Era quase de madrugada quando Eragon foi até seus aposentos. Ele estava cansado, tanto da batalha quanto de enterrar seus Cavaleiros que ele mesmo treinara, e muitos outros dragões selvagens também se foram. Saphira devia estar mais cansada ainda, logo que se ajeitou dormiu. Mas ele não conseguia. Muitas coisas ocupavam a sua mente, e a principal delas era Galväne. Eragon sabia que fora o melhor a ser feito, mas matar a garota que gostava lhe trazia tanta tristeza... ele mal notou que havia mais alguém ali. Quando se sentiu Nasuada estava na frente dele. Ela sorriu minimamente.

–Desculpe entrar sem avisar ou estar aqui, mas eu achei que fosse precisar de uma amiga.

As palavras tão simples dela fizeram Eragon se sentir melhor. Ela sentou ao lado dele e o abraçou. As lágrimas caíram sem que ele percebesse e logo chorava compulsivamente. Ele tremia, e a dor era tão intensa que ele parecia que não ia mais conseguir respirar.

–Você me entende... – ele sussurrou. – Me diga como eu faço pra isso tudo parar. Como eu faço pra essa dor ir embora? – ele perguntou já sabendo a resposta.

–Ela não passa. – ela disse infeliz. – Ela sempre vai estar em algum lugar do seu coração, ás vezes ela vai parecer que não existe, mas sempre está lá. É algo que nem o tempo cura.

Ele a abraçou o mais forte que podia. Um tempo depois ele notou que não abraçava mais a Rainha, e sim seu meio-irmão Murtagh. O Cavaleiro murmurava talvez palavras para ajudá-lo ou algum encantamento, mas Eragon logo caiu no sono. Os dois outros saíram de seu quarto.

–Acha que ele vai ficar bem? – Nasuada perguntou.

–Ele precisa estar bem. Se ele não conseguir vai fingir.

–Se fizer isso irá machucá-lo.

–Talvez não aja como não machucá-lo. Ele sempre se sentirá culpado pela morte dela, se pelo que me contou realmente gostava dela.

–Só eu acho que o que vai mesmo piorar tudo para ele... – ela abaixou a voz quando chegaram perto dos quartos. – é que Arya está aqui.

–Eu também penso nisso. Ela talvez piore tudo, mas Eragon não vai dizer nada sobre isso.

Nasuada assentiu. O assunto havia acabado, mas um clima tenso se espalhou no ar. Murtagh suspirou.

–Você está brava pelo que eu fiz? – ele perguntou hesitante.

–Hã? – ela se virou para ele.

–Ah... você sabe... eu ter beijado você por pânico.

–Não, não estou brava, e eu não faço ideia do porque você estar se desculpando por isso.

Ele se encolheu minimamente.

–Não era algo que eu queria fazer...

–Não queria? – ela o interrompeu surpresa.

Agora sim ela ficou com raiva. Ela esperava que Murtagh ainda sentisse algo por ela, qualquer coisa a mais do que apenas ela ser a Rainha de Alagaësia. Digamos que Nasuada sempre gostou – na verdade amou – o Cavaleiro. Ele fora seu porto seguro quanto tudo era escuridão, é claro que se apegara á ele. Ele se mexeu inquieto.

–Eu não deveria ter feito aquilo, deveria ter achado outro modo de... eu não sei, tirá-la de sue transe.

–Não deveria mas fez, e eu não lhe culpo por isso. Mas você não queria? – ela perguntou novamente. Ele olhou para o chão e ficou em silêncio. – Não vai me responder?

Ele a encarou indeciso.

–Não, eu não queria.

Mas até ele mesmo pode perceber o quão falsas eram aquelas palavras.

–Você é um idiota. – ela disse revirando os olhos.

Tirando coragem de algum lugar ela o puxou pela gola e o beijou. Ele não ficou muito tempo estático, tratou de colocar seus braços na cintura dela e corresponder o beijo. Um tempo depois ela se afastou, meio corada e não sabia o que fazer ou o que falar. Ele beijou-lhe a testa e entrou no quarto. Ela ficou um tempo ali percebendo o que acabara de fazer então foi dormir.

[...]

O dragão branco e o dragão vermelho estavam um pouco afastados do castelo. Fírnen não estava junto, ele estava tentando conversar com Saphira. Eally havia lhe contado que havia descoberto seu verdadeiro nome, já que ele notou que ela estava diferente. Ele havia ficado diferente quando descobrira o seu nome verdadeiro. Ela parecia mais forte, mas também mais cansada. Thorn até fizera o favor de caçar para ela.

Eu gostaria de falar com ela. Parece-me que será o dragão mais poderoso que eu terei a honra de conhecer.

