A pedra no meu sapato escrita por Johanna


Capítulo 2
A primeira tarde com ele.




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E lá estava eu: sentada ao lado de Peter no meu sofá, depois de muita insistência dele.

— Então, onde estão seus pais? — Ele me cutucou.

— Sou emancipada. — Eu o encarei, tipo "vai embora, ninguém te convidou para vir aqui".

— Oh.. — Ele fez uma pausa. — Eu também. Desde os quatorze anos.

Nossa... Cedo, não? E eu já reclamava de estar sozinha aos dezesseis. Vi que seu olhar ficou profundo, dirigido ao chão.

— Sinto muito. — Não sei se essas palavras ajudariam, mas...

— Que tal irmos na praça do centro? Passear. — Ele me encarou.

— Tudo bem.. — Acho que meu sinto muito foi completamente ignorado.

Logo que chegamos eu trocara de roupa, então apenas juntei um dinheiro, minha bolsa, e saímos. Caminhamos lentamente em silêncio até chegar ao centro da cidade, e então, na praça. O caminho era longo, e por menor que fosse essa cidade, o ambiente era agradável e me fazia relaxar.

A praça era um lugar lindo. Rolland era um lugar muito florido. Flores e mais flores, para todos os lados. Espalhadas pela cidade, nas cores roxo e amarelo. Eu sempre morei na cidade grande, e por melhor que eu achasse, não era tão lindo e bem cuidado desse jeito. Aqui não parece ter pobreza nem infelicidade.

— Sarah.

— Hm?

— Aqui. — Eu olhei para Peter e ele estava com sua mão direita estendida para um banco de mármore, típico de praças. — Vamos sentar aqui.

Eu assenti com a cabeça e segui-o até o banco, onde nos sentamos.

— Que lugar lindo — Eu comentei.

— Huh, você não sabe o que é beleza. — Ele olhava fixamente para uma árvore em nossa frente.

Seu humor era tão monótono. Eu não conseguiria descrever o quanto ele me parecia infeliz. Mas eu acho que posso entender. Com apenas cinco anos, meus pais me largaram sozinha em casa junto com os empregados para viver assim até meus dez anos. Então eles venderam aquela casa e me levaram para outra cidade para vivermos como uma família normal. Não durou mais de um ano e já me levaram para um internato, onde fiquei até ano passado. Agora eu estou sozinha. E ele também, desde mais cedo na verdade. Sinto pena. De nós dois.

— E você sabe? O que é ser... Feliz? — Perguntei.

— O quê? — Ele me encarou, mas dessa vez com um olhar de espanto.

— Eu não sei. Nunca soube, na verdade. — Eu tentei sorrir, mas a tristeza tomou conta de mim. — Não sei o que aconteceu com você, mas.. A minha vida não foi.. Não é fácil. E nunca vai ser. Só acontecem desgraças comi...

— Shh. — Ele colocou um dedo em minha boca. — Não fale bobagem.

O olhar dele ainda era o mesmo olhar fuzilante de antes. Mas, agora parecia não estar mais tão terrível. Em seus olhos estava a compaixão. Pena, de uma pobre coitada que fica se lamentando para alguém que ela acabou de conhecer.
Eu olhei para baixo e repensei.. Que eu não deveria sair me expondo assim para qualquer um. Ele finalmente tirou o dedo que me fez calar a boca. Levantei a cabeça e meus olhos encontraram os seus. Como alguém poderia ser tão lindo? Ele era perfeito. Me olhava intensamente.

Peter colocou sua mão logo atrás da minha orelha e foi carregando meu rosto de encontro com o seu... Eu vou deixar acontecer. É do jeito que eu sempre imaginei. O beijo perfeito. Mas.. Não. Espera. Eu estou me deixando levar por Peter. Aquele malandro. Idiota.

— Preciso ir no banheiro. — Eu murmurei e me levantei rapidamente.

Andei tão rápido que quase corri. O banheiro público da praça era diferente de tudo que eu já vi: era um cômodo. Vi a enorme placa de "Elas", com a bonequinha em cima. Fui até ele e abri a porta. Era igual os banheiros dos shoppings. Tinha até poltronas. Enfim, me dirigi até a pia e joguei água no rosto. Uma porta do sanitário se abriu, e de dentro dela saiu Lucy.

— Olá, Sarah. — Ela sorriu ironicamente. — O que fazes aqui?

— Eu vim.. Passear. — Eu não ousei mover os olhos até ela, que parecia agressiva.

— Sozinha? — Ela parou do meu lado e cruzou os braços.

— Hmm.. — Sequei minhas mãos e meu rosto. — Tenho que ir.

Caminhei em direção à saída. Senti uma mão quente pegar meu ombro e me virar violentamente para trás.

— Você não respondeu a minha pergunta. — Ela me encarou. Profundamente.

— Eu disse que tenho que ir. — Sorri, tirei sua mão de meu ombro e saí pela porta.

Peter me esperava do lado de fora. Eu o puxei pelo braço e levei-o até a barraca de sorvete que ficava logo na frente do banheiro. Tirei meu celular da minha bolsa e vi que toda aquela caminhada até em casa e depois até a praça + ficar sentado no banco + ida ao banheiro tinham tomado quatro horas da minha vida. Nossa. Já eram quase cinco horas da tarde. Da próxima vez que vier para o centro pego um táxi. Pedi ao senhor da barraquinha um sorvete, mas só tinha de leite condensado. Eu odeio leite condensado. Mas, para passar o calor que eu estava sentindo por quase beijar alguém e também ser quase espancada no banheiro, decidi comprar.

