Para Lembrar escrita por Beatriz Dionysio


Capítulo 19
Medo


Notas iniciais do capítulo

Sinto muito pela demora. Estou conseguindo voltar a escrever aos poucos.
Aguardo ansiosamente os comentários.
Obrigado.



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O som de risos era o melhor som com que eu poderia acordar, abri os olhos e encontrei Claire e Mason em uma batalha de cosquinhas.

– Veja quem acordou Car. – a felicidade na voz dele me trouxe sensações que a muito estavam perdidas. Não pude deixar de sorrir ao fitar o homem em minha cama. – Algo me diz que talvez ela também precise de algumas cocegas. O que acha Car?

– Definitivamente!!! – minha pequena estava vermelha e extremamente risonha quando se atirou contra mim.

E foi assim que minha manhã começou.

Enquanto Claire assistia TV, Mason e eu cuidávamos do café. Ainda não havíamos dito nada, mas não era preciso palavras, não quando ele me olhava daquele jeito. Era estranho e frustrante ter a certeza de que apenas ele, aquele que destruíra meu coração, podia trazê-lo de volta a vida.

– Você esta muito quieta. Preciso ficar com medo?

– Não. – respondi, enquanto virava os ovos. – Na verdade...

O som de meu celular me interrompeu, talvez eu apenas devesse deixa-lo tocar.

Vendo minha indecisão Mason disse – Tudo bem, estarei aqui quando acabar.

Posso ter vacilado quando ele gentilmente acariciou minha bochecha. Balançando a cabeça para clarear meus pensamentos insanos, corri para meu quarto.

– Alô?

– Erin? Erin Everly?

– Sim?

– Sou Holly Baker, Jorge me passou seu número, espero que não se importe. – Baker, a garota interessada nas aulas de Ballet.

– Tudo bem. – com todos os últimos acontecimentos acabei me esquecendo de ligar para ela. – Sou eu quem devia ter ligado.

– Não se preocupe com isso. Estou na cidade e achei que talvez pudéssemos nos encontrar, o que acha?

– Claro, seria ótimo.

Depois de marcar um ponto de encontro desliguei e corri para a cozinha. Holly parecia uma boa garota e eu estava excitada com a ideia a conhecer.

Encontrei Mason no sofá com Claire, assistindo Bob Esponja, ele ria tanto quanto ela. Seus olhos se voltaram para mim, fazendo com que eu estremecesse.

– Tenho uma nova entrevista hoje.

– Isso é ótimo.

Um pensamento repentino surgiu.

– Car, o que acha de irmos conhecer alguém hoje? – seus olhinhos voltados para mim, já brilhavam com a expectativa de conhecer alguém.

– Podemos tomar sorvete depois?

Rindo disse a ela que sim.

Mason provavelmente pensava que a tal pessoa seria Holly, ignorando o sentimento de culpa, me arrumei enquanto ele dava banho em Car.

Vestido. Sapatos. Perfume. Bolsa. Bolsa! Onde ela...

– Procurando por isso?

Mason me olhava do outro lado do quarto, segurando minha bolsa surrada. Caminhei até ele e a peguei, evitando olha-lo nos olhos. Ele não entenderia. Derek não entenderia, mas tinha de ser feito. Eu tinha de fazê-lo.

– Ei! – disse ele, gentilmente segurando meu queixo, fazendo com que eu o olhasse. – Algo errado?

Eu ainda não sabia como lidar com a aproximação repentina dele. Era desgastante ter sentimentos tão contraditórios pelo homem que amo. Ao passo de que ama-lo e querer mata-lo ao mesmo tempo não fosse grande coisa.

– Estou bem. Tudo esta perfeitamente bem. – o sarcasmo em minha voz me surpreendeu.

– Droga Erin, eu já disse que sinto muito.

– Você sente muito? – o riso me escapou, frio e sem vida. – Ah claro, me desculpe Mase, não pretendia ferir seus sentimentos.

– Eu só... Deus Bu. Estou tão cansado, cansado de ser um canalha, cansado de ter medo, cansado de brigar e...

