Born to Die escrita por Agatha, Amélia


Capítulo 66
Liberdade


Notas iniciais do capítulo

Sentimos muitíssimo pela demora, essa semana foi muito cheia e, para completar, o computador aqui de casa é comunitário... O final de ano está bem corrido, tivemos provas quase todos os dias e, o pior de tudo, aula no sábado. Felizmente já passamos em todas as matérias, e temos uma folga, mesmo assim os estudos vêm em primeiro lugar.
Não vamos enrolar muito...
Boa leitura!



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*Narrado por Avery Hopper

Meus olhos estavam fixos no chão, mais especificamente no túmulo de Michonne. No lugar de uma cruz, para simbolizar o local de seu enterro, fora colocada sua katana. Ela estava com a ponta presa ao chão, era como se a qualquer momento sua dona fosse pegá-la novamente. Passei as mãos pelo rosto antes de colocá-las nos bolsos da calça jeans. Apesar de preferirmos a presença de todos do grupo, não dava para esperar muito, por isso o funeral estava sendo feito no dia seguinte à descoberta do corpo. Dessa forma, além de mim, minha mãe, Tyreese, Scott e Mika estavam lá.

Havia sido muito de repente, e fora difícil absorver aquela informação. Michonne estava morta. Seu cadáver apresentava alguns hematomas visíveis, o que nos levava a crer que tinha sido torturada. Aquilo servira para me deixar um pouco deprimida, toda aquela animação inicial parecia ter sido enterrada também. Não que eu estivesse cética, mas não dava para acreditar que minha amiga estava morta, não depois de tudo o que ela havia passado. Michonne era uma sobrevivente.

Scott lia algumas palavras da Bíblia, mais especificamente uma passagem sobre a vida eterna, que seria alcançada pelos merecedores. Ele mesmo achava errado se apegar a Deus apenas na dificuldade, mas o ruivo reconhecia que aquilo era necessário no momento. Mesmo me esforçando para prestar atenção, um pensamento sempre tentava invadir a minha mente: como estariam os outros? Poderiam saber sobre Michonne, ou não. Talvez estivessem mortos. Sacudi a cabeça e a voltei para o céu repleto de nuvens, por onde passavam alguns raios do Sol.

Não havia derramado muitas lágrimas, queria tentar ser forte como ela. A única fora aquela no muro, quando tinha visto seu cadáver. Ninguém chorava, mas os rostos de todos demonstravam a tristeza que sentiam. Sem ajuda de ninguém do Alto do Morro, organizáramos aquele funeral, cabisbaixos e com o objetivo de dar a Michonne sua despedida e seu descanso final. O resto da comunidade seguia em frente, talvez não soubessem que ela tinha sido. Mas era isso que teríamos que fazer em seguida, nos acostumar com a dor de outra perda e seguir em frente.

– Vamos sentir muito a sua falta – minha mãe concluiu assim que Scott fechou a Bíblia. – Agora nós temos que voltar a trabalhar.

Essa fora a deixa para nos afastarmos,nenhum de nós ousou dizer algo.Eu deveria estar indo para o estábulo, mas não tinha cabeça para trabalhar, a única coisa que eu queria era dormir. Ainda não estava pronta para voltar ao muro, aquilo me lembrava o dia anterior. Enquanto me aproximava do hotel, notei uma pequena aglomeração mais ao fundo. Um homem apontou o dedo em nossa direção e todos começaram a vir. A maioria deles segurava lanças, alguns possuíam pistolas. Os homens possuíam uma expressão séria, então me esforcei para parecer firme.

– O que está acontecendo? – mamãe perguntou por todos nós.

– Temos ordens do Gregory para levá-los – um deles explicou.

– Onde ele esteve todo esse tempo? – ela indagou.

– Apenas obedeçam se não querem que algo mais grave aconteça – outro homem respondeu de forma grosseira. Eu não conseguia entender o que estava acontecendo, todos eles pareciam bastante irritados, era como se descontassem aquilo em nós. Pude reconhecer na pequena multidão alguns caras dos muros, talvez eles me ajudassem.

