Dezoito anos. Faz dezoito anos que eu não vejo meu pai. Bom, para falar a verdade, eu nunca o vi antes. Sempre morei com a minha mãe e nunca o conheci. Toda vez que a perguntava sobre ele, ela desconversava. Tudo o que eu sei sobre ele é que é italiano e perigoso, já que segundo minha mãe, esse foi o motivo dela ter se afastado dele.

Agora, depois de dezoito anos sem nunca ter falado comigo, ele de repente aparece na minha casa querendo conversar. Queria ficar com raiva, mas não conseguia, pois sabia que se não fosse pela minha mãe ter fugido para longe dele, provavelmente eu teria uma maravilhosa vida ao lado do meu pai.

Ah me desculpe, esqueci-me de me apresentar. Meu nome é Catarina, fiz dezoito anos recentemente no dia quatro de setembro, mês passado. Tenho um metro e sessenta e oito centímetros de altura, sim, eu sei que sou baixa. Cabelos longos e castanhos, assim como os meus olhos. Ou seja, sem graça o quanto possível. E nem vamos falar do fato de eu andar feito uma pata.

Enfim, voltando ao assunto. Meu pai que eu nunca conheci apareceu para mim dizendo querer recuperar o tempo perdido. É uma longa história e para vocês entenderem, devemos voltar um pouco no tempo.

Nasci em Brasília, Brasil. Minha mãe é do Paraná, mas nunca teve o sotaque sulista que as pessoas costumam imitar. Moro em um pequeno apartamento em um bairro calmo desse movimentado Distrito Federal. O nome da minha mãe é Luna, ela sempre trabalhou bastante para nos manter e apesar de certas dificuldades, nossa vida é boa.

Como disse antes, nunca conheci meu pai, apenas sei que ele é italiano, e por ironia do destino talvez, fui para uma escola de mesma origem. Não gostava muito da escola e das pessoas de lá, sempre as achei metidas demais, mas no meio de tanta arrogância, ainda havia pessoas que se salvavam, e essas pessoas eram minhas amigas.

Carolina e Elena, duas das três pessoas que eu mais zelo em todo o mundo. Já demos muitas risadas juntas e também derramamos muitas lágrimas, mas sempre continuamos unidas.

Ao pensar nelas, lembrei que havia prometido entregar à Carolina, o nosso trabalho de português para ela ver como ficou. Peguei o trabalho em cima da minha escrivaninha e coloquei dentro do caderno. Olhei-me no espelho para ver se tudo estava certo, ajeitei o cabelo, peguei minha bolsa, coloquei no ombro e saí do quarto. Encontrei com minha mãe na cozinha e me despedi dela, coloquei os fones de ouvido e comecei a ouvir a música I Love You da 2NE1.

Fiz meu caminho normal até a escola, sem nenhum imprevisto ou coisa do tipo. Chegando lá, fui até a porta da sala que já estava aberta, entrei e sentei em meu lugar. Entreguei o trabalho à Carolina que senta ao meu lado e tentei prestar atenção na aula, estava morrendo de sono. Maldita internet!

As três primeiras aulas passaram rápido, durante o intervalo conversei um pouco com minhas amigas e voltei para sala, a próxima aula seria de Geografia. O professor era chato, assim como a matéria, mas para minha sorte essa aula também passou rápido, assim como a seguinte.

Na hora da saída, o portão estava bastante movimentado como sempre, mas havia algo diferente naquele tumulto. Geralmente as pessoas se espalham quando saem da escola, mas agora elas parecem admirar algo.

Fui abrindo caminho na multidão pedindo licença e pisando em alguns pés, quando finalmente consegui sair da escola, fiquei surpresa e com medo ao mesmo tempo. Havia um carro estacionado do lado de fora da escola, mas não era qualquer carro, óbvio. Era uma limusine preta, com vidros totalmente pretos, e cercada por homens com ternos da mesma cor. Percebi que um dos homens ao ver-me, abaixou-se na altura da janela do carro e esta logo se abriu, não pude ver quem estava lá dentro, mas parecia ser alguém importante. O homem, provavelmente um segurança, falou algo para a pessoa dentro do carro. Fiquei apavorada.

O mesmo homem aproximou-se de mim me fazendo tremer de medo, olhou-me olhos e disse:

– Por favor, entre no carro.

Colocou uma mão em minhas costas e me guiou até a porta do veículo. Pensei em dar um chute no cara e sair correndo, mas provavelmente seria pega. Não tinha a menor ideia do que estava acontecendo, eu deveria provavelmente não entrar naquela porcaria de carro e chamar a polícia, mas algo me dizia para não fazer aquilo e descobrir quem estava lá dentro, e meu instinto estava sempre certo... Bom, pelo menos na maioria das vezes.

O homem abriu a porta e eu entrei no carro. Com o coração quase saindo pela boca, olhei para o lado e vi um senhor, ele devia ter uns setenta anos, quando este viu que eu estava com medo, sorriu e me disse gentilmente:

– Não se preocupe, quero apenas conversar. – Abriu ainda mais o sorriso. – Senti sua falta Catarina.

Não estava entendo nada e agora sim eu estava apavorada.

