Acordei com os fracos raios de sol que adentravam em meu quarto. Lentamente fui levantando o olhar, até que ele alcançou meu relógio de cabeceira. Eram oito da manhã, me levantei e me arrumei o mais despojadamente possível (afinal eu estava de férias, pra que tanto?). Desci as escadas para tomar um café.

Na cozinha estava minha mãe a preparar o café. Sentei-me a mesa e peguei um copo de suco de laranja.

-Sua tia ligou. - Comentou ela.

-E o que ela disse?- Perguntei desinteressada no assunto.

-Ela quer ajuda, acabou de se mudar.- Ela me devolveu e cuspi todo o suco.

-Como assim?- Perguntei indignada, ainda estávamos no final de junho, já era a sétima vez que ela se mudava apenas neste ano. E depois sobrava para mim ajudar a arrumar os móveis, decoração e sei lá eu o que mais. Era um saco.

-Calma filinha... Sua tia só quer uma ajudinha, custa tanto?- Me perguntou toda carinhosa, um jeito tão meloso que me deixou meio irritada.

-Mãe, aquilo é um saco!!-Resmunguei- “Ah, Mabel querida, que roupas são essas?” Mabel querida, por que não coloca este retrato mais pra lá?”, “Mabel, docinho, não é assim que se arruma um sofá caro destes, bobinha!”, “Que foi querida? Está cansada? Já?” - Falei imitando tia Christie.

-Meu amor, mas veja pelo lado bom. Você vai ver Charlot, quanto tempo faz que não passam um tempo juntas? Acho que poderão por a conversa em dia, afinal, terão um mês inteiro para isso...

-O que? Um mês? Mãe!

-Você pode levar um amigo!- Me falou, não sei se pra minha sorte ou azar mas todos estavam viajando.

-Eu não vou!

-Mabel, já está decidido, você vai e pronto. –Disse ela pondo um ponto final na conversa.

Sai da mesa sem terminar o café. Voltei para meu quarto mal-humorada. Joguei-me em minha cama e olhei pela janela de ponta cabeça. Sempre achei o céu muito bonito, queria poder voar nele desde criança.

Fiquei um tempo lá, encarando o céu e a única coisa boa que achei para melhorar meu lado foi que poderia ler os livros dela. Toda aquela biblioteca dela, afinal tia Christie era uma historiadora famosa. Acho que essa era a única coisa boa que ela tinha. Porque tirando isso ela e Charlot era idênticas.

Se pelo menos Thabita estivesse aqui... mas ela estava na chácara do tio com um tal de Gunter, acho que ela gostava dele mas nunca se confessou.

Arrumei minhas malas durante a manhã toda e depois do almoço silencioso e de clima tenso fui buscar minhas malas. Dei uma boa olhada em meu quarto e de ultima hora resolvi levar minha mochila laranja. Ela era bem grande mas desde que ganhei ela nunca saiu de casa. Dentro delas tinha algo que eu adorava mas que só eu e Thabita sabíamos o que era.

Ela era bem pesada, dentro tinham inúmeras folhas, usadas e em branco, assim como alguns cadernos e quatro estojos, sim a bolsa era enorme.

Coloquei as malas no porta-malas e entrei no banco da frente com alguns lanchinhos e coisas para a viajem. Pelo que minha mãe tinha dito seria um longo caminho.

Fiquei observando o caminho, primeiro o bairro, depois a cidade, as fazendas, alguns pontos de comércio, e a infinita estrada. Tirei algumas fotos do caminho, eu gostava dessas imagens, principalmente de tirar fotos dos grafites e pichações, sempre as achei interessantes. Cochilei em uma parte do trajeto até que minha mãe me acorda.

-Mabel, filinha, chegamos...

-Hã? Quem? Onde?-Perguntei desnorteada coçando o olho

-Estamos na nova casa de sua tia...

-Ahhhhh..... Eu não quero....

-Vamos tomar um café antes...-Falando essas palavras meu estomago roncou.

Sai do carro e olhei em volta.

Nada, era ai onde estávamos, no meio do nada. Tinha algumas campinas, um rio e além desse rio uma cerca de madeira que limitava a casa e um bosque. A casa era de pedras brancas por fora que cobriam o térreo e o primeiro andar. O segundo era coberto por tijolos. Todas as janelas bem grandes. O que me parecia um meio pilar na frente, acho que tinha uma porta lá. Deveriam ter muitos quartos lá já que havia varias sacadas. Uma casa grande demais para três pessoas, bem a cara deles. A grande porta de madeira da entrada abriu e revelou uma voz que já conhecia.

