Reckless escrita por Moony, Bela Barbosa


Capítulo 14
Capítulo 14 - Instintos Animais


Notas iniciais do capítulo

Oooi, pessoal! GENTEEEE, RECKLESS TÁ DE CARA NOVA, VOCÊS VIRAM? O que acharam?
Eu queria dizer que tô muito feliz com o número de reviews do capítulo passado, gente, de verdade! E agradecer porque a cada capítulo ganhamos mais e mais leitores, algo que eu acho maravilhoso! Então gostaria de pedir a vocês que, quem puder, continue comentando, acompanhando e divulgando a história para os amigos, ok?
Música do capítulo: https://www.youtube.com/watch?v=CVUOTzoVeZA&index=13&list=PLjOLZVat-eRA6oZ8N5KfbfWvMjURJht2B



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E, assim, Daniel me beijou.

Seus lábios, frios, tocaram os meus antes mesmo que eu pudesse prever seus movimentos. E então, mais do que nunca, eu me entreguei a um momento na minha vida. Nossos narizes, testas, queixos, de alguma forma, por mais bobo e simples que possa parecer, também se encaixavam, mas principalmente nossos lábios. Assim que se tocaram, eu quis mais. Mais dele, mais daqueles beijos, mesmo sem ter sequer provado um inteiro. Ironicamente, foi isso que me permiti fazer: provar aquele beijo até seus limites. Honestamente, estava louca para que aquele momento chegasse.

Minha mão, praticamente sozinha, foi parar na sua nuca, onde seus cabelos levemente encaracolados nasciam formando pequenos cachos gostosos de sentir. E eu o trouxe para mais perto de mim. Abri minha boca, lhe permitindo que fizesse como bem queria. Daniel, sem hesitar, depositou sua língua sobre a minha quase no mesmo movimento que suas mãos fizeram até chegar nas minhas costas. 

Tanto eu o puxava quanto ele me puxava como se nossa vida dependesse daquilo, daquela proximidade. Nada mais do que nosso beijo refletia. Eu estava amando aquilo. Se em algum momento da minha vida eu tinha conhecido os lábios de alguns 5 ou 6 caras antes dele, agora nenhum deles existia mais. Daniel era marcante, presente, de certa forma selvagem, mas incrivelmente carinhoso. Eu podia sentir isso. Aliás, era capaz de entender muito mais dele através do seu beijo do que simplesmente olhando seus olhos, que sempre pareciam uma charada para mim. Ri com esse pensamento, mas sem parar o beijo. 

O mundo podia acabar e eu ainda não ia querer que acabasse.

Principalmente porque eu não ia saber exatamente o que fazer depois que terminássemos de nos beijar. Por isso, agi como se esse momento não fosse chegar e continuei o beijando por quanto tempo meus pulmões me permitissem. 

Daniel começou a fazer mais pressão com as mãos, me puxando para ainda mais perto dele. Segurei ainda mais forte em sua nuca para poder me aproximar melhor dele, sem deixar de beijá-lo momento algum, mas infelizmente, mudar de posição com os olhos fechados não é a coisa mais fácil dese fazer: quando pus minha mão livre intencionalmente no cantinho do banco do motorista, para me achegar mais a ele, a bendita da mão escorregou e foi parar no vão entre os dois bancos e a marcha. 

Meu corpo imediatamente se afundou um pouco e o beijo foi forçado a parar de forma inesperada. Abri os olhos e gritei, assustada com a "queda", enquanto Daniel riu. Tirei a mão de perto da marcha e a olhei: nenhum machucado, felizmente.

Daniel ainda ria. Algo me dizia que não era simplesmente por causa do incidente causado por mim, mas sim pela situação como um todo. 

— Hey, isso doeu! - Reclamei.

— É, eu imagino - Falou, pegando em minha mão e dando uma olhada no dedo em questão - Mas não foi nada, garota. 

Respiramos fundo em coro. Nos entreolhamos, também no mesmo exato segundo.

Pela primeira vez, ele parecia dizer tudo com os olhos. Estava tão confuso quanto eu, e não podia julgá-lo por isso. Mas havia também uma pontada de felicidade, dava pra ver. Só me restava esperar que fosse isso mesmo,

— Daniel... - Balbuciei - Isso foi de verdade?

Ele contraiu os lábios num sorriso torto, extremamente sexy.

— Foi tão real quanto sua performance de Julieta.

Sua resposta me fez rir.

