Como Se Livrar De Uma Vampira Apaixonada escrita por Rafa


Capítulo 17
Capítulo 17


Notas iniciais do capítulo

Boa noite galera.



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Basile,

Foi assim que você planejou isso o tempo todo?

Claro que foi.

Como fui idiota por não perceber o esquema em sua totalidade. Ou – devo ser honesta comigo mesma – talvez eu soubesse a verdade. Mas queria tanto o poder também...

Esta noite, porém, quando encostei as presas no pescoço de Anastácia, todo o futuro ficou claro para mim. O cheiro do sangue dela foi como um soro da verdade injetado nas minhas veias, um espelho rachado refletindo meu próprio eu infernal.

Você sabia o tempo todo que uma garota americana que não fosse criada como vampira seria destruída com facilidade caso assumisse o trono. A carta que escrevi alertando que Rachel não estava preparada, que estaria vulnerável ao ataque de fêmeas famintas pelo poder, não foi uma revelação para você. A fragilidade dela o agradava. Você contava com isso. Ah, meu Deus, Basile, será que nós contávamos com isso?

Eu teria me casado com ela, cumprindo o pacto, teria levado Anastácia para o nosso mundo na Romênia, onde ela ficaria quase absolutamente indefesa, e então iria abandoná-la ao seu destino sinistro. Quando? Quanto tempo isso teria demorado? Um ano? Menos? Mas, a essa altura, os clãs iriam estar unidos de forma legítima e todo o poder estaria nas nossas mãos. Nas suas mãos.

Você forçaria o destino, Basile? Iria derrubá-la pessoalmente? Em segredo, é claro, com a mão enluvada de uma de seus lacaios... ou tentaria forçar a minha mão?

Com Anastácia escondida em nosso castelo no alto, quem seria melhor para cuidar de sua “destruição” do que a mulher que compartilhava a cama com ela?

Seria esse o golpe mais cruel, Basile? Fazer com eu me sentisse como me sinto e depois arruiná-la? Seria essa sua tentativa de me endurecer? Mesmo para você isso parece maligno demais. Vil demais. Ou talvez, mesmo depois de todos esses anos, eu o subestime – o que é sempre um erro perigoso.

E se eu não fizesse como me orientou, se não a destruísse, você me despacharia também, acusando-me de insubordinação? Eliminaria a herdeira inconveniente? Quem, entre os Anciões Fabray – e presumo que todos conheçam e aplaudam suas intenções relativas a Rachel -, iria culpa-lo?

Que desgraça! Que poder você teria então: controle absoluto sobre os dois maiores clãs de vampiros, sem nenhum sucessor para mordiscar seus calcanhares.

Você sabia o tempo todo que eu chegaria a ter um sentimento tão profundo por ela?

Não é adequadamente cruel, Basile, que, agora, para protegê-la, eu precise abrir mão dela?

Liberte-nos, Basile. Libere Anastácia de mim e me libere, também, ainda que por pouco tempo. Apenas por alguns meses. É tudo que peço. Deixe-me em paz. Não quero pensar em pactos, em poder, nem em nada do que, como você, sou capaz de fazer.

Porque a parte mais doentia é que, mesmo de má vontade, admiro sua estratégia. Sinto um prazer doentio ao ver o plano em sua totalidade. ao saber que, no seu lugar, eu teria feito a mesma coisa: sacrificaria uma adolescente americana insignificante sem pensar duas vezes, no interesse de comandar tantas legiões malditas de vampiros. Quase posso sentir o poder em minhas mãos.

Mas, é óbvio, eu sou quem sou: produto de suas mãos.

Assim permaneço como sempre,

Sua,

Sempre, irrevogavelmente e irredimivelmente,

Quinn,

P.S: Anastácia pode surpreender todos nós, Basile. Pode mesmo. Talvez tenha uma tremenda capacidade de lutar. Mas não serei o instrumento de sua inevitável destruição.

P.P.S: no caso de você não ter deduzido o que quis dizer com tudo o que escrevi acima, deixe-me ser clara: opto por desobedecer o pacto.

A escolha não é uma coisa maravilhosa, Basile? Não é de se espantar que os americanos deem tanto valor a ela.

***

- Rachel?

Meus olhos se abriram de repente. Eu estava no meu quarto, deitada na cama, no escuro, mas havia alguém ali. Sentei-me num pulo, procurando a luz.

