Shiroi escrita por Yasu Tanizaki


Capítulo 2
Morte ou Ilusão?


Notas iniciais do capítulo

Mais um :3 A partir daqui comecei me empolgar mais com a história xD Espero que gostem~



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Não consegui chegar até minha casa e percebi depois que minha mochila de escola não estava mais comigo. A noite já tinha caído e o céu estava bem escuro por conta de ser época de lua nova, além de algumas nuvens escuras cobrirem as estrelas.

Me arrastei por horas pelos becos, parando de minuto em minuto para me debruçar em algo e gemer e chorar de dor. Aquilo fora o máximo que eu podia aguentar; ser agredida fisicamente a tal ponto. Até minha garganta estava seca e eu tinha dificuldades em respirar. Eles poderiam ter me matado, mas só me deixaram nesse estado deplorável para que sofresse mais, como se eu já não tivesse sofrido o suficiente na vida.

Minhas dores só aumentavam e eu já não via mais motivos para continuar aqui nesta vida. Por todos esses anos cogitei seriamente o suicídio, mas nunca o fiz. Falta de coragem, talvez. Mas hoje não restara nada dentro de mim, apenas a dor e o desespero.

No final do beco escuro pelo qual me arrastei por essas longas horas agonizantes, encontrei a subida até o topo de um dos prédios. A subida da escada de metal era íngreme, mas subi juntando o resto de forças que tinha em mim, me agarrando e me forçando para cima. Quase escorreguei umas duas vezes, mas consegui chegar ao topo depois de muito esforço, já suando e perdendo o ar dos pulmões. Engatinhei até a beirada, era alto o suficiente para fazer um estrago bem feito. Cinco andares no máximo. Escalei cinco andares para saltar para a morte.

O vento forte e frio já castigava mais meu rosto ferido e meus braços e pernas desnudos. Me levantei com cautela e fiquei ereta na borda, pronta para saltar. Lá embaixo, uma rua bem deserta e com pouca luz, ótimo para morrer em paz. Em paz. Eu teria finalmente a paz depois da morte?

Respirei fundo pela última vez, senti as lágrimas que caíam quase congelando no meu rosto. Engoli em seco, fechei os olhos, ignorei a dor e deixei tudo ir dentro de mim com um único grito:

– Eu quero morrer! – minha voz ecoou com força e o vento a levou para bem longe.

Juntei os pés, tranquilizei a mente, relaxei meu corpo e saltei.

Foi como se eu mergulhasse em um oceano feito de ar, eu sentia os jatos fortes de vento congelante passando por mim numa velocidade absurda, mas eu não tinha mais frio nem dores. A queda parecia ser infinita, o chão nunca chegava. Teria eu já morrido? Esperei um pouco mais, então abri os olhos. Tudo que enxerguei foi um rosto fino e ossudo diante de mim, muito próximo ao meu, os olhos grandes e vermelhos, a boca quase transparente e as veias nas pálpebras dos olhos eram salientes. Gritaria se tivesse voz, mas tudo escureceu e acabou.

* * *

Meus olhos se abriram novamente. Me senti como se estivesse nua, não tinha noção de tempo ou espaço. Meus olhos se acostumaram à luz fraca acima de mim. Acordei no chão da rua em que saltei, mas não morta, pelo contrário, sentia novamente as dores por todo o corpo, a fome e o frio. Pisquei os olhos mais algumas vezes e respirei fundo enchendo os pulmões de ar. Não quis me mexer, tinha medo, então me mantive imóvel com o rosto colado no asfalto úmido e o corpo torto no chão.

– Você desejou morrer? – ouvi uma voz masculina, suave e baixa.

– Q-quem está aí? – gaguejei com o pouco de voz que me restava, mas continuei imóvel.

– Responda. – a voz era quase doce e reconfortante.

Fiquei quieta e calada. Das sombras saiu uma silhueta humana e caminhou devagar até o meu lado, na luz fraca do poste. O ruído compassado da sola das botas no asfalto ecoava e o andar era quase felino. Eu só via suas botas pretas e lustrosas se aproximarem e pararem bem ao lado do meu rosto. Com medo, fechei os olhos imaginando receber um chute forte na cabeça.

– Se acalme.

– Quem é você? – percebi que tinha voltado a chorar assim que ouvi minha voz sair mais aguda.

– Depende, quem você quer conhecer? – a voz era tão calma que parecia se divertir.

– Me ajude!

– Ajuda? Eu ouvi muito bem você gritar pela morte... Agora quer ajuda?

– Por favor... – implorei ao desconhecido

– Certo. – ouvi seu suspiro.

Ele se abaixou ficando de cócoras ao meu lado, só então pude vê-lo. Uma leve sombra cobria parte do seu rosto, mas tinha a pele bem branca, assim como os cabelos. Olhos doces de uma tonalidade estranha, quase vermelhos. Uma boca pequena e pouco rosada. Estava inteiro de preto e vestia uma espécie de capa. Não me foquei em detalhes, comecei novamente a ter medo.

– Se eu pudesse salvar sua vida, dar-lhe tudo que deseja, aceitaria? Felicidade, amigos, dinheiro, respeito... Ou ainda prefere a morte?

