Teias cortantes escrita por CondL


Capítulo 1
Observador




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Apertei bem o binóculo em minhas mãos enquanto observava variadas janelas do apartamento ao lado do meu. Ninguém suspeitará que o tímido David as observava e pensava nelas, algumas vezes pensava nelas em cenas de morte e sofrimento me colocando em uma situação que eu mesmo me envergonhava, na verdade não queria pensar em garotas inocentes deste jeito mas minha mente tentava me enganar criando os mais variados cenários cruéis e mórbidos. Desci as lentes do binóculo até a primeira janela com a luz acesa que vi, havia uma mulher com cabelos louros, curtos e enrolados, tinha lhe visto na rua a pouco tempo atrás, passei por seus olhos azuis e sonhadores, rosto com tão poucas imperfeições que poderia jurar que era coisa de minha mente. Ela se observava no espelho se preparando para dormir, massageando seus cabelos que depois de sua delicada mão passar pelos fios voltavam a sua posição normal, enfim depois de alguns segundos contemplando sua própria imagem refletida naquele pedaço de vidro se levantou e fechou as cortinas, vi a luz apagar, provavelmente logo depois se deitou e tirou uma curta mas boa noite de sono.

- Boa noite !

Eu disse baixinho em minha janela enquanto se preparava para observar os outros, todos tinham ido dormir, alguns homens desocupados que julgo chegarem de um longo dia de trabalho assistiam televisão vendo canais inúteis da televisão, crianças não queriam dormir e mulheres tentavam ter uma boa noite de sono fugindo dos olhares de seus maridos. Na rua poucas pessoas se arriscavam a andar na rua iluminada apenas pela luz dos postes e faróis de carros que dirigiam a toda velocidade loucos para voltar para casa depois de um dia difícil e cansativo.

Mulheres loiras, morenas, pais de família, bêbados e desabrigados, observei todos em uma só noite e ninguém suspeitará de nada, sei que era invasão de privacidade e coisa assim, mas não tinha nada a perder, eu morava em um lugar tão escondido e vagabundo da cidade e em um apartamento tão pequeno por um motivo: eu tinha fugido da prisão ao qual fui enviado por um crime que nunca cometi, um assalto a mão armada com mascarás e houve até um assassinato, o plano do único bandido foi simples mas eficaz para me enviar a mais de 20 anos de cadeia. Tinha sido o último a entrar em uma lojinha de conveniência, o bandido entrou na loja e desceu 5 tiros no dono da loja, em seguida mal percebi um carro perseguindo o meu até em casa, como fui o último a aparecer nas câmeras da loja antes do bandido os policiais bateram na minha casa, checaram meu carro e acharam uma coisa que nem eu sabia que estava lá: a arma usada no crime contendo apenas 1 bala, um silenciador e a roupa do bandido foi queimada perto do meu carro, como os policiais de onde eu vivo não investigam, preferem usar coisas óbvias, por tribunal fui indicado a mais de 20 anos, mas felizmente como a justiça me prendeu facilmente eu pude fugir facilmente pulando o muro depois de um de um descuido dos guardas. Vivo em um apartamento pobre e barato ao lado de um de pessoas que levam uma vida normal, trabalho em um pequeno mercado fingindo ser quem não sou, ninguém saberia que David na verdade não era meu nome verdadeiro, e sim Maurício, um dia tive uma vida normal. Se você quer culpar alguém pelo meus pensamentos cruéis culpe a prisão, ela me libertou os meus sentimentos mais obscuros.

Depois de anotar tudo no meu pequeno caderno guardei ele dentro da gaveta junto ao meu binóculo e peguei uma pequena câmera digital, coloquei no modo vídeo e gravei tudo o que estava no meu apartamento, quando cansei simplesmente vaguei até a janela novamente e gravei a rua enquanto dizia:

- Então mais uma noite comum gravada por um homem incomum !

A luz ajudava a câmera que gravava uma área escura, e como sempre tentei gravar apartamentos, mesmo que o zoom da câmera não fosse bom. Apartamentos de baixo, todos já tinham fechado janelas e cortinas, ás vezes podia observar pequenas sombras de pessoas e animais se movendo, fui subindo com a câmera. Quarto aceso, quarto apagado, todos seguiam uma pequena ordem, alguns nem habitados pareciam afinal... a cada apartamento que subia um frio batia em minha espinha como se eu fosse alertado por mim mesmo a não fazer isso, iria me arrepender com certeza, como quando você está em um site da internet e clica em um link desconhecido que suspeita ser um vírus ou um site pronto para lhe pregar um susto, assim me sentia, como se não tivesse de ir adiante com aquela gravação. Quarto de cima, gravei, outro quarto acima, gravei. Até que cheguei ao penúltimo andar, o que vi na janela me fez a espinha e uma vontade enorme de se jogar, meu cérebro balançou parecendo que meu mundo estava mudado, a partir de quando eu vi aquilo a minha insegurança aumentou e meus medos vieram a minha mente novamente, como no momento que fui preso em frente a minha casa com todos os vizinhos me observando. O que eu vi foi alguém me observando, parecia ser homem, binóculo em uma mão e câmera em outra direcionados a mim, ao ver que tinha lhe percebido acuou para trás e eu fiz o mesmo. Desliguei a câmera e joguei sobre o criado mudo e fechei a janela e cortina, deitei em minha cama e fiquei olhando fixamente para o teto pensando em que diabos alguém estaria me observando.

