B o n d s escrita por Return To Zero


Capítulo 4
Meu coração é da cor dos seus cabelos


Notas iniciais do capítulo

Demorei dois dias pra escrever um capitulo filler, eba



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Nossa nova casa era ampla e colorida, apesar de ser um tanto gelada. Ficamos lá por um bom tempo, até.
"O que você está pintando?" Kirishie perguntou certa vez "Mais algum desastre?"
Meses após nossa mudança, uma grande guerra tomou conta de praticamente todo o mundo. Kirishie foi varias vezes até a Sociedade, e sempre voltava meio irritada. E eu sempre pintava ela, em sua terra natal, para agradá-la, e ela sempre se impressionava com a velocidade em que eu pintava.
"Um dia nós vamos morar lá. Você vai adorar." ela sempre dizia tambem
Até que, certo dia, ela resolveu me levar até a Sociedade. Encontrei-me com Tsuki, que parecia estar de cara amarrada comigo.
"É Amano-san pra você." ela disse, fazendo um bico enorme
"Calma, ele é só uma criança." Kirishie me defendeu
"Crianças não deviam sair por aí, chamando os outros de gorda!"
"O quê?!"
"Pensa que eu não ouvi? Seu... Grrr, espirito desgarrado!"
"Ouch, essa doeu."
Tsuki tocou a aba do chapéu e tirou uma das penas castanhas. Imediatamente ela se tornou solida e brilhante, como um faca. Tomei alguns passos para me proteger, e ela me lançou a primeira faca-pena. Deslizei para o lado e ela voou para a parede em frente.
"Volte aqui que eu vou te mostrar quem está gorda e fora de forma!"
Ela continuava arrancando suas penas e atirando-as contra mim. Pareciam não ter fim. Não sei como mas eu sempre desviava e isso a deixava tão irritada, mas eu me divertia tanto e não conseguia parar.
Dessa vez ela arrancou uma última pena e resolveu me enfrenter.
"Que feio, eu estou desarmado." eu disse por entre um sorriso. Ela se enfureceu ainda mais "Calado, você é um mero Previsor!" ela grunhiu, desferindo alguns golpes que eu desviei automaticamente.
Era estranho. Eu não sabia de onde eles viriam, ninguém saberia. Mas eu desviava como se meu corpo soubesse. Como se alguém me controlasse.
Em certo momento consegui empurrá-la a uma certa distancia. Fiquei alguns segunds estaticos, com aquele sorriso divertido em meu rosto, mas meu interior estava uma bagunça. Do que ela havia me chamado mesmo? Previsor?
Antes que eu pudesse voltar à realidade, Tsuki arrancou um dos sinos que pendia de seu chapéu. Olhou pra mim, balançando-o e atirando contra mim, mas ele não me acertou. Parou centimetros a minha frente e pôs-se a badalar de forma suave. A cada badalada, outros sinos surgiam ao meu redor.
Em dado momento, todos badalaram ao mesmo tempo e se chocaram contra meu corpo. um deles acertou, de forma estrategica, meu plexo solar, me fazendo gorfar um tanto de sangue. Do que era feito esse maldito sino?
Ajoelhado no chão, abraçando a barriga com um dos braços, dei um riso despreocupado "Brincadeirinha chata né, sua gorda?"
O último sino investiu contra meu corpo, mas o segurei com a mão livre com tamanha força que eles se despedaçou entre meus dedos. Pude ver a bruxinha estremecer, como se algo dentro de si também houvesse quebrado, e ela recuou um pouco.
Me levantei sem pressa e caminhei para ela, devagar. Ela balbuciava algo, e corria os olhos de Kirishie para mim. "Com medo, bruxinha?"
Sem cerimonia, retirei o chapéu dela. Pude ver suas grandes orbes marejarem, e antes das lagrimas escorrerem, seu rosto estava enfiado entre os seios redondos, brancos e macios da ruiva.
"Kirishie! Ele pegou meu chapéu!" ela choramingou no colo da outra, como se alguém tivessse arrancado seu coração "Eu não sou nada sem meu chapéu!"
"Stark, kaeshite."
