Minutos se passaram enquanto eu somente apreciava os batimentos cardíacos rápidos, acalmando-me de certa forma. A porta da sala se abriu e eu me separei de Fitch, indo até a outra ponta da bancada, colocando uma distância grande o suficiente para caber mais uma pessoa entre nós e tomei um gole de meu cappuccino já frio. Jason nos encarou com os olhos semicerrados.

— O que está acontecendo aqui? – ele perguntou desconfiado.

Edward surgiu por detrás dele e lhe deu dois tapinhas nas costas. Vi que os dois estavam com roupas comuns de quem saí de casa para ir até o parque, e não de alguém que saiu para correr e fazer patrulha. Isso me fez parar o café na metade do caminho para minha boca e indagar com todo o tom de suspeita, ignorando sua pergunta anterior.

— Onde foram?

Jason se endireitou e colocou os braços na frente do peito.

— Correr. – Edward disse e deu uma olhada longa para Fitch. Foi difícil não perceber que seus músculos tensionaram sob aquele olhar. Não era medo, mas sim outra coisa. Outra coisa que eu não conseguia desvendar.

Mas eu não tinha certeza se uma vez que o desvendasse, poderia o entender por completo. Fitch era um quebra-cabeça que eu passaria horas procurando as peças certas para encaixar. Só bastava ter paciência.

E ter paciência nunca tinha sido uma das minhas maiores virtudes.

Teria de descobrir o maldito segredo pela boca de outra pessoa, uma vez que Edward se recusava a falar.

— Com essas roupas? – apontei para a calça jeans e a blusa de frio que Edward usava, desnecessariamente, uma vez que não sentia praticamente nenhuma mudança de temperatura.

Ele deu de ombros e pegou o galão de leite da geladeira, entornando tudo goela abaixo, ganhando meus olhares de nojo. Ele limpou a boca suja com as costas da mão e esfregou na calça. Mais nojo.

— Eca. – murmurei.

Edward riu enquanto fechava o galão e o enfiava novamente na geladeira.

— Isso é nojento.

E então ele cruzou os braços em cima do peito.

— Não mais nojento do que vocês dois estavam fazendo antes de chegarmos. – sua resposta foi como um tapa na cara.

Escancarei a boca, chocada demais para conseguir responder qualquer coisa.

— Como você... – comecei, mas parei uma vez que percebi a besteira que escapuliria de minha boca, observando os olhos de meu irmão se arregalarem cada vez mais. – Não aconteceu nada. – resmunguei por fim, tomando mais um gole de meu café, para esconder meu rosto em chamas.

Fitch deu um sorriso de canto e abaixou a cabeça, deixando o cabelo louro cair sobre os olhos azuis e cílios compridos.

Edward delineou sua própria boca e apontou para mim.

— Certamente que não. – disse levantando uma das sobrancelhas.

Pude ver meu irmão revirar os olhos e esconder o sorriso, apesar de levemente chocado.

Eles estavam felizes por terem conseguido me deixar constrangida na frente do cara que deixava meus joelhos moles só por dar uma olhada mais fixa em minha direção?

Não consegui terminar o café e derramei o resto na pia.

— Vou me arrumar para trabalhar. – anunciei, não me importante em esperar respostas de nenhum dos três. Eu realmente só queria me enfurnar no quarto, lembrar do Guiador da noite passada e dormir o dia todo. Infelizmente, por insistência de minha parte para voltar a trabalhar o mais rápido possível, essa bonança não mais me pertencia.

Arrumei o cabelo emaranhado em um coque, colocando uma roupa mais simples do que tinha ido pela primeira vez, alongando meus músculos doloridos pelo exercício, amarrando a bota escura de couro e colocando o cachecol em volta do pescoço. Minha boca ainda queimava pelos beijos de Fitch e a culpa em minha mente se tornava maior à cada minuto. Eu nunca deveria ter o beijado sabendo que ele estava comprometido com Cali.

Mesmo sabendo que o que ele sentia por mim era algo muito mais palpável do que seus sentimentos por Cali, eu não conseguia juntar as peças do quebra-cabeça.

Por que ele estava com ela? O que ele estava escondendo?

Respirei fundo para me acalmar e saí do quarto. Fitch estava parado na frente do quadro da sala, encarando-o de uma maneira tão intensa quanto eu e Jason tínhamos feito. Parei do seu lado.

— É um belo quadro. – ele comentou sem se virar para mim, ainda de braços cruzados.

Afaguei suas costas gentilmente enquanto o sentia relaxar. Fitch se virou para mim, segurando meu rosto com uma das mãos, e tirando uma mecha de cabelo do coque, enrolando-a no dedo indicador.

— Prefiro quando o usa solto. – Fitch murmurou suspirando depois.

Ondas de excitação passaram por meu corpo.

Ele estava ali. Comigo. Sem Cali.

Coloquei minha mão em cima da sua e sorri.

— Preciso ir. – ele disse com a voz baixa, como se estivesse me confidenciando um segredo.

Meu coração palpitou.

— Não precisa ir embora se não quiser.

Fitch afagou minha bochecha.

— Tenho assuntos para resolver, Helena. Não posso simplesmente largar tudo em Sleepy Hollow para ficar com você.

Sua resposta me perfurou como uma faca cega.

— Oz tem tudo sobre controle lá, pode muito bem cuidar da empresa sozinho.

Ele olhou para mim com um traço de tristeza.

— Não estou falando da empresa, Helena. São coisas muito mais importantes do que isso.

Abaixei os olhos e retirei a mão de cima da dele.

— Ah, entendi...

Eu não entendia.

Fitch levantou meu queixo cuidadosamente e encostou os lábios nos meus.

— Não fique assim, eu vou contar quando estiver pronto, tenha paciência. – ele sussurrou encostando a testa na minha, fechando os olhos.

Assenti e me afastei dele minimamente.

— Preciso ir. – disse engolindo o bolo que se formava em minha garganta. – E você também. – completei em voz baixa.

Ele fez que sim com a cabeça.

— Minhas horas com você são um benefício por pagar um preço tão grande. – Fitch sussurrou me abraçando, e deixando-me confusa ao mesmo tempo. Quando franzi o cenho, ele continuou. – Eu te amo, Helena.

E enquanto nos abraçávamos e eu ouvia seus batimentos cardíacos leves e suaves, me ocorreu:

Eu não conseguia responder o mesmo.

Fiz um esforço para sorrir e beijei sua bochecha, me soltando dele. Peguei as chaves do carro e saí porta afora. Não me preocupei em ver se meu irmão ou Edward viriam comigo. Não pensei em nada. Só precisava sair daquela casa recheada de mentiras e segredos. Eu não aguentava mais segredos do que os meus.

Precisava treinar. Dor me impedia de pensar bobagens.

E eu queria acreditar que meus pensamentos sobre os segredos que me rondavam eram puras bobagens.