Peter pegou o último de leite condensado. Ele já havia começado a comer. De ansiedade, mordi o sorvete. Umas cinco dentadas seguidas. Sim, dentadas. Mas... Aquilo era tão ruim, doce demais. Eu.. Ah meu Deus... Não estou me sentindo bem. Eu... Vou...

— Mas que... — Foram as únicas palavras que saíram da boca de Peter, depois de eu.. Ter vomitado em cima dele.

— Ah meu Deus... Eu... — Como eu me explicaria? — Sinto muito...

— Cale a boca. — Ele olhou para sua camisa toda branca cheia de gosma verde escura. — Merda.

Ele ficou olhando para mim por alguns minutos. Que olhar fuzilante. Mas não o fuzilante normal — eram tipo umas quinhentas bazucas e metralhadoras.

— Vamos pra minha casa. — Sem esperar minha resposta ele pegou minha mão e só faltou me arrastar.

Ele não estava tão violento. Eu acho. Mas quem não ficaria bravo se.. Fosse vomitado? Não demorou nem cinco minutos para chegarmos no prédio dele. Era no centro. Subimos, ele abriu a porta... Silêncio absoluto. Era um prédio luxuoso.

O apartamento era limpo e super confortável, o que era difícil para um menino. Sentei-me no sofá enquanto — sem nenhuma palavra — ele foi — eu acho — trocar de camisa. Havia uma TV enorme na minha frente, quer dizer, na parede. Devia ter umas cinquenta polegadas, se é que existe esse tamanho.

Comecei a ouvir passos se aproximando na minha direita. Olhei para ver o que era e... Era o paraíso. A perfeição. Em uma coisa só. Peter estava sem camisa. Bom, a camisa que ele colocaria estava na mão dele. Ele parou de caminhar quando notou que eu o observava. Ele tinha realmente músculos super definidos. Sua barriga de tanquinho, aquilo era a perdição, realmente...

— Sarah? — Ele tentou chamar minha atenção.

— Huh? — Eu ainda encarava a barriga dele quando me dei por conta. — Ah! Oh meu Deus. Desculpe. Desculpe!

— Não. — Ele fez uma pausa. — Precisa... Se desculpar.

Eu coloquei a mão entre os joelhos e os fechei. Eu. Não. Deveria. Ter feito isso. Se bem que... Se estava lá era para ser notado, né? Não. Não que nem uma imbecil de boca aberta babando que só faltava agarrá-lo. E com tudo isso, como ele podia continuar com aquela cara super-sexy-séria me encarando?

— Me Des... — Eu ia me desculpar.

Quando eu decidi me virar para o lado para encarar seu rosto para me desculpar, ele já estava do meu lado. E quase me beijando. Cara... Como eu não ouvi ele sentando no sofá? Como eu não percebi que seus lábios quase tocavam os meus? Sarah, você é MUITO imbecil. Deveria receber o prêmio de retardada do ano.

Eu não queria aquilo. Então, — vagarosamente — comecei a me afastar dele...

Mas, ele seguia meus movimentos. Quando percebi, tinha ido tanto para trás que já estava deitada no sofá, e ele estava em cima de mim. Palmas.
Eu não podia. Me envolver com alguém agora. Não. Espera. Eu posso. Quer saber?

Foda-se. Fodam-se meus pais. Eles nunca estiveram aqui. Nunca vão estar. Eu não preciso entrar nas regras. Então, eu posso. E eu quero.

Entrelacei as mãos no seu pescoço e puxei seu corpo violentamente. Ele me beijou. Eu desci minhas mãos até suas costas. Era confortante sentir aqueles músculos. Eu afastei a boca da dele e a abri para respirar. Eu ficaria sem fôlego se continuasse sem parar. Então Peter me beijou novamente. Selvagemente. Nossas línguas dançavam num ritmo acelerado.

E, eu confesso, que... Nunca imaginei narrar essa cena. Não com essa idade. Não no primeiro dia em que eu o conheci. A mão de Peter que antes estava no meu rosto já estava na minha cintura. Então, ele começou a subir novamente, e durante o beijo eu a senti entrar por baixo da minha blusa, na minha barriga. Como um choque, Peter rapidamente se afastou de mim. Como se fosse um crime. Sua expressão era de espanto.

— D-Desculpe. — Ele olhava fixamente para o chão. — Eu não posso.
Eu ajeitei minha blusa. Sentamo-nos um ao lado do outro no sofá. Em silêncio. O que diabos eu acabara de fazer? Eu precisava... Sair dali.

— Eu... Preciso ir.

— Tudo bem.

Eu levantei e catei minha bolsa. Fui até a porta, e Peter foi atrás de mim. Sem emitir qualquer som, descemos pelo elevador até o térreo, e lá ele abriu o portão para mim. Cruzei a calçada entre o prédio e a rua.

— Espera. — Ele veio até mim (ainda sem camisa, uuuh). — Toma.

Ele estendeu a mão e me alcançou um cartãozinho com número de taxi.

— Obrigada. — Sorri. — Tchau.

— Tchau. — Ele sorriu, fechou o portão e retornou para sua casa.

Agora, rebobina que eu não acreditei. Ele sorriu. Peter, sorriu. Para mim. Um dia todo aturando suas manias e nada de sorrisos. Era lindo. Estonteante. Distrativo. Poderia fazer o mundo parar. Me senti nas nuvens. Liguei para o numero de táxi, que logo chegou. Quando me dei por conta, já estava em casa. Coloquei meu pijama e me deitei, embora fossem apenas 18:30 da tarde.

E lembrei de tudo que aconteceu hoje.

Eu disse para mim mesma que não cairia na dele. Infelizmente, não pude cumprir.


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Notas finais do capítulo

Essa é uma das minhas partes favoritas, confesso. Espero que gostem, e me motivem a continuar postando. Aproveitem.



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