Provavelmente é mesmo. Mas tenho certeza que também irá querer conhecer Umaroth e os outros Eldunarís.

Ela também é o dragão mais forte que já conheceu?

Hmm... creio que não, caso não saiba eu cresci convivendo com Shruikan. Ele era um dragão poderoso.

Tenho certeza que era, afinal ele conseguira... fazer tudo isso, e usar um corpo de uma Cavaleira e um dragão ao mesmo tempo.

Isso com certeza não fora fácil.

E Saphira conseguira derrotá-los, isso é muito admirável. Eally estava mesmo encantada com o outro dragão.

Saphira seria a única capaz daquilo, ela parece ter nascido com algum dom especial. Além de ter sido a última fêmea, ela e Eragon foram capazes de derrotar Galbatorix. Isso não é para qualquer ser.

Nem você, não é? A admira por ter feito algo que nem você nem seu Cavaleiro puderam fazer.

Eu e Murtagh não pudemos fazer nada. O dragão disse infeliz.

Quando a conheceu? Digo, quando a viu pela primeira vez?

Ah... faz um bom tempo. Meu Cavaleiro e eu fomos á nossa primeira luta de verdade. Ela foi a primeira fêmea com quem eu encontrei, e era diferente de Shruikan, mas estávamos de lados opostos então lutamos. Ela era mais forte e mais rápida, mesmo depois que eu passei o seu tamanho.

Mas agora ela é maior que você, como pode?

Eu fui libertado do encanto de Galbatorix, e por uns anos eu crescia minimamente. Deve ser por isso. Eu espero que ela esteja bem.

Ela está.

Como pode ter certeza? Pelo que minha Cavaleira viu, Saphira gostava demais do dragão que matou.

Ela não o amava, o único que amou fora Fírnen. Duvido que Saphira tenha acasalado com outro dragão.

Tem certeza disso? Já se passaram quantos anos desde que ela viera para cá? Se Eragon se relacionou com Galväne obviamente Saphira tenha também se relacionado com o dragão da elfa.

Eu duvido. Thorn começou a ficar um pouco irritado.

Duvida nada. Eally debochou do outro. Sabe que isso é verdade. Qual o problema de admitir.

Nenhum. Thorn disse rosnando.

Não é o que parece. Eu diria que você está... com ciúmes. Eally disse se divertindo.

Que tolice o que diz filhote. Thorn estava mesmo com raiva.

Não me chame de filhote, sabe que eu tenho razão. Isso é sério? Então você já gostou da...

Thorn rosnou e jogou fogo nela. Depois saiu voando dali. Eally ficou confusa um pouco, e depois viu que Saphira – o glorioso dragão azul – se aproximava do castelo. Ela resolveu ir falar com a outra.

Olá. Eally disse hesitante e entusiasmada.

Oi, você é Eally, o dragão de Nasuada, ouvi falar de você. Saphira disse e fez uma ligeira reverência.

Você ouviu falar de mim? Não acredito! Eu que ouvi falar muito de você! Eally disse balançando o rabo. Eu sei que isso pode parecer estranho e eu sei o quanto está extremamente cansada, mas eu preciso saber se você já amou aquele dragão marrom que teve que matar.

Saphira ficou surpresa com aquela pergunta e de certo modo triste.

Não, eu não o amava, apenas gostava muito dele.

Você escolheu Fírnen para ser seu companheiro até o seu fim?

Sim, eu o escolhi.

O dragão branco entendeu várias coisas, então agradeceu e saiu voando, seguindo o cheiro de Thorn para achá-lo. Chegou até a praia. Haviam ilhotas um pouco afastadas, e era pra lá que ele provavelmente havia ido. Eally voou sobre o mar noturno até chegar em uma, mas não era lá que Thorn estava. Ela o achou em uma ilhota bem afastada. Ele estava perto de um lago em meio ás árvores. Ela se aproximou cautelosa. Ele levantou a cabeça mas não parecia tão amistoso assim.

Acho que estava certo.

Sobre?

Quando se escolhe um companheiro ele é para a vida toda. Eally se sentou ao lado dele que estava deitado.

Ele rosnou de leve.

Eu me apaixonei por ela. Thorn começou. Ela era minha inimiga, eu sei, mas era a única fêmea com quem eu tive contato durante anos. Mas ela escolheu Fírnen, e é claro que eu não pude mudar isso. E Murtagh e eu fomos embora...

Eu sinto muito. Eally falou.

Nossos sentimentos são fortes e intensos filhote, tem sorte de ainda não sentir amor.

Eally mexeu a cabeça e rugiu inquieta.

Eu não diria isso.

Como assim? O dragão a encarou.

Eally abaixou a cabeça envergonhada, mas mesmo assim murmurou:

Eu amo você.

