Medo

Eu entrei no carro novamente, David e Sarah não fizeram perguntas sobre o que havíamos combinado, até porque, acho que ouviram tudo o que dissemos. Rony dirigia já iria fazer uma hora e nada de acharmos um posto! Eu o olhava pelo espelho e vi a tensão se tornando cada vez mais aparente em seu rosto. Rony estava perdido, e se ele estava perdido, todos nós estávamos.

–Você não disse que se lembrava de onde era?- perguntou Sarah furiosa.

–Eu sei que está aqui em algum lugar eu só...- ele parou de falar ao se deparar com o grande obstáculo à sua frente. Minha respiração ficou presa na garganta. Uma multidão de zumbis se avolumava no meio da estrada. Rony afundou o pé no acelerador estava prestes atropelar todos a sua frente. E o pior de tudo é que não sentia nenhum indício de meu poder para ajudar.

–Segurem-se!- ele gritou por cima do barulho do motor que se esforçava cada vez mais conforme a velocidade vinha aumentando. Eu encarei os monstros que se aproximavam rapidamente de nós, não via a aura deles, e aquilo para mim era uma novidade. Estávamos prestes a nos chocar contra eles. Eu fechei meus olhos, temi o que veria e o que poderia acontecer. Ouvi o barulho do vidro se estilhaçar e a quantidade de corpos que se chocavam contra a lataria, o carro balançava violentamente enquanto passávamos por cima daquilo que acredito eu ser os corpos dos zumbis. Agradeci internamente ao meu instinto de manter os olhos fechado, não seria uma cena nada bonita!

–Rony veja!- ouvi David gritar ao meu lado. Abri os olhos, atrás de mais algumas centenas de zumbis estava o posto.

–Não vamos conseguir pegar a gasolina com essa quantidade de zumbis em volta!- falei por cima do barulho do motor, os gemidos dos zumbis e os corpos contra o carro.

–Talvez se você fizesse aquilo que fez na casa...- gritou Sarah, mas Rony a interrompeu.

–Não... acabaria explodindo o posto!

–Então o que faremos?- perguntou David.

–Eu não sei!- gritou Rony frustrado. Os zumbis pareciam não acabar mais e o vidro do carro não aguentaria muito tempo, também não poderíamos parar ali para encher o tanque com o pouco de combustível que Rony guardou, e a gasolina estava praticamente no fim. Se Rony fosse um mecanismos tenho certeza de que seria capaz de ver as engrenagens tentando girar. Uma ideia me veio à cabeça, olhei para a porta do carro, e para as dezenas de zumbis atrás dela. Se fosse rápida talvez conseguisse fazer, mas teria que ser tão rápido que só pudesse ver um borrão, seria um risco pois abriria a porta e deixaria uma oportunidade para algum zumbi entrar. Senti um calafrio me subir pela espinha. Será que conseguiria?

Faça! Ouvi a voz dizer.

Respirei fundo, fechei os olhos e senti um formigamento na pele, o anjo dentro de mim se preparava para sair. Quando abri os olhos tudo estava em câmera lenta, abri a porta e saltei, com o pé a fechei novamente, minhas asas se abriram imediatamente, consegui desviar de um zumbi antes que ele me atingisse e já estava a metros de altura deles voei em direção ao posto, os zumbis estavam ocupados demais indo em direção ao carro não tinha nem um ali precisaria ser rápida mas como levaria a gasolina para lá, ou pior, como a colocaria no carro!

Use sua mente! Disse a voz, respirei fundo e me concentrei, ergui minha mão na direção do tanque, minha mão começou a tremer e junto com ela o tanque. Suspirei para me concentrar melhor e logo fiz um gesto como quem poderia erguê-lo e assim aconteceu o tanque se ergueu, e com ele flutuando por cima dos zumbis junto a mim voei acompanhando ao carro, que seguia atropelando os zumbis sem parar, podia ver que ele desacelerou por um instante, creio eu que Rony tenha feito isso por minha causa, mas quando voava acima do carro os ele voltou a acelerar e logo nos distanciávamos dos zumbis. Rony continuou dirigindo e eu voando até que mantivéssemos uma distância razoável, ou em outras palavras... quando o carro não aguentou mais, e morreu.

Aterrissei ao lado do carro agora morto e trouxe o tanque comigo. Rony saiu do lado do motorista e logo Sarah e David também saíram do carro.

–David pegue o galão vazio no porta malas, aquele que a água acabou ontem e o encha de combustível, vai ser mais um reserva, e Sarah encha o tanque do carro,- ele dava as ordens rapidamente e os dois se apressavam para obedecer, eu sorri e me permiti me sentir orgulhosa por ter ajudado... por um segundo- E você!- Rony apontou para mim e logo depois pegou meu braço e me puxou para longe do carro e de Sarah e David. Ele apertava tanto que acho que meu sangue ficou preso. Quando me soltou, estávamos a uma distância considerável para que mesmo que gritássemos ninguém pudesse nos ouvir, o que na minha opinião não era nada seguro, mas essa parecia ser a intenção de Rony.

–Ei o que deu em você?- perguntei furiosa.

–O que deu em mim?- ele me encarou com o rosto vermelho de raiva- O que deu em mim? Você salta do carro no meio de um monte de zumbis, correndo o risco de morrer e destruir toda a esperança que resta no mundo e você pergunta o que deu em mim? O que deu em você, Rachel?

–Eu só quis ajudar!- respondi irritada.

–Você enlouqueceu isso sim!- ele gritou.

–Eu acho que na verdade salvei nossas vidas, o tanque está ali não está? Eu estou aqui não estou? Então qual o problema agora?

–O problema é que... o problema é...- ele passou as mãos pelos cabelos, sua expressão exalava puro desespero.- Você é nossa prioridade agora, Rachel! Não podemos deixar que nada aconteça a você.

–Opa, opa, opa...Não foi esse o nosso combinado! Nós tratamos que cuidaríamos de Sarah e David juntos, e que eu não deveria ser incluída na sua lista de pessoas que deva proteger.- Rony suspirou.

–Eu sei, Rachel, mas...

–Sem mas, Rony, trato é trato!

–Acontece, Rachel, que é tarde demais!- balancei a cabeça confusa.

–O que é tarde demais?

–Você já está na minha lista de proteção, e queira você ou não, está no topo dela!

A determinação brilhava nos olhos de Rony, e foi ali que eu vi que nada o faria mudar de ideia, e aquilo definitivamente me pegou de surpresa. O garoto que antes me deixaria na estrada, faria de tudo para me proteger, se duvidar daria a própria vida por mim. O que era de fato um grande problema.