Contos de Redenção- Prólogo escrita por Tiagobm


Capítulo 5
Iniciação


Notas iniciais do capítulo

Boa leitura.



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No dia seguinte ao fim dos meus treinos, não precisei me preocupar com o meu antigo horário rígido, pois, segundo Heleno, estava tendo meu merecido descanso. Acordei sem saber em que parte do dia estava, se bem que, vivendo no subterrâneo sem sol sempre era difícil ter noção do tempo.

Saí do meu quarto, mas, ao invés de encontrar o esconderijo de sempre, vi que tudo estava escuro, como se todas as lamparinas tivessem se apagado de uma vez só. Com exceção de uma trilha formada por velas em fileira, meu lar estava um breu. Havia algo errado ali.

Voltei ao meu quarto correndo, peguei a adaga dada por Heleno que guardava em baixo do travesseiro e vesti meus trajes cinza.

Com a adaga em mãos, segui a trilha, fazendo a menor quantidade de barulho possível. Percorri o caminho até terminar em uma sala onde nunca havia estado antes.

Como não havia mais velas, tudo estava escuro. Porém, preferi não tentar acender nenhuma luz ou carregar uma vela para não chamar atenção de quem quer que pudesse estar por perto.

Entrei no quarto e, assim que dei alguns passos, a porta se fechou com um baque forte. Consegui me segurar para não gritar e destruir o meu elemento surpresa.

Quando tentei empurrar a porta e ela não se abria, percebi que eu não tinha o elemento surpresa. Era uma armadilha, e eu havia caído.

Sem saber em que parte do cômodo desconhecido eu estava, andei com cuidado segurando a adaga na frente do meu corpo, na direção para onde eu seguia, em busca de uma parede.

Enquanto me mexia, o assoalho rangia atrapalhando minha concentração. Até que eu percebi algo estranho com esse som, ele parecia... Descompassado. Parei de me movimentar e de repente, comecei a suar frio. O barulho continuava.

Dei um impulso para trás, o mais rápido possível, me virando para a direção contrária. Havia mais alguém comigo na sala. Se eu não achasse quem estava "me fazendo companhia" eu estaria com problemas. Era pegar ou ser pego.

Poderiam ter se passado minutos, ou horas, eu não saberia a diferença. Enquanto os rangidos pareciam vir de todos os lugares, a parede que eu tanto procurava não se mostrava.

Com o tempo, eu já começava a fazer força para não ter uma respiração ofegante e mostrar minha presença. Pode não parecer, mas, caminhar sem fazer barulhos gasta muita energia já que manter um apoio do seu centro gravitacional e manipular os acúmulos de força do impacto de seus passos exige esforço muscular.

Eu estava totalmente alerta quando escutei um baque fraco no assoalho na minha diagonal. Imediatamente tive o impulso de correr naquela direção munido com a adaga.

Mas, eu já não era o mesmo. Depois de ter sofrido tantas vezes por ser descuidado, irresponsável, tonto, escolha a palavra se quiser, eu havia passado a ser muito mais cauteloso.

Contive meus instintos e respirei fundo, seria aquilo uma armadilha? Se eu ignorasse o barulho, quanto tempo ficaríamos naquela caçada às escuras? Ou melhor, quanto tempo eu aguentaria antes de perder as forças?

Tive então uma ideia da qual me orgulho muito. Ao invés de seguir ao barulho, joguei minha adaga em sua direção, tomando cuidado para que ela, propositalmente, fizesse barulho, e agarrei meu colar. Isso mesmo, não me desfiz da joia que quase custou minha perna. Depois de tudo o que eu tive que passar, imaginei que vende-la seria um desperdício, acabei transformando ela então meu colar da sorte.

Não se passaram nem dez segundos quando eu escutei um barulho alto do meu lado. Sem esperar por mais nada pulei na direção do barulho golpeando com meu colar. Eu sei, pode parecer estranho bater em alguém com uma joia, mas esse cristal era muito duro, e pontudo. E sair dando golpes às cegas com uma arma potencialmente mortal não me parecia a melhor das ideias.

Eu estava em cima de algo não muito maior do que eu, o que quer que fosse, não resistiu muito após a terceira pancada. Sinceramente, eu não tinha a mínima vontade de ficar perto daquilo. Decidi sair de perto antes de qualquer possível reação. Desci de cima do que eu imaginava ser uma pessoa e tateei o chão em busca de minha arma

Quando a achei, andei em busca de uma parede para descansar as costas e comecei a pensar em como sair dali, até que uma nova porta de se abriu. Atrás dela estava mais uma fileira de velas.

A primeira coisa que tentei fazer foi pegar uma vela para iluminar a sala escura e ver o que eu havia derrubado. Mas, ao encostar minha mão na cera, ela foi repelida instantaneamente. Por isso, presumi que ela estivesse sob algum tipo de encanto. Quem estava fazendo aquilo pensou muito bem no plano.

