Na segunda-feira, Lily mal esperava para ir à Academia de Artes Modernas, embora estivesse receosa. O que Jason diria caso a visse? Ela saíra correndo depois dele beijá-la, algo que ela queria desde que o conhecera. Tinha medo de que ele pedisse uma explicação, já que ela não a tinha. Mesmo assim, continuava ansiosa para vê-lo novamente. Depois do sábado, não parara de pensar nele e em como seus lábios eram gelados. Ela queria mais daquilo, ter aquela sensação novamente. Definitivamente, Lily Jackson estava apaixonada... Ou melhor, completamente apaixonada por Jason Parker. E o que ela faria com isso? Guardaria para si e mais ninguém.

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Ao fim da última aula na escola, ela pegou seus materiais e saiu logo dali, não via a hora de chegar em casa, longe daquele estabelecimento que só lhe fazia sofrer.

Assim que chegou em sua casa, colocou a jaqueta no cabideiro, como sempre, e subiu as escadas em direção ao quarto. Trocou de roupa, colocando um shorts jeans, uma blusa dos Rolling Stones e prendeu o cabelo em um coque alto. Desceu as escadas e assentou-se à mesa para almoçar. Os pais já o haviam feito e voltado ao trabalho, deixando a menina sozinha na mesa. Ela comeu sua macarronada com molho branco pensando em Jason. Na verdade, era só nisso que ela pensava desde o beijo.

Terminando o almoço, ela escovou os dentes e subiu para o quarto, deitando-se na cama e colocando os fones de ouvido, logo escutando My Way, do épico Elvis Presley. Enquanto ouvia, pensava nos momentos que tivera com Jason.

Flashback on

“Abaixou-se, com o olhar fixo no livro e tocou-o, ao mesmo tempo que mãos pálidas e geladas fizeram a mesma coisa. Lily levantou o olhar lentamente até que eles pararam no par de olhos mais lindos que ela já conhecera. Conteve um sorriso.”

“Ela aproximou-se dele, passando os dedos gelados pelos cabelos sedosos e extremamente bonitos do garoto, o deixando nervoso. Quando percebeu, Lily já estava um tanto... Perto demais.”

“E quando foram notar, estavam selados. Jason encostou seus lábios nos de Lily e um turbilhão de sensações percorreu seu corpo, especificamente em seu coração. Ela queria abraçá-lo, dizer que o amava, que queria estar o tempo todo com ele, mas não podia. Não podia porque aquilo tudo era um erro. Ao perceber o que estava fazendo, ela soltou-se imediatamente do garoto, que se assustou com o ato.”

Flashback off

Nesse momento Lily já estava no banheiro do quarto, olhando-se fixamente no espelho. Uma pequena e boba lágrima caiu de seu rosto, ela precisava chorar. Não sabia exatamente o motivo de todo aquele sofrimento, mas quando percebeu, o objeto já estava em suas mãos. Aquele maldito objeto. Ela não o usava há muito tempo, mas agora era hora de voltar a manejá-lo. Não via outra opção para tudo que estava passando e embora fosse contra aquilo, ela não tinha escolha.

Pegou a lâmina e enfiou-a em seus pulsos, com todo ódio que sentia junto. Afundou-a o máximo que pôde, embora sentisse uma dor horrível, ela não queria parar, ela não conseguia parar. Se ela chorou? Oh, sim. Mas não pela dor que a lâmina causava e sim pela dor que todo o seu sofrimento causava. O que a fazia sentir pior era pensar que o que Jason lhe causara era tão forte à ponto de fazê-la se mutilar. É claro que ele não tinha culpa de beijá-la, ela também queria isso, mas não podia ter. Ela simplesmente não podia ser feliz, não sabia ser feliz. Depois da morte de Lizzie, tudo que ela sabia era ser aquela menina estúpida que pintava quadros e ouvia música antiga. Por mais que tentasse ser diferente, ela não sabia como fazer isso. Simplesmente era assim, chata, boba e completamente idiota. Não havia nenhuma maneira de mudar. Não mesmo.

Soltou a lâmina na pia quando ouviu alguém bater na porta. Imediatamente cobriu os braços — totalmente ensanguentados — com um pano branco que viu no banheiro e foi até lá, logo a abrindo.

— Lily, querida, fiz um lanchinho pra você, já que almoçou tão pouco — Dircy sorriu docemente, estendendo a bandeja de lanches. — Coma, minha flor, vai te fazer bem.

— Não estou com fome, Dircy, já comi o bastante — ela disse sorrindo torto.

— Deste jeito vai acabar ficando doente! Não come, não bebe, só fica trancada neste quarto! Ora essa, já não sei mais o que oferecer!

— Dircy, eu... — Ela fez uma pausa, uma ideia veio-lhe à cabeça — Traga-me aquele doce que comi na festa da mamãe... Figi, fiti... Fini! Isso, fini! Se me trouxer o fini, eu como.

— Mas eu quero que coma comida, não doce! Só lhe trago se comer este pãozinho que fiz. Só um, coma! — Ela implorou com os olhos, Lily não podia negar.

— Tudo bem — pegou um dos pães e comeu. — Pronto, agora traga-me o fini, por favor.

— Volto em instantes.

E assim Dircy saiu. Lily bufou, irritada. Aquela mulher podia ser um doce, mas quando queria alguma coisa ninguém mudava sua opinião.

Correu de volta ao banheiro, tirando o pano branco — que Dircy nem percebera em seus pulsos — e jogou-o no chão, pegando a lâmina e escondendo-a na gaveta da pia do banheiro. Lavou os pulsos, sentindo dor e colocou luvas que cobriam os cortes dos dois braços. Quando a empregada voltou, ela pegou o doce e deitou-se na cama, deliciando-se enquanto ouvia mais dos sucessos de Elvis Presley.

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Dando a hora de ir para a Academia de Artes Modernas, Lily terminava de arrumar-se. Vestia uma calça jeans branca com partes rasgadas, uma blusa com o símbolo do Rock N’ Roll e um tênis vans preto. Colocou uma jaqueta de couro com spikes para tapar os cortes nos pulsos. Arrumou — pela primeira vez — o cabelo em um rabo de cavalo alto e passou — milagrosamente — um lápis de olho. Definitivamente, ela queria estar... Apresentável, já que nunca seria bonita.

Quando saiu de casa, depois de despedir-se dos pais, pegou a bicicleta e pedalou, novamente tendo aquela sensação do vento batendo em seus cabelos, fazendo-a sentir-se livre. Por um instante, lembrou-se daquela lâmina horripilante tocando seus pulsos, lhe fazendo sentir aquela dor insuportável. A memória foi tão horrível que a fez cair da bicicleta, que ficou por cima dela na queda. Por sorte não batera a cabeça no chão, ou o acidente teria sido pior. Um homem de aparência esquisita foi lhe ajudar. Deveria ter no máximo trinta anos, os cabelos eram grisalhos e vestia uma roupa de guarda de trânsito. Ele a puxou delicadamente, deixando-a de pé.

— Obrigada. Acho que perdi a atenção enquanto pedalava.

— Tudo bem. Fique mais atenta da próxima vez, sim? — Ele disse, abrindo um sorriso acolhedor.

— Sim. Vou indo. Novamente, obrigada pela ajuda. — Lily despediu-se e subiu na bicicleta.

— Não tem de quê.

Voltando a pedalar, dessa vez sem pensamentos ruins, ela logo chegou na Academia de Artes Modernas. Colocou a bicicleta no mesmo lugar de sempre e subiu as várias escadas até a entrada do estabelecimento. Como sempre fazia, pegou o elevador de portas douradas e assim que as mesmas se abriram, ela caminhou até a “Ala de Artes 5” e adentrou o local. A primeira coisa que bateu em seus olhos foram as orbes mais lindas que já vira. Definitivamente, Jason estava mais bonito naquele dia.

Ela andou devagar até o sr. Lemon, que a olhava com seus olhos irritados, principalmente pelo atraso da garota.

— Srta. Jackson, como sempre atrasada — ele adiantou as coisas.

— Eu posso explicar, sr. Lemon — ela disse, com medo nos olhos. Aquele homem era estranho — quando estava vindo eu caí da bicicleta, o que me rendeu minutos a mais. Um guarda me ajudou, mas ainda assim eu tive que pedalar devagar, fiquei um pouco tonta. Desculpe.