A  sensação que eu senti naquele instante não pode ser definida por uma palavra só. Mas parecia que o mundo, o universo inteiro e todas as galáxias se resumiam àquele carro em que nós estávamos, e que toda a alegria do mundo emanava dali. Era incrível estar como eu estava.

Daniel tomou o primeiro retorno e então, finalmente, tomamos o rumo do centro histórico. Lá, ele me levou num restaurante especializado em batatas recheadas chamado La Belle Vie. Me senti honrada, já que ele sabia que esse era meu prato preferido. Além do mais, estava boba demais pra não acreditar que tudo naquele dia havia sido, de certa forma, planejado. Mesmo que não fosse, era assim que eu ia pensar até que me provassem o contrário. 

O que mais me surpreendeu foi que, assim que chegamos, havia um velhinho na porta do restaurante, que diga-se de passagem, estava lotado. Tão lotado que achei que não haveria lugar para nós dois. No entanto, assim que descemos do carro, o tal velhinho abriu um belo sorriso. Quando olhei para trás, Daniel também ostentava um imenso traço alegre em seu rosto. Deduzi que os dois se conheciam. De fato, assim que chegamos mais perto, o velhinho o recebeu com um forte e caloroso abraço. Era até engraçado ver os bracinhos finos e enrugados daquele senhor envolverem um jovem tão atlético quanto Daniel. Especialmente porque ele vestia sua típica jaqueta de couro, que lhe dava um ar de bad boy a mais. Como se ele realmente precisasse disso....

— Danny! - O velhinho exclamou.

— Sr. Allen, há quanto tempo! 

— Por que nunca mais veio aqui? Marion e eu sentimos sua falta, meu jovem.

Curiosa, eu observava a cena com um sorriso discreto nos lábios. Eles pareciam ser amigos de longa data.

— É, eu sei, é que estava atolado com a faculdade, o Tom, tantas coisas pra cuidar... O senhor sabe como é.

Tom? Quem é Tom?

— Sim, eu sei... - O velhinho disse em tom pensativo - Mas quando eu tinha a sua idade nunca perdia a oportunidade de comer num bom restaurante. E nem de levar uma bela moça comigo.

Estava tão absorta na conversa dos dois, que nem notei o Sr. Allen me olhar ao dizer a última frase. A olhada dele provocou a atenção de Daniel também, que riu assim que nossos olhos se encontraram. Corei de vergonha.

Daniel estendeu uma de suas mãos, estava com um sorriso encantador nos lábios, e com seus olhos ele praticamente me chamava. Apenas para confirmar o que eu já havia percebido, ele abriu os lábios num inaudível "vem" direcionado exclusivamente a mim. Peguei sua mão, um tanto fria e bem maior que a minha. Ele me conduziu para mais perto de si.

— Esta, Sr. Allen, é a Lizzie - Me apresentou.

Estendi a mão para o velho, sorrindo para ele, que retribuía.

— Muito prazer, Sr. Allen.

— O prazer é meu, Lizzie. Moças bonitas podem me chamar apenas de Saul - Ele respondeu em tom galanteador, provocando risadas em mim e em Daniel.

Agradeci a ele.

— Sabe, Sr. Allen, a gente ia almoçar aqui hoje, mas pelo que eu estou vendo, o restaurante está bem cheio. - Daniel disse alternando olhares entre mim e Saul - Acho melhor a gente voltar outro dia.

Eu concordei com a cabeça. Aparentemente, o próximo lugar disponível só apareceria em pelo menos uma hora.

— E desde quando não tem lugar para você, Danny?! - O velhinho pareceu chocado.

Eu ri. Saul Allen era um homem engraçado. Magrelo, usava suspensórios e tinha um visual engraçado por conta do bigode branco e da cabeça parcialmente careca. Gostei dele de primeira.

Daniel me lançou um olhar como que perguntando se eu havia entendido o que ele queria dizer com aquela frase. Infelizmente, eu sabia tanto quanto ele. Olhamos para Saul esperando uma resposta.

***********************

— Façam da minha casa a casa de vocês! Podem tomar o tempo que for, qualquer coisa estarei lá embaixo. - O Sr. Allen anunciou e, em seguida, se retirou.

Estávamos na casa dele, que era justamente em cima do seu restaurante. Era um apartamento adorável, apesar de muito pequeno. As paredes eram brancas e azuis e os móveis todos antigos. Não desses antigos tipo vintage, mas simplesmente velhos mesmo. Clássicos, digamos assim. Era tudo em madeira branca, desde a mesa até o móvel da TV, o suporte do sofá, as cadeiras, mesas e banquinhos. Era uma casa muito bonita e bem arrumada.