– Kal, o que foi? – indaguei.

– Avery... – ele começou com um tom contrariado.

– Estamos com as suas crianças. A nossa paciência está esgotando, é melhor virem logo! – outro homem cortou Kal. Olhei para minha mãe em busca de uma resposta, sua pele estava tão branca quanto uma folha de papel, dava para saber o motivo. Eles estavam com as crianças. Ela abaixou a cabeça primeiro, e todos nós fizemos o mesmo, apesar de não estarmos entendendo direito o que ocorria.

Fomos conduzidos até o último andar do hotel, onde eu sabia que ficava a estação de rádio. Provavelmente fora uma suíte presidencial nos tempos antigos do hotel, porém os móveis tinham sido substituídos por aparelhos de transmissão. As crianças estavam sentadas no chão, seus olhares eram confusos e assustados. Brianna estava dentro de uma cesta forrada por panos, chorando muito.

– Sentem-se! Não quero ouvir uma palavra aqui! – um deles vociferou.

Obedeci, apesar de estar contrariada. Vasculhava meus pensamentos em busca de um motivo para aquilo, tudo ainda era um mistério. Pelo que pude deduzir, estávamos sendo presos a mando de Gregory. Ele estivera sumido por muito tempo, e de repente aqueles homens surgiam alegando estar cumprindo ordens do antigo líder do Alto do Morro. Tive vontade de questionar aquilo novamente, mas tinha medo que algum de nós, principalmente as crianças, pudesse ser punido por isso.

Involuntariamente acabei me lembrando de quando minha mãe e eu fôramos sequestradas por Malcom e Rose. Os olhares ameaçadores eram os mesmos, apesar de que eles com certeza não estavam em busca de suprimentos. A sensação de estar nas mãos de alguém me perturbava, eu só queria poder fazer algo para nos tirar daquela situação. Eu ansiava por respostas, mas para isso precisaria conversar com aqueles mal encarados que pareciam estar dispostos a matar se apenas abríssemos a boca, então não era uma boa opção.

– O que está acontecendo? – Scott sussurrou o mais baixo possível, tentando fazer com que ninguém mais ouvisse.

– É o que eu gostaria de saber – Tyreese respondeu num tom quase inaudível. – Mas parece que eles não vão nos dar muitas informações.

– Temos que ficar em silêncio – minha mãe disse olhando para as crianças, mas o aviso servia para todos.

– A Bri não para de chorar – Sam falou parecendo preocupado com ela.

– Eu sei, vamos acalmá-la.

Cruzei os braços, irritada com aquela situação. Se tinha algo que eu gostava muito era de liberdade, e o fato de estar presa era o suficiente para me aborrecer. No meu primeiro sequestro, logo no início, eu havia reagido contradizendo as ordens que recebera e me manifestando diante de tudo. Porém eu não era mais uma criança, e com certeza minha mãe me repreenderia. Não éramos só nós duas, havia outras pessoas em risco no momento, e enfurecer mais aqueles homens estava fora de questão. Eles não pareciam desesperados como Malcom e Rose, estavam cumprindo o que julgavam ser seu dever.

– Temos que sair daqui, não podemos continuar nessa situação – minha mãe disse quando notou que os homens não estavam prestando atenção.

– Como assim? O que está acontecendo? – Scott indagou.

– Não sei, por isso eu tenho que falar com Gregory – ela respondeu. – Talvez eu possa convencê-lo a nos soltar, mas pode não ser o suficiente, precisamos ter outro plano. Ave, presta atenção. Eu vou distraí-los por algum tempo, enquanto isso você tem que mandar uma mensagem para o Jesus pelo rádio.

Sacudi a cabeça afirmativamente, tentando ouvir tudo atentamente, apesar do tom de voz baixo que minha mãe usava. Passo a passo ela explicou o que eu deveria fazer, deixando o procedimento bem claro. Apertar alguns botões e falar pelo microfone, tudo sem chamar nenhuma atenção, aproveitando que ela seria a distração. Tudo que eu precisava fazer era ser rápida e muito cautelosa. Depois disso, falou o que eu deveria dizer caso ele atendesse, enfatizando o risco que isso tinha.