Outra pessoa a acendeu. Comecei a gritar, mas uma mão firme sobre a minha boca impediu, empurrando-me de volta no travesseiro.

- Não grite, por favor – sussurrou Quinn enquanto eu me retorcia. Fiquei parada e ela afastou a mão. – Peço desculpas por assustá-la e pelo tratamento grosseiro. Mas eu precisava falar com você.

Por um momento fiquei quase empolgada por encontra-la no meu quarto. Ela está aqui por minha causa... E então todos os acontecimentos da noite voltaram de uma vez.

Sentando-me de novo, apertei as cobertas em volta do peito.

- O que você quer? – falei rispidamente olhando o relógio. – São três da madrugada!

- Não pude dormir depois do que aconteceu esta noite. – Ela se sentou na beira da cama, sem ser convidada. Ainda vestia a roupa do baile, mas sem o terninho. A blusa estava amarrotada.

- Só vou conseguir descansar depois que conversarmos.

Levantando as cobertas, olhei para mim mesma, sem ter certeza do que usava para dormir. Será que estou descente, pelo menos?

- Está tudo coberto – garantiu Quinn, com um sorriso minúsculo nos lábios. – Sua roupa de dormir não revela nada além do amor insistente pelos cavalos árabes.

- Você está numa situação tão precária que nem acredito que tentou fazer uma piada. Passou totalmente dos limites.

Quinn ficou sem jeito.

- É mesmo. Só fiz a brincadeira na esperança de fingir que nosso relacionamento não tinha mudado essa noite.

- Você quase me mordeu, Quinn. E depois foi embora com a Kitty. Com certeza as coisas mudaram.

- O que eu fiz esta noite, ou o que quase fiz esta noite, foi imperdoável – concordou ela arrasada. – Foi repreensível. Não somente por ter chegado perto de mordê-la, mas também por fazê-lo em público. E com Kitty olhando, a mulher que me acompanhava. Não sei o que me deu. Nem sei como começar a pedir seu perdão.

Tudo naquele pedido de perdão doía. Estar perto de mim era “repreensível” era “ imperdoável”? Ela não conseguiu imaginar “o que deu nela” para sentir atração por uma criatura tão repulsiva como eu. Ainda mais porque isso teria perturbado sua preciosa prioridade: Kitty Wilde.

- Você me despreza mais do que nunca. Não é?

- É.

- Você foi embora, imagino que Brody tenha ficado chateado.

- Vamos sobreviver.

Meu tom frio pareceu confundi-la.

- É. Acho que vamos. – Ela esperou. – Pensei que você teria mais a dizer.

- O que quer que eu diga, Quinn? – Eu pretendia dar um gelo nela, mas de repente tudo saiu numa explosão. – Você aparece na minha porta, me persegue durante meses e, quando finalmente me convence de que sou especial, quando finalmente sinto algo por você, você vira tudo de cabeça para baixo e fica de quatro pela mesma loira perfeitinha de quem todo mundo gosta. Você é tão típica...

- É verdade? Você começou a sentir algo por mim?

Sua voz estava agridoce, mais azeda do que doce.

- Senti Quinn. Senti. Só por um momento. – Minha raiva foi sumindo, acomodando-se numa tristeza carrancuda. – Agora parece um pesadelo. Um “erro”, para usar a sua palavra. Um erro terrível.

Quinn esfregou os olhos cansados.

- Ah, Rachel... Não pense que sabe toda a verdade sobre o que faço ou digo – retrucou ela, enigmática. – Às vezes nem eu sei. Se pareço incoerente, é porque estou lutando comigo mesma.

Ela se inclinou para frente, torcendo as mãos.

- Que desgraça. Fiz uma tremenda confusão.

- É. Acho que sim.

Ela me olhou com sofrimento nos olhos.

- Você nunca vai entender como é ser seduzida pela normalidade.

Quase funguei.

- Você? Normal?

- Sim, eu. Normal.

- A última coisa com a qual você se importou foi em ser normal.

- Não Rachel. Isso não é totalmente verdade. Não nos últimos tempos. – Quinn se levantou e começou a andar pelo meu quarto pequeno, falando baixinho, quase consigo mesma. – Você não faz ideia de como foi ser criada na solidão. Ser criada para um objetivo. Seus pais, Rachel, não têm uma finalidade para você. Você não é uma ferramenta deles. Você existe apenas para ser amada por eles. Sabe como isso é estranho pra mim?