Tudo o que pude fazer então foi seguir a nova fileira de velas que me levou a uma nova e muito pequena sala, dessa vez iluminada. Ao chegar nela, mais uma vez a porta se fechou atrás de mim.

Eu avistei outra saída do outro lado do local, mas esta estava fechada e, provavelmente, trancada, assim como esteve a primeira. No centro do pequeno cômodo havia uma mesa com frascos de diferentes cores e um papel entre eles.

Cheguei mais perto para observar melhor e, ao levantar um frasco para retirar o papel, o chão estremeceu. Olhei assustado para o bilhete e lá dizia:

"Beba, ou morra tentando".

De repente, quase teatralmente, as paredes começaram a se aproximar gradualmente, e de suas superfícies, antes lisas, passaram a sair pequenas lâminas. Seria aquilo minha mente pregando-me uma peça? Não, outra armadilha. O pânico tomou conta de mim e quase tomei o primeiro líquido que vi pela frente.

Mas ao levar o fluido à minha boca senti um cheiro familiar. Era veritóssum, um tipo de veneno muito perigoso. Atirei o frasco contra as lanças que se aproximavam cada vez mais.

Busquei em minha mente todas as informações sobre venenos que havia aprendido com Sebastian em nossas exaustivas aulas teóricas. Haviam mais quatro frascos, eu esperava que algum deles não tivesse veneno. Não vou fingir que fui corajoso ou engenhoso. Se eu não estivesse muito ocupado salvando minha vida eu estaria provavelmente molhando as calças.

Tentei fazer uma eliminação rápida antes que as lâminas chegassem a mim:

O primeiro era rosa, coloquei umas gotas em cima do papel e ele se corroeu. Veneno de mandrágora concentrado.

Caso você nunca tenha visto uma mandrágora, eu te considero uma pessoa de sorte. Essas malditas plantinhas podem parecer inofensivas, mas, uma vez que a pessoa entra em contato com seu veneno, ela ingressa em um processo de morte lenta enquanto as raízes da mandrágora penetram no corpo e sugam seus nutrientes.

O segundo continha uma substancia azul, coloquei meu dedo de leve dentro do frasco e o levei a boca, era doce. Extrato de veneno alquímico.

O terceiro frasco tinha um líquido preto em seu interior, derrubei um pouco em cima da mesa e encostei nele com meu dedo indicador para depois esfregá-lo com meu dedão, era viscoso. Veneno do tipo mais barato e comum.

As paredes estavam a centímetros de meus braços quando retirei o quarto frasco. O líquido era transparente e límpido, como a água. Maldição, no fim das contas tudo parece com água!

Não conseguia pensar em nada, seria aquilo álcool, acetona? As paredes estavam perigosamente perto quando pensei "Pro inferno com isso!" e bebi o líquido antes que eu fosse esmagado. Era água.

Engraçado não? Não, é engraçado porque não era você que estava prestes a morrer seu pequeno sádico. E depois eu sou o maluco.

Depois de ter tomado todo o líquido do frasco, a porta do outro lado se abriu. Não tentei entender as conexões mágicas que faziam aquilo funcionar, tentei sair da sala inteiro.

Corri até a saída e, no caminho, fui arranhado por uma das lâminas, mas consegui chegar ao outro lado. Tirando o corte no braço direito eu havia me saído bem.

Não me surpreendi ao ver outra trilha de velas, eu simplesmente segui o curso destas. Dessa vez fui levado a um quarto vazio e bem iluminado.

Já estava avançando quando senti algo em meu pé enquanto andava. Olhei para baixo e meu sangue gelou, meu pé estava em um fio de seda firme e quase invisível, quase como uma teia. Olhei em volta e percebi que a sala inteira estava coberta de fios.

Aquilo tudo tratava-se de uma armadilha muito bem bolada, todos os fios se interligavam e, quando um deles fosse acionado, o sistema inteiro desencadearia uma explosão ou algo do tipo.

Recuei meu pé com todo o cuidado, eu podia ter me saído bem com os venenos e no combate às cegas, mas esse tipo de armadilha realmente não era o meu forte.O pouco que sabia era que, se quisesse destravar a armadilha de fios, teria que destruir a matriz do sistema sem ativar seus componentes. Entretanto, não sabia onde ela estava nem como eu passaria por todos os fios para destruí-la.

Enquanto eu pensava no que fazer, de repente, eu notei um arco apoiado no canto da parede. Isso era suspeito, suspeito de mais. Mas eu não conseguia pensar em nada e, depois de tudo isso, eu estava cansado demais para dar a mínima para o meu senso de cautela.

Peguei o arco, mas só achei uma única flecha, o tiro teria de ser preciso. Certo, problema de como destruir a matriz resolvido, eu só precisava destruir um pequeno dispositivo, o qual eu não sabia onde estava, com um único tiro certeiro. Simples não?

