela possa estar vivo e isso está afetando muito ela.

Edmundo quase respirou aliviado. Quase.

– E o que espera fazer? - perguntou.

– Eu, nada. Mas você saberia ajudá-la. - respondeu Caspian, deixando o mais novo confuso.

– Eu? - o mais novo perguntou confuso. - Por quê não você?

Caspian suspirou. - Porque eu a conheço bem. Ela me ajudou muitas vezes e eu a ajudei outras tantas. Mas mesmo assim, eu não posso ajudar ela nessa parte. Eu tinha a certeza que meu pai tinha morrido, mas ela sempre teve a dúvida a rondando.

– E por quê seria eu que conseguiria?

Caspian sorriu, brincalhão. - Porque eu sei que você seria o único que conseguiria ajudá-la.

– Como assim? - Edmundo continuava confuso, mas sabia que não devia gostar nada do sorriso que o outro tinha nos lábios.

– Edmundo, admita o que sinta.

Edmundo nem ao menos tentara se fazer de desentendido. Nas últimas semanas, ele pegara-se observando-a ao longe mais vezes do que esperava, a esperava toda noite para que conversassem e Selena já havia quase esquecido de seu livro. Passavam quase todo o tempo juntos e ele sorria apenas em vê-la sorrindo - mesmo que isso não tivesse acontecido muitas vezes desde que saíram da mansão de Coriakin. Ele passara a desvendá-la de todo o mistério que parecia envolver-lhe no primeiro momento naquele barco. E agora, quando Edmundo se lembrava da conversa que tivera com Lúcia ainda na Inglaterra, onde ela insinuara que ele precisava de uma namorada, ele só conseguia enxergar Selena ao seu lado.

– E de que adiantaria? - ele perguntou por fim.

– Acontece que Lúcia veio conversar comigo. - Edmundo estava prestes a perguntar o que isso tinha a ver quando Caspian continuou. - Concordamos que você está apaixonado e Lúcia tem quase certeza sobre ela. Não deixe as coisas impedirem, aproveite enquanto pode. Você ainda tem uma chance.

– Mas assim que destruirmos essa névoa, nós vamos embora. - disse Edmundo.

– Eu sei, você sabe, e Lena também. Ela sabe das consequências, ela convive comigo desde quando assumi o trono. Agora basta ela sofrer sozinha quando forem embora ou ter lembranças boas para amenizar essa dor.

~*~

Enquanto isso, no camarote das garotas, Lúcia estava deitada ao lado de Gael. Se lembrava de como estava como Susana e, principalmente, de como se sentira bem com aquilo. Era noite e Selena ainda não havia se deitado e, por mais que estivesse preocupada com a tempestade e ela lá fora, sua mente no momento rondava o fato de como se sentira linda no rosto de Susana. Então deu uma espiada em Gael e, quando percebeu que esta dormia profundamente, tirou a folha do feitiço arrancada de um dos livros de Coriakin de debaixo das cobertas e repetiu as palavras escritas, em voz alta.

– "Transforme tudo direito,

Me torne um ser perfeito.

Cílios, lábios, sem defeito,

Faça-me ela, tão mais bela,

Do que eu tão singela."

Estava tão concentrada em suas palavras que nem ao menos notara uma névoa verde e incomum rondando por ali. Ao terminar de recitar, olhou para si mesma, procurando sinais de mudança, e ficou decepcionada quando viu as mesma imperfeições de sempre. Lúcia se sentou; a tempestade havia sumido e já era dia novamente. Levantou-se e foi até o espelho que havia ali e observou. Algo foi mudando à medida que se aproximava. Primeiro a camisola. A saia subiu, as mangas encurtaram e o detalhe da camisola formou uma fita amarronzada na cintura. O branco se transformou em azul claro e pequenas bolinhas brancas se formaram pelo tecido. Estava lindo.

E então Lúcia levantou seu olhar e viu seu rosto. Os cabelos cresceram e escureceram, sua pele ficou branca e delicada, as sardas eram mais claras e menos concentradas, e os olhos mudaram para o azul. Seus lábios se encheram e ganharam uma cor mais avivada. Tocou seu rosto com cautela e sorriu. Estava linda como a irmã. Ouviu música vinda do espelho. Empurrou-o e ele abriu como uma porta, dando um lindo lugar. Um jardim exuberante. Não era nada parecido com a Inglaterra. Havia garçons andando com bandejas, carregando bebidas e petiscos, servindo para a aparente alta sociedade - mulheres de longos vestidos e jovens atraentes olhando para ela.