Olhei para ela, sem saber o que dizer. Sem querer interrompê-la.

Ela parou e sorriu para mim, um sorriso triste.

- Eu vim pra cá e, de repente, havia um mundo novo. Nossos colegas de escola, por exemplo. Eles têm permissão para ser tão... tão frívolos!

- Você detesta frivolidade.

- Mas a frivolidade é fácil. – O sorriso sumiu. – Eu costumava achar que os adolescentes americanos fossem ridiculamente voltados para si mesmos. Mas isso é viciante, por falta de uma palavra melhor. Eu me vi atraída pelo seu mundo. Estar entre vocês é estar de férias. As primeiras férias da minha vida. Se descontarmos as pressões inerentes ao cumprimento do pacto, não há expectativas para mim, além de fazer pontos de saque e ataque no vôlei.

- Quinn, o que você está tentando dizer?

Ela se deixou afundar de novo na cama.

- Acho que estou relutante em abrir mão de tudo isso por agora.

- Abrir mão de quê?

- Dos bailes enfeitados com papel crepom barato. Dos jeans. Do vôlei. De estar com uma garota sem o peso das gerações espiando por cima dos meus ombros...

- Kitty. Você não quer abrir mão da Kitty?

Ela recuou.

- Para uma garota que bloqueou todas as minhas tentativas de fazer a corte, de repente você está muito possessiva.

- Era você que ficava dizendo como era importante nós duas nos casarmos, caramba!

Quinn passou os dedos pelos cabelos cor do sol.

- Se tivesse mordido você esta noite não haveria como voltar atrás. Sabe disso, não sabe? Eternidade. É isso que estará em jogo quando estivermos juntas. Eternidade. Está preparada para isso? E, Rachel, uma parceria comigo não é algo que você deveria desejar. A eternidade pode vir mais depressa do que prevíamos, caso se junte a mim.

- Não entendi.

Ela segurou minha mão, entrelaçando meus dedos.

- É exatamente por isso Rachel Berry, que eu a liberei.

- O quê?

- Eu dissolvi o pacto.

- Por causa da Kitty – repeti, puxando a mão. Odiei o ciúme que me entregava como uma força física. – Você quer morder a Kitty. É disso que se trata.

Quinn balançou a cabeça.

- Não. Eu não morderia Kitty. Se bem que não tenho certeza se reluto por impor a condição de vampira em Kitty ou por impor Kitty ao mundo dos vampiros.

Não acreditei. Sabia que ela queria Kitty.

- Quinn, de acordo com o pacto, você precisa me morder. Nós estamos prometidas uma a outra. Se não fizer isso, violará o tratado e a guerra vai começar...

- Estou tentando lhe dizer, Rachel, que o pacto não existe mais.

Na voz dela havia um tom definitivo que me apavorou e meu ciúme foi substituído por uma agitação mais doentia, mais forte.

- O que você fez, Quinn?

- Escrevi aos Anciões. Avisei-os de que não vou mais participar desse jogo ridículo.

- Você o quê? – Isso saiu quase como um grito. – Você o quê? – repeti, baixinho.

Houve um tremor de medo, mas também de determinação, nos olhos de Quinn.

- Escrevi ao meu tio Basile. Cancelei todo o combinado.

- Achei que não pudesse fazer isso.

- Mas fiz.

Minha agitação se intensificou, virando pavor e fazendo minha nuca arrepiar. A última coisa que eu esperava ver no rosto de Quinn era medo. Por isso soube que ela estava numa encrenca enorme.

- O que vai acontecer?

- Não sei – admitiu Quinn. – Mas você vai estar em segurança. Não deve se preocupar. Fui eu que tomei a decisão. Eles não lhe farão mal. – Ela segurou a minha mão de novo e permiti que ela cruzasse nossos dedos outra vez.

- Mesmo que isso custe minha existência, Anastácia, você estará em segurança. Eu lhe devo isso, por motivos que nunca precisará saber ou entender.

O pânico tomou conta de mim e apertei os dedos dela com força.

- O que vai acontecer, Quinn?

- Não deve se preocupar com isso.

- Quinn... – Pensei na cicatriz no seu braço. Em suas palavras. “É claro que eles batiam em mim. Repetidamente. Estavam criando uma guerreira...” – Eles vão castigar você?