Meu acompanhante me olhou. Ele tinha cachos bem leves, provavelmente porque seu cabelo estava curto, mas tenho certeza de que se deixasse o cabelo crescer, ficaria muito bonito. Na verdade, ele ficaria bonito de todo jeito. Quando você nasce assim, já facilita um bocado. Seus olhos, agora mais azuis do que cinza, me fitavam com certa animação. A barba crescendo dava um charme a mais a seu sorriso. Era a combinação perfeita para a perdição.

— Quer conhecer a Marion? - Ele perguntou.

Assenti com a cabeça. Se o Sr. Allen era tão legal, sua esposa deveria ser ainda mais! Quando dei o primeiro passo para adentrar a casa, fui surpreendida por um toque. Um toque, faço questão de ressaltar, totalmente inesperado. Eram os dedos de Daniel na minha mão. Ele a segurou e me conduziu casa a dentro. Como seguiu na minha frente, eu pude simplesmente olhar para nossas mãos juntas e sorrir ao vento pelo quanto aquilo não faria o menor sentido na minha cabeça há uma semana atrás. Mas hoje, era exatamente como eu queria que estivesse acontecendo.

Seguimos reto num corredor que desaguava em três portas. Daniel abriu a do meio com a mão livre que tinha e gritou "Marion, venha cá!". Em seguida, ele assoviou. Franzi o cenho. Não se chama velhinhos com assovios! Que coisa mais feia. Mas tudo bem, eles se conheciam, eles que sabiam dos próprios costumes...

Esperei que a velhinha viesse. Mas ela nem sequer se pronunciou. A porta entreaberta não deixava sequer que eu a visse. Daniel gritou seu nome mais uma vez. No mesmo segundo, ouço passos em nossa direção. Passos leves. Muitos passos. Se a coisa estava estranha, havia ficado mais ainda. Estreitei ainda mais os olhos quando subitamente, aparece um focinho na porta, e ele mesmo se encarregou de abri-la por inteiro, permitindo que eu visse completamente a dona daquele rostinho peludo. Era uma linda golden retriever, uma das minhas raças preferidas de cachorro. 

— Uau, então essa é a Marion! 

Daniel riu, afagando a cabeça dela.

— Você esperava o quê? Que Marion fosse uma velhinha?

Balancei a cabeça positivamente e vi Daniel se desmanchar numa gargalhada gostosa. Ele ficava lindo rindo, para variar.

— Eu achava que era a esposa do Sr. Allen. Ele é gente boa demais pra ser tão só - Afirmei.

— Ele era casado, princesa, mas isso antes de eu conhecê-lo. A esposa dele faleceu no ano que nos conhecemos - Daniel comentou.

Sentei-me no chão e juntei-me a Daniel nos carinhos para com a linda golden à nossa frente.

— Tenho todo o tempo do mundo para ouvir essa história - Demonstrei curiosidade.

Ele me acompanhou e sentou-se no chão também. Marion deitou entre nós dois, com a cabeça em meu colo, e continuamos mexendo em seu pelo macio. Ela era extremamente dócil.

— Bem, eu devia ter uns 15 ou 16 anos quando vim aqui pela primeira vez com meus pais. Viemos por causa das batatas, um amigo tinha recomendado pra nós - Ele começou, olhando bem em meus olhos -, e assim que chegamos, eu vi uma cachorrinha perdida e muito machucada na calçada. Ela passava de mesa em mesa pedindo comida, mas ninguém cedia. Eu fiquei com dó e fui levar um pedaço da batata pra ela. Meus pais brigaram, mas eu insisti que queria levar ela comigo. Marion estava num estado realmente deplorável aquele dia. Eu e meus pais argumentamos por um bom tempo se levaríamos ela ou não, até que o Sr. Allen chegou e perguntou o que estava acontecendo. Eu lhe expliquei, e ele prometeu que a cachorra seria minha, que eu poderia vê-la sempre que quisesse, se eu deixasse ela morar com ele. Eu topei o acordo na hora e então começou: nunca mais parei de vir aqui, primeiro por causa da Marion, depois porque fiz uma amizade com o Sr. Allen e, claro, por causa das batatas - Nós dois rimos - Acabou que ele realmente precisava da cadela mais do que eu. Sua esposa, Flair, tinha morrido há alguns meses naquela época, e Marion o ajudou muito a superar o trauma – Explicou.