– Entendeu?

– Sim – sussurrei.

– OK, vamos começar. O choro da Brianna deve servir para ocultar o rádio. Cuida deles por mim, eu confio em você – dei um pequeno sorriso, havia outra motivação. Ela confiava em mim, eu não podia decepcioná-la. Fiquei feliz pela confiança que minha mãe tinha em mim, eu desejara aquilo por muito tempo. A única vez em que ela havia confiado em mim de verdade fora na missão, e dessa vez era diferente. Qualquer erro seria fatal, e mamãe me conhecia bem o suficiente para saber que eu era propícia a cometer erros. Todavia ela estava tendo fé em mim, sabia que eu conseguiria.

Minha mãe se levantou e caminhou até a porta. Eu poderia ter ficado pensando sobre a confiança que ela depositara em mim e deixar que o orgulho tomasse conta do meu corpo, mas apenas a observei tentado esperar o momento certo. Os homens ficaram a analisando com um olhar interrogativo, mesmo assim ela se manteve firme e os encarou. Um deles destravou a arma, e eu cerrei os punhos.

– Volte para lá – ele apontou para nós com metralhadora.

– Eu quero falar com o Gregory. Já que vocês não dizem nada, eu preciso que ele me explique.

Fiquei observando o desenrolar do diálogo, assim como os outros homens, até me lembrar que aquilo era a distração. Fui agachada até o rádio, tentando chamar o mínimo de atenção possível. Brianna continuava chorando, as crianças, ainda assustadas, permaneciam sentadas no chão com as pernas cruzadas. Mika começou a se aproximar da ruiva, contudo o meu olhar de advertência a parou, aquele choro seria crucial. Tyreese e Scott me fitaram sem entender aquilo, mesmo assim continuei.

Cuidadosamente, fiz tudo o que minha mãe pedira, me lembrando exatamente de suas palavras. Quando terminei, dei uma olhada para trás, eles continuavam discutindo em um canto mais afastado. Eu tinha medo que aqueles homens fizessem algo contra ela, mas me concentrei na minha missão. Com sorte a ajuda externa que receberíamos chegaria logo e tudo isso estaria acabado, independentemente do motivo de Gregory estar fazendo isso. Eu gostaria muito de saber seus objetivos ou intenções, porém estar livre era o mais importante.

– Tem alguém na escuta? – sussurrei no tom mais alto que pude. Aguardei por algum tempo, e meu coração disparou assim que obtive resposta.

– Fala mais alto, não dá pra te escutar – não consegui distinguir a voz em meio aos chiados, mas as palavras foram claras.

– Não dá, eles podem ouvir. Diga para Rick e Jesus que eles precisam voltar logo. O Alto do Morro foi comprometido, Gregory assumiu o controle e agora estamos presos – eu mesma não havia entendido o que estava falando, apenas repetia as palavras que minha mãe dissera, talvez ela já soubesse o que se passava. Provavelmente o fato de Gregory ser o mandante tivesse a ajudado a formular aquela hipótese. Mesmo assim, as intenções dele continuavam obscuras, a única coisa que eu sabia sobre o homem era que ele estava contra a guerra.

*Narrado por Sarah Grimes

Eu ainda tentava digerir as palavras de Jesus, era muita coisa para mim. Gregory estava do lado do Negan, fazendo exatamente o que o homem dissera. Imediatamente pensei em Grace sendo ameaçada. Eu deixara minha filha lá exatamente para que ela ficasse segura, mas não era isso que estava acontecendo. Então era verdade, Gregory iria usar nossa família para nos impedir.

Seguimos Jesus pelo corredor, ele parecia muito apressado e sério. Segurei a mão de Rick em busca de apoio enquanto descíamos as escadas, ele parecia tão confuso quanto eu. Compartilhávamos o mesmo sentimento em relação a nossa filha, só de pensar que minha bonequinha de olhos azuis estava correndo riscos meu coração já ficava apertado e eu sentia que precisava fazer algo. Apesar de saber o que atos desesperados e feitos sem pensar resultavam, não tínhamos muito o que fazer e a quem recorrer, apenas voltar para o Alto do Morro.

