A Areia Vermelha escrita por Phantom Lord


Capítulo 23
Capítulo 22, Relógios




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O tempo tem propriedades surpreendentes.

Você poderia estudar e buscar o quanto quisesse, mas nunca descobriria muito a respeito dele. Isso porque o tempo sempre muda e isso independe das vontades do ser humano. Como é possível descobrir coisas a respeito de algo que está em constante mudança? Qual a garantia de que o que você descobre está correto ou é conclusivo e permanente?

Eu detesto observar as consequências que ele traz. Me encaro no espelho, às vezes, e vejo o quanto de mim foi embora. Sorte que não posso me ver por dentro.

Agora eu me sento no grande saguão de mármore-mar, encarando o telão. O tempo também age, na arena. E conforme ele avança, eventos surpreendentes acontecem. E eu não me importo com qualquer coisa extraordinária que aconteça. Apenas anseio pelo momento decisivo em que o sangue inimigo será derramado.

Em uma breve pausa para descanso, Plutarco se junta a mim para assistirmos juntos um trecho dos jogos. É a primeira vez desde que esses jogos começaram em que ele assiste como espectador e não como idealizador-chefe. Catelyn não se sente bem em assistir os jogos comigo depois do choque da quase-morte de Peeta Mellark. E ambos concordamos que talvez seja melhor assistirmos os Jogos Vorazes em ambientes diferentes.

Plutarco, ao contrário de minha pequena neta, se sente bem à vontade aqui. Ele não para de tagarelar sobre armadilhas e invenções que estão ocultas em cantos da arena onde a câmera está filmando. É quase infantil, o modo como ele age, como se estivesse brincando. Mas afinal é isso o que ele faz como idealizador-chefe. Brinca. E eu não vou repreendê-lo por isso.

Mas torna-se enjoativo e entediante o tempo em que os outros tributos vão morrendo e apenas agora, algo começa a me preocupar realmente. A aliança dos jogadores, na Arena. Eles agem em equipe e fica cada vez mais evidente que a intenção de assassinato entre eles mesmos não acontecerá. A aliança de Katniss começa a crescer.

Em sua equipe, ela ainda tem Finnick. A velha que o montava já não está mais viva graças a uma densa nuvem de VTX-12, uma substância perigosa e letal, em forma gasosa. Tive esperanças de que Katniss morresse ali, mas por uma espantosa sorte, ela caiu nos braços da segurança de outra área do Grande Relógio e se livrou do veneno. Também Peeta sobreviveu. O trio caiu na área de perigosos macacos assassinos mutantes, mas saíram ilesos, embora uma quarta mulher de algum distrito, tenha morrido de um modo brutal. Eu desconfio dela, porque momentos antes de ser golpeada por um dos macacos, ela se atira à frente de Peeta, como que para protegê-lo do ataque. Mas ela não fazia parte da aliança. Quem protegeria alguém que mal conhece? Não existe lógica nisso.

Depois, Johanna Mason aparece, saindo da área onde cai a chuva misteriosa, que eu descubro ser chuva de sangue. Um toque macabro, porém, criativo. Eu e Plutarco trocamos olhares e sorrisos silenciosos, carregados de significados. Até que fica claro que Johanna e o par de patéticos inventores do Distrito 3 que ela trouxe consigo irão se juntar à aliança.

Plutarco vê que eu estou cada vez mais irritado com essa coisa. Ele parece bastante preocupado com essa aliança também, pois pode chegar o momento em que ele mesmo terá de matar cada um dos integrantes, já que é bem possível que eles não queiram se matar. Mas até mesmo o melhor dos seres humanos desconhece seus limites e chegará um tempo em que, por instinto de sobrevivência, a aliança se transforme num empecilho para a liberdade.

É uma tortura ver o modo como Katniss Everdeen soube escolher as pessoas em sua equipe. É como se ela soubesse de quem iria precisar. O tributo feminino do Distrito 3 está em algum tipo de choque, porém, repete palavras que impulsionam o cérebro miúdo da garota a funcionarem. Depois de repetir “Tique-Taque” pelo menos cinquenta vezes, a tal Wiress faz com que Katniss desvende um segredo que ela não descobriria facilmente.

A arena é um relógio gigante. Agora tanto eu quanto ela sabemos. A diferença é que eu reúno esperanças de que ela vá na direção errada e ela espera pelo contrário. Não será tão difícil para Katniss, agora que ela começa a se lembrar de que em cada área onde esteve e onde os outros estiveram, algum fenômeno incomum aconteceu.

Estratégias começam a se desenrolar, mas sentimentos confusos cansam minha mente e depois de um suspiro, penso que é hora de eu descansar um pouco. Mal vejo as horas passarem e só me dou conta disso depois de uma olhadela no meu relógio de bolso.

Decido subir para o meu quarto, mas eu não durmo. Não prego os olhos, sequer. Meus olhos estão fixos no dossel sobre a cama e eu observo o tecido vermelho como sangue, fluindo como um rio suave em cima de mim.

A que ponto deixei chegar as coisas. Ha. O modo terrível como sinto que as coisas acontecem me perturba. Até onde eu iria para manter Panem nas minhas mãos? Até onde iriam meus inimigos para tirá-la de mim? Eu não conheço muito a respeito de quem quer que seja meu inimigo. Ainda que Katniss Everdeen seja a chama que acende tudo isso, sei que ela não está sozinha e jamais estará. Existe gente demais que me odeia, que se juntou a causa dela para me destruir. Mas eu sei tão pouco sobre eles e temo que eu não possa descobrir muito mais além do que já sei sem transformar Panem na nação do caos.

Mas já me asseguro de estarmos preparados para conflitos maiores. Assim que Katniss morrer na arena, a primeira reação será a de confronto. Quando mostrarmos nossos mais antigos aerobarcos de artilharia pesada à esses revolucionários, eles voltarão para suas casas e ignorarão sua mártir, a garota em chamas, que em breve será apagada e transformada em uma espiral de fumaça cinzenta.


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