Então Marion, que eu havia descoberto ser uma cachorra e não uma senhora de idade, como se compreendesse nossa conversa, pulou em Daniel, aninhou-se nas pernas cruzadas dele com o rabo abanando e ali se aconchegou. Seu pelo dourado contrastava com as vestes negras dele. Achei graça na cena. Ele cuidava dela, de fato, como uma criança cuida do primeiro cachorro. Mas ela pareceu se cansar logo, afinal já tinha certa idade, e foi-se deitar perto da mesa que nos aguardava com o almoço.

— Acho que devemos comer – Daniel opinou.

Eu concordei com a cabeça.

— Nós vamos, mas antes eu tenho que fazer algo – Falei.

Nós dois nos pusemos de pé e o moreno me encarou com a testa enrugada de dúvida. Eu ri.

— Sua jaqueta está cheia de pelos. Não vou deixar você comer assim.

Sacudi minha blusa e bati as mãos nas calças com o mesmo intuito de tirar o excesso de pelos. Mas quanto a Daniel, caminhei até ficar atrás dele e eu mesma tirei sua jaqueta de couro infestada de pelos dourados da Marion.

Dobrei a peça e sacudi a camisa de baixo, que era uma manga comprida azul claro, muito simples e bonita.

Me pus na frente dele, ainda batendo a mão sobre suas vestes para lhe garantir um traje melhor para a refeição. Ele ria.

— Pronto. Agora sim você está pronto para comer – Sorri.

Só então eu o analisei pela primeira vez sem aquela jaqueta de couro. Por mais sexy que ele ficasse dentro dela, eu já estava morrendo de curiosidade para tirá-la. Para a minha não-surpresa, ele permanecia lindo apenas de blusa.

— Azul. Essa cor fica bem em você – Observei – Acho que devia usar mais. Se quer saber, a cor ressalta seus olhos.

Daniel parecia lutar contra um sorriso. A velha história de esconder sentimentos, fossem eles pra bem ou pra mal. De qualquer forma, dava pra ver em seus olhos como ele se sentia: especial. Fiquei me perguntando há quanto tempo alguém não dizia algo tão gentil para ele.

Tomei a liberdade de eu mesma pegar sua mão e o puxei para a mesa que contava com dois belos pratos de batata recheada de calabresa, queijo parmesão, maionese e cenoura. O cheiro estava delicioso!

Nos sentamos e imediatamente começamos a comer. Por sinal, o sabor estava tão gostoso quanto o cheiro, algo que a fome apenas salientou. Os temperos harmonizavam muito bem uns com os outros e a mistura de sabores também. O melhor é que quanto mais comíamos, mais comida parecia aparecer no prato.

Mesmo sem trocar uma palavra sequer enquanto comíamos, por vezes nos olhávamos e ríamos sem razão alguma. Esses são os melhores tipos de companhia.

E assim se passou o resto do dia: a companhia se mostrando cada vez mais agradável. No centro histórico, fomos a várias lojas, antiquários, armazéns, tudo, é claro, sem passar perto do jardim central para evitar que eu viesse a óbito. E nos divertimos um bocado!

Nas lojas de ornamentação, festas e fantasias, Daniel fazia questão de provar todos os bigodes engraçados e máscaras toscas, o que me provocava muitos risos. Além disso, descobri sua incrível habilidade de imitação quando ele pegou um par de óculos escuros e imitou o Stevie Wonder num piano. Surpreendentemente, ele era um deus no piano. Conseguia imitar uma voz grave idêntica à do cantor. Eu também me diverti muito assistindo! 

Já nos antiquários, foi meu momento de brilhar. Aproveitei que já tinha feito um curso de DJ e usei os toca-discos para mixar músicas e fazer um som legal, mas quando eu e Daniel nos tocamos que aqueles eram vinis verídicos e que manuseá-los como os discos de hoje em dia é o suficiente para eles ralarem e nunca mais voltarem ao normal, tivemos que sair correndo antes que alguém nos pegasse e nos obrigasse a pagar tudo. Por sorte, achamos um beco escondido e ficamos lá até ver o dono do antiquário passar direto, liberando a zona. Depois do medo, vieram os risos.

