–Oi, meu nome é Ramão, sou um fantasma. - Ele me falou sorrindo.

–U-um fantasma?- Perguntei pasma

–Isso. Mas por favor, não grite. - Pediu ele calmo, fazia uma careta como se tentasse ficar sério.- Qual seu nome?

– Mabel Victorique- Respondi com seus olhos me encarando.

–Mabel Victorique...- Repetiu aleatoriamente. Olhei para ele mais detalhadamente. Ramão não era azul mas sim a luz que ele emanava.

Sua pele era pálida, seus cabelos castanhos escuros, assim como seus olhos. Ele vestia algo como um paletó, calças sociais e um par de sapatos sociais, todos pretos.

–O que você quer?- Perguntei sem rodeios e ele pareceu se assustar com a pergunta repentina. Assim que interpretou a pergunta virou bruscamente a cara para a direção oposta a mim. Logo começou a gaguejar.

–E-er... b-bem...e-e-eu-u pe-pe-per-per-d-

–Dá pra falar direito e olhar na minha cara, quero saber o que você esta falando. - Ele virou o rosto lentamente, estava soando frio e o rosto todo vermelho, olhando para todos os lugares onde não encontrasse meus olhos.

–Eu per...-Ele começou a falar mas começou a abaixar a voz, não entendi nada.

–Pode repetir?-Pedi um pouco menos grossa, estava ficando com dó dele.

–Eu perdi o-o meu... colar... Ele...Ele esta debaixo da s-sua cama...- Assim que terminou de falar, Ramão olhou para baixo com o rosto ainda mais vermelho.

–Ok, vou procurar seu colar.- Respondi e ele me olhou surpreso e feliz. Agachei-me e olhei debaixo de minha cama, não dava para ver nada. Fiquei tateando o chão, até que toquei em algo bem ao fundo, era um tipo de renda com um metal em um lado e no lado oposto um metal com uma pedra e um pingente, deveria ser o colar. Fui me levantar e bati a cabeça na cama, soltei um “ai!”e depois sai com mais cuidado. A luz de Ramão deixava mais clara a vista do colar.

Ele tinha rendas florais pretas, na frente um tipo de metal circular com uma pedra vermelha e embaixo um pingente preto.

–É este?- Perguntei e ele assentiu com um largo sorriso. Entreguei a ele e deitei-me novamente em minha cama.

Na manhã seguinte acordei bem cedo, olhei no relógio de cabeceira ao meu lado, eram sete e meia. Tomei um banho para acordar e coloquei uma roupa confortável. Pelo silencio tia Christie e Charlot ainda estavam dormindo. Silenciosamente abri a porta da biblioteca.

Acho que aquele era um dos maiores quartos da casa, mas provavelmente menor que o de tia Christie. As paredes tinham um tom bege e um rodapé de madeira, assim como o chão. Uma lareira com um tapete enrolado e três poltronas ficavam em um canto e no resto do quarto tinham varias estantes e caixas de livros, fui adentrando no cômodo até me deparar com uma grande e pesada cortina azul escuro, atrás dela havia uma sacada, então eram sete quartos com sacada. Mas essa sacada era muito mal iluminada, provavelmente seria muito escuro de noite.

De repente ouvi tia Christie me chamar. Respondi, e um tempo depois ela voltou a me chamar, respondi novamente e tudo voltou a se repetir até que desci as escadas e entrei na sala de jantar, lá estavam Christie e Charlot tomando café da manhã.

–O que foi?-Perguntei irritada ela não tinha olhado para mim, estava passando manteiga em uma torrada, Charlot encarava minhas roupas com nojo, grande novidade...

–Docinho, eu fico aqui três séculos te chamando e você não responde...

–Mais eu respondi- Respondi quase gritando ela se virou para me encarar mas parecia ter levado um choque.

–Meu deus, Mabelzinha, o que aconteceu com suas roupas?-Ela me perguntou como se tivesse dó de mim

–Nada.

–Você parece um garoto nessas roupas, mude já.- Ela mandou ríspida.

–E se eu não quiser? Muito obrigada, mas estou confortável assim. - Respondi grossamente e ela se retirou.

Charlot ficou me olhando incrédula.

–Nossa, como você é grossa!- Reclamou ela passando um farto tanto de nutella em seu pão.

–Charlot, sei que você me odeia, mais não acha que sua brincadeira de ontem anoite passou dos limites?

–Que brincadeira?- Ela me perguntou sem entender.

–Você sabe muito bem! Me acordar pra me pregar um peça tão tosca, como se eu fosse acreditar que um fantasma tinha perdido um colar feminino! Haha, onde esta aquele colar agora, Charlot?

– Quer dizer que além de retardada, agora é louca? –Ela me perguntou indignada.

Charlot era boa em fazer drama, mas eu sabia quando ela se fingia, e este não parecia o caso. Senti como se tivesse levado uma punhalada nas costas.

– Então não foi você?- Perguntei tentando raciocinar, isso não fazia sentido, a não ser que fosse um sonho, isso, com certeza era um sonho!

–Dãh, claro que não! Aff- Ela bufou e sai de lá me deixando sozinha. Observei a mesa cheia de comida, eu não ia comer lá sozinha. Preparei um pequeno prato- com uma maçã, um pão com nutella e um suco de laranja- e fui comer em meu quarto. Depois de comer, devolvi o prato à cozinha e fui arrumar a casa. Pelo jeito tia Christie e Charlot tinham voltado para tomar café. Era para varrer os cômodos. Tia Christie estava vendo o conteúdo de algumas caixas e Charlot varria algum quarto perto do seu. Resolvi arrumar a biblioteca.

Fiquei um longo tempo perdida em meus pensamentos até que ouvi um barulho vindo da sacada. Andei até lá, o mais calma que pude. Abri o vidro e sai para a sacada, não tinha nada.

–Aqui em baixo! – Falou uma voz que reconheci instantaneamente. Olhei para baixo e vi Ramão à sorrir.

–Meu deus!- Exclamei surpresa.

–Foi bem engraçado. –Comentou ele e eu fiquei perdida, engraçado o que?

–O que foi engraçado?

–Agora de manhã, aquela menina é sua prima, não é?

– Você estava vendo?- Já não bastava ter levado aquele gelo do escândalo de que tinha acusado ela de ter aprontado para depois saber que ele tinha visto tudo, estava queimando de vergonha.

–Agora entendo porque você tava tão irritada ontem. -Ele abriu um largo sorriso.

–Pensei que só dava pra ver fantasma de noite.

–É, geralmente, mais é que eu estou com muito ens acumulado.

–Ens? O que é isso?- Perguntei curiosa, ele parecia que ia me falar mas de repente virou bruscamente a cabeça para trás e se virou de volta agitado.

–Eu te conto depois. Vou entrar no seu quarto hoje a noite, me espere.- Falando isso ele se foi.