– Senhores, a senhorita Pevensie.

Todos a olharam e aplaudiam, fazendo alguns comentários.

– Que bela moça.

– Uma graça.

Susana abaixou a cabeça envergonha e continuou até encontrar Edmundo, oferecendo-lhe o braço.

– Edmundo?

– Está muito bonita, irmã.

Susana sorriu. E Pedro chegou logo depois.

– Como sempre. - disse, estendendo o braço do outro lado de Susana.

– Pedro! - disse Susana, surpresa e animada em ver o irmão.

Um homem com uma câmera apareceu e eles pararam.

– Com licença, professora. Posso tiar uma foto? - ele perguntou.

– A mamãe vai adorar! - disse Pedro, virando-se para a câmera e sorrindo. - Todos os filmes dela numa mesma foto.

– Sorriam! - o fotógrafo disse.

Então Susana percebeu que algo estava errado. - Espera! - disse a Pedro e Edmundo. - Aonde é que eu estou? - os irmãos estranharam sua atitude. - Cadê a Lúcia?

– Lúcia? - perguntou Edmundo. - Quem é Lúcia?

Edmundo e Pedro sorriram para a câmera e um flash quase cegou Susana, que estava ficando confusa. El tentou se soltar dos braços dos irmãos, procurando entender a situação.

– Susana, o que foi? - perguntou Pedro.

– Por favor, senhorita. - disse o fotógrafo amigavelmente, limpando rapidamente a lente da câmera. - Um belo sorriso.

– Edmundo eu não sei de nada disso. - disse Susana, tentando se soltar. - Eu já quero voltar.

– Voltar pra onde? - perguntou Edmundo, confuso.

– Pra Nárnia. - respondeu Susana como se fosse óbvio.

– Mas o quê que é Nárnia? - Edmundo e Pedro continuaram a sorrir para a câmera.

– Que história é essa? - Susana perguntou, desesperada.

Os dois olharam-na preocupadas e ela finalmente conseguiu se soltar dos braços deles.

– Para com isso! - ela pediu desesperada para o fotógrafo, que continuava a tirar inúmeras fotos.

Susana colocou a mão sobre o rosto, desesperada para que tudo aquilo sumisse. Não podia ser possível! Lúcia ou... ela... não podia simplesmente ter saído do mapa. Mas então tudo sumiu e ela entrou em um silêncio. Tirou as mãos do rosto e encontrou-se novamente no camarote, com o espelho à sua frente. Era Lúcia novamente. Era Lúcia o tempo inteiro, mas apenas na casca de Susana. Estava confusa, com os lábios trêmulos e se assustou ao ver Aslam andando atrás de si, até parar ao seu lado.

– Lúcia. - disse com firmeza.

– Aslam? - perguntou surpresa, e se virou para encontrá-lo frente a frente, mas ele só aparecia a ela pelo espelho.

– O que você foi fazer, filha? - perguntou o leão, triste e decepcionado, e Lúcia começou a realmente se desesperar.

– Eu não sei. - ela disse sinceramente. - Foi horrível!

Aslam assentiu. - Mas foi escolha sua, Lúcia.

– Aslam, eu não escolhi tudo aquilo! - disse ela e Aslam a olhou confuso. - Só queria ser bonita como a Susana. Só isso.

– Você desejou sumir, portanto tudo o mais sumiu. - ele explicou e Lúcia abaixou a cabeça, envergonhada. - Seus irmãos e irmã não teriam vindo a Nárnia sem você, Lúcia. Você descobriu primeiro, se lembra?

– Me arrependo tanto...

– Você duvida do seu valor. Não fuja de quem você é.

Aslam se retirou e um estrondo foi ouvido, fazendo Lúcia se sentar rapidamente em sua cama com um grito.

– Aslam!

A tempestade ainda acontecia ali fora e Gael ainda dormia ao seu lado - e ainda sem sinal de Selena. O papel ainda estava ali e, com raiva, ela o amassou e se levantou para jogá-lo na lareira. Das chamas, Aslam apareceu rugindo e a estranha fumaça verde que a perseguia sem ser vista, saiu pela porta. No exato momento em que Edmundo trazia uma Selena desacordada nos braços, desesperado.


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