Sofia ri da ideia de Flaviana, porém avalia a possibilidade. As garotas ouvem uma voz chamando por Sofia e a loira logo reconhece como sendo a da sua irmã. Irritada, sonsa e cheia de raiva. Em poucos segundos, Anita está lá, com uma cara horrível, fitando-a como se pudesse matá-la e comer seu coração cru.

– A gente precisa conversar e dessa vez nem adianta vir com desculpas, você vai me ouvir...

Continua...

– Acho que tem alguém precisando de um tapinha da Sofia né Flaviana? – Sofia acaba soltando, a voz cheia de ironia e um sorriso sarcástico nos lábios enquanto vai até o closet novamente. Ela sabia que havia acontecido algo muito sério, ou então a irmã não estaria daquele jeito na porta do seu quarto, mas estava de tão bom humor que não deixaria a cara feia da irmã estragar seu dia – Uma pena que eu não esteja trabalhando hoje, apesar de que não sei se toda a nossa comoção em te deixar mais apresentável resolveria alguma coisa, talvez um bom café da manhã ajude a melhor sua cara que eu preciso dizer, está péssima.

– Flaviana, você pode nos dar licença – Anita falou se direcionando a morena sentada na cama que olhava para as irmãs, num misto de preocupação e curiosidade.

– A Flaviana fica – Sofia cruza os braços em frente ao corpo e encara a irmã a desafiando – Ela é minha amiga e estava aqui primeiro.

– Ótimo, então ela vai ouvir tudo que eu tenho para te falar Sofia.

– Ouvir o que Anita? – a loira indagou levantando uma das sobrancelhas, não dando muita importância para o que a irmã tinha a dizer – Agora eu vou ter que ouvir sermão de todo o Grajaú por não ser a filha perfeita feito você? – um risinho debochado transparece em seus lábios – Porque se for isso, eu não estou com tempo e nem com saco de ficar ouvindo a sua voz Anita, sem falar que... Eu tenho mais coisas importantes a fazer.

– Tipo beijar o namorado da sua irmã? – Anita discursou fitando a irmã com raiva. Sofia é pega de surpresa e não consegue disfarçar. As duas se encaram por alguns segundos sem falar nada e Sofia pode sentir o rancor da irmã em suas palavras e pela primeira vez ela se arrepende verdadeiramente de ter beijado Ben naquela festa – Pois é, o Ben me contou, ontem à noite, enquanto você depois de ter estragado mais uma reunião da nossa família fugiu de casa, pra sair com algum cara que deve ser bem parecido com você, sem caráter, sem sentimentos por ninguém ou por nada. Eu ainda não consigo acreditar no que você fez Sofia – ela gritou alto, deixando manifestar toda a sua raiva – Como você consegue deitar a sua cabeça a noite e dormir em Sofia? Sendo essa pessoa horrível que você é.

– Oi? – Sofia hesitou, revirando os olhos – Acho que algumas coisas não foram bem esclarecidas né. O seu namoradinho, aliás o príncipe perfeito, foi até a festa, ficou me perseguindo a noite toda e depois me beijou com uma desculpinha de quem só queria falar comigo e eu – ela faz uma pausa – Eu sou a pessoa sem caráter, sem sentimentos, horrível. Você já se ouviu falando Anita? É patético. Se você veio aqui só para falar disso e tentar recuperar a honra do seu príncipe sapo, sinto lhe informar que eu tenho mais o que fazer.

– Eu sei que foi você que planejou tudo isso.

– Ah claro, eu sabia, sabia que ia sobrar para mim, a bruxa da história – Sofia argumentou aumentando o tom de voz – E porque não sobraria não é, vamos lá, é mais fácil acusar a Sofia do que encarar a verdade de frente...

– A verdade é que você sempre teve inveja de mim Sofia e até hoje você não consegue aceitar que o Ben me escolheu – Anita rebate se aproximando da irmã.

– Ele te escolheu tão bem que na primeira oportunidade que teve se arrependeu e veio correndo atrás de mim, essa é a verdade Anita!

O barulho do tapa ecoou pelo quarto e Sofia sentiu seu rosto aquecer e queimar pelo impacto da mão da irmã em seu rosto. Raiva, indignação, vergonha e decepção estavam presentes no rosto de Anita, mas em seu olhar havia tristeza, o que a deixava em desvantagem com a irmã. Os olhos de Sofia estavam determinados, debochados, e ignoravam a dor ou qualquer outra coisa.