Ele pareceu analisar a história de Lily, tentando entender se ela mentia ou dizia a verdade. Por fim, suspirou derrotado e preferiu acreditar que aquilo realmente acontecera.

— Tudo bem. Vou deixar passar dessa vez. Mas não quero que esses atrasos continuem, caso contrário terá problemas por conta disso. Entendido?

— Sim senhor — Lily assentiu e seguiu para seu lugar.

Posicionou-se ao lado de Ashley, que a encarava um tanto atordoada.

— Você está mesmo bem? — Ela disse, parecendo preocupada.

— Estou. Vamos esquecer isso, sim?

— Sim.

Logo depois disso o sr. Lemon começou a explicar sobre artes góticas, pintores com esse estilo, etc. Depois da explicação os alunos tiveram de pintar quadros com esse tema e assim todos fizeram. Terminando, ele recolheu as pinturas e as colocou onde sempre colocava. Pouco antes da aula chegar ao fim, ele pediu que todos contassem como foi o “encontro” entre as duplas para o trabalho coletivo. Na vez de Ashley e Drinna, a história chegou a ser engraçada.

—... E no fim o palhaço saiu todo molhado, eu fiquei com a maquiagem toda acabada e o cabelo completamente horrível, cheio de folhas e a roupa toda suja. Mas pelo menos a Drinna também ficou assim. É isso que dá colocar duas meninas que se odeiam num parque com uma fonte de água. Fim do nosso “encontro”. — Contou Ashley, o que fez todos rirem com os acontecimentos.

— Anh... Esse “encontro” não foi exatamente como o que propus, mas tudo bem. Pelo menos tentaram. Bem, agora é a sua vez, Srta. Jackson. Conte-nos como foi seu “encontro” com o sr. Parker.

Lily não sabia bem o que dizer. Com certeza não falaria da parte do beijo, isso nunca. Disse-lhes de como fora divertido quando jogaram aqueles balões na parede e de quando pintaram um ao outro. Todos parecerem gostar do “encontro” deles, diferente de Lily. Enquanto ela contava, Jason a olhava fixamente, lembrando-se de quando se beijaram. Sem dúvida fora o melhor beijo de sua vida. Ele não podia mais negar: sentia alguma coisa pela dama Lily Jackson.

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No fim da aula, Jason correu até Lily enquanto ela conversava com Ashley, que assim que viu o garoto, arrumou uma desculpa esfarrapada e foi embora. Estranho? Muito. Jason aproximou-se cautelosamente por trás da garota, tocando-lhe o ombro devagar. Quando ela sentiu seu toque, virou-se na mesma hora, um tanto assustada.

— Eu só queria pedir desculpas pelo que aconteceu no sábado — Jason disse, fitando os pés — não queria te magoar.

Lily não sabia o que dizer, estava emocionada.

— Não magoou. Eu... E-Eu gostei daquilo. Mas tive que ir embora. Desculpe — dessa vez ela baixou os olhos, envergonhada.

Jason levantou o olhar, fitando a garota. Sem perceber, tocou seu rosto, levantando-o cuidadosamente. Os olhos dos dois encontraram-se e Lily queria beijá-lo novamente. Porém, por um breve segundo, Jason olhou para os braços da garota, e o que viu fez ele se afastar bruscamente dela.

— Lily, o que é isso? — Ele puxou as mangas da jaqueta de seus pulsos, deixando a mostra os cortes profundos que fizera mais cedo. — Você se cortou? Ficou maluca?

Ele estava indignado, queria gritar com ela. Lily não se conteve, derramou lágrimas e atirou os joelhos no chão, tapando o rosto com as mãos.

— Eu não queria, eu juro! Não tive opção!

— Sempre tem uma opção! Se cortar não acaba com os seus problemas! — Jason gritava, também ajoelhado. Ele não queria que a garota sofresse daquele jeito.

— Mas dessa vez não tinha! — Ela gritou de volta.

— Me diga... Por que quis se cortar? — Dessa vez ele disse mais calmo, sem gritar.

— Por... Por sua causa, seu idiota! Quis me cortar porque eu gosto de você, mas não quero gostar!

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