Olhei novamente para o espelho despedaçado,uma manhã chuvosa,um espelho quebrado,o dia seria perfeito,pensei ironicamente enquanto recolhia os cacos de vidro espalhados pelo chão do meu quarto. Uma gota de sangue,ótimo,mais alguma coisa para piorar meu dia? Eu achava que não,como estava enganada.

Ouvi minha mãe me chamar no andar inferior da casa,recolhi rapidamente os últimos pedaços de vidro e os joguei no lixo do meu banheiro pessoal. Desci calmamente a escada que levava em direção a cozinha,o sangue espalhando-se pelo corrimão da mesma.

-Lave essa mão- minha mãe resmungou assim que adentrei a cozinha.

-Visão perfeita-era uma bela manhã para ironias,retruquei deixando a água da torneira correr livremente sobre minha mão.

Quando finalmente o sangramento cessou,o que me pareceu uma eternidade,enquanto no relógio passaram-se apenas três minutos;Tomei meu café da manhã rapidamente,minha mãe me olhava curiosa quando subi a escada de volta para o meu quarto. O chão estava com manchas de sangue espalhadas,preferi ignorar-lás e abaixe-me para pegar um par de tênis embaixo da minha cama,algo cortou minha mão,perfeito,parece que eu não tinha feito um bom trabalho anteriormente,puxei o par de tênis e acabei caindo de costas,nossa eu sou tão forte que consigo me derrubar? Não sei,mas quando virei-me para levantar,alguma coisa cortante voou na direção de meu olho esquerdo,acertando-o. Senti a dor me atingir,mas não quis gritar,levei minha mão,que não estava sangrando,na direção do meu rosto,a dor ficava cada vez mais intensa e eu não conseguia enxergar com o olho atingido,o sangue em minha mão assustou-me,olhei para a porta onde minha mãe entrava:

-Mila- ela disse segurando-me,senti seus braços me envolverem e então não vi mais nada.

Eu não sabia se era manhã ou noite quando acordei,se é que posso dizer que estava acordada,sentia alguém afagando meus cabelos,mas não via quem era,eu não via NADA.

-Camila,pode me ouvir?-a voz de meu pai fez-me querer abrir os olhos,porque eu não conseguia?

-Pai?-disse insegura.

-Está se sentindo bem?-ele me perguntou,sua voz soava tristonha.

-Não,eu quero ver você-respondi rispidamente

-É melhor contar logo a ela.-eu reconheceria a voz do meu meio-irmão em qualquer lugar.

-CONTAR O QUÊ? -eu estava ficando nervosa,droga,estava cansada de só escutar eu queria enxergar.

-Camila- meu pai disse carinhosamente,entretanto sua voz soava...tensa,talvez-Você está em um hospital,você...

-Está cega-meu meio-irmão interrompeu meu pai,secamente completou.

CEGA? eu não conseguia ver,isso era um fato,mas eu queria,eu tentava desesperadamente entender. Um sentimento de revolta invadiu-me e senti meu rosto molhado.

Lágrimas... eu ainda as sentiria muito antes de me conformar com um erro médico,deixando-me totalmente sem poder ver a luz do Sol,o brilho das estrelas,as cores das flores...

Agora,sabia que aquela manhã chuva de espelho quebrado,de brilho vermelho no espelho,mudara para sempre minha vida.