Thorn ficou surpreso e calado, e isso doeu nela. Fírnen fora o primeiro macho que vira, mas ele era de Saphira e Eally ficara feliz pelos dois. Quando vira Thorn algo nela havia crescido, e com o tempo percebeu que fora o amor. Ela manteu em segredo, assim como sua Cavaleira.

Mas não se preocupe, eu o deixarei em paz. Sei o quanto gosta dela, não vou tentar lutar por você.

Ser derrotada não era algo que Eally gostasse. Mas ela sabia que ela nunca teria chances contra Saphira, e também sabia que ela nunca poderia viver junto de Thorn, assim como Nasuada sabia que não poderia ficar junto de Murtagh. Ela se levantou e começou a caminhar para longe, mas Thorn também se levantou. Ele a impediu de ir embora.

Eu falei que os sentimentos são intensos quando temos certeza de algo.

Sim...

Eu também disse que tinha me apaixonado, não que eu ainda estava.

Eally ergueu a cabeça e o encarou curiosa.

Você é tão diferente dela, que eu não consigo nem dizer. Você tem uma grande coragem, aquilo que fez hoje fora surpreendente, seu rugido foi o mais poderoso que eu já ouvi.

O dragão branco ficou ligeiramente impressionada. E uma pequena esperança cresceu nela.

Mas não sou mais forte, nem mais bela, nem melhor que Saphira.

Eally... não se ache tão inferior á ela. Cada dragão é especial de sua maneira, acredite em mim quando lhe digo que é de você quem eu gosto, que admiro e que quero ao meu lado.

Não consigo simplesmente acreditar. Está dizendo isso apenar por ter pena de mim. Ela rosnou para ele.

Eu não tenho pena de você filhote, escute o que eu digo...

Não me chame de filhote. Ela mostrou os dentes. Você a escolheu para ser sua companheira embora ela não tenha feito o mesmo. Não me iluda e não me faça criar expectativas.

Eu não a escolhi Eally...

Mas também não me escolheu, eu sei disso.

Eu a escolhi, mas não sei se sou o companheiro certo para você. Você não deve subestimar a si mesma, mas talvez eu não seja digno de ter o seu amor. Eu já fui horrível, um dragão mau e tenho certeza que não sou digno de ter alguém tão... forte e especial quanto você perto de mim. Merece algo mais do que eu.

Eally foi quem jogou fogo em Thorn desta vez.

Nós aceitamos o amor que achamos que merecemos.

O que quer dizer com isso?

Quero dizer, Thorn, que não devia se minimizar, é um grande dragão, e sempre será o mais especial e o melhor de todos para mim, não importa o seu passado.

Thorn se aproximou e Eally esfregou seu focinho no seu pescoço. Ele deu leves mordidas na base do pescoço dela rosnando baixo, mas também era um rosnado divertido. Eles começaram a andar em círculos bem pertos um do outro, tanto que poderiam tocar o rabo do outro se quisesse. Ela chicoteava de leve o pescoço dele. Ela abriu as asas para tentar parecer maior e rosnou para ele, que começou a balançar o corpo todo como se fosse atacá-la. Eles se agacharam como dois cachorros se preparando para brincar e soltaram fogo para o céu. Ele esfregou o seu focinho do dela.

Melhor dormir, logo vai amanhecer e talvez vão precisar da nossa ajuda.

Ajuda? Ela disse em tom de deboche.

Vá dormir filhote.

Não me chame de filhote.

Mesmo assim ela se encolheu como uma bolinha e se deitou. Não é como se sentisse a necessidade de acasalar com ele naquele momento, sentia... carinho. Muito carinho, e amor pelo outro. Ele se deitou ao lado dela e cobriu-a com uma de suas asas. Ela se aconchegou em sua barriga quente.

Thorn?

Sim?

Acha que há futuro para nós dois?

Ele voltou a cabeça para ela que fez o mesmo. Ele tocou de leve em seu focinho, talvez aquilo fosse um “beijo de dragão” ou apenas um afeto, um modo e montar que tudo ficaria bem.

Nós faremos nosso próprio futuro, e eu juro, que se for preciso eu forçarei Murtagh a se tornar Rei para que eu fique ao seu lado.

Eally rosnou baixo com as palavras.

Talvez não precise forçá-lo.

Talvez não. Agora durma filhote.

Não me chame de filhote. Ela resmungou, mas não estava irritada na verdade.

Ok... filhote...

Ela rosnou levemente. Um pouco antes de Thorn dormir, ele sussurrou “eu te amo” na língua antiga. Ele não se importava se ela estava dormindo e se não tivesse ouvido, era o que ele sentia. E faria de tudo para que os dois tivessem um futuro juntos.