– Eu não sou prostituta. – murmurei quase me engasgando com o nó que se formava em minha garganta.

– O que? – ele gargalhou alto como se tivesse acabado de ouvir uma piada. – Não, não... Eu não preciso desse tipo de serviço para dar-lhe o que precisa.

– Eu quero morrer...

– Não, você não quer. – ele mordiscou o lábio inferior. – Não, com certeza você não quer isso, posso ver em seus olhos. Se eu te deixasse morrer iria ficar muito arrependida de preferir a morte. Serei bom para você. – ele abriu um sorriso simpático.

– O que você é?

– Ahá! – exclamou ele com animação. – Agora fez a pergunta certa Kaori-chan! – me assustei em ele saber meu nome e quase me movi, mas foi impossível. – Relaxe. Você prefere ficar aí deitada ou o quê? – de repente ele agia como se fosse íntimo à mim.

Levantei os olhos para ele. Ele estava brincando com a minha cara? Que diabos era esse homem?

Senti dedos finos e longos na minha cintura e logo estava de pé. Ainda com dores, mas de pé. Eu olhava nos olhos dele, atônita.

– Ah, finalmente posso te olhar de perto. – ele se curvou e quase colou seu rosto ao meu. – Você está um trapo, nem os piores demônios têm essa sua feição... – ele franziu os lábios.

Me mantive em silêncio. Ainda estava muito em choque para fazer qualquer coisa além de respirar. Aliás, talvez tudo isso seja apenas um sonho e eu esteja mesmo morta finalmente. Só espero que alguém faça minhas dores pararem para que eu me sinta realmente morta.

– Oh, certo, a sua pergunta. Bom, eu sou um demônio. – disse ele.

Continuei imóvel olhando nos olhos dele.

– É sério... – ele revirou os olhos e cruzou os braços. – Você desejou morrer, eu sou um demônio, logicamente ouvi sua súplica...

– Isso faria de você um shinigami. – falei baixinho.

– Não, de jeito nenhum, fique quieta e escute. Antes que algum deus da morte te achasse suplicando a morte, eu corri primeiro na frente. Sou um demônio comprador de almas.

Me mantive inexpressiva e incrédula, o que fez ele ficar impaciente e revirar os olhos novamente. Devo tê-lo irritado, porque quando fechei os olhos para respirar fundo e os abri novamente, não era mais ele mesmo.

– Minha verdadeira forma, você deve ter gostado mais dela. – agora sua voz era mais forte e alta, o que me provocou um arrepio pela espinha.

– D-de... – gaguejei.

Era aquele rosto. O rosto ossudo de quando pulei! Os olhos bem mais vermelhos agora, as maçãs do rosto bem proeminentes, as veias, os lábios transparentes, o cabelo preto com aspecto molhado jogado para trás, e um par de chifres espiralados. Metade da face era mais escura, percebi então que eram marcas como se a pele tivesse sido queimada ali. Perdi o ar novamente e dei um passo para trás, o que me fez cair no chão.

– Sim, demônio. Finalmente acreditou. Sinceramente, vocês humanos são muito incrédulos e desconfiados, ninguém acredita em mim quando uso minha forma humana. – ele fez um beicinho com os lábios finos e estendeu a mão para mim. – Não tenha medo, eu sei que é feio.

– P-por quê? – balbuciei novamente, me apoiando na sua mão magra de dedos longos.

– Você sabe, naturalmente demônios são feios... – ele tombou a cabeça para o lado e me puxou para cima.

– Não isso. É que... Você veio me salvar?

– Sim. – ele fez uma pausa esperando que eu perguntasse por algo mais. – Em troca da sua alma, é claro. – arqueou uma sobrancelha como se falasse a coisa mais óbvia do mundo.

– Minha alma? Minha alma para que, quando eu realmente morrer, vá para o inferno junto de você?

– Ding ding. – imitou um sininho e riu em seguida. – Você é esperta.

– Por quê?

– E muito curiosa também. Bom, eu sou um demônio, coleciono almas. – deu de ombros. – Olhe, você pode morrer agora e dar adeus a essa vidinha miserável que teve nesses dezessete anos, ou escolher viver até a velhice com felicidade e dignidade. Até construir uma família, sei lá.

– Isso é realmente verdade?

– Garota, demônios não mentem.

– Irônico.

– Humanos mentem. – ele franziu o cenho, irritado. – Bom, tanto faz. Vê? Você já se sente melhor agora só pela minha presença. – ele mordeu o lábio, mas gargalhou em seguida.

De fato, me sentia melhor. Movi meus músculos só para ter certeza e certamente estava curada.

– Eu ainda não respondi, por que me fez me sentir melhor? – toquei meu ombro e não senti mais os cacos de vidros que estavam ali.

– É só uma gentileza. – ele fez cara de desgosto. – Ah, sinceramente, humanos...

Fechei os olhos novamente e os mantive assim por alguns segundos, esperando o momento em que ia morrer de verdade, mas esse momento não veio. Não foi um sonho, ilusão, paranoia ou mágica. Foi um demônio em busca de minha alma.


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