Pensei, pensei e pensei, mas nada me ocorria, me sentei no chão com dor de cabeça de tanto pensar em uma forma de resolver o problema.

Enquanto descansava, pensei ter escutado alguma coisa, por isso, levantei na mesma hora e olhei para baixo. Eu estava simplesmente sentado em cima de um dos fios. Respirei por um momento e agradeci ao deus dos fios que não rasgam.

Não podia acreditar na sorte que tivera, se o fio tivesse rasgado, eu provavelmente estaria morto agora. Mas, depois de me acalmar do susto, algo passou por minha mente.

Aproximei-me do fio no chão e, com muito cuidado, toquei de leve neste. O fio vibrou e escutei um barulho agudo vindo do fundo da sala. Mas é claro, os fios se interligam! As vibrações, dessa forma, deveria se repercutir por todo o sistema.

Mal acreditando na minha própria sorte, repeti o processo várias vezes até localizar o pequeno gancho de metal do lado do que mantinha os fios esticados. Se eu conseguisse fazer com que o gancho fosse ao chão, os fios não ficariam mais eretos e não haveria perigo de ativar a armadilha. O real problema era que ele se encontrava no outro extremo da sala, distante demais.

Segurei o arco com sua única flecha de madeira e ponta de ferro e mirei com cuidado no gancho. Antes de atirar respirei fundo várias vezes e me concentrei para tentar atirar tão bem quanto Pheu atirava em minhas aulas. Apesar de todo o treino, eu não era um especialista em arcos.

Após toda a preparação, soltei a corda presa entre meus dedos e vi a flecha acertando o gancho e retirando-o da parede. Eu havia conseguido. Ou era isso que eu pensava.

Parece que eu havia acertado um fio junto com o gancho o que resultou em um dardo indo em direção ao meu peito, seu eu não tivesse desviado o tiro teria sido mortal, mas, felizmente, ele acertou apenas meu braço esquerdo.

Continuei andando, dessa vez em um ritmo mais acelerado, quando, ao passar pela porta, senti uma pontada de dor no braço onde eu havia me ferido com o dardo.

Observei melhor o ferimento e percebi que saía uma espécie de pus. Maldição! Eu havia sido envenenado. Não sabia quanto tempo demoraria para que o veneno fizesse efeito, por isso, devia agir rapidamente.

Continuei a seguir as velas, me controlando para não correr e espalhar o veneno pelo corpo mais rapidamente. Quando a trilha de velas acabou, eu fui parar em um cômodo totalmente escuro.

Não sabia que desafio me seria imposto agora, mas eu já começava a ficar tonto em função do veneno. Diferente das outras vezes, sem mais nem menos, o local ficou mal iluminado por luzes verde-claras vindas do que pareciam ser cristais.

Já me preparava para o próximo obstáculo quando uma voz familiar começou a falar, em conjunto com sua voz, silhuetas escuras apareciam de todos os cantos:

–Seth Taresmin, você completou todas as etapas de sua iniciação em nossa irmandade. Sozinho você demonstrou aptidão nas habilidades que prezamos mais necessárias para chegar até aqui.

Eu estava surpreso ao ser chamado junto com meu sobrenome, podia contar nas mãos o número de pessoas que conheciam esse nome. Tive certeza de minhas suspeitas ao ver uma das silhuetas encapuzadas dar um meio sorriso e nele mostrar um dente de ouro, só podia ser Perry, eu reconheceria aquele dente adquirido à força em uma briga de bar em qualquer lugar. Não pude evitar sorrir, era tudo apenas mais um dos testes de Heleno.

Eu realmente estava preocupado com eles, achava que havia algo acontecido a todos. Mas todas as minhas preocupações sumiram enquanto uma voz familiar falava em tomo solene:

"... E por esses e outros motivos eu e o restante do conselho reconhecemos Seth Taresmin como o mais jovem integrante da Irmandade até hoje. Agora a questão é: Você aceita e promete trilhar os sombrios caminhos que nosso seleto grupo lhe mostrar? Sempre arriscando sua vida pelos interesses de nossa família?".

–Sim, eu aceito e prometo. - Respondi tentando esconder o entusiasmo. Vários risinhos soaram nos cantos. Bem, acho que nunca fui bom em esconder entusiasmo.

–Então a partir de hoje você será conhecido como Seth, O prodígio por sua entrada antecipada em nosso grupo.

Após isso, as luzes se intensificaram e os vultos foram tirando, um a um, seus capuzes e revelando suas identidades. Todos estavam lá, Pheu, Perry, Heleno, Lílian. Ao olhar para ela notei algo estranho: ela estava com um ferimento na cabeça. De repente algo me ocorreu. Teria eu lutado com ela na sala escura?

Antes que qualquer um pudesse vir me cumprimentar ou fazer qualquer outra coisa, eu senti uma pontada de dor no peito e tudo começou a ficar escuro.

Eu havia esquecido o veneno...


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