– Agora você vai ver o quão horrível eu posso ser Anita – Sofia pegou a irmã pelos cabelos e os puxou com força fazendo a irmã gemer de dor. As duas acabaram caindo no chão. Anita tentou reverter a situação, sem sucesso, enquanto Sofia esbofeteava a cara da irmã, sem dó nem piedade. Flaviana tentava, em vão, chamar a atenção das duas, gritou seus nomes, mas as duas as ignoraram, por isso resolveu sair a procura de ajuda.

– Eu com inveja de você? – Sofia replica ofegante, enquanto a irmã tentava arranhar seu braço para se desvencilhar – Olha para mim e olha para você Anita.

– Você só é um rostinho bonito Sofia – Anita rebate conseguindo se desvencilhar brevemente – Ninguém te ama, além dos nossos pais, e você sabe disso.

– Ah claro, porque todos só conseguem amar, ser amigos da maravilhosa princesa – Sofia responde rapidamente – Será que o Ben concorda com isso Anita?

A pergunta pega Anita desprevenida. Ela sempre teve certeza do seu amor pelo príncipe sapo, desde o princípio, mas não podia afirmar se Ben sentia o mesmo por ela, apesar de o ex-namorado ter afirmado várias vezes, ela nunca conseguia se sentir segura quanto a isso. Saber que ele e Sofia, haviam tido um envolvimento, por menor que tivesse sido, a deixava insegura. Todo o conto de fadas que a mesma havia idealizado na sua cabeça, os planos que os dois haviam feito, as similaridades, os momentos de carinho e cumplicidade que haviam trocado, tudo parecia ter sido um sonho... Um sonho que havia acabado. Bernadete entrou no quarto seguida por Flaviana e Soraia atrás e pode observar Anita chorando, no chão e com o rosto vermelho, enquanto a irmã mais nova se afastava, com o olhar raivoso direcionado para Anita.

– Ai meu Deus – a perua ponderou exasperada indo na direção da irmã mais velha – Anita, você está bem? – a morena fechou os olhos sem querer responder, as lágrimas deslizando por suas bochechas fartas. Bernadete fitou Sofia, sabendo, de antemão, que aquilo só poderia ser obra da enteada mais nova – Alguém pode me explicar o que aconteceu aqui?

Um silêncio percorreu o quarto e perdurou por alguns segundos. Ninguém parecia disposto a falar.

– Eu só quero ir embora daqui Bernadete – Anita sussurra num tom baixo, se sentindo envergonhada, encarando discretamente a madrasta com os olhos inchados de tanto chorar.

– Calma Anita – Bernadete tenta acalmar Anita – Vem, levanta, eu mesma vou te levar em casa, assim a gente conversa no caminho, mas antes, Soraia, leva ela pra cozinha e prepara um chá, uma água com açúcar, dá alguma coisa para ela se acalmar um pouco.

Anita passa próximo da irmã e Sofia a fita, com os braços cruzados, sabendo que, como sempre ela estava fadada a novamente levar a culpa.

– Isso só pode ser obra sua né Sofia? – Bernadete indagou sendo dura com a loira, que não a respondeu. Adiantaria alguma coisa ela negar? Conhecia muito bem como funcionavam as coisas, ela sempre seria taxada como a bruxa invejosa que queria destruir a felicidade da irmã. Observou que a amiga abria a boca para falar algo, mas fez sinal para a mesma parar, sabia que não haveria argumentos que justificasse para Bernadete sua atitude com a Anita. Ela sempre seria a culpada – Eu vou levar a Anita em casa, mas, quando eu chegar, a gente vai conversar Sofia.

Sofia viu a noiva do pai se afastar e bateu a porta do quarto com força.

– Isso sua idiota, defende ela, todo mundo defende ela no final – falou se jogando na cama, sem conter agora as lágrimas. Flaviana se aproxima da amiga sabendo do momento difícil que a mesma passava. As duas se abraçaram por alguns segundos e depois sorriram uma para outra, em cumplicidade.

– Ai meu Deus, você acabou com ela Sofia!

– O que eu fiz foi ainda pouco, a Anita tá merecendo muito mais. Veio no meu quarto me chamar de invejosa, é uma ridícula mesmo.

– Você devia ter deixado eu contar a verdade para a Bernadete.

