O refeitório parecia um daqueles bares de estrada. O lugar era grande, uma casa toda de madeira com a decoração rustica, com certeza não é o tipo de lugar que se espera encontrar em um acampamento para semideuses, a menos que sejam os semideuses do faroeste. Em um enorme balcão havia um homem musculoso que servia a carne. Em um canto tinha três mesas, cada qual com vários copos. Percebi que uma só tinha água, na outra qualquer tipo de refrigerante que você possa imaginar e na outra tinha suco.

Semideuses e sátiros circulavam pelo local. Logo eu e Leae havíamos perdido Peter em meio à multidão. Achamos John e Vector sentados em uma mesa no canto conversando com um senhor de aparência seria. Aproximamo-nos do local, quando nos viram, eles pararam a conversa.

– Senhor Terácio, essas são Leae e Beky. Trouxemo-as com John. – Vector nos apresentou.

– Um prazer conhece-las minhas jovens. – o Sr. Terácio disse. – Por que não se sentam?

Eu e Leae nos sentamos. As cadeiras eram de madeira com um acolchoado de couro. Não tinham braços, mas eram extremamente confortáveis. Depois de acomodadas, eu perguntei.

– O senhor é o diretor do acampamento?

– Sou sim, por que a pergunta? – ele respondeu/perguntou.

– Minha mãe me disse que o senhor já havia informado a ela que eu teria que ficar um tempo aqui.

– Sim, sua mãe. Uma pessoa muito agradável, uma aluna excelente, treinei muito bem ela.

– Minha mãe esteve aqui?

– Claro! Jane, não é? Todos os semideuses na América do Sul já estiveram aqui!

– Quer dizer que existem outros acampamentos?

– Ah sim! Em cada continente tem um, menos na Oceania, Antártida e América Central.

– Por que escolheram Salvador pra guardar o acampamento?

– Quem disse que estamos em Salvador?

– Mas eu vim do meu colégio! E o meu colégio fica em Salvador!

– O acampamento está em todos os lugares! Em cada lugar da América do Sul tem um!

– Como se pode estar em centenas de lugares ao mesmo tempo?

– Os deuses fazem isso toda hora! Só é necessário um pouco de magia! Hecáte é a deusa patrona do nosso acampamento, os deuses menores tem esse privilégio.

– Não sabia disso.

– Acha que os livros que você lê dizem tudo?

– Mas o Acampamento Meio-Sangue existe? E Nova Roma?

– Existem! Lógico!

– Quer dizer que as histórias dos livros são reais?

– Como você é esperta! Sim, são! Tudinho que você leu.

– Mas tem algumas coleções que ainda estão sendo escritas, significa que o que ocorre nelas está acontecendo agora?

– Significa que se conversarmos mais, o almoço vai acabar e você não comerá nada.

Nem tinha percebido o tempo passar enquanto conversávamos. Meus amigos nem estavam mais na mesa, provavelmente fazendo seus pratos. Mas o modo como ele mudou de assunto me incomodou imensamente. Se nada estivesse acontecendo ele não teria mudado de assunto. Decidi deixar pra lá, porque meu estômago não estava me deixando pensar direito.

Comi um delicioso churrasco com macarrão (eu sei que é uma combinação estranha, mas são os meus dois pratos favoritos) e bebi um milk-shake especial para novatos. Depois que todos já tinham acabado, o Sr. Terácio se posicionou a frente e pigarreou, as conversas pararam e todos os olhares se direcionaram a ele.

– Boa tarde a todos! – ele começou. – Creio que todos acharam o almoço maravilhoso, pois este realmente estava. Meus parabéns para Júlio, o nosso cozinheiro. Hoje recebemos novos semideuses! Subam aqui, por favor, John, Leae e Beky.

Opa, opa! Por essa eu não esperava! Mas fiz o que ele mandou e subi no tablado, me posicionando entre John e Leae, logo atrás do Sr. Terácio.

– John Grur, filho de Zeus! Deixo você agora com seus irmãos! – ele exclamou.

Então John era filho de Zeus... Interessante. Uma massa de garotos e garotas com cabelos encaracolados e olhos azuis veio à frente e receberam John com cumprimentos amigáveis. Logo eles não estavam mais no refeitório. Os murmúrios recomeçaram e eu ouvi algumas garotas dizendo “Que gato”. O Sr. Terácio pigarreou de novo, surtindo o mesmo efeito de antes sobre a “plateia”.

– Leae Vrestan, filha de Atena! Que seus irmãos a guiem! – ele falou.

Vários garotos e garotas se aglomeraram na frente, todos com olhos castanhos puxados pro cinza, entre eles reconheci Mike. Eles também cumprimentaram Leae e a levaram para fora. Dessa vez ninguém arriscou um murmúrio. O Sr. Terácio continuou:

– Agora temos aqui uma semideusa que é filha de semideuses que são filhos de semideuses... Muito sangue divino. Seus parentes que escolham. Beky Darlins, com sangue de Poseidon, Hades, Deméter e Apolo! Quem ficará com ela?

Os murmúrios encheram o salão como uma onda. Uma garota de cabelos loiros brilhantes disse:

– Nós ficamos com ela!

– Nem pensar! Nós temos menos semideuses! – gritou um garoto de olhos verdes e cabelos castanhos.

– Nós só temos dez! – exclamou um garoto com olhos azuis.

Dai começaram uma discussão. Os que provavelmente eram filhos de Apolo gritavam que o número de semideuses não importava, os filhos de Deméter gritavam que como não era o grupo que tinha mais semideuses nem o que tinha menos deveriam ficar comigo e os filhos de Poseidon gritavam que tinham poucos semideuses. Então uma garota que devia ter uns 14 anos e que era extremamente parecida comigo chegou mais a frente.

– Eu fico com ela. – ela disse pacificamente.

Como todos os outros estavam ocupados demais discutindo, nem a ouviram. O Sr. Terácio assentiu pra ela e fez um gesto para eu segui-la. Ninguém percebeu também quando eu desci do tablado e fui com a garota para fora do refeitório.