"Mas nunca! Ela quase me matou!"
"Eu não ia te matar, seu imbecil! Só queria te dar um susto!" a morena protestou
"E você chamou ela de gorda."
"Não, eu chamei a lua de gorda, muitos meses atrás. "
"E quem você acha que fica pendurada lá, o tempo todo, iluminando aquele maldito planeta cheio de..."
Ela continuou a praguejar mas eu nem dei ouvidos. Aquela garota estranha era uma especia de lua?
Melhor, a nossa lua.
Melhor ainda, a lua de vocês, já que não somos exatamente a mesma coisa.
Seus braços se esticavam entre o abraço de Kirishie, e imploravam pelo chapéu que, dessa vez, devolvi sem hesitação.
Ela o recebeu e colocou-o na cabeça, muito irritada. Ainda reclamava sobre as mesmas coisas quando estalou os dedos, fazendo uma vassoura se materializar em sua mão. Logo, ela estava voando pelo céu, indo embora.
"Você parece lutar muito bem" a ruiva comentou, continuando nosso caminho "Onde aprendeu?"
"Não faço ideia" respondi "Era como um mecanismo de defesa, talvez?"
"Kamoshirenai. Vamos cuidar disso em casa."
***
Após caminharmos um pouco mais, chegamos àquela sala de antes, com uma mulher sentada à mesa. Já tinha seus fios de cabelos prateados e, diferente das outras duas bruxas, seus olhos eram grandes e azulados.
"Quem está aí?" ela berrou de novo, estreitando os olhos para nós
"Watashi da, watashi" Kirishie respondeu novamente, balançando as mãos "Voltei para falarmos do quadro do nosso pequeno Previsor."
De novo essa palavra.
Ela ordenou que nos sentassemos, e assim fizemos. Limpou os oclinhos de armação fina e dourada, botou-os no rosto e nos encarou, como se quisesse escolher as palavras mas nenhuma parecia boa o suficiente.
Depois de longos minutos de silencio, perguntei "Por que eu pinto esses quadros? Por que as coisas que eu pinto, sempre acontecem?"
Ela pigarreou, como se sua visão houvesse voltado ao normal
"Astunt Edmond foi um grande pintor há tempos atrás. Sendo um homem muito solitario, cada pintura que ele fazia era como um amigo novo. Tanto acreditava nisso, que suas pinturas ganharam vida. Claro, ninguém acreditava nele. Até perdeu grande parte de sua popularidade com isso, por ser considerado louco ou endemoniado. E então, ele se matou."
Houve um pequeno silencio onde eu tentava entender as coisas, e Kirishie checava suas unhas despreocupadamente.
Ela continuou: "Mas ele gostava tanto, tanto de pintar que essa vontade prendeu-o aqui. Ele morreu bem no dia em que você morreu, e na mesmo hora. Isso dá alguns privilegios na hora de escolher um Recipiente."
"Privilegios?"
"Kirishie!" a ruiva deu um pulo na cadeira, quase batendo continencia "Você não explicou nada para o rapaz?"
"Oh, bem... Bem... Achei que não seria importante."
A velha revirou os olhos, impaciente "Olhe garoto, já perdi as contas de quantas vezes eu já tive de explicar isso em todos esse anos de trabalho, portando serei breve" assenti com a cabeça, prestando muita atenção "Achei que, sendo Sunao Kirishie uma de nossas melhores subordinadas, e tendo estado com você por mais de dez anos, você estaria a par da situação." ela lançou um olhar mortifero para Kirishie, que não percebeu pois estava checando suas unhas novamente.
Puxa vida.
Também lancei um olhar a ruiva. Dez anos se passaram e ela continuava identicamente linda desde a primeira vez que a vi. Parecia não envelhecer nunca, ou se bronzear, ou se machucar. Era bela, e delicada feito uma boneca.
Me perdi naqueles cabelos avermelhados cor do pôr-do-sol.
Qual era a cor do meu coração?