Batidas vieram do outro lado da parede me fazendo de curiosidade agarrar minha câmera e ligar ela novamente, a encostando na parede enquanto fazia o mesmo com meu ouvido. Alguém batia na porta da vizinha tão forte que aposto que todos do hotel podiam ouvir, mas acho que ninguém se importava. O som de uma porta se abrindo, sem conversa, sem nada, apenas ouvi minha vizinha perguntando:

- Quem é você ?

E alguém entrando no apartamento, contra a vontade dela pensei, ouço os passos pesados e a porta se fechando, será que ela tinha um amante ? Um namorado ? Se bem que nunca vi ela com outro homem... mas o que ouvi foi pior, um grito no início tentando ser alto em seguida abafado por alguma coisa presa em sua boca, nada ouvi mais, apenas um silêncio profundo e o som de algo pesado caindo no chão.

Para falar a verdade vejo problemas mas procuro não me envolver mesmo que eu possa de uma maneira ajudar... cruel ? Não ! Era apenas uma maneira de não ser reconhecido, ás vezes quando você tenta fazer o bem o resultado nem sempre é tão bom, e bem, achava que o que tinha ouvido era nada de importante, então deitei em minha cama e fechei os olhos tentando dormir, enfim eu consegui.

Novo dia, nova vida ! Levantei da cama sonolento, vaguei em direção ao banheiro onde escovei meus dentes, lavei meu rosto e penteei meus cabelos espalhados pela cabeça, me arrumei para trabalhar, mas antes de sair peguei a câmera de cima do criado mudo. Fora do meu apartamento chequei se a chave ainda estava embaixo do vaso de plantas ao lado da minha porta, aquela cópia era essencial se eu perdesse a chave, sai e desci pelas escadas escuras até a portaria ao qual estava abandonada. Sai do prédio e sorri a todos que passavam, a mulher loira que observei outro dia e seu marido arrogante, a uma mãe que levara os filhos ao colégio e observei outro dia, seus cabelos eram ruivos e olhos incrivelmente castanho, sorri até para um homem que já estava bêbado logo pela manhã, mas quando passou um homem com cabelos negros e uma barba rala por mim senti algo estranho, como se já tivesse o visto antes mesmo sabendo que não, talvez fosse ele que tinha visto ontem me observando no binóculo, ou talvez não... estava com a câmera e depois iria checar...

Fui até o mercadinho e passei quase todo o dia atendendo clientes, alguns simpáticos, outros apressados e outros arrogantes. Trabalhava com Lisa e Sabrina, e também o dono daquilo ali: Rodrigo, um homem magro e com camisas abotoadas até o pescoço, já Lisa e Sabrina eram diferentes, Lisa com cabelos negros e olhos verdes, Sabrina era loira e olhos castanhos, um nariz um tanto estranho mas não era feia. Elas papeavam, perguntei:

- Lisa, você está com seu laptop ?

Ela me olhou com os olhos brilhando e disse:

- Sim, está nos fundos, perto da despensa...

- Posso usar ?
- Claro...

Eu fui em direção aos fundos enquanto ouvia uma risadinha fina das duas atrás de mim, mas não me virei. Entrei na despensa e o laptop estava lá, ligado na tomada sem acesso a internet, mas o que queria ver era uma coisa: o vídeo que gravara do homem que me observou na noite passada. Tirei a câmera e um cabo do bolso e conectei ao laptop, logo a tela iluminou a mensagem de reconhecimento de um dispositivo, cliquei na pasta e havia vários vídeos que grava das pessoas dos prédios ao lado do meu, as vezes gostava de perseguir as pessoas escondido até o prédio delas e elas nunca me viam. Cliquei no último vídeo e diminui o som, a imagem da câmera girando pelo meu apartamento era vista, logo após gravação de janela por janela, o som dos carros passando pela rua, e logo após a imagem foi subindo aos poucos, gravando sem muito foco cada janela ao qual passava e click... pausei a imagem no exato momento que o homem aparecia. Lembrei da aparência do que vi na rua, achava que era ele, tinha certeza, mas fui analisar e não era, o do vídeo parecia ter o cabelo com detalhes loiros. Com certeza não era ele !

O dia acabou como qualquer outro, o mercado fechou quando estava escurecendo e voltei caminhando sozinho para casa e sem medo, naquele dia não fora incomodado por ninguém, mas tinha a enorme sensação que alguém estava me seguindo que perdi a coragem até de olhar para trás, entrei no meu apartamento correndo e subi as escadas. Fui tirar a chave para abrir a porta mas apenas apertei o trinco para baixo e ela misteriosamente se abriu, alguém tinha achado minha chave e aberto... andei checando cada cômodo com cuidado para que meus passos não fossem muito barulhentos, o último que restará era meu quarto, fui me aproximando com cuidado, meus passos pareciam fazer muito barulho e um simples movimento parecia durar mil anos, andei devagar, empurrei a porta e... ninguém ! Suspirei aliviado, mas alguém havia estado lá, lembro de ter trancado a porta antes de sair... olhei no meu criado mudo, o caderno não estava lá, comecei a entrar em desespero, meus segredos, alguém roubou por que sabia que era importante... procurei em todos os lugares, embaixo da cama, encima, no criado mudo, até banheiro... mas resolvi olhar no guarda roupa, abri fortemente e algo caiu em cima de mim me derrubando, levantei assustado e olhei para o que estava no chão e que tinha me derrubado: era o corpo da minha vizinha !


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