Solidão escrita por XxLininhaxX


Capítulo 3
Cap. III – A morte




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Hyoga acordou um pouco tonto. Podia jurar que alguém havia entrado no quarto na noite passada e havia feito carinho em seu rosto. Ele estava dormindo, mas pôde sentir. Era um toque diferente, não sabia quem tinha feito aquilo, mas havia gostado. Gostou tanto que começou a sonhar que Ikki estava lá, fazendo-lhe aquele carinho tão gostoso. Mas depois, percebeu que jamais poderia ser Ikki e passou a sonhar com Kanon. E por falar em Kanon, encontrou-o sentado em uma cadeira perto de sua cama, debruçado em seu peito e segurando sua mão. Sentiu todo o carinho que Kanon transmitia. E também sentiu, ao ver sua expressão, que ele estava cansado e que havia passado a noite toda ao seu lado. Isso o deixou triste e feliz ao mesmo tempo. Gostava de saber que Kanon tinha pelo menos um pouco de carinho para com ele, mas teve a certeza de que aquele carinho que ele sentiu na noite passada não foi Ikki. Voltou a ter aquele olhar melancólico e vazio. Olhou para o outro lado e viu seu Mestre sentado em um sofá, com a cabeça apoiada para trás. Sabia que tinha agido mal com seu Mestre e pretendia se desculpar, mas não queria acordá-lo.

Antes de pensar qualquer outra coisa, sentiu sua mão ser apertada e o peso do corpo de Kanon diminuir. Kanon estava acordando, e ao ver Hyoga acordado sorriu:

- Quem bom que acordou! – Disse Hyoga.

- Você sente-se melhor? Deixe-me tirar sua temperatura. – Kanon verificou se a febre havia abaixado, mas estava do mesmo jeito. – Droga, ainda está alta.

- Não se preocupe, isso logo vai acabar. Por que não vai descansar um pouco? Você deve estar todo dolorido de ter dormido em uma posição tão ruim.

- Você planejou tudo isso, não foi?

- É, foi sim. Agora que eu estou doente, vou voltar para a Sibéria e acabar com a minha vida de uma vez por todas. Morrerei e ficarei eternamente perto de minha mãe e meu Mestre Cristal. – Pela primeira vez, Kanon viu um sorriso de felicidade no rosto de Hyoga; era lindo. O irônico é ele estar feliz com sua própria morte.

- Você não vai desistir dessa idéia, não é?

- Não, ninguém vai sentir minha falta mesmo!

- Eu vou sentir.

- Você tem ao Saga, não precisa de um pivete, como eu, ao seu lado.

- Você pode ser um pivete, mas é o pivete que eu gosto. Aliás, não só eu como seus amigos e seu Mestre.

- Todos têm a quem se apoiar, não vão ficar tristes por muito tempo, isso se ficarem tristes.

- Hyoga, você não tem jeito! O que eu posso fazer para melhorar esse seu ânimo?

- Vá descansar e depois volte para os braços de quem você ama! Da minha vida cuido eu!

- Você é duro na queda, hein?

- Eu só... – Hyoga parou de falar, sentiu uma dor muito forte no peito.

Kanon se desesperou, não sabia o que fazer. Viu Kamus dormindo e o sacudiu com toda força, para acordá-lo:

- Kamus, acorda! ACORDA DROGA!

- AI! O que pensa que está fazendo? Quer me matar? – Disse Kamus um pouco tonto.

- O Hyoga, ele tá passando mal! Anda depressa!

- O que?

Kamus logo se recuperou do susto e foi atender Hyoga. Ele estava com falta de ar e seu peito começou a doer, buscando alguma forma de respirar. Kamus pegou um nebulímetro ( aquelas bombinhas que ajudam a pessoa a respirar, não tenho certeza quanto ao nome.) e colocou em Hyoga. Logo ele se acalmou e voltou ao normal. Kamus se aliviou:

- Que bom que passou, mas se continuar assim terei que levá-lo ao hospital. Acho que não vai ter jeito.

- NÃO! – Hyoga gritou, mas logo perdeu o ar e Kamus teve que ajudá-lo novamente.