Ela deu uma risada sombria.

- Ah, Anastácia. Castigo não é exatamente o que vou enfrentar nas mãos dos Anciões.

- A gente pode tentar argumentar com eles... – falei, sabendo que era uma sugestão impraticável.

Quinn sorriu pra mim e havia ternura no rosto dela.

- Você tem um coração bom e é abençoada com uma ingenuidade que às vezes é perigosa. Mas o mundo está cheio de criaturas como minha pobre e malfadada Fera. E eu. Criaturas que presenciaram coisas monstruosas e acabaram por se tornar monstros também. Criaturas que talvez devessem ser sacrificadas.

- Para com isso, Quinn – exigi. – Para de falar assim!

- É verdade, Anastácia. Você nem pode conceber as coisas que aparecem nos meus sonhos, nas minhas tramas e na minha imaginação...

Engoli em seco.

- Foi isso que quis dizer no Halloween, quando falou que poderia me mostrar coisas “não legais”?

Os dedos de Quinn apertaram os meus.

- Ah, não, Anastácia. Nada de violência contra você. Independentemente do que pensa de mim ou do que vá recordar de mim no futuro, por favor, acredite que eu não iria nem poderia fazer mal a você. Talvez houvesse um tempo antes de eu conhece-la, em que, se você tivesse ficado no meu caminho para o poder... mas agora, não. – Ela hesitou e afastou o olhar. Depois murmurou: - Meu Deus, espero que não...

- Tudo bem Quinn – acalmei-a. – Sei que não faria mal a mim. – Mesmo assim, ela ter admitido aquilo me abalou. Houve um tempo em que ela poderia ter feito mal a mim? Por que acrescentou aquela advertência no final?

Mas Quinn não estava me escutando. Ela olhava fixamente para as paredes cor-de-rosa que tanto odiava.

- Para minha família, para os meus filhos, poderia ter sido diferente. Eu realmente vi um novo caminho aqui, apesar de todas as vezes que zombei deste lugar e de suas convenções.

- E se você ficasse aqui? – sugeri, esperançosa. – Poderia viver como uma pessoa comum.

Assim que soltei as palavras, percebi como pareciam bobas. Mesmo assim Quinn me surpreendeu dizendo:

- Talvez por mais algumas semanas, se eu tiver sorte.

- Só isso?

- Só. Sei qual é o meu lugar e eu seria atraída de volta a ele – Quinn desentrelaçou nossos dedos, ficando de pé. – O importante é que saiba que está liberada do pacto. Absolvida. Você está livre para... bem... – Um toque do seu riso de zombaria se esgueirou de volta na voz dela. – Livre para fazer o que quiser da vida. Ir para a faculdade. Morar em alguma casa de dois andares no subúrbio. Ter filhinhos de olhos azuis, com gosto pela vida rural, correndo pelo campo. Seu destino lhe pertence. Isso eu prometo.

- E se eu não quiser mais essas coisas?

- Confie em mim, Anastácia... Rachel. Um dia você vai olhar para esses poucos meses e achar que não passaram de um sonho estranho. Um pesadelo em potencial. E vai ficar muito, muito feliz, por ele jamais ter se realizado.

Então Quinn beijou minha testa e eu soube que o peso de nosso destino compartilhado jamais seria tirado de seus ombros. Ela podia brincar de ser uma adolescente normal, mas isso era apenas um breve adiamento. O destino de Quinn Fabray estava amarrado em pergaminhos, preso em genealogias e imposto por punhos ou coisa pior. Isso me deu calafrios.

Ouvi seus passos indo em direção à porta, mas ela parou antes de sair.

- A criatura mais linda que eu já vi na vida foi você, esta noite – disse baixinho. – Quando dançamos... e a visão de você me deixando, com a cabeça erguida, sem olhar pra trás, enquanto as pessoas abriam caminho... Não importa onde more e com quem escolha se casar, Anastácia, você sempre vai fazer parte da realeza. Eu vou me lembrar eternamente de sua imagem esta noite, assim como vou recordar do modo como chorou por mim quando eu estava machucada lá embaixo. Esses são dois presentes que você me deu e que vou guardar enquanto puder.

Quinn saiu e fechou a porta. Depois, apesar da doçura e do calor de suas palavras, estremeci no escuro.


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Notas finais do capítulo

É isso...



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