Por fim, visitamos umas lojas de arte e achamos algo em que nenhum dos dois é bom: desenhar. Conseguíamos, no máximo, fazer bonecos palitos e um sol sorridente no canto. Mas ainda assim, resolvemos fazer um campeonato e decidir quem era melhor ao desenharmos Marion e chamarmos a atendente da loja para decidir quem havia feito o melhor trabalho. Ela disse que o porquinho mais bonito tinha sido o de Daniel. Eu e ele saímos de lá sem contar a ela que a real intenção era desenhar um cachorro, não um porco.

Depois dessas e mais outras aventuras, voltamos para o carro aos risos.

— Então - Daniel se pronunciou -, onde quer ir agora, princesa?

Estreitei os olhos pensando em algum lugar interessante no qual ele pudesse me levar. Pizzaria, karaokê, cinema, sorveteria, enquanto algumas opções como essa passavam pela minha cabeça, meus pensamentos foram interrompidos pelo vibrar do meu celular no bolso no porta-luvas do carro do Daniel.

Assim que notei a vibração, o tirei de lá e, antes de atender, vi que logo na tela inicial, constavam 17 ligações perdidas de um número que eu desconhecia. Comecei a me desesperar achando que algo grave tivesse acontecido com minha mãe ou com o Ben.

— Alô?! – Atendi, já um tanto nervosa.

— Lizzie? É você? – Uma voz masculina já conhecida se pronunciou do outro lado da linha.

— Sim, sou eu. Quem é você? – Indaguei, ainda sem conseguir lembrar de quem era a voz.

— Lizzie, é o Jason! Até que enfim você atendeu, eu tô te ligando há horas! – Sua voz estava claramente alterada, como se ele estivesse apreensivo ou irrequieto sobre alguma coisa – Escuta, a Claire, alguém invadiu a casa dela e acertaram ela na cabeça. Ela perdeu um pouco de sangue e me pediu pra ligar pra você assim que eu cheguei lá, e aí ela desmaiou. Por favor, vem logo pra cá, eu tô no hospital Saint Cecilia, não sei mais o que fazer...

Jason parecia se embaralhar com as palavras, ofegava em cada ponto ou vírgula que aparecesse e isso quando não parecia tremular os lábios ao falar. Me desesperei ao ter notícias dele e de Claire naquele estado.

— Tudo bem, Jay, tudo bem, só por favor fica calmo, ok? Eu estou indo agora mesmo.

Desliguei.

Daniel me olhava aflito.

— O que houve?

Eu o encarei, sacudi a cabeça tentando respirar com calma e tentava não parecer tão angustiada, o que acredito não ter conseguido.

— A Claire. Alguém entrou na casa dela e deixou ela inconsciente, eu não sei direito, mas sei que ela está no hospital Saint Cecilia. Daniel, por favor, me diz que você sabe onde fica...

— É claro que eu sei, garota – Ele respondeu com firmeza – Estamos indo para lá agora mesmo.

 

************************

 

 

— Claire, Claire Goodman. Onde ela está – Já fui perguntando afoita, assim que chegamos ao hospital.

— Ela está no quarto 109, senhorita – A recepcionista me entregou um cartão com o número dito e eu o segurei, com a mão trêmula.

Olhei para Daniel e ele pareceu entender o que eu sentia: se aproximou de mim e me deu um forte abraço. Pôs minha cabeça em seu peito e ali mesmo afagou meu cabelo com muita calma.

— A Claire vai ficar bem, princesa. É só um momento difícil e você precisa ser forte – Ele dizia baixinho no meu ouvido – E você consegue ser.

Respirei fundo e o apertei um pouco mais antes de soltar. Daniel sabia ser um bom amigo. Agarrei sua mão e então o puxei para que fôssemos ao quarto em que Claire estava. Havia um imenso corredor vazio até chegarmos lá, cheio de outras portas e enfermarias vazias. Eu e Daniel corremos por aquela imensidão branca até chegarmos ao quarto 109.

Quando olhei pelo vidro da porta, vi Claire deitada numa maca, felizmente acordada, e Jason do seu lado, segurando sua mão e conversando com ela. Antes de tudo, fiquei me perguntando a razão de Jason estar ali, mas percebi que não era a hora nem o lugar de me preocupar com isso, então apenas balancei a cabeça e abri a porta.

No instante em que fiz isso, todos no quarto me olharam. O médico, curioso para ver quem acabara de entrar; Jason, que não deixava confundir a alegria por me ver em seu olhar; e finalmente, Claire, que demonstrava alívio.