– Como se fosse adiantar alguma coisa, óbvio que ela ia acreditar na Anita – a loira responde impaciente, secando as lágrimas do rosto.

– Já pensou no que vai fazer o que agora que os dois devem ter terminado – Flaviana continua fitando a amiga.

– Eu sei lá – a loira rebate ainda magoada e depois reflete por alguns segundos a informação repassada pela amiga. Não havia pensado nessa possibilidade. Ben e Anita haviam terminado? – Ai meu Deus, será que eles terminaram? Porque do jeito que a Anita é idiota...

– Eles terminaram, e não me pergunte como eu sei.

– Óbvio que a Anita não suportaria algo assim no seu namoro perfeito de conto de fadas – Sofia sorri, vitoriosa.

– Amiga, eu só não quero que você se decepcione com esse garoto de novo – Flaviana argumenta ficando de frente para a amiga.

– Caramba Flaviana, eu já falei, o Ben é passado, mas isso não me impede de me divertir com ele e com a minha irmãzinha querida.

Sofia sabia que o ex-namorado da irmã não havia contado a verdade para ficar com ela, não era tão inocente assim como a irmã, mas só o fato de ele ter contado e ela saber que de alguma forma, ela ainda mexia com ele, a deixou extremamente feliz. A felicidade dos dois a incomodava, assim como aquela aura que pairava sobre os dois de casal perfeito. O dia estava começando perfeito e ela sabia que nada poderia estragar seu dia.

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Ben abriu os olhos e fitou o teto por alguns segundos antes de levantar. Estava péssimo. Sentia dores por todo o corpo pela prática exaustiva de parkour que havia feito durante a madrugada e havia dormido tão poucas horas e tão mal. As poucas horas que conseguiu se desligar do mundo real e dormir, era perseguido por pesadelos que envolviam Sofia e Anita. As imagens do último sonho ainda estavam frescas em sua mente, a voz da Anita, gritando por socorro, enquanto ele era envolvido por uma Sofia risonha e sedutora. Ele queria ter ido atrás da princesa, mas o seu eu no sonho havia optado por Sofia, e quando ele fechava os olhos, ainda podia sentir os lábios da loira nos seus e sua risada maliciosa. Isso que o deixava se sentir tão culpado, afinal, desde quando Sofia era alguma opção para ele?

Talvez no começo, quando ele não “conhecia” a loira, não sabia das suas reais intenções. Havia se decepcionado tanto com Sofia, ela era tão diferente dele. Já com a Anita as coisas pareciam mais simples, fáceis, tinham tanto em comum que uma aproximação foi algo natural de acontecer. Ele amava várias coisas na Anita, e odiava muitas coisas em Sofia, mas não podia mais negar para si mesmo, Sofia ainda mexia com ele. Ela era como algo perigoso e extremamente atraente. Ele a tirava do sério, e, em todas as vezes que discutiam, ele tinha uma necessidade latente de segurá-la pelos braços, que ele julgava ser mais impulsivo do que qualquer outra coisa. Ele não sabia explicar com exatidão o que sentia pela loira, já que uma mistura de sentimentos e emoções passavam pela sua mente sempre que pensava nela, mas sabia nunca havia sentido algo parecido, por ninguém.

Colocou uma camiseta qualquer, e resolveu ir fazer sua higiene matinal e depois ir procurar Anita. Precisava saber como ela estava, e só conseguiria ficar em paz quando falasse com a ex-namorada. Ex-namorada, ele pensou na palavra, soava tão estranho para ele. Assim que se aproximou da cozinha, não pode deixar de ouvir a voz da tia Luciana e da Vera conversando e quando ouviu Vera falando de Sofia, paralisou, comedido.

– Ainda não acredito que a Sofia tenha feito isso comigo, francamente, sair com um rapaz, uma hora daquelas, sem avisar ninguém – Vera suspirou fundo, lembrando da pior noite da sua vida – E o pior, ela enfrentou a gente, como se o susto que ela nos deu não fosse nada.

– Eu sei que a mina vacilou, mas ela é jovem Vera e estava magoada, vai dizer que você nunca saiu escondido dos nossos pais com algum namoradinho hein?

– Os tempos eram outros Luciana, agora é perigoso, imagina se acontece algo com ela, se o rapaz não é de boa índole.

– Mas mana você mesma falou que conhecia o rapaz.