"... E nessa transação, o Recipiente acaba ganhando um tipo de 'superpoder' ao encarar, face-a-face, o sobrena...Está me ouvindo, Stark?" lutei contra o instinto de observar Kirishie para sempre e fiz que sim com a cabeça. Ela continuou "Sobrenatural. Quando duas pessoas morrem ao mesmo tempo, é bem comum ter uma transação direta. Quando alguém morre, e tem algo que a prende aqui, ela entra em uma especia de fila para receber um recipiente. Cada vez mais morrem pessoas com enormes vontades de permanecerem, algumas vão embora depois de poucos dias; outros, meses. Outros, como Kirishie e eu, vamos durar para sempre."
"Por quê?" indaguei
"Alguém precisa tomar conta de tudo isso" Kirishie respondeu
"Onde eu estava mesmo?"
"Transação direta."
"Oh sim" ela ajeitou os oculos "Quando duas pessoas morrem ao mesmo tempo, ocorre uma transação direta. Elas trocam de corpo, literalmente. Raramente há rejeições."
"Quer dizer que eu," apontei para meu peito "que estava nesse corpo, pode estar por aí?"
"Provavelmente." ela deu de ombros e eu sorriu "Agora, o segundo assunto."
"Por que as coisas que eu pinto acontecem?"
"Errado." ela balançou a cabeça resignadamente "Elas vão acontecer. Por isso você pinta."
Ficamos em silencio por alguns segundos. Como assim, eu era um vidente?
"Um Previsor." ela corrigiu "Há anos não temos um, o que significa que você é raro, util. Único e precisamos muito de você."
"Mas por quê?"
"Essa guerra que você previu... Ela tem bases sobrenaturais. Os humanos são meros... Ahn... Fantoches. E nós precisamos lidar com isso, E você pode prever também, uma especia de cura para essa doença."
"Mas como eu posso fazer isso?"
"Pinte, Stark. É isso o que você faz, é para isso que você vive." ela adicionou, com uma expressão grave "Para nos salvar."
Engoli em seco. Aquele lugar estava me dando pequenos calafrios, talvez tenha sido o grande golpe de responsabilidade. Agora, eu precisava prever uma especie de messias?
Kirishie trocou mais algumas palavras com ela, e logo saimos dali.
***
Atravessamos aquele corredor de cores neutras. Ele estava praticamente vazio, pois estavam cuidando da guerra que se espalhava. Aos poucos eu absorvia a informação de que eu era extremamente importante para a Sociedade. Mas por que ninguém olha pra mim?
Parei para pensar que eu já pintei - ou melhor, previ - varios outros desastres. Todos tinham raizes sobrenaturais?
"Quem era aquela mulher?"
"Pode chamá-la de Madre Superiora. É como a chamamos."
"Vocês são uma especie de freiras?"
Ela soltou uma gargalhada e acendeu um cigarro.
"Volte a pintar, garoto."
***
Mais tarde, ela gritou meu nome.
Com o susto, meu braço escorregou, fazendo o pincel encharcado de tinta vermelha fazer um traço em meio as delicadas feições de Kirishie projetadas na tela.
"Vem aqui." ela me chamou de novo. Estava no centro da sala usando um vestido preto, justo, diferente de tudo. Sapatos de salto alto, e o cabelo preso de um jeito especial, adornado com uma flor branca "Vamos dançar."
"Mas eu..." antes que eu completasse a frase, Kirishie me puxou para mais perto, fazendo nossos corpos se chocarem de forma suave "... não sei dançar."
"Sabe sim, não se preocupe."
Não, não sei não.
Kirishie já era uma mulher alta, e os saltos faziam com que meus labios roçassem pela pele exposta no decote. Será que ela percebeu que, em certas vezes, dancei com meus labios por sua pele de forma proposital? Era tão macia, suave e fria.
Uma música invisivel, que só tocava em nossa cabeça, nos embalou. Eu dei os primeiros passos e, surpreendentemente, eu sabia dançar.
Mas que dança era aquela?
Levantei os olhos e descobri Kirishie aproveitando aquele momento como nunca havia visto em todos esses anos. Tão linda, serena e vermelha.
Foi quando percebi.
Meu coração é da cor dos seus cabelos, Kirishie.


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