Além da morte escrita por Williane Silva


Capítulo 3
Luz azul!


Notas iniciais do capítulo

quem sabe pra onde vamos quando morremos, mas quando amamos muito alguém sempre temos uma segunda chance.



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Eu fiquei onde estava, completamente trêmula e apalermada, durante um longo tempo. A meu lado, o gato continuava a se lamber com toda a calma do mundo.

Olhei para a pulseira mais uma vez. Era mesmo o presente que dei a Edward. Não tenho a menor dúvida. Mas haviam me dito que tinha sido destruída na África. Então, como fora aparecer no pescoço de um gato, em Illinois?

Tentei parar de tremer, mas não consegui. A pulseira de prata me trazia lembranças tão fortes que chegaram a doer, como se alguém tivesse cravado uma faca no meu coração.

O pulso branquinho de Edward, com seus pelos aloirados que brilhavam no sol. Seus olhos azuis cheios de desejo, me olhando com paixão. Seu rosto atraente, seus lábios carnudos tocando os meus....

O gato se levantou, espreguiçou-se languidamente, então seguiu seu caminho através do longo corredor. Dentro de poucos segundos, desaparecendo novamente por entre as sombras.

Ah, não dessa vez, pensei, meio em pânico, meio zangada. De jeito nenhum! Segurando firme a pulseira nas mãos, levantei correndo e acende a luz do corredor.

Meus joelhos estavam trêmulos, mas comecei a seguir o gato com determinação. Meu coração parecia prestes a explodir.

Foi com uma enorme surpresa que o vi parar em frente ao quarto que deveria ter sido meu e de Edward, encostou de leve na porta e entrou com toda a calma, desaparecendo na escuridão.

A princípio, eu pensei que fosse ter um infarto. Era como se meu coração fosse pular para fora do meu peito. Não. Não é possível. O gato não pode ter entrado ali. A porta estava trancada. E a chave, nas águas do lago de Michigan.

De qualquer maneira, me forcei a seguir o animal, muito embora eu não entrasse naquele quarto havia mais de um ano.

Acende a luz lentamente e olhei em volta. O gato estava em cima da cama, me encarando com seus olhos muito verdes.

Aquilo tudo era um grande absurdo.

O gato não pode ter entrado nesse quarto. Ele estava trancado. E jamais poderia estar usando a pulseira de prata. Ela havia sido cremada, juntamente com o corpo de Edward.

Mas eu própria e o bichano estávamos ali dentro. E a pulseira estava firme em minhas mãos.

“tudo bem,” disse a mim mesma, tentei me acalmar.” Deve haver uma explicação racional para tudo isso. Tem que haver. Você é uma cientista. E das boas. Pense da maneira lógica.”

A casa esta à venda. O corretor tinha me perguntado uma vez a respeito do quarto trancado. Eu lhe disse que tinha perdido a chave.

– Mas eu não posso mostrar um quarto fechado aos clientes.- o homem reclamou.- Chame um chaveiro e peça para que ele faça uma nova chave.

Eu me recusei a lhe da explicações.

– Eu não tenho tempo. Se quiser, mande o senhor mesmo fazer uma chave nova. Não uso esse quarto.

O corretor me olhou de uma maneira meio estranha, mas eu não me importei.

– Já disse que não uso o quarto.- eu repeti.- Se resolver abri-lo, não se esqueça de fecha-lo novamente. Não o quero aberto em hipótese alguma.

O corretor balançou a cabeça concordando e não disse nada. Mas continuou a me olhar de forma um tanto estranha.

– Faça o que tiver de fazer enquanto eu estiver fora.- eu continuei.- O senhor conhece meus horários.

Agora, eu passei as mãos nervosamente pelos meus cabelos. Claro. O corretor mandou fazer uma chave nova e se esqueceu de fechar a porta. Muito simples. Era evidente.

Comecei a relaxar e, mais uma vez, olhei em volta. Havia teias de aranha por toda a parte. O papel que forrava a parede estava rasgado em alguns lugares.

A enorme cama era a única mobília no quarto, além de um espelho grande cuja moldura de magno estava suja e estragada.

Olhei para minha imagem no espelho. Uma mulher pálida de lindos cabelos ruivos encarou-me de volta.

Voltei minha atenção à pulseira em minha mão. Bem, havia sido fácil explicar a porta aberta do quarto. Mas... havia explicação para aquilo?

“ Devo ter entendido mal,” disse a mim mesma.” O Dr. Sales deve ter dito uma coisa e feito outra. Ele mandou o bracelete. Eu estava em estado de choque. Guardei-o em algum lugar. Depois esqueci, porque queria esquecer.”

