A árvore de memórias escrita por Licht


Capítulo 16
15. A Árvore e a despedida.




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Havia muitas plantas no quintal da nova casa de Itsuki. Elas cercavam um grande pátio que dava para a casa principal - era uma propriedade enorme, porém totalmente vazia. O local que era muito movimentado por criados e pacientes, agora só abrigava quatro pessoas - Bom... três pessoas. Ryotaro já era um senhor, portanto sua morte não foi surpresa para o filho e o neto que receberam Natsume muito bem desta vez. Já as muitas plantas pareciam chorar - talvez por causa da chuva que havia caído, ou talvez porque soubessem que o velho Endo, quem cuidava carinhosamente de cada uma delas, havia falecido.

Natsume entrou em silêncio, e assim permaneceu todo o tempo em que caminhava ao lado de seu gato até o quarto da menina. Daichi e Hideki - pai e filho - que demonstravam não gostar nem um pouco do rapaz, desta vez não protestaram com sua entrada. Hideki abriu a porta para que o rapaz entrasse e logo depois a fechou, deixando-o sozinho com Itsuki, que dormia sentada no chão, com a cabeça encostada em sua cama.

O sol começava a aparecer do lado de fora e a luz entrava pela janela da menina, de forma que batia levemente em seu rosto. Ela dormia profundamente e dava para ver claramente seus olhos profundos e roxos - ela devia ter chorado por toda manhã. Os dois Endos que ainda restavam não pareciam tão surpresos com a morte de Ryotaro, mas Itsuki era yokai. Já estava viva, pelos cálculos do rapaz, há uns 70 anos e não entendia nada, absolutamente nada sobre a morte. Sobre como a vida humana é passageira.

Ele se aproximou cuidadosamente, pondo-se de joelhos ao lado dela. Observou bem a cena e cedeu ao impulso de levar uma das mãos até o rosto da menina; Passou os dedos pelos fios de cabelo que atrapalhavam e então, finalmente entendeu que estava apaixonado por ela.

Não houve espaço para que se assustasse com isso, ou que a vergonha tomasse seu corpo fazendo-o se distanciar como de costume faria. Com o seu toque, Itsuki acordou e seus olhos voltaram a se encher de lágrimas. Ela o abraçou depositando o rosto em seu ombro e tudo o que Takashi pode ouvir eram os soluços do choro da menina. Imediatamente ele a abraçou de volta, segurando-a pela nuca firmemente. Não, aquele não era o tempo para palavras e nem hesitações.

Quando os soluços de choro foram diminuindo, a velha, porém pequena Naoko Itsuki começou a falar. Falava o quão se sentia culpada e arrependia. O quanto se sentia sozinha, que estava sendo castigada por ter esquecido de procurar sua mãe. Volta e meia os soluços voltavam a aumentar e tudo que Natsume podia fazer era segurá-la mais forte. Também não havia tempo para se sentir feliz com todos os toques.

Ela não entendia o porquê num piscar de olhos era abandonada. Sua mãe, Reiko, seu irmão. Itsuki segurava o rapaz com tanta força e Madara a olhava com pena por isso. Porque ele sabia dos sentimentos da menina por ele, mesmo que ainda não fosse percebido por ambos. E sabia também o quão ela tinha medo de piscar os olhos e perdê-lo também

Mas a vida humana era assim.

Provavelmente antes que pudesse terminar de piscar, Natsume Takashi iria e desapareceria bem como Reiko havia feito. Provavelmente se casaria, teria filhos - com sorte poderia vê-los. Nyanko imaginou se choraria se visse o túmulo do rapaz.
Preferia acreditar que não, que iria seguir com o plano de vê-lo morrer, pegar o livro dos amigos, preferencialmente com alguns nomes. Mas no fundo sabia que não era mais sobre isso.

— É por isso que você não devia se envolver com humanos - disse o gato com um sorriso quase que assustador - eles são facos e morrem demasiadamente rápido.

Ambos encararam Madara sem muito entender. Tinham em comum uma expressão de choque, mas seus motivos eram diferentes. Natsume por considerar o gato algo mais próximo de um melhor amigo que já teve, e Itsuki por estar apaixonada pelos seres humanos.

Nyanko, na verdade, falava aquilo para si mesmo. Dizia para si mesmo que havia cometido um erro porque sabia que agora sofreria com a morte do menino que seguia - mas o mesmo tempo, não se via em outro local. Aquilo era essencial para ele:

— Mas já que fez - suspirou profundamente o gato, completando sua frase após uma longa pausa - aproveite cada minuto. É o que podemos fazer - guardar suas boas memórias.

Itsuki pulou dos braços do rapaz e recolheu o gato com as mãos, dando-o um abraço forçado. Ele, é obvio, ficou reclamando e foi devidamente ignorado.

As horas passavam e deixaram consigo uma sensação agridoce. A meio-yokai estava com o coração partido com a morte do irmão, mas também estava feliz: essa sensação de dor só existia porque ele se tornara parte essencial dela.

Logo, o sol começava a se por dando início a uma nova noite. Natsume recolheu seu celular porque mostrava as horas, e então lembrou de protestar.

— O que é isso? - dizia o rapaz apontando para o aparelho.

— Um... Celular? - Itsuki respondeu o obvio tentando sair da conversa.

O rapaz respondeu com um olhar repreensivo, impedindo-a de fugir por mais tempo.

— Você andou gastando o dinheiro da sua família de novo? - Natsume já havia dado horas de sermão na meio-yokai, que demorou certo tempo para entender o significado e o valor do dinheiro.

— Não, não! Eu trabalhei por isso. - ela respondeu num certo tom irritado. - Por isso você não pode recusar.

Takashi olhou confuso para a menina. Como assim trabalhou? Itsuki respondeu que ficou cerca de um mês trabalhando em alguns lugares indicados pelo falecido irmão, até que juntasse o suficiente parar comprar um celular para ele.

Ainda estático, o rapaz respondeu que não poderia ficar com o telefone. Nunca havia sentido a necessidade de ter um, por sinal - ele estendeu as mãos segurando o aparelho em tom de agradecimento. Itsuki olhou para ele inchando as bochechas de raiva, e então segurou as mãos dele com ambas as dela.

— Mas eu quero estar mais com você, Natsume-san! Você não pode negar!

Nyanko riu. Achava os humanos devagar e engraçados. Takashi estava completamente vermelho e sem jeito e ainda assim, Itsuki não percebia a situação. Era verdade que muitas vezes aconteciam desencontros entre os dois, mas provavelmente a menina havia escutado algo das amigas ou lido em algum de seus livros algo que a fizesse querer isso. Estava curioso.

Natsume acabou ficando com o aparelho e voltou para casa com um indisfarçável sorriso no rosto. Já Nyanko estava se divertindo com a situação, agora que reparara que o rapaz havia finalmente notado os próprios sentimentos, fazia alguns comentários e brincadeiras maldosas, deixando Natsume completamente desconsertado.


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