Ele vinha caminhando em minha direção, com flores e presentes. A neve caia suavemente sobre seus cabelos negros. Seus passos tinham graciosidade, porém, com um jeito masculino único. Quando ele chegou até a mim, me abraçou e sussurrou ao meu ouvido:

– Agora você será eternamente minha.

Eu assenti, enquanto beijava seu pescoço.

Então alguém começou a me chamar e me balançar, assim, eu acordei.

Era madrugada de quinta-feira, e minha mãe estava no meu quarto, desesperada. Alguém estava tentando arrombar a porta da frente. É claro que, se eu quisesse voltar a dormir, ia ter que ir lá embaixo ver quem era, e tranquilizar minha mãe. Porém, ela não queria que eu fosse.

– Ah, mãe. Fala sério. - resmunguei, enquanto abria a porta do quarto. - Com certeza é o papai. Eu vou lá abrir pra ele.

Quando terminei de descer as escadas, que davam na sala de jantar, não tinha tanta certeza que era meu pai. Quem é que fosse que estava batendo na porta, estava chutando-a, não havia dúvidas que era um ladrão. Voltei correndo para o quarto e peguei meu celular para ligar para a polícia. Minha irmã, Bianca, estava chorando.

Disquei o número com os dedos trêmulos e iniciei a ligação:

– Emergência, em que posso ajudar? - disse a atendente.

– Por favor, tem alguém tentando invadir minha casa. Me ajude. - eu estava desesperada.

– Se acalme. Eu vou rastrear a ligação e vou encaminhar uma viatura para o local. Agora por favor...

Não ouvi o resto da frase. Quem estava tentando invadir minha casa, já tinha conseguido. Do andar de cima, nós ouvimos o barulho da porta sendo quebrada. Não tinha saída. A polícia demoraria uns dez minutos pra chegar à minha casa.

Abri a porta do quarto, saí para o corredor, e fiquei no topo da escada, escondida, observando o homem que estava entrando em minha casa. Quando ele passou em frente à janela, iluminada pela luz da rua e eu pude ver seu rosto, meu pulso esquerdo doeu. E eu gritei.

Foi um grito baixo, abafado, mas ele escutou e olhou imediatamente para onde eu estava. Agora, era uma questão de minutos até ele subir as escadas e vir atrás de mim.

Me abaixei e corri para o quarto. Tranquei a porta e coloquei a cama de Bianca para barrar a passagem, impedindo que ele entrasse no quarto.

Bianca veio chorando me abraçar:

– Nós vamos morrer, Lucy?

Eu não sabia o que dizer. Sim? Não?

Como não consegui me decidir, respondi com algo bem inteligente, do tipo: "Não! Tudo está bem".

– Ainda bem que tenho você, Lucy. - ela sorriu. - Você sempre me protege.

Agora ela estava, realmente, me torturando. Como eu pude dar falsas esperanças a um ser tão puro como ela? Uma criança tão inocente, de apenas seis anos. Meus olhos estavam queimando. Precisava fazer alguma coisa. Mas o que?

Não deu tempo para pensar; o homem começou a bater na porta do quarto. Bianca gritou, assustada. Eu a abracei e me joguei atrás das pilhas de ursos de pelúcia que ela insistia em guardar, mesmo sendo alérgica.

Meu pulso esquerdo começou a doer novamente. As batidas na porta ficavam cada vez mais fortes. Minha mãe chorava como uma criança, e eu não posso julga-la, eu também queria chorar, mas não podia. Bianca confiava em mim, então, eu tinha que dar um jeito. Mesmo no último segundo, eu tinha que fazer alguma coisa.

Meu pulso me incomodava cada vez mais. A dor se transformou em queimação, e meu pulso começou a ficar vermelho. Então, algo curioso aconteceu. Na mancha vermelha que tinha aparecido, agora surgiu duas linhas pretas que iam desenhando sobre minha pele. Até formarem um símbolo, complicado porém, quando eu olhei para ele uma onde de adrenalina percorreu por minhas veias. E a partir daquele momento eu sabia que minha vida nunca mais seria a mesma.

E, sim, eu estava certa.