Balancei a cabeça, tentei raciocinar com um pouco mais de clareza. Quem sabe tive apenas imaginado que o Dr. Sales me disse que a pulseira iria ser cremada juntamente com o corpo. Afinal das contas, eu fiquei num estado tão deplorável quando Edward morreu, que poderia ter compreendido tudo errado, bloqueado qualquer lembrança e inventado qualquer história na minha cabeça, a fim de me proteger.

Sim, disse a cientista dentro de mim. Era aquilo mesmo.

Mas então... como é que a pulseira foi parar no pescoço do gato? E que fim levou sua coleira?

Talvez o Dr. Sales tivesse me mandado a pulseira e eu a esconde em algum lugar, a fim de não ter de olha-la a toda hora. E aí o gato a encontrou e...

Não. Aquilo era ridículo. Gatos não costumam colocar pulseiras em seus próprios pescoços.

“É isso aí Isabella. Tente arrumar uma boa explicação para essa história maluca.”

Senti um arrepio estranho e assustador por todo o meu corpo. Será que eu mesma coloquei a pulseira no pescoço do gato? Estava tendo surto de amnésia ao algo parecido?

As paredes do quarto pareciam se fechar em torno dela. Olhei par aa enorme cama ali no centro e pensei:

Nós teríamos feito amor nessa cama. E nossos filhos teriam sido concebidos ali.

Senti vontade de sair daquele quarto e nunca mais voltar e entrar nele. E queria que o gato também saísse. Era como se o bichano estivesse violando o lugar.

– Dê o fora daqui, sombra.- eu ordenei.- Agora!

O gato, porém, em vez de me obedecer, foi se esconder debaixo da cama.

Era evidente que ele iria fazer aquilo. Sombra era o gato mais mal educado que já conhece.

– Saía daí!- eu voltei a gritar. Eu parecia prestes a ter um ataque nervos.

Como ele não deu sinal de vida, eu me ajoelhei ao lado da cama, levantei a colcha empoeirada, estende a mão e espiei ali embaixo.

– Muito bem, seu tratante. Se você não vier por bem, vai vir por mal!

Nada do que eu Isabella Swan experimentei na vida havia me preparado para o que vi.

Não havia nada debaixo da cama, exceto um espaço infinito preenchido por uma luz azul brilhante. Não havia sinal do gato. Nem da minha própria mão.

Soltei um grito horrível e recolhe a mão. Ela reapareceu, como que por magia. Mas debaixo da cama, a luz azul continuava a se estender infinitamente.

Era uma luz que não tremia, nem mudara de cor. Uma espécie de névoa sólida que parecia brincar com minha visão e confundir meu cérebro.

“ Estou sonhado. Está tudo bem, porque isso é apenas um sonho.”

Porém a luz era bem real. Com cuidado, estende novamente a mão. Ela desapareceu, como se estivesse sido engolida pelo clarão azul. Retirei a mão e ela reapareceu.

Quanto mais eu olhava para a luz, mais profunda ela me parecia. Era como se eu estivesse à beira de um novo e desconhecido universo. Não havia chão debaixo da cama. Não havia nada, exceto a luz azul infinita.

Então, à distancia, eu ouvi um som. O miado do gato. Era um miado triste e solitária, como se o bichano me quisesse ao seu lado.

Meu Deus, ele quer que eu o siga. Que vá atrás dele.”

Eu estava paralisada de horror. O gato, que até então parecia mudo, estava me chamando para ir atrás dele. Sob minha cama, havia uma espécie de universo alternativo.

E eu compreende que eu tinha ficado maluca.

Levantei com dificuldade e percebe que meus olhos estavam cheios de lágrimas. Apaguei a luz e, ao deixar o quarto, bate a porta com toda a força, para que o gato não pudesse mais sair dali.

Desce a escadaria em pânico, quase tropecei no caminho, mas consegui andar até o térreo, da casa. Acende todas as luzes.

Me dirigi para à cozinha e derrubei uma cadeira pelo caminho. Não me incomodei em levanta-la. Machuquei o tornozelo, mas nem senti dor.

Tentei pensar com clareza. Tinha de ligar para alguém. Qualquer pessoa: Alice. Aro. Ou algum outro amigo.

Tirei o fone do gancho, pouco me importando com a hora. Mas aí então ouvi um barulho e deixei que ele caísse de minhas mãos. Movendo-se como uma sombra, o gato preto havia entrado na cozinha.

O sininho balançou lentamente. A coleira estava de volta em seu pescoço, como se nunca tivesse desaparecido.

E a pulseira de prata continuava firme nas minhas mãos.

Eu acabei não telefonando para ninguém. Deixei na cozinha e fui dormi no sofá da sala, onde acende todas as luzes. Foi difícil relaxar, mas, por fim, acabei caindo num sono profundo.

Sonhei com Edward. Foi um sonho tão real, que era como se ele tivesse voltado no tempo. Parecia que eu estava com ele de novo. Com riqueza de detalhes, os acontecimentos de um quente domingo à noite em meu apartamento em Ibadan voltando-me à mente.

Eu tinha voltado do Sudão, onde passamos um fim-de-semana colhendo amostras de sangue dos habitantes da tribo de Lassa Ubi. Era janeiro, época em que costumava haver um surto de meningite naquela área.

O calor era absurdamente infernal. Uma poeira pungente da cor do sangue enchia o ar. O sol parecia cozinhar a terra e a temperatura chegou aos quarenta e cinco graus centígrados.

Eu estava exausta, quando voltei para casa. Depois de um longo e carinhoso abraço, Edward tirou minhas roupas e me deu um banho bem fresco.

O toque dele em meu corpo me deixou completamente relaxada, mas ao mesmo tempo, me excitou de uma maneira incrível.

Com a maior calma do mundo, Edward usou suas mãos e sua boca para me fazer delirar de desejo. Então, quando eu não pude mais me conter, ele me ajudou a sair da banheira, me enxugou com uma toalha grande e felpuda e me levou para a cama.

– Há uma garrafa de champanha no gelo.- ele sussurrou em meu ouvido.

– Eu não quero champanha.- eu responde, jogando longe a toalha e o abracei com força.- Quero você.

Nós amamos com loucura, uma, duas, três vezes. Depois, eu deitei a cabeça em seu ombro e ambos começamos a conversar.

– Não quero mais que você vá ao Sudão sozinha, querida. É muito perigoso. Não suportaria se algo lhe acontecesse.

Eu lhe dei um beijo no canto da boca.

– Mas você também costuma viajar sozinho, Edward. E se algum dia, alguma coisa lhe acontecer.

– Nada jamais vai me acontecer.- ele garantiu.- Eu te amo muito. E sempre voltarei ao seus braços. Sempre.

– É uma promessa?- perguntei, beijando agora sua garganta.

– Sim. É uma promessa. Eu voltarei, Bella. Seja lá onde estiver, eu darei um jeito de voltar.

Eu acordei frustrada, dolorida por ter dormido no sofá e ainda por cima, cansada. De qualquer modo, me senti completamente lúcida.

O sonho havia sido tão real, que era como se Edward tivesse voltado para mim enquanto eu dormia, a fim de me confortar.

Os acontecimentos da noite passada já não pareciam tão assustadores. Era provável que eu tivesse imaginado aquela luz estranha debaixo da cama.

De qualquer maneira, havia algo de muito concreto naquela história. A pulseira de prata. Bem, também poderia haver uma explicação plausível para o fato. A pulseira esteve comigo o tempo todo. Não foi o gato que a trouxe para mim. O gato não tinha nada a ver com aquilo. Sombra, apesar de maio esquisito, era apenas um animal comum. Fui até a cozinha e o encontrei ali deitado num tapetinho, dormindo o sono dos justos.

Fechei a porta, me sentindo mais tranquila. Com certeza entrei numa espécie de choque, ao descobrir a pulseira esquecida. E o choque, fez com que eu começasse a ver varias coisas.

Senti necessidade de falar com alguém sensato, como uma amiga Alice ou o próprio Aro. Só que ainda era muito cedo para ligar para qualquer pessoa em Chicago.

Era a hora exata, porém, de fazer uma ligação para a Nigéria. Passava do meio-dia na África. O Dr. Sales devia estar chegando em casa, vindo da igreja.

Ele diria que tinha me mandado a pulseira de volta. E tudo estaria explicado. Claro. Eu era uma cientista. Havia sempre uma explicação lógica para tudo.

Apanhei a agenda e tirei o fone do gancho. Não tinha mais falado com o Dr. Sales após a morte de Edward. Não tive coragem.

Demorou muito tempo até que consegui finalmente fazer a ligação para Ibadan. Então, ouvi a voz gentil e educada do Dr. Sales, me complementando em sua língua nativa.

– Dr. Sales.- eu disse, em inglês.- Como vai o senhor? Aqui é Isabella Swan, de Chicago. Espero não estar incomodando.

– Ah, professora Swan!- ele me saudou, mudando imediatamente para a língua inglesa.- Mas que prazer? Espero que esteja tudo bem com a senhora!

– Eu estou bem, sim.- menti.- E o senhor? E a família?

– Estamos todos bem, obrigado. E seu trabalho?

Conversamos sobre amenidades durante alguns instantes. Então, não podendo mais esperar, eu entrei no assunto em questão.

– Dr. Sales, eu gostaria que o senhor me ajudasse a refrescar a minha memória. Quando Edward morreu, eu entrei em estado de choque. E há coisas que aconteceram naquela época que eu não consegui registrar na minha cabeça.

– As grandes dores costumam realmente pregar peças em nossa mente.- respondeu o doutor educadamente.- O que a senhora gostaria de saber?

Eu hesitei. Era difícil tocar nesse assunto. Lembrei perfeitamente do Dr. Sales. Era um homem alto, negro e distinto, com óculos redondos na ponta do nariz. Tinha a simpatia tão comum dos nigerianos e era escrupulosamente honesto.

– É sobre... há... aquela pulseira prateada que Edward usava quando morreu. Foi o senhor que a mandou para mim, não foi? Acho que ainda nem agradeci e ...

O Dr. Sales me interrompeu.

– Não, professora Swan. Ele insistiu muito. Quis conservar a pulseira com ele, até depois da morte. E foi o que aconteceu.

Eu senti que o meu sangue fugiu do rosto. Apertei a pulseira em minha mão com mais força ainda.

– Eu... Eu acho que houve algum engano, Dr. Sales. A pulseira me foi enviada de volta. Na verdade, ela está comigo agora mesmo.

Mas o Dr. Sales continuou a insistir. O bom médico parecia ferido, quase indignado.

– Sinto muito, Professora Swan. Isso não é possível. A Irmã Sarah lhe dirá a mesma coisa. Ele usava a pulseira, nos seus momentos finais.

Eu respirei fundo, tentando me acalmar. Não fui bem sucedida. Ao contrário. Fiquei mais tensa a cada minuto que passava.

O Dr. Sales continuou a falar:

– Nós ficamos preocupados que ela fosse roubada. Edward queria usa-la até o fim. E nós ficamos muito honrados por ele ter nos confiado essa importante missão. E ela foi cumprida. O corpo foi cremado com a pulseira professora Swan.

Agora eu comecei a ter dificuldade para respirar.

O Dr. Sales continuou a falar com voz convicta.

– Nós vimos algumas partículas de prata junto com as cinzas. A irmã Sarah, o pastor e eu. O pastor e eu jogamos as cinzas no rio, professora Swan. E vimos as partículas de prata desaparecer em meio às águas. Pode perguntar ao pastor Miguel. Ele lhe dirá a mesma coisa.

– Eu... eu sinto muito. Sinto muitíssimo mesmo. Como já disse, minha mente não estava muito clara na época... e devo ter confundido a pulseira com outra joia de prata. Perdoe-me, por favor. Acredito no senhor de todo o coração.

Eu torce para não o ter ofendido, parecendo duvidar de sua honestidade. Realmente eu acreditava nele.

Lembrei bem da irmã Sarah. Era quase uma santa. Ajudava todo mundo. Edward brincava, dizendo que podia até ver um elo em volta de sua cabeça.

E o pastor Miguel? Era um homem corretíssimo, incapaz de um só ato menos nobre. Eram três testemunhas completamente confiáveis.

Ao desligar o telefone, os fantasmas da noite passada. Voltaram para me assombrar. Tudo bem, disse a mim mesma, com nervosismo. A pulseira original havia mesmo sido destruída.

Talvez, em meio à minha enorme dor, mandei fazer uma outra igual. E depois esquece.

Enterrei a cabeça nas mãos. Eu estava desesperada.

“ A morte de Edward fez com que eu ficasse meio maluca. Não pensei que tivesse chegado a tal ponto.”

Eu era uma cientista. Vivia num mundo governado pela lógica. Havia razões, médicas ou psicológicas. Para o que tinha me acontecido.

Eu iria descobri tais razões. Iria volta ao quarto, olhar debaixo da cama e ver que não havia luz azul alguma lá embaixo.

Sim. Era aquilo mesmo que eu iria fazer. Dar uma olhada no quarto à luz do dia e compreender que não tinha visto o que não existia.

Só que me faltou coragem para ir até lá.


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Notas finais do capítulo

espero que gostem.



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