Encontramos Carl, Fred, Maggie e Eugene no fim do corredor. O primeiro parecia um tanto cabisbaixo e desolado, seu chapéu não estava na cabeça e os olhos focavam no chão. Carl nunca fora de demonstrar seus sentimentos, ele costumava ser mais reservado, por isso vê-lo com os olhos vermelhos me deixou sensibilizada. Eu queria entender o motivo daquela tristeza, talvez fosse alguma perda, era a alternativa mais aceitável. Maggie também possuía um olhar triste, algo de ruim havia acontecido e não deveria ter relação com o que estava acontecendo no Alto do Morro. Quando Jesus apareceu todos ergueram os olhares instantaneamente.

– Como você ficou sabendo disso? – Rick perguntou assim que nos reunimos.

– Um morador do Reino estava com o rádio quando recebeu uma mensagem. Uma garota disse aquilo, ela estava sussurrando, falou que alguém não podia ouvir o que estava dizendo – Jesus explicou.

– Era a Ave? – Carl indagou preocupado.

– Ou a Mika – ele completou. – Enfim, precisamos voltar agora mesmo antes que seja tarde de mais. Não sabemos o que Gregory pretende, e ele está com o seu grupo.

Entreolhamos-nos por alguns segundos, a preocupação era evidente pelas expressões de todos nós. Não era preciso dizer muito, todos tinham consciência que precisávamos ir até o Alto do Morro. Seguimos pelos fundos do prédio para pegar o carro, ignorando a guerra que persistia do outro lado do antigo prédio comercial, não pude deixar de notar a ausência de Glenn e Michonne. Percorri o local com os olhos, eles não estavam em lugar algum.

– Onde estão Glenn e Michonne? – perguntei depois de algum tempo. Carl abaixou a cabeça, sendo tomado novamente pela tristeza inicial.

– Glenn foi buscar o carro – Maggie respondeu.

– Michonne foi no meu lugar, ela invadiu o Santuário – Rick explicou num tom mais baixo, mesmo assim não pude deixar de captar o abatimento em sua voz. Ele não precisou dizer mais nada, era por isso que todos estavam um tanto desanimados, principalmente Carl, que era um grande amigo de Michonne. Eu sabia que numa guerra as perdas eram inevitáveis, mas seria melhor se ela continuasse viva. Mesmo assim, seu sacrifício era mais um motivo para prosseguirmos, Michonne dera sua vida pelo sucesso da missão, e para salvar meu marido. Eu seria eternamente grata por isso, mesmo que não pudesse fazer muito por ela.

Saímos do prédio rapidamente, ninguém dissera nada durante o trajeto. Do outro lado, a batalha prosseguia, podíamos ouvir tiros e gritos o tempo inteiro. Mesmo que quiséssemos ajudar, a nossa família era prioridade no momento. Ezekiel nos acompanhou pela saída enquanto recebia instruções de Jesus, o líder do Reino era quem assumiria o comando durante a nossa ausência.

Fomos por um beco próximo, os Salvadores não perceberiam se passássemos por lá. Os que iam à frente estavam armados, prontos para qualquer imprevisto, porém tudo indicava que o local estava limpo. O carro deveria estar mais adiantado, não queríamos ter que passar perto do tiroteio. Paramos no final do beco, tudo estava muito calmo e Glenn ainda não tinha chegado. Um errante solitário veio caminhando em nossa direção, com os braços esticados, as pernas cambaleantes, suas roupas sujas e rasgadas, e o rosto completamente deformado, repleto de cortes e algumas marcas que indicavam mordidas. Trazia na mão esquerda um objeto prateado e reluzente, que eu não pude identificar de longe.