Sem pestanejar, corri até ela e me debrucei sobre o leito do hospital, abraçando-a num abraço aliviado e ao mesmo tempo, ainda preocupado. Ela carregava um enorme curativo de gaze branco na parte de trás da cabeça, mas a julgar pela agulha na mão do médico, deduzi que ela tivesse levado alguns pontos na cabeça.

— Graças a Deus que você chegou, Lizzie! – Ela balbuciou – Céus, eu fiquei tão preocupada com você!

Franzi o cenho. Como assim ela leva uma pancada na cabeça e ainda tem que ficar preocupada comigo?

— Mas por quê? – Questionei.

Ela olhou para os dois lados antes de me responder, como se estivesse verificando o lugar e testificando se não havia nenhuma presença perigosa.

— Lizzie, eu tinha acabado de chegar em casa quando dois homens armados entraram depois de mim e me renderam. Eles eram altos, loiros, pareciam dos países do norte... tinham um sotaque muito pesado.

No mesmo segundo, olhei para Daniel, parado na porta com o queixo quase no chão, tão pasmo quanto eu. Percebi em seu olhar que a ficha havia caído tanto para ele quanto para mim. Os russos haviam feito isso com Claire, muito provavelmente buscando por mim ou por Daniel, já que eu e ele tínhamos estado ali antes.

— O que mais aconteceu, Claire? – Indaguei, aflita.

— Bem, eles simplesmente olharam pra mim, disseram alguma coisa no idioma deles e me deram uma coronhada na cabeça. Eu caí, doeu muito, mas não apaguei na hora... Outro deles chegou e disse “Não, não é essa que estamos atrás, é a ruiva. Pode deixar essa aí de aviso”. Daí eu me toquei que eles estavam falando de você e fiquei desesperada, mas não tinha como sair de lá. Minha visão tava apagando, tudo ficando preto quando o Jason chegou lá em casa. – Nesse momento, ela apontou pra ele. Nós dois nos olhamos e Jay sorriu encantadoramente. Ainda estava me perguntando por que ele tinha ido à casa dela.

— É tudo verdade – O belo moreno com cabelos levemente claros confirmou – Quando eu cheguei lá, tudo o que ela conseguia dizer era pra eu te ligar, e aí desmaiou.

Suspirei e passei a mão na testa, sentindo extrema culpa por tê-la colocado naquela situação. Fiquei pensando que se eu tivesse mesmo ido dormir na casa de Daniel, ela ainda estaria bem na sua casa.

— Claire, eu não sei nem o que dizer... Eu sinto muito. – Falei sinceramente.

— Você não tem que estar – Ela respondeu pegando na minha mão -, ainda bem que isso aconteceu comigo e eu estou viva. Fico imaginando se esses caras tivessem achado você... Seja lá por que motivo tenha sido, eles não te querem por aqui, Lizzie. É melhor você resolver isso logo.

Mais uma vez, olhei para Daniel. Foi justamente o que ele tinha me dito, mas que eu havia sido teimosa demais para aceitar.

— Sabe, Lizzie – Jason se fez ouvir -, eu acho que você tem andado com más companhias. O pessoal que machucou a Claire só se envolve com esse tipo de gente.

Quando mirei Jason, percebi que ele olhava diretamente para Daniel. Não com um olhar fraternal ou amigo, mas sim com verdadeiro despeito e intolerância.

Daniel deu alguns passos para a parte de dentro do quarto hospitalar.

— Escuta aqui, Michigan – Ele se pronunciou em tom de defesa -, se você tiver que dizer algo sobre mim, pode dizer isso diretamente pra mim.

Daniel usava um tom que eu só o tinha visto usar quando brigou com Brian na festa em que nos conhecemos. Na natureza, isso era o equivalente ao som que os animais silvestres fazem quando se sentem ameaçados e partem para a linha de defesa.

Jason riu ironicamente, como que debochando de Daniel e levantou a voz:

— Caso você não tenha reparado – Colocou as mãos dentro da jaqueta cor de mostarda que vestia, e que também lhe proporcionava um ar sensual -, foi exatamente o que eu fiz, Woods.

O olhar de Daniel, que antes não passava de um olhar preferencialmente de defesa, havia se transformado na mais perfeita expressão de ataque. Ele caminhou os passos que lhe faltavam para chegar em Jason, o que de certa forma aumentou a tensão e me fez crescer uma faísca de receio de que eles chegassem às vias de fato.

— Rapazes – Uma voz masculina, e quando olhei de onde veio, descobri que havia sido do médico, se fez ouvir – se quiserem brigar, não vão fazer isso na minha sala de hospital.

Daniel e Jason apenas olharam para ele e depois voltaram a se encarar, como numa verdadeira disputa do meio animal por comida, território ou parceira. Eu temia que eles não fossem obedecer às ordens do médico, até porque conheço um pouco de Daniel e posso afirmar que cumprir regras ou deixar de seguir seus instintos são coisas que ele não faz com muita frequência. Por isso, resolvi me intrometer eu mesma.

— Jason – Chamei -, por que foi à casa da Claire? – Finalmente, arrumei um momento oportuno para lhe fazer essa pergunta.

Quando fitei novamente a loira, vi que ela dormia. Provavelmente, por causa do machucado, devia ter apagado em algum momento da discussão.

Jason riu levemente.

— A Claire não te contou? Eu e ela somos primos.

Uau! Que mundo pequeno, era tudo que eu conseguia pensar naquela hora.

Jason caminhou até onde eu estava com calma e um delicado sorriso em seu rosto. Sentou-se do meu lado na maca.

— Ela me disse que tinha recebido uma amiga em casa e iria adorar que eu fosse jantar com ela e essa garota.

Eu ri com a coincidência. Percebi que Claire realmente se importava comigo, com o que tinha dito a ela na noite anterior sobre estar muito confusa, e vi que ela queria ajudar. E que não sairia marcando encontros para mim com caras idiotas.

Instantaneamente, lembrei-me que Jason era um cara muito legal. E que da última vez que nos vimos, fiz algo bem feio com ele sem dar explicação nenhuma, o que talvez o tenha deixado preocupado ou com raiva de mim. Não gosto dessa sensação. Se tenho um problema, prefiro enfrentá-lo.

— Jay - O chamei, obtendo toda sua atenção -, eu sinto muito pelo que aconteceu da última vez que nos vimos. - Completei sinceramente.

Ele riu um pouco e balançou a cabeça. Seus cabelos, castanhos tão claros, quase dourados, caíam um pouco sobre a testa formando um desenho lindo em seu rosto.

— Não foi nada.

— Não - Eu insisti -, foi sim. Eu prometo explicar tudo quando estivermos com mais calma, ok?

Jason concordou e parecia feliz. Feliz em ver que eu não o tinha rejeitado de vez, ou tentado lhe enganar.

— Hey, garota - Daniel chamou.

— Sim?!

— A gente tem que ir. Não é o gênio da informática que vai te ajudar agora - Ele disse, em gozação.

Eu assenti e me levantei para irmos embora, mas antes, Jay me segurou pelo pulso esboçando um "EI!" em tom de advertência.

— Você vai mesmo embora com esse cara?! - Perguntou, abismado.

Respirei fundo. Detesto quando me dizem o que fazer.

— Jay, você toma conta da Claire, ok? Pode deixar que eu cuido de mim mesma.

Ele se levantou para me dar um abraço, o qual eu retribuí, e em seguida fui lhe dar um beijo na testa. Jason era meu amigo também, mostrava preocupação por mim desde o dia em que me ajudou a fazer a matrícula fora de hora.

Quando finalmente me virei para ir embora e já ia dando de cara com um Daniel apressado e inquieto que me esperava na porta da sala, fui surpreendida por uma mão na minha cintura me puxando de volta. A mão de Jason que havia me prendido me puxou para ainda mais perto dele quando de repente e não mais que isso, ele selou a distância entre nossos lábios com um beijo.

Ele era maiis forte que eu. Me segurava ali. Mas mesmo que eu quisesse que aquele beijo acabasse, não tinha muitas forças para demonstrar isso devido à minha enorme surpresa mediante aquilo tudo. Praticamente, eu estava em choque. Não esperava que Jay fosse fazer aquilo, especialmente na frente de Daniel.

Obviamente que eu não estava numa situação de recusar aquele beijo. Tudo bem que tinha recebido um milhares de vezes melhor mais cedo no mesmo dia, mas isso não quer dizer que eu não me sentia mais atraída por Jason e muito menos que eu não quisesse beijá-lo.

No entanto, como se não bastasse o susto, ele fez questão de deixar bem claro que aquilo não era um selinho. Tratou de me abraçar com sua outra mão também e me colocar numa posição mais confortável para que a minha língua e a sua pudessem conversar apenas as duas. Alguns segundos muito bons, eu admito, talvez por causa do espanto ou da adrenalina, mas que quando acabaram, me deixaram completamente sem chão.