– Eu conhecia, quando ele tinha sei lá, oito, dez anos, faz muito tempo que eu não vejo ele, não tenho contato com a família. Agora ela tá lá, de castigo, espero que o Caetano fique firme até o fim.

– Ai Vera, você sabe muito que eu não acho legal esses negócios de castigo... Porque não chamar o menino para jantar aqui em casa e ai você vê, se o garoto é firmeza mesmo.

– Do jeito que ela saiu daqui ontem, acho difícil ela querer voltar pro Grajaú tão cedo... Ai, você não sabe como me doeu ser dura com a Sofia ontem, mas eu não sei mais o que fazer com essa menina.

– Talvez ela só esteja precisando se apaixonar, para amolecer o coração de vez, vai por mim mana, libera o namoro que ela vai ficar calminha, calminha.

– Ai, francamente você tem cada ideia Luciana.

– O garoto é bonitinho? – Luciana pergunta empolgada a irmã – Porque a minha sobrinha é linda.

– Eu não sei Luciana, e vamos parar de falar nisso, eu nem sei se a Sofia realmente está namorando esse rapaz – Ben dá um passo para trás se sentindo enjoado e acaba fazendo barulho. Sua mente processando a conversa das mulheres a sua frente com torpor e irritação.

– E ai Ben, tudo firmeza mano? – Ben acenou com a cabeça, embora soubesse que as coisas não estavam nada bem – Tá com uma cara péssima, deve ser fome.

– Oi Ben, bom dia! – Vera cumprimenta de maneira amistosa e fraternal – Você acordou tarde hoje, quer tomar café?

– Brigada Vera, mas acho que eu to sem fome – Ben respondeu tentando disfarçar sua insatisfação. Ele não queria perguntar, mas, sua impulsividade não deixou-se calar e quando deu por si, pode ouvir a si próprio perguntando, com a voz mais ríspida do que gostaria – Quem é esse o cara que a Sofia tá namorando?

– A Sofia não tá namorando Ben, é só mais uma das bobagens da Luciana.

– É claro que ela não tá namorando, ela só tá dando uns pegas num playboy da Barra tá ligado.

– Luciana! – Vera chamou a atenção da irmã e depois voltou a fitar o enteado – Eu não conheço direito o rapaz Ben, mas o nome dele é Matheus, ele é amigo de infância das meninas.

Ben abaixa os olhos achando o nome familiar e logo lembra-se do cara inconveniente que havia ficado atrás da Sofia a festa inteira. Ele havia se apresentado e falado que seu nome era Matheus. Ele havia falado com aquele sorrisinho presunçoso que era amigo de infância das duas.

– Idiota! – ele deixou escapar, distraído, atraindo a atenção das mulheres.

– O que você disse Ben? – Vera perguntou fitando o moreno sem entender.

– Eu... Eu – Ben titubeou sendo pego de surpresa e agradeceu por não ter falado em voz alta todas as “palavras bonitas” que estava pensando a respeito do tal Matheus – Eu falei que eu sou um idiota, porque eu esqueci que eu tinha que que fazer uma coisa importante, mas acho que eu vou fazer agora. Você viu a Anita por aí?

– Ela saiu mais cedo, disse que tinha que fazer um trabalho na casa de uma amiga lá na Barra e depois ia passar no Serguei. Ben, você tá bem? Tem certeza, você tá pálido, é melhor você comer algo antes de sair, tenho certeza que o que quer que você tenha que fazer pode esperar não é?

– Desculpa Vera, mas não vai dar mesmo, eu preciso ir – ele saiu rapidamente e foi até o banheiro. Encarou seu reflexo no espelho por alguns segundos enquanto ainda tentava absorver as últimas informações. Achou que quando soubesse que Sofia estava namorando alguém ficaria feliz, já que a mesma deixaria ele e a princesa em paz, mas agora, que o seu namoro havia sido destruído pela loira, não parecia ser justo que ela fosse feliz com outro cara. Sem falar que ela e o cara nem combinavam, e ele era mais velho que ela, e a Vera não podia permitir esse tipo de coisa, mas, talvez as coisas fossem melhor assim, ele tentou justificar para si mesmo, quem sabe ainda houvesse tempo de consertar as coisas com a Anita e Sofia os deixasse em paz. Não, ele, refletiu, ela não podia estar namorando, ficando com aquele cara, justo aquele cara.