- Mabel, querida, como vai, amorzinho? Venha aqui dar um abraço na titia!- Ela falou toda eufórica. Não tinha mudado muito desde o mês passado, quando tinha se mudado para uma casa de praia, acho que tinha desistido de morar lá... E pensar que tive que passar o dia inteiro carregando pra lá e pra cá aquela dezena de redes, as vezes me pergunto onde ela tinha arrumado tudo aquilo. Voltando ao assunto, tia Christie estava com seus longos cachos loiros perfeitos que combinavam com seus olhos verdes. Ela usava um vestido preto simples, mas para compensar estava cheia de joias. Dei um abraço nela.- Charlot, venha aqui dar um oi para sua prima!!

Charlot saiu de dentro da casa, a primeiro momento pensei que ela estava arrumada para uma festa ou algo assim, mas descartei a ideia já que a pessoa mais próxima estava a pelo menos algumas horas de distancia. Seus cabelos eram castanhos e crespos como os de tio Marshall com algumas mechas mais claras, como os de tia Christie, e os olhos verdes. Acho que ela tinha feito chapinha, torci para que chovesse. Ela usava um shorts e uma blusa pink, ambos super curtos. E para completar, um salto alto. Ela veio em minha direção e me olhou com sua cara de nojo. Ela estava encarando minha roupa e meu cabelo todo bagunçado.

-Oi, Charlot! Que saudades!- Falei como se tivesse encontrado um baú de diamantes, e realmente tinha achado! Haha, Charlot não gostava de abraços nem coisas do tipo, muito menos de mim. Ela não podia recusar meu abraço naquele momento, estávamos todos olhando para ela. Como ela ainda não tinha feito nada resolvi apreciar meu triunfo mais um pouco.- Que foi, Charlie? Não quer dar um abraço na sua priminha que gosta tanto de você?

Ela me encarou com uma expressão que parecia misturar ódio e surpresa, ela estava encurralada. Caminhou em minha direção devagar e me abraçou.

- Acho melhor saber dormir de olhos abertos, Mabel... – Ela cochichou em meu ouvido enquanto me abraçava.

Depois de me soltar entramos na casa nova. Assim que entramos estávamos na sala de estar, e mais em frente a mesa para refeições. Ela estava cheia de comida, desde chá e café a mini pastéis. Passamos um tempo tomando café, a tarde inteira mais precisamente.

Assim que minha mãe foi embora, tia Christie me deixou escolher um quarto para mim. Naquela casa tinham dez quartos, dos quais seis tinham sacadas. Tive a opção de escolher um entre sete. Escolhi o que ficava perto do quarto usado como biblioteca, por sorte ele tinha uma sacada e ficava longe dos quartos que Charlot e tia Christie usavam.

Meu quarto era até bom. A cama era bem espaçosa, o armário de madeira também. Abri a porta da sacada e observei o bosque. Fiquei lá um tempo, observando o bosque e sentindo a brisa fresca.

-Mabel querida, vá tomar um banho, mais tarde jantaremos. Arrumaremos a casa amanhã, tudo bem, docinho?- Tia Christie me pediu gritando de algum lugar da casa.

Escolhi uma roupa qualquer e fui tomar um banho. O banheiro mais próximo ficava em frente ao meu quarto. Despi-me, liguei o chuveiro e fiquei sentindo a agua morna em meus ombros. Sem querer deixei cair sabão em meus olhos e comecei a esfrega-los debaixo da agua corrente.

De repente ouvi um barulho estranho e me virei em direção da porta, nada. Fiquei assustada por um tempo, mas logo deixei pra lá.

Sai do banho e fiquei arrumando meu quarto quando ouvi tia Christie gritar de novo.

-Mabel, meu docinho, estou indo levar Charlot em uma festa e vou voltar muito tarde, tente não abusar muito, ok? Vamos acordar cedo amanhã!

-Tudo bem tia!

Fiquei lá até ouvir o carro saindo. Depois peguei minha bolsa laranja e meu celular. De dentro da bolsa tirei um caderno, virei varias folhas até achar uma em branco. Era hora de desenhar minhas fotos.

Deveriam ter passado horas quando terminei de desenhar. Como tinha dormido a noite inteira, resolvi apenas escovar os dentes e ir dormir. Foi o que fiz.

Não me lembro muito bem de ter sonhado, mas lembro de ter sentido algo claro perto de mim, não sei o que era mas estava me acordando. Abri os olhos e vejo algo meio azul meio transparente em minha frente, não era uma coisa, era...Gritei com todas as minhas forças quando me toquei que era um garoto. Um garoto em meu quarto!!Como assim?

Ele tapou minha boca com uma das mãos. Mas por que o garoto era azulado?

-Fique quieta, por favor!- Ele me pediu. Fiz que sim com a cabeça e ele me soltou. Não, ele tinha... Tremeluzido?

-Oi, meu nome é Ramão, sou um fantasma!