Assim que Jason sorriu para mim, seu olhar se voltou para Daniel e sua expressão converteu-se numa mistura de orgulho e altivez em relação ao meu acompanhante. Foi um olhar quase de "ela é minha" pelo que eu pude perceber. De certa forma, aquilo me deixou enojada.

— Ok, Jason. Acho que isso foi suficiente - Afirmei antes de balançar a cabeça em reprovação e me virar definitivamente para ir embora com Daniel.

Pelo visto, a provocação de Jason tinha dado certo. Daniel estava possesso de raiva. Seus punhos estavam cerrados e ele havia fechado a cara de uma forma indescrítivel. Seus olhos, que haviam se transformado numa imensidão cinza, se mantinham fixos em Jason como se ele fosse um tipo de inimigo a ser eliminado, e a tensão (e provavelmente, junto com ela o cheiro de testosterona) só aumentava naquele recinto.

À medida que eu caminhava até a porta, sentia essa chateação ficar presa na minha garganta. Não achava digno que me tratassem assim, nem eu e nenhuma outra pessoa. Que se dane, pensei assim que cheguei à porta.

— Escutem, Jason e Daniel, eu não quero vocês ou nenhum outro homem se orgulhando às minhas custas como se eu fosse qualquer tipo de troféu idiota, ok? - Exasperei, bufando de raiva e alternando o olhar entre os dois, que pareciam sem reção - Eu fui clara? - Terminei, ainda mais exaltada.

Os dois balançaram a cabeça positivamente.

Bufei, e então saí de lá sem no mínimo esperar que Daniel me acompanhasse.

Entrei no carro ainda com uma carranca e de braços cruzados. Eu sabia que Daniel não tinha provocado a situação, mas estava irritada com ele também.

Assim que ele também entrou no banco do motorista, cravou seus olhos em mim até que eu resolvesse olhar para ele, o que eu realmente não queria fazer.

Respirei fundo algumas vezes para me acalmar. Se fosse seguir a terapia dos números, já deveria ter contado até 5.238 para melhorar.

— O que é? - Perguntei a ele ainda emburrada.

— Hey, eu sei que você está brava e você tem todo o direito de estar, mas o que eu vou dizer agora é sério - Disse, com toda a calma do mundo.

Eu fitei seus olhos, já quase sem nenhum resquício de fúria e com gestos pedi que ele prosseguisse.

— Eu e você estamos em perigo, e eu não confio em ninguém, então vou tomar conta de você, eu mesmo. Vamos pra minha casa hoje, ok? - Eu confirmei com a cabeça. Daniel estava certo, e a minha teimosia em aceitar isso havia acabado de dar seu primeiro fruto - Só que tem uma condição.

Juntei as sobrancelhas. O que será que ele queria dizer com aquilo?

— Quando eu te levar pra casa, você não vai poder contar a ninguém o que viu por lá - Daniel usou provavelmente o tom mais sério desde que nos conhecemos. Ele não estava bravo nem nada, mas muito incisivo - A vida que eu tenho lá, tudo o que eu te mostrar é algo que fica entre mim e você, apenas, ok? Ninguém mais do que nós. Posso contar com você pra isso?

Confesso que eu hesitei. Fui preenchida de medo e apreensão mediante ao que podia haver lá dentro, porém segundos depois, voltei a mim mesma e percebi: se esses dias todos não me serviram para fazer confiar em Daniel, então que importância tiveram? Ele não era um louco psicopata, e disso eu tinha certeza. Todas as minhas surpresas quanto a eles haviam sido positivas. E por que essa também não?

Por isso, apenas suspirei e respondi:

— Pode contar comigo, Danny. O que acontecer lá, fica lá. Você tem a minha palavra.


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Notas finais do capítulo

TAN TAN TAN TANNNNN! E agora, gente? O que vocês acham que tem na casa do Danny? Muitos cadáveres debaixo da cama? Haha digam o que vcs querem ver e eu terei prazer em atender ♥ AH, além disso, postei uma fic também original nessa semana e pra quem quiser ler, aqui está o link. Essa segunda fic eu vou demorar mais a postar nela, porque Reckless tem que ficar sempre em primeiro plano, né, gente ♥
Beijos, espero que tenham gostado!
LINK: https://fanfiction.com.br/historia/699330/Lei_de_Murphy/



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