– Desculpe-me, mas como você sabe meu nome? – Perguntei tentando ser cuidadosa com as palavras, afinal, não sabia quem era aquele homem.

– Ah, desculpe, foi rude de minha parte não ter me apresentado. Meu nome é Timóteo, - fez uma pequena pausa. - sou seu pai.

E foi assim que eu vim parar aqui, no meio de um restaurante francês com o meu pai que nunca havia visto. Ainda estava com o meu uniforme, e pelo o que Timóteo havia me dito, minha mãe sabia da minha atual localização e companhia. O que era realmente bom, pois ela tende a surtar quando não tem notícias de mim por pelo menos a cada cinco minutos, salvo quando estou na escola.

Estávamos no meio de um silêncio constrangedor quando ele decidiu falar.

– Eu sei que é repentino e você provavelmente deve me odiar, mas precisava falar com você. – Disse quando terminou de fazer o pedido ao garçom.

– Repentino realmente é, mas não te odeio. Sei que não foi sua intenção se afastar de mim. – Nesse momento ele sorriu novamente.

– Fico feliz que você me entenda.

–Mas por que vir atrás de mim apenas agora?

– Você já tem 18 anos, já é maior de idade e pode tomar suas decisões. Além do mais, vim lhe pedir uma coisa. – Fez uma pausa como que tentando encontrar as palavras certas. - Venha morar comigo na Itália.

Encarei-o por um instante tentando entender se eu ouvi certo. Morar com ele? Mal o conheço!

– Desculpe, mas eu nem te conheço direito. – Desculpei-me.

– Eu sei, mas essa é uma ótima oportunidade para nos conhecermos, certo? Você tem apenas mais três dias de aula, o que faz a ocasião perfeita para mudar-se. Itália tem ótimas universidades e é um lindo país, tenho certeza que irá gostar!

Quando ele terminou de falar, parei e pensei. Sempre quis mudar minha vida completamente e mudar de país estava nos planos, então, por que não? Sempre quis sair do Brasil e como ele mesmo disse Itália é um lugar maravilhoso e cheio de cultura, e eu como uma amante de história não podia deixar essa chance passar, quer dizer, esse homem é o meu pai! Não é como se ele fosse um completo estranho. Eu acho.

Respirei fundo e sorri.

– Eu iria adorar viver com você na Itália! Mas, eu realmente gostaria de conhecer você melhor.

Ele sorriu.

– Então vamos aproveitar esse almoço para colocar o papo em dia. Agora, se você quiser saber tudo mesmo, - Suspirou – é melhor se preparar.

Não entendi no começo, mas depois logo entendi o que ele quis dizer. Timóteo me disse sobre seu trabalho, sobre como ele lidera a família mais forte da máfia e está perto de se aposentar. Fiquei bastante surpresa, mas ao mesmo tempo várias dúvidas foram esclarecidas, como o porquê de minha mãe ter dito que se afastou dele por ser muito perigoso.

Confesso que fiquei bastante assustada, afinal, o homem a minha frente podia facilmente ter matado alguém! Mas ele era o meu pai, então daria que lhe dar créditos por isso. Além de assustada, fiquei um pouco curiosa. Explico, sou uma apaixonada pelo mundo a máfia. Não o tiroteio e o tráfico de drogas, talvez as cenas de ação dos filmes sejam legais, ok, admito isso, mas sou apaixonada verdadeiramente é pelo romantismo da coisa. As festas, o jogo político, a decorações dos lugares por onde os mafiosos passavam nos filmes, a língua (mesmo não sabendo nada), Roma, Florença, Sicília, e todos aqueles lugares que a família Corleone passou. Irônico meu pai fazer parte dessa vida. Acho que posso me considerar sortuda. Acho.

Falei para ele que não me importava se ele era o líder da máfia, isso apenas fazia-o mais legal. Novamente, não tinha certeza disso. Timóteo riu e continuou a me contar sobre a vida dele enquanto almoçávamos. Não vi o tempo passar e quando percebi, já era três da tarde.

– Acho melhor irmos, sua mãe deve estar começando a ficar preocupada. – Timóteo disse enquanto levantava-se.

Levantei-me também e segui atrás dele, indo até o carro, ele abriu a porta para mim e entrei, ele fazendo a mesma coisa logo em seguida. O carro começou se mover. Timóteo e eu conversamos enquanto não chegava em casa, nesta hora foi minha vez de contar um pouco sobre a minha vida. – nada de novo para ele, já que mesmo que eu não soubesse, Timóteo acompanhava minha vida se preocupando comigo. – Logo cheguei em casa, despedir-me e saí do carro, entrando no prédio. Teria que falar com minha mãe sobre a minha mudança de país e isso não seria fácil, afinal, sempre foi só nós duas e agora eu a deixaria, mas isso era preciso. Eu precisava sair e começar uma vida nova.

Parada em frente à porta do apartamento, coloquei a chave na tranca, girei e abri a porta, vi minha mãe sentada no sofá e ela logo sorriu quando me viu entrar.

É... Isso vai ser difícil.

Do outro lado do mundo, na Itália, um jovem rapaz loiro estava sentando em sua cama observando uma foto com um olhar pensativo. Ele passou os dedos sobre o pedaço de papel como se estivesse acariciando quem estivesse impresso alí.

– Catarina...