Ele me envolveu em seus braços e por um segundo, apenas por um segundo, esqueci tudo. Tudo o que havia sido dito, tudo o que acontecera, todas as lágrimas e toda a dor. Mas então esse segundo se foi, levando com ele minha insanidade.

– Eu preciso de espaço. – sussurrei. Os sentimentos em mim eram tão confusos, por que tudo tinha que ser tão confuso. A equação era simples, mas do que simples “Garota ama garoto. Garoto ama garota”, por que nós, pessoas tínhamos que complicar tudo?

Dizendo isso, passei por ele, chamei Claire e deixei meu apartamento.

***

– Erin?

Agora enquanto dirigia até o hospital, a ideia já não parecia tão boa. O que eu diria a ela? Ei Car esta é a sua mãe?

– Erin?

O toque dela em meu braço me trouxe a tona novamente.

– Sim querida.

– Vamos tomar sorvete, certo? – assenti e ela continuou -, então estava pensando, ... já é quase hora do almoço, o que acha de comermos um Hambúrguer?

– Claro. – respondi enquanto estacionava o carro.

O medo instalou-se em mim. Como ela reagiria?

– Oi Erin!

Deus! Dando o melhor sorriso que pude, esperando que ele não parecesse tão falso quanto era, virei-me para a voz de Barbara, a enfermeira oxigenada que insistia em flertar com Mason na última vez em que estivemos aqui.

– Olá, Barbara não é mesmo? – falei, vendo o sorriso dela falhar.

– O que a trás aqui?

– Vim visitar minha irmã.

– Ah claro. – seus olhos, verdes e sinistros como os de um gato, recaíram sobre Claire, que distraída olhava o local. – Você já conhece o caminho.

Trazendo Claire comigo, caminhei confiante até o quarto de Blair.

Quando entramos, a peguei no colo, e então me sentei com ela na velha poltrona laranja ao lado da cama de minha gêmea. Claire observava, estudando-a.

– Diga olá a Blair Car. A verdadeira Blair.

– Olá Blair. – ela sussurrou, um tanto acanhada. – Por que ela se parece conosco?

– Por que ela é minha irmã gêmea amor. – o franzir de suas sobrancelhas não era certo, não para alguém tão pequeno como ela. Talvez aquilo fosse um erro e...

– Ela é minha mãe, não é?

Suas palavras tanto me assustaram quanto me trouxeram certo alivio.

A abraçando mais apertado, sussurrei – Sim Bu.

– E por que ela não corda?

Ai estava a pior parte. Como explicar a uma garota de sete anos que sua mãe havia sofrido um acidente de carro, e que este lhe deixara em coma nos últimos seis anos.

– Porque ela não pode.

– Como a Bela adormecida?

– De certa forma.

– Então por que papai não a beija?

Um sorriso triste e melancólico tomou minha expressão. Se beijos de amor verdadeiro resolvessem tudo, o mundo estaria bem melhor. Ou talvez ainda pior, já que muitos não reconheceriam o amor, nem que este os acertasse na cara, enquanto outros simplesmente destroem o sentimento.

– Nem tudo é como nos contos de fadas Car. Ela sofreu um acidente.

Minha pequena fitava a mulher adormecida a nossa frente. Éramos tão parecidas fisicamente que chegava a ser assustador, o mesmo nariz arrebitado, lábios cheios, olhos azuis, cabelos ruivos...

– Ela não a deixou porque quis, ela a deixou para me salvar Car.

Uma lágrima escorreu em seu rostinho pequenino, a enxugando, continuei – Sua mãe é uma heroína, e ela te amava muito, mas do que a soma de todas as estrelas do céu, multiplicadas por um milhão.

Claire se agarrava a mim enquanto olhava sua mãe.

– Você pode falar com ela se quiser.

Insegura, ela aproximou-se da cama.

– Ei mãe. – lágrimas borravam minha visão, enquanto a pequena mulher a minha frente, tomava a mão de Blair na sua. – Sinto muito por não ter vindo antes, eu só queria que você soubesse que sinto sua falta todos os dias. Eu tenho a Erin e isso é mais do que já tive. Obrigado por ter cuidado dela, ela cuida de mim e do Sam. Você deveria conhecer ele, ele não gosta de hospitais, mas...

– O que é isso?

Merda! Derek Campbell, a última pessoa que eu esperava ver hoje, estava parado na porta, me fulminando com os olhos.

– Derek eu...

– Você não tinha o direito Erin, não tinha porra!

– Meu Deus! Essa é a mãe dela.

– Claire, venha estamos indo embora.

– A não, você não vai mesmo...

Minha pequena nos olhava como se fossemos loucos. E talvez eu fosse, a trazendo aqui para conhecer sua mãe quando seu pai havia deixado bem claro que aquilo nunca iria acontecer.

– E você vai me impedir, certo? – o escarnio em sua voz, trouxe o pior de mim.

– Não seja tolo Derek, Claire esta grande o suficiente para entender que...

– Ela é minha filha, você não tem ideia do que é melhor para ela. Isso foi um grande erro Erin.

– Não acho que...

– PAREM!

Estupefata olhei para Claire, que estava vermelha, tapando seus ouvidos com suas mãos.

Agachando-me em frente a ela falei – Sinto muito Bu, não devíamos gritar perto de você.

– Não Erin, vocês não deveria gritar um com o outro.

Esta era Claire, sempre me surpreendendo com o quão inteligente e madura ela é.

– Sinto muito princesa. – falei, enquanto a abraçava.

– Eu sei, obrigado pelo que fez Só Blair – ela respondeu sussurrando em meu cabelo.

– Papai?

– Sim querida? – Derek que a pouco aparentava estar furioso, agora parecia envergonhado, assim como eu.

– Erin e eu vamos comer um Hambúrguer, você vem com a gente?

Então ele começou a rir, e eu não pude evitar também, enquanto Claire nos olhava como se fossemos loucos novamente.

– Eu adoraria.

Ela correu até ele, o beijou a bochecha, tomou uma das tulipas vermelhas que ele trazia e a colocou atrás da orelha de Blair.

Vinte minutos depois, eu fitava a janela enquanto Claire “brincava” lá fora.

– Eu sinto muito. – por fim, sussurrei.

Derek também a olhava, como se olhar a garota fosse diminuir a tensão entre nós, ou algo assim.

– Sou eu quem devia ter feito.

Eu tinha tanto a dizer, mas me faltava palavras. Por que tudo tinha de ser confuso? No começo eu era Blair, só Blair, então Derek estava lá, tão carinhoso e amável quanto misterioso; Sam se foi e a dor de perdê-lo foi tanta que me apeguei aquilo que conhecia, a uma certa garotinha de seis anos e seu pai. Então tudo mudou, tudo aquilo que acreditei conhecer tornou-se uma mentira, como amar alguém quando seu coração já pertence a outro?

– Onde ele está?

Derek me estudava com seus grandes olhos cor de âmbar.

– Como você está?

Essa era uma pergunta que talvez nunca pudesse ser respondida. Eu nunca soube exatamente como essa coisa funciona.

– Eu não sei. – sussurrei, ainda olhando Claire, que brincava no balanço.

– Estou aqui Erin, sempre estive. – talvez este seja um dos meus problemas, a sua aproximação, sua preocupação. – Ainda somos nós, lembra?

Assenti melancolicamente, eu não ia chorar.

– Às vezes o peso do mundo pode ser demais para nós mortais, mas há sempre alguém com quem podemos contar. Sempre.

Ele cuidadosamente tomou minhas mãos nas dele, aquilo era reconfortante, ter alguém, um amigo era tudo o que eu precisava agora. Sem centelhas ou formigamentos, apenas o calor de um amigo, nada mais.

– Obrigado. – um sorriso fraco formou-se no canto de meus lábios.

– Assim esta melhor. – e a recompensa foi um sorriso caloroso dele, aquele que também sorria com seus olhos de menino. – Estarei aqui se você quiser conversar.

Depois de nossa pacifica refeição, Derek voltou para a cidade e Claire e eu fomos para o meu Café preferido onde encontraríamos Holly.

Claire não dissera uma palavra no caminho, ou mesmo pediu para que eu ligasse o som. Desde o hospital, ela estava bastante calada, falando somente quando perguntávamos algo a ela. Aquilo me preocupava.

Quando entramos procurei por alguém vestido de rosa, como Holly disse que estaria, e me deparei com uma mulher pequenina que aparentava ter uns vinte e poucos anos, loira, usando um vestido salmão. Ela estava absorta em algum livro então me aproximei, esperando que aquela fosse mesmo minha candidata.

– Desculpe, estou procurando...

– Erin?

Ela rapidamente se levantou, vindo até mim e me dando dois beijos estalados, em minhas bochechas.

– Estou tão feliz que decidiu vir.

Ela era pelo menos dez centímetros mais baixa que eu, Holly parecia uma pequena fada, ou uma boneca de porcelana delicada, com seus cachos loiros e olhos grandes, extremamente azuis, e um sorriso encantador.

Uma hora depois eu sentia como se a conhece a vida toda. Holly Baker era engraçada, doce e perfeitamente normal. Claire e eu a amamos, era impossível não ama-la.

Descobri que ela acabara de se mudar para Santa Monica pois conheceu Adam, quando estava fazendo uma viajem a um ano, e agora que tinham se casado alguém teria de ceder. Ela estava excitada com a ideia de viver aqui, mesmo que isso a afastasse de seus pais.

– Sinto muito, eu falo demais. – ela parecia envergonhada.

– Não se preocupe, preciso conhecer bem as pessoas que contrato. – respondi, sorrindo ao ver o brilho de esperança em seus olhos. Holly era apenas alguém tentando começar uma nova vida, ela ainda parecia estar em sua bolha de recém-casada.

– Esta dizendo que...

– Sim. Não acho que preciso de muito mais, seu currículo é perfeito e... – não pude continuar, pois ela me surpreendeu puxando-me para um abraço.

– Obrigado Erin.

Depois de marcamos de nos encontrar novamente para assinar os contratos e formalizando tudo, Claire e eu nos despedimos e voltamos para o carro.

Ela continuou calada todo o caminho para a casa dela.

Quando paramos em frente a grande casa azul, ela praticamente pulou do carro.

– Tchau Erin.

– Tchau Car. – sussurrei, sabendo que ela já não podia me ouvir.

Melancólica dirigi de volta para meu apartamento, pensando no que diria, no que faria com relação a Mason.

Eu estava disposta a aceita-lo de volta? Estava disposta a correr o risco novamente? A dor era real, o medo era real, e eu? Eu estava aterrorizada.

Quando as portas do elevador se abriram, eu esperava encontrar Mason jogado no sofá, mas o que encontrei foi Sammy e um apartamento dolorosamente silencioso.

Ele se foi.

Agarrando o anel em meu colar, caminhei até meu quarto. Vinho e um bom banho de banheira ajudariam.

Quase cai quando vi o bilhete preso no espelho. Tremula o peguei.

“Você disse que precisava de espaço, então eu voltei para meu apartamento. Espero que saiba que isso não durará muito tempo, não quando eu não posso simplesmente fugir novamente, você é o meu lar Bu, minha casa, e é pra você que sempre voltarei.

Você pode vir até aqui. Eu estarei esperando. E se você vir, então eu saberei.

Com amor, M”

A dúvida, a incerteza e o medo corroíam meu interior. O que fazer quando você se sente quebrada por dentro? Quando se sente incapaz de dar um passo a frente porque simplesmente tem medo de cair novamente?

Poderia eu, correr para aquele que me destruiu a alguns meses atrás, aceita-lo, perdoa-lo e ama-lo novamente?


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Notas finais do capítulo

Acho que odeio o Mason :/