Todos ficaram a postos, no momento nenhum de nós trazia armas brancas. O primeiro pensamento que veio à minha mente foi que, se Michonne estivesse lá, seria ela a pessoa que mataria aquele mordedor. Mas ela não estava conosco, ela se sacrificara por nós, eu sempre me lembraria disso. Antes que qualquer um pudesse fazer algo, afinal, depois de tanto tempo, um único caminhante não fazia mais a diferença, Maggie seguiu em sua direção, mantendo uma pequena distância.

– É o relógio dele... – ela disse como se não acreditasse naquilo. Na noite em que ficáramos acordadas conversando enquanto eu aguardava o fim da reunião de Rick, Maggie tinha falado do relógio que fora de seu bisavô e que Hershel dera a Glenn. Naquela mesma conversa, a mulher mencionara seu medo de que o pequeno Hesh perdesse o pai, só ao ouvir sua voz trêmula pude perceber isso. Se o relógio de Glenn estava com aquele walker, poderia se tratar dele próprio.

Todos aqueles pensamentos foram interrompidos por um som de frenagem, e o carro vermelho derrapou por alguns metros antes de passar por cima do errante e finalmente parar. Surpreendentemente, era Glenn quem dirigia o veículo, e a imagem dele trouxe um grande alívio para todos nós, principalmente sua esposa.

– Por que vocês estão assim? Maggie? – o coreano desceu do carro com um olhar preocupado, e antes que o homem pudesse dar um passo, ela se jogou sobre ele.

Já estávamos dentro do veículo a caminho do Alto do Morro quando Glenn começou sua explicação. Ele disse que ia com outro homem para buscar o carro, porém os dois haviam de deparado com uma manada no caminho e Glenn precisara ir sozinho, como nos velhos tempos. Contudo, antes disso, pedira para seu acompanhante entregar o relógio a Maggie, no caso de não se verem novamente. Aquilo tudo resultara em um grande susto, mas no momento já estava tudo bem.

Depois daquilo, todos ficamos em silêncio no carro de sete lugares. Comecei a rever os acontecimentos anteriores: primeiro o ataque ao Santuário, desde o início tínhamos consciência de que Negan não aceitaria a oferta de paz, e o plano das janelas havia sido um sucesso; eu perdera o dia seguinte, tudo o que sabia era o que Fred me dissera sobre os Salvadores terem nos encurralado; horas atrás eu havia me encontrado com Rick, que estava vivo graças a Michonne, que dirigira o carro em seu lugar para quebrar a cerca. Tudo parecia estar bem, até que Jesus nos contara sobre a mensagem que uma das garotas mandara pelo rádio.

Nem vi quando chegamos à comunidade e o veículo parou em frente ao portão. Todos os meus pensamentos deram lugar a Grace, a imagem dela sendo ameaçada não me agradava muito. Não conseguia deixar de pensar que eu era culpada pelo risco que minha filhinha corria, nunca me perdoaria se algo acontecesse a ela. Gregory se mostrara um homem pior do que parecia, nunca esperaríamos que ele usasse nossas crianças para continuar tendo aquela vida pacífica e submissa.

– Eduardo, abra os portões! – Jesus gritou enquanto saía do automóvel, estranhando o fato de que já não estavam abertos. Aquilo só contribuiu para aumentar a minha apreensão, precisávamos entrar para salvá-los.

– Agora vocês são inimigos do Alto do Morro, não podem mais entrar. É melhor irem embora antes que algo aconteça. Jesus, não queremos machucar ninguém, mas iremos fazê-lo se for necessário – o homem respondeu.

*Narrado por Gabriela Hopper

Continuei descendo as escadas enquanto me perguntava se Avery conseguira enviar a mensagem. Apesar de ter certeza que minha filha poderia fazer aquilo, não dependia só dela. Quando começava a andar mais lentamente, perdida em pensamentos, Kal forçava a ponta da lança contra as minhas costas, fazendo com que eu voltasse ao ritmo normal.

Eu não conhecia Gregory, por isso era difícil formar hipóteses, mas tudo levava a crer que eu estava certa. O homem era tão ausente que não dava para acreditar que as pessoas o chamavