A Feiticeira escrita por rkaoril


Capítulo 9
Cena de Guerra




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IX

SABRINA

SABRINA PENSOU QUE NÃO IRIA dormir naquela noite. Após ter visto tantas queimaduras, feridas e garotos envenenados, assim como monstros dos mais feios, um dragão negro feito de ferro que cuspia fogo e uma de suas melhores amigas envolta em uma espécie de aura cinza que a fez parecer um fantasma, ela não achou tal ideia provável.

Na mais sincera opinião de Sabrina, Elizabeth tinha se parecido muito com uma daquelas garotas guerreiras de animes que tanto gostava – qual era o nome daquela que matava gigantes? Minha casa em espanhol? Mi casa? – mas a aura cinza que a rodeou durante a batalha, tal como olhos de íris vermelha e vários machucados que mal foram notados pela mesma deixaram Sabrina completamente preocupada.

Quando o dragão se desfez e tudo veio ao chão, Sabrina pensou que Elizabeth fosse se levantar e rir da cara de todos – como ela fazia após ganhar uma briga com um valentão – mas ela ficou lá, escondida entulhos de ferro preto e vapor sem mostrar sinal de vida por longos minutos.

Sabrina quase teve um ataque cardíaco.

Ela saiu correndo no meio da fumaça que o dragão tinha soltado. A colina meio-sangue foi completamente preenchida com vapor e muitos jovens haviam ficado boquiabertos com Elizabeth, alguns até assustados. Sabrina queria gritar com todos, mandar todos fecharem suas bocas e tentarem ajudar a garota que acabara de salvar suas vidas.

Ela foi a única que enfrentara o vapor e os ferros pretos que estavam fervendo – Sabrina pensou por um breve momento que Suzana fosse uma traíra, mas se lembrou que ela não estava presente por se responsabilizar a levar os feridos para o acampamento em segurança. Ela chutou vários entulhos de ferro preto, tento fortes dores de cabeça, sonolência e dormência causadas pelo material negro, mas continuou seguindo até encontra-la debaixo de alguns entulhos ferventes.

Sabrina quase teve outro ataque cardíaco – além de inconsciente, Elizabeth estava com sua pele geralmente pálida muito avermelhada por causa do calor. Uma placa imensa de ferro preto com algumas protuberâncias pontudas na direção do céu estava em cima de suas costas, provavelmente uma das peças da cabeça, os chifres do dragão.

A filha de Atena analisou a situação da outra garota – ela parecia estar respirando profundamente, embora claramente inconsciente. Ela se ajoelhou perto de Elizabeth, tentando encontrar a melhor maneira de livrá-la da placa de ferro – seria melhor tirar a placa da menina ou a menina da placa?

Sabrina cometeu o erro de tentar puxar a placa – o calor queimou a ponta de seus dedos. Ela sacudiu as mãos na frente do peito, tentando aliviar a dor. Quando finalmente pareceu passar um pouco, algo doeu em seu peito – se havia doído tanto ter encostado seus dedos, como Elizabeth estaria com mais da metade do corpo debaixo da placa?

Ela tinha que tomar uma decisão rápida, ou inconsciência seria o menor dos problemas de Elizabeth.

Ela desembainhou sua adaga, era linda esculpida em bronze celestial, como tinham dito a ela. Ela brilhou na escuridão da noite, iluminando as vistas de Sabrina. Ela colocou a adaga próxima a Elizabeth, examinando o metal do ferro em cima dela. Uma, duas, três. Haviam três camadas de metal sobrepostas para criar as escamas.

Sabrina se lembrou de como Elizabeth tinha vencido o dragão – colocando sua espada entre as escamas de um ponto vital, o pescoço. Ela não tinha certeza se funcionaria nessa ocasião também, mas tinha que tentar algo depressa.

Ela encaixou a lâmina no metal, entre a primeira e a segunda escama. Puxou com toda a sua força na direção oposta às escamas, e então ouviu um estalo e a camada mais exterior deslizou até o chão, tirando um terço do peso sobre Elizabeth. Ela repetiu isso até sobrar apenas uma camada, empurrando-a com o pé para longe da menina.

Sabrina se surpreendeu quando viu o que havia debaixo da placa de metal – acima de Elizabeth, uma camada de terra grossa havia protegido ela do peso e do calor das placas de metal, como um casulo de terra. Sabrina facilmente deslizou Elizabeth para fora do casulo, apoiando todo o peso da menina em seu ombro. Ela estava preocupantemente leve.
– Elizabeth? – ela sacudiu um pouco a garota em seu ombro – Acorde!

Elizabeth não respondeu.

Sabrina quase se desesperou, mas sabia que a amiga precisava seriamente de um daqueles tônicos chamados ambrósia, que o pessoal de seu chalé havia mencionado sobre poderes curativos. Ela passou o braço de Elizabeth ao redor de seu pescoço, fez o possível para segurar em sua cintura e tentou sair da lugar quente e abafado.

Após alguns passos, Sabrina ouviu vozes.
– Sabrina! – gritava uma voz masculina. Ela reconheceu como a voz de Raphael – Elizabeth! Onde vocês estão?
– Meninas! – gritou outra voz.
– Estamos aqui! – respondeu Sabrina. Ela avançou mais alguns difíceis passos até ser encontrada por alguns semideuses. Ela reconheceu Raphael e uma menina de seu chalé, mas outros eram desconhecidos.

Um dos meninos que Sabrina não conhecia tomou Elizabeth de seus braços, segurando ela tão gentilmente quanto possível e a levou colina acima, correndo como louco e a deixando para trás. Sabrina – que estava prestes a desmaiar – se apoiou na menina de seu chalé, uma tal de Verônica – uma menina magra e alta com cabelos muito lisos e olhos cinzas como os de Sabrina – que era a conselheira do chalé 6.

Verônica a ajudou até a enfermaria do acampamento. Chegando lá, Sabrina se sentiu ainda pior – o lugar estava quase que lotado. Todas as camas estavam ocupadas por pessoas inconscientes. Os bancos estavam cobertos por meninos e meninas com braços quebrados, queimaduras leves e feridas dolorosas. No chão, alguns agonizavam enquanto eram tratados com ambrósia e néctar, alguns sofriam de hemorragia e outros choravam de dor.

Sabrina percebeu chocada enquanto um grupo de cerca de 10 pessoas tentava atender a todos. Uma menina com cabelos ruivos, olhos azuis e pele bronzeada – embora fosse inverno – cantava pra um menino cheio de queimaduras, que ao ouvir a melodia iniciava uma regeneração instantânea. Outro menino enrolava o braço de um garoto, outra passava a mão de leve por sangramentos fazendo com que eles se estancassem, outra tocava testas de inconscientes e pessoas com hematomas e fazia com que eles acordassem e se curassem. Sabrina os reconheceu como o pessoal do chalé de Apolo, o deus dos médicos.
– Você se sente bem? – perguntou Verônica.
– Estou ótima. – respondeu – Obrigado por me ajudar até aqui, mas eu tenho que ajudar minhas amigas. – ela disse. Verônica assentiu.
– Boa sorte.

Sabrina caminhou pela enfermaria, tentando não tropeçar nos doentes. Quanto mais enfermos via, pior se sentia.

Ela havia sido protegida por tantos enquanto perambulava pelo campo de batalha. Sabrina tinha tentado ajudar os feridos, muitos nos quais recém curados se levantavam apenas para se machucarem novamente. Ela estava segurando uma adaga, ela estava com suprimentos de cura e não havia tentado nem ao menos espetar um daqueles monstros. Se sentia tão culpada que seus olhos começaram a marejar.

Foi quando viu Elizabeth em uma cama, no fundo da enfermaria. Suzana estava ao seu lado, segurando sua mão e mordendo o lábio para não cair em lágrimas. Do outro lado da cama, uma menina de cabelos muito dourados passava a mão a centímetros da pele de Elizabeth, curando suas queimaduras externas. Quando se aproximou, Sabrina percebeu que ela tinha muitas sardas e olhos castanhos, assim como um arco e alijava nas costas.

Quando terminou com as queimaduras de Elizabeth, ela colocou a mão em sua testa. Sabrina olhou de perto, esperando a amiga abrir os olhos e sorrir quando após alguns minutos a menina loira retirou a mão, Elizabeth tão inconsciente quanto segundos antes.
– Qual o problema? – perguntou Suzana, sua voz fraca e desigual – Por que ela não acorda?
– Não se preocupe. – disse a menina loira, olhando de repente para Sabrina – Ela não levou nenhum golpe, nem nada que a forçasse a ficar inconsciente. Ela desmaiou de exaustão. Tenho certeza que após uma boa noite de sono, ela irá estar bem. Se me dão licença, acho que outros campistas precisam de mim.

A menina loira as deixou, caminhando rapidamente na direção de um garoto sangrando no chão.
– Sabrina – disse Suzana – você viu o que aconteceu com ela? – Sabrina fechou seus olhos por um minuto, tentando organizar as pipocadas em sua cabeça.
– Sim. – ela disse – Ela salvou a todos nós.
– N-nossa. – disse Suzana, um pequeno sorriso se formando em seus lábios – Elizabeth sabe mesmo como abalar uma festa. – Sabrina não conseguiu impedir um pequeno sorriso. Ela se sentou aos pés da cama, onde Suzana acabara de sentar-se. Ambas ficaram quietas por um segundo, apenas ouvindo os gemidos de outros pacientes.
– Ela é filha de Hades. – disse Sabrina, surpreendendo a si mesma – Ela... ela foi incrível.
– Isso não é bom? – perguntou Suzana – Hades é um dos três grandes não é? Isso faz dela super-forte.
– De certa forma – disse Sabrina, embora achasse que super-forte fosse pouco. Ela queria dividir com Suzana suas preocupações, mas decidiu que seria melhor esclarecer isso quando tivesse plena certeza.

Ela e Suzana deixaram a enfermaria juntas. Estavam muito quietas, tendo acabado de presenciar uma situação de guerra. De alguma forma, havia realmente sido melhor do que era o de esperar – era cerca de 10 monstros para cada campista – mas não ter lutado propriamente realmente deixou Sabrina de péssimo humor. Ela olhou para o céu da noite, as milhares de estrelinhas brilhando com a lua cheia.

Ela decidiu que ficaria mais forte, que nunca mais iria assistir uma amiga lutando até a morte sem fazer nada.


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