- Por que gritou, quer ficar pior?

- Não quero ir... para o hospital... eu vou melhorar.. eu... eu prometo...

- Não vem não, Hyoga. Você acha que eu vou te deixar nesse estado?

- Eu quero... ficar... aqui...

- Kanon, será que você pode nos deixar a sós!

- Tudo bem, mas pega leve com ele. – Disse Kanon saindo do quarto.

- Eu sei o que faço!

Kanon saiu do quarto e Kamus deu um suspiro bem demorado. Aquela conversa ia ser bem longa. Ele se sentou ao lado de Hyoga na cama e começou a acariciar seus cabelos. Kamus ficou algum tempo só com aquela carícia, percebeu o quanto seu pupilo havia crescido, mas continuava com aquela cara de criança inocente. Suspirou novamente e acariciou o seu rosto, estava tão bom daquele jeito, ele não queria conversar, queria mostrar que gostava dele. Mas Hyoga ficou um tanto inquieto, ainda estava sem jeito por causa da noite anterior:

- Mestre, eu queria te... pedir desculpas por... – Foi interrompido por Kamus.

- Sssshhhiiiuuu... não diga nada! Depois você pode falar, mas agora, deixe-me aproveitar as boas lembranças.

Ficou silêncio por um tempo, até que Kamus resolveu começar. Tentou ser bem sutil:

- Você não mudou mesmo. Você está igualzinho aquela criança de muito tempo atrás. Uma criança sozinha e triste, que só precisava de um carinho. Eu não podia te dar isso, tinha que ser o mais frio possível para que você entendesse que ser cavaleiro não era brincadeira. Mas agora as batalhas acabaram, não preciso mais agir assim. – Kamus passou sua mão delicadamente no rosto de Hyoga, que fechou os olhos aproveitando aquele momento. – Lembro-me da primeira vez que você ficou doente. Tive que fazer de tudo para você não morrer. Você passou muito mal, mas eu estava pior. Não sabia o que fazer, até que um dia você, deitado em sua cama, segurou minha mão e disse “papai”. – Hyoga corou com o comentário, sabia que Kamus não era sentimental e ele ainda era uma criança. – Eu fiquei com os olhos marejados, não podia responder. Mas aquilo, por mais incrível que pareça, me deixou mais tranqüilo. Se você tinha me chamado assim é porque confiava em mim. E isso me motivou a continuar cuidando de você.

Kamus ficou calado um tempo, apenas fitando o discípulo que já estava com os olhos marejados:

- Como acha que eu me sinto vendo você desse jeito? Querendo morrer e sofrer. É difícil! Tudo bem, nunca demostrei esse sentimento antes, mas não esperava que isso acontecesse.

- A culpa... não... não é sua...

- Não fale nada, deixe-me terminar. Hyoga, você é importante para mim. Eu não gosto de vê-lo tão abatido, e tudo isso por causa de um idiota, que você acha que te odeia, mas está completamente apaixonado por ele. Hyoga, a vida tem seus altos e baixos. Se toda vez que um ser humano estiver diante de um problema, não agüentar e se matar, o mundo não teria ninguém. Todos têm seus problemas, e você não é uma exceção. Eu sei que você se sente sozinho, mas morrer não é a solução.

- O Kanon... ele te... contou... não é?

- Sim, me contou tudo. Nunca pensei que você pensaria coisas como aquelas. Isso me deixou muito chateado. Você pode até não acreditar, mas eu já passei por isso. Quando voltei a vida, percebi o quanto eu amava o Milo. Mas ele só conseguia me irritar, eu detestava essa mania dele. Até que um dia ele teve coragem e se declarou para mim. Descobri que ele só me irritava para me ver ao seu lado. Às vezes as coisas não são o que parecem. Você disse que a pessoa por quem você está apaixonado te odeia, mas você já perguntou para ele?

- Não...

- Então você jamais pode ter essa certeza. Eu entendo completamente o que você está sentindo. Quando a gente se apaixona, só queremos a pessoa amada ao nosso lado, e quando não a temos nos sentimos sozinhos. Mas no seu caso, sua paixão te cegou, porque você achava que não tinha ninguém com quem pudesse desabafar. Entendo seu desespero, mas você precisa valorizar a vida que tem. Acredite em mim, Hyoga, a vida é muito preciosa. Eu, que já passei pela morte, consigo ver isso. E estou tentando fazer com que você veja isso também. Não quero que passe pelo que eu passei, sei que um dia todos nós vamos morrer, mas não tente antecipar esse dia.

- Mas... Mestre...

- Você não está mais sozinho, eu estou aqui para te ajudar. Você sabia que foi a Athena que me chamou aqui? Sabia que todos os seus amigos estão muito preocupados com você? Na verdade, Hyoga, você nunca esteve sozinho, você se isolou porque achou que seus amigos não precisavam ouvir sua dor e sofrimento.

- Eu... sinto muito... mas...

- Prometa para mim, prometa que não vai tentar suicídio novamente! Prometa que não vai ficar sofrendo sozinho!

- Não... não posso...

- Você não entendeu, Hyoga? Não entendeu que você está sofrendo porque quer? Não entendeu que, além de fazer você sofrer, está fazendo todo mundo sofrer também?

- Mestre... não quero mais sofrer... não quero ver meus amigos sofrendo... mas... mas eu não agüento... não agüento mais a pressão... é difícil...

- Eu já disse, Hyoga, você está sofrendo porque quer. Por que você não conversa com o Ikki?

- Co... como... como você sabe?... O Kanon... te contou?

- Não, ele só disse que era uma pessoa conhecida e que, atualmente, mora aqui na Mansão. E a única pessoa que mora aqui na Mansão e parece que te odeia é o Ikki. Por que não fala com ele?

- Eu já... já tentei... mas... mas ele não me es... escuta...

- Entendo, realmente ele parece ser bem cabeça dura. Mas se você gosta tanto dele, por que está desistindo tão facilmente? Não quer saber se ele gosta de você?

- Tenho medo... de descobrir...

- Se você não encará-lo de frente, jamais vai parar de sofrer!

- Por isso eu quero morrer.

- Mas isso eu não vou permitir!

- Você não... pode... me impedir

- Você sabe que posso. Vamos, deixa de ser medroso e levanta esse ânimo! Por que você não me mostra aquele sorriso bem grande!

- Não consigo...

- Tudo bem, você é mais cabeça dura que o Ikki! Mas, pelo menos, prometa que não vai cometer uma loucura.

- Não quero...

- Isso é uma ordem!

- Não... não vou... obedecer...

- HYOGA!

- Tá bem... eu prometo...

- Ótimo! Não faça essa cara, você ainda vai me agradecer algum dia. Bom, agora, chega de papo, eu preciso cuidar de você.

- Mestre...

- Sim!

- Obrigado!

Kamus deu um beijo na testa de Hyoga e passou a cuidar dele.

Durante a semana, Hyoga melhorou bastante. Teve que ir algumas vezes ao hospital, mas conseguiu melhorar. Pelo menos em questão de saúde, mas por dentro ainda sentia aquele vazio. Já tinha resolvido, ia voltar para a Sibéria. Lá ele poderia esquecer um pouco os problemas e quem sabe, depois de tudo resolvido, ele não voltaria. Somente Kamus, Kanon, Milo e Saori sabiam dessa decisão, Hyoga não queria que seus amigos soubessem. Sabia que se eles descobrissem, não permitiriam sua partida.

Saori, sabia disso, mas não concordava com Hyoga. Queria que ele ficasse no Japão com os amigos, então fez questão de contar para eles:

- Seiya, Shiryu, Ikki e Shun, eu chamei vocês para pedir um favor. Vocês sabem que o Hyoga já está melhor, não é?

- Sim, e daí? – Perguntou Shun.

- Bem, agora que melhorou, ele cismou que quer voltar para a Sibéria.

- O QUE! – Manifestou-se Ikki, que ao ver o olhar assustado dos outros se acalmou e continuou a escutar, fingindo indiferença.

- Mas por que ele quer voltar? – Perguntou Shiryu.

- Isso só o Kanon e o Kamus sabem. Mas eu gostaria que vocês conversassem com ele, talvez ele mude de idéia se vocês pedirem.

- Vocês vão perder tempo se acham que ele vai desistir. – Disse Ikki. – Vocês conhecem aquele Pato, sabem que quando ele cisma com alguma coisa, ninguém consegue convence-lo do contrário. – Ikki se levantou para sair, mas antes disse. – Deixem ele ir, não vai fazer falta nenhuma.

Ikki saiu da sala de cabeça baixa, deixando a todos confusos. Ikki ficou tão chocado com a notícia que havia se exaltado na frente de todos. Ikki ficou chateado:

- “ Quem aquele Pato pensa que é para me abandonar desse jeito? Agora eu entendi porque o Kanon falou antes que fosse tarde demais. Mas o que eu posso fazer para ele não ir? Não posso me declarar, não quero fazer isso. Mas também não quero ficar longe do meu Patinho! Droga, de novo em um beco sem saídas! O jeito é torcer para que meus amigos consigam convence-lo. Queria pelo menos me despedir decentemente, mas... ”

Ikki foi tirado de seus devaneios por trombar com alguém:

- Por que não olha por onde anda, imbecil?

- Você não tem educação, não Fênix? Foi sem querer, além disso, foi você que trombou em mim. Fica aí, viajando na maionese e não olha por onde anda. Cuidado para não pensar muito, senão sai fumaça. – Disse Kanon se levantando e limpando a roupa.

- Ora seu... – Ikki ainda estava caído no chão.

- Kanon! Que bom que chegou! – Hyoga vinha descendo as escadas com aquele sorriso alegre que a muito tempo não dava, mas passou a se alegrar mais depois da conversa com Kamus.

- Hyoga, meu Patinho, é tão bom vê-lo feliz desse jeito. Sabia que você fica lindo sorrindo! – Hyoga corou com tal comentário. Chegou perto de Kanon e lhe deu um selinho.

Hyoga não havia percebido a presença de Ikki, que ainda estava caído no chão. Quando percebeu tentou ajudá-lo:

- Oi Ikki! Não tinha te visto aí. Você está bem? – Disse dando a mão para o amigo.

- Humf... – Ikki dispensou a ajuda e se levantou sozinho. – Por que não vão se agarrar em outro lugar, hein?

- Credo, já de mau humor? Isso faz mal para a saúde! – Disse Hyoga.

- Vocês dois me irritam!

- Tá com ciúmes, Fênix? Não pensei que gostasse do Hyoga! – Disse Kanon.

- Kanon! – Hyoga o repreendeu, MUITO corado.

- Tá com medo de perder ele para mim, Gêmeos! – Ikki já tinha perdido o controle mesmo, então, pelo menos ia se divertir um pouco.

- Eu confio no meu taco! Mas acontece que eu e Hyoga não estamos tendo uma relação, só estamos, como posso dizer! “Ficando”, se é que me entende! Aliás, eu já amo outra pessoa e o Hyoga já tem um pretendente. – Dessa vez, Hyoga ficou roxo.

- AH! Então quer dizer que o Ganso está apaixonado! Quem será o pobre coitado! – Ikki disse isso da boca para fora, estava morrendo de ciúmes e curiosidade para saber quem havia roubado o coração de seu Patinho.

- Você não precisa saber! Não é da sua conta! – Disse Hyoga, um pouco chateado.

- Humf... Tem razão, não tenho nada haver com a sua vida! Dela eu quero distância!

Ikki se virou e foi em direção do jardim. Hyoga deu um suspiro de tristeza, por que Ikki tinha que lhe ferir daquela forma? Kanon percebeu e tentou animá-lo:

- Não fique assim, tenho certeza que ele só fala isso da boca para fora.

- Queria poder acreditar nisso! – Hyoga suspirou mais uma vez. – Bom, mas isso não importa. Que tal você me ajudar a fazer as malas? Vou para a Sibéria amanhã!

- Eu já vou te ajudar, mas antes eu preciso falar uma coisa com o Milo. Vai na frente que depois eu vou, tá bem?

- Tá!

Hyoga subiu para o quarto. Kanon foi em direção do jardim, não era exatamente com Milo que ele ia conversar. Ao chegar, encontrou Ikki sentado em um banco em frente ao jardim. Resolveu conversar:

- Fênix!

- O que quer aqui?

- Calma, só quero conversar!

- Não tenho nada para falar com você!

- Você vai deixar o Hyoga ir embora sem dizer nada?

- Isso não é da sua conta!

- É claro que é!

- E por que?

- Porque não quero ver o Hyoga triste!

- E o que eu tenho haver com isso?

- Você não imagina o quanto está envolvido.

- Eu sei que ele não gosta de mim, ele deixa isso muito claro! Por que se interessa tanto que eu me declare?

- Porque você ainda pode ter uma surpresa!

Ikki ficou calado, o que será que Kanon queria dizer com isso? Será que... Não, ele não conseguia acreditar! Mas no fundo de seu coração, uma pontinha de esperança se formou. Kanon se virou para ir embora, mas antes disse:

- Você é muito cabeça dura, Fênix! Vai deixar de ser feliz por causa de um orgulho bobo.

- Espera, Kanon! Você sabe de quem o Hyoga gosta, me diga, quem é?

- Se você é tão cego a ponto de não enxergar o óbvio, pode ter certeza que não chegará a lugar nenhum! Descubra por si próprio quem é o verdadeiro amor de Hyoga!

Kanon foi embora. Mais uma vez Ikki ficou confuso, Kanon falava de uma forma muito obscura, porém ele deixava as coisas muito claras. Era difícil decifrar as palavras de Kanon, mas ele precisava saber! Havia uma possibilidade de Hyoga estar apaixonado por ele? Tinha que descobrir, e antes que Hyoga fosse embora.

Ikki estava tão absorto em seus pensamentos que nem viu seu irmão se aproximar:

- Hey, niisan! Posso me sentar aqui?

- Hã? Ah, claro Shun!

- No que estava pensando? Estava muito concentrado, deve ser importante para deixá-lo com esse ar de seriedade.

- Nada de importante, estava pensando na minha vida.

- Por que não pára de ficar escondendo o que sente e se abre mais?

- Você sabe que não sou desse tipo.

- Mas assim você não vai conseguir ser feliz. Por que não se declara logo para o Hyoga e acaba com esse sofrimento?

- O QUE?

- Não precisa ficar tão espantado, eu sou seu irmão. Se eu não soubesse de seus sentimentos, seria um cego! Eu conheço você, sou o único que sabe a verdade sobre seus sentimentos.

- Não sei o que seria de mim sem você, Shun.

- Eu só quero te ver feliz! Vamos, maninho! Deixe de ser tão orgulhoso e vá logo falar com ele!

- Eu não consigo!

- É claro que consegue! Você só precisa de um empurrãozinho! Toma, isso é para você. – Shun estende um pequeno caderno para o irmão.

- O que é isso?

- Era do Hyoga. Como ele também é muito reservado, escreve seus sentimentos aí.

- Como sabe?

- Ele é meu melhor amigo, basta forçar um pouco e ele conta todos os seus segredos. Mas só tem um que eu nunca descobri.

- E qual é?

- De quem ele realmente gosta. Mas, depois de ler esse caderno, descobri coisas interessantes.

- Como conseguiu esse caderno?

- Isso é segredo! – Shun piscou para seu irmão e se levantou. – Bom, tenho que ir. Você sabe o que tem que fazer, não é?

- Isso não é certo.

- O que não é certo é a verdade ser escondida! Tenho certeza que você vai gostar do que está escrito aí! Você tem que ler, antes que ele vá embora!

Shun entrou na Mansão sorridente, deixando um Ikki muito confuso para trás. Ikki não sabia quais eram as intenções de Shun, mas agradecia aos deuses por tê-lo como irmão. Ele era o único que o entendia, e sempre o ajudava! Ikki amava muito seu irmão e continuaria amando para sempre. Ele nem percebeu, mas ficou, mais ou menos, meia hora pensando no irmão. Até que se deu conta do objeto em suas mãos. Então, o nome da pessoa que Hyoga amava de verdade estava escrito naquele caderno! Por que será que ele estava com medo de ler? Pensou em devolver para Shun, o caderno, e dizer que não tinha nenhuma chance de rolar nada entre Hyoga e ele. Mas havia alguma coisa no fundo de seu coração que insistia que ele deveria ler e procurar Hyoga. O seu grande problema era seu orgulho, Ikki era muito orgulhoso. Não gostava de falar sobre seus sentimentos, seu orgulho fazia-o se sentir superior a essas “frescuras”; como ele julgava. Mas isso era só fingimento, ele era sozinho e sofria, sim, por causa dos sentimentos, só não demonstrava.

Ikki decidiu entrar e descansar. Estava muito tenso e precisava esfriar a cabeça. Resultado: Não conseguiu. Hyoga não saía de sua cabeça! E ainda tinha aquele maldito caderno que ele não conseguia soltar. Ele, praticamente, dormiu abraçado com ele. Teve pesadelo e depois não conseguiu mais pregar os olhos. Como estava na hora do jantar, decidiu descer e comer alguma coisa.

Ao chegar na sala de jantar, viu Hyoga e Kanon abraçados à mesa. Seu coração pesou, mas continuou do mesmo jeito; indiferente:

- Oi niisan! Que bom que chegou! – Disse Shun.

Todos, imediatamente, olharam para Ikki:

- Oi gente! O que estão olhando, perderam alguma coisa? – Disse Ikki.

- Esse é o nosso Ikki, sempre de mau humor! – Debochou Seiya.

- Pelo menos eu tenho um cérebro, diferente de você!

- Será que vocês podem parar de discutir! Até na hora do jantar vocês têm que brigar! – Disse Saori.

- Perdão, senhorita. – Disse Seiya.

Ikki não disse nada. Olhou na direção de Hyoga, que estava olhando para ele. Quando seus olhos se encontraram, Ikki teve calafrios percorrendo-lhe a espinha. Mas o que o surpreendeu foi Hyoga ter ficado corado e desviar o olhar. Será? Será que suas suspeitas estavam certas? Ikki lembrou-se do caderno, tinha que ler.

Depois do jantar, nada de interessante aconteceu. Todos conversaram amigavelmente e depois foram dormir.

Hyoga estava ansioso! Voltaria para as terras gélidas da Sibéria, ia encontrar seus antigos amigos e, principalmente, estaria longe de seus problemas. Hyoga não pretendia voltar tão cedo, nem passagem de volta ele comprou. Claro que ele sentiria falta de seus amigos, de sua deusa, de seu Mestre e de seu amor, por mais que esse o fizesse sofrer. Mas não tinha volta, ele já havia decidido e só um milagre para fazê-lo desistir.

De manhã, bem cedo, Hyoga levantou-se. Ninguém estava acordado, nem mesmo seu Mestre. Hyoga não queria se despedir, por isso pegara o vôo o mais cedo possível. Somente Tatsume estava de pé. Hyoga nem se despediu dele, afinal, não ia muito com sua cara. Apenas disse:

- Cuide-se Tatsume. E cuide da Saori também.

- Isso você nem precisa pedir!

- Ótimo! Gostaria que dissesse para todos que eu não queria me despedir, não por falta de coragem, mas porque, com certeza, nós nos veremos de novo. E porque também não gosto de despedidas.

- Pode deixar.

- Obrigado.

Hyoga saiu sem dizer mais nada. Olhou para trás, com certeza, sentiria falta de todos.

Quando já era um pouco mais tarde, todos acordaram e foram tomar o café da manhã. Ikki, sentiu falta de Hyoga, mas não perguntou nada. Nem mesmo Kanon havia comentado, então ele deveria estar bem. Mas, mesmo assim, ele sentia um aperto no coração. Era como se ele tivesse perdido uma parte importante de si. Estava com um pressentimento ruim. Perguntou-se como Hyoga estaria! Será que ele estava bem! Tinha que vê-lo ou essa dúvida jamais sairia de sua mente.

Depois do café, finalmente, alguém resolveu perguntar:

- Onde está Hyoga? Ele ainda está dormindo? – Perguntou Kanon.

- Deve estar. – Disse Milo.

- Aquele Pato é realmente muito preguiçoso! – Debochou Ikki.

- Hyoga não está dormindo. – Disse Tatsume.

- Como sabe? – Perguntou Saori.

- Ele foi embora já faz tempo.

- O QUE? – Todos perguntaram, surpresos.

- É, ele foi logo de manhã. Eu até estranhei ele ter acordado aquela hora.

- Mas... ele nem se despediu! – Disse Ikki em um tom de mágoa.

- Ele disse que não queria se despedir porque vocês voltarão a se ver. E também disse que não gosta de despedidas.

- Aquele Pato desprezível! É um covarde! – Ikki agora não conseguia se controlar mais. Saiu correndo para seu quarto, tentando esconder as lágrimas.

Ikki trancou a porta, deitou-se na cama e socou seu travesseiro. Não conseguia acreditar que seu Patinho o havia abandonado desse jeito! Começou a sentir raiva de Hyoga! Queria mais é que ele morresse! Mas, de repente, se lembrou do caderno. Pelo menos ele poderia saber de quem Hyoga realmente gostava. Ikki pegou o caderno e abriu, na primeira página tinha um poema e algumas observações. Ikki folheou o caderno, mas só aquela página estava escrita. Então ele começou a ler:

Sofrer, sofrer

Não vou mais agüentar

Sofrer, sofrer

À morte me entregar

Venha morte

Minha vida destruir

Venha morte

Em seus braços quero cair

Minha vida acabou

Não sou digno de viver

O meu tempo terminou

A morte eu irei ver

Por que? Por que?

Não agüento mais a dor

Por que? Por que?

Não posso ter meu amor

Sozinho eu estou

Sofrendo de amor

O amor que me isolou

E me fez sentir dor

Digo adeus

A todos com quem, durante minha vida, andei

Digo adeus

A quem verdadeiramente amei

OBS: Esse foi meu poema de adeus, quase não dá para ler porque minhas lágrimas mancharam o papel. Quero dizer que minha vida acabou aqui, não quero mais viver, não agüento mais tanto sofrimento. Vou me atirar aos braços frios e eternos da morte. Mas antes, como eu sei que alguém, algum dia vai ler minhas angústias, quero me despedir de pessoas que foram importantes para mim:

Shun, meu melhor amigo! Aquele que sempre ouviu meus problemas, que sempre me consolava, que sempre estava ao meu lado. Jamais me esquecerei de seus braços acolhedores.

Shiryu, um amigo sábio, honesto! Aquele que sempre admirei, que sempre me dava sermões e conselhos, que sempre se preocupou comigo. Jamais me esquecerei de sua amizade.

Seiya, um amigo alegre, divertido! Aquele que sempre me fez lutar pela paz, que sempre me alegrou, que sempre me mostrou que a vida também tem alegria. Jamais me esquecerei de seu sorriso.

Kamus, meu Mestre! A pessoa que me criou e cuidou de mim com todo carinho que poderia me dar. A quem sempre admirei por sua força e seus ensinamentos. O pai que eu não tive! Mestre Kamus, meu pai de coração, eu te amo! Obrigado por tudo!

Milo, um guerreiro muito forte! A pessoa que deu felicidade ao coração de meu Mestre. Um amigo sincero e verdadeiro. Devo-lhe perdão por causa de nossas brigas. Sempre te achei uma excelente pessoa, com quem aprendi muito também! Agradeço aos deuses por ter te conhecido!

Saori, minha deusa! A quem protegi com meu corpo e alma! Não me arrependo de tê-la protegido. Talvez minha ajuda não tenha sido muito grande, mas fiz o que pude. Você sempre será minha deusa, não importa aonde eu estiver. Muito obrigado!

Kanon! AH Kanon! Você me ajudou nos momentos de dor com sua alegria, seu carinho. Eu sentirei muita falta de seus carinhos, seus abraços, seus beijos. A pessoa que me deu atenção, me deu amor nos momentos em que eu estava mais carente. Aquele que se preocupou comigo e que foi um grande amigo, mesmo que por pouco tempo. Te amo, nunca se esqueça de mim, porque jamais me esquecerei de você! Agradeço-lhe com todo o meu coração!

Agora, a última pessoa! A pessoa que conquistou meu coração e roubou minha alegria! A pessoa a quem amei secretamente e que admirei por ser forte e firme, mas, ao mesmo tempo, linda e perfeita! Sua força me chamou atenção e sua beleza me conquistou! Seu coração, mesmo que fosse impossível perceber, era bondoso e atencioso. Roubou minha paz, minha alegria, meu sono e meu amor. Mesmo que eu não tenha conseguido sua atenção e mesmo sabendo que me odiava, sempre amei e sempre amarei. Seu nome, o nome que me infernizou, o nome que eu amei, o nome que só me trouxe dor, o nome que irei guardar para sempre em meu coração: Ikki Amamya. Eu te amei, te amo, e para sempre vou te amar!

Adeus, amo todos vocês, não se esqueçam disso!

Adeus.”

Ikki estava boquiaberto! Ele chorava sem parar. Hyoga o amava e ele foi cego ao não perceber. Hyoga tinha ido embora e a culpa era toda dele. Ele não foi forte o suficiente para se declarar. Ele viu que Hyoga estava sofrendo, Kanon tentou avisar, mas ele não teve coragem. O orgulho foi maior e agora ele estava sozinho. A culpa era toda dele! Dessa vez ele não se perdoaria:

- “ Droga! Droga! Mil vezes droga! Ele me ama! Ele me ama! E eu sou um burro sem sentimentos! Ele estava sofrendo por minha causa! Ele queria morrer por minha causa! E o que eu fiz? Ignorei-o, debochei de sua fraqueza, mas eu fui mais fraco! Fui fraco de não protegê-lo em um momento de dor! Ele foi mais forte! Tentou ser meu amigo, mesmo achando que eu o odeio! E eu só consegui debochar de seu sentimentalismo! Eu sou mesmo um imprestável! Hyoga, meu Patinho, me perdoe! Perdoe-me, por favor! Mas volte para mim, não me deixe sozinho! Volte!”

Ikki estava desesperado, não conseguia parar de chorar. Tinha que pensar um pouco, tinha que se acalmar. Resolveu sair um pouco. Precisava respirar e pensar em um jeito de reencontrar seu Patinho. Nem que tivesse que ir para a Sibéria para procurá-lo, ele iria! Estava com a consciência pesada, se sentia culpado pela partida de Hyoga. Ikki passou, mais ou menos, umas duas horas andando pela cidade e pensando na vida. Mesmo que tenha pensado bastante, ainda sentia uma dor no peito que insistia em continuar. Alguma coisa estava para acontecer. Decidiu voltar mais rápido para a Mansão.

Qual não foi sua surpresa ao ver todos chorando. Ele sentiu mais um calafrio, ali não tinha boa coisa:

- O que está acontecendo? Por que estão todos chorando?

- Niisan! Você precisa saber! Aconteceu uma tragédia! Nem sei como lhe contar, nem por onde começar!

- Fala logo, Shun! O que aconteceu?

- É que... é que... o... o...

- FALA LOGO SHUN!

- O avião que o Hyoga pegou caiu! Não há nenhuma chance de ter tido sobreviventes! A Saori confirmou, o Hyoga morreu! Seu cosmos desapareceu!

Pronto! Aquilo tinha, realmente, acabado com seu dia! Já não bastava tê-lo longe por muitos dias, agora seria para sempre! O que ele tinha feito aos deuses para ser castigado daquela forma? Por que aquilo estava acontecendo com ele? Agora sim ele se odiava de verdade! A culpa era dele! Ikki sentiu toda a culpa nas suas costas e caiu no chão. Sem forças para se levantar. Ele não queria se levantar, queria morrer e ir para junto de seu Patinho, mas nem para isso ele tinha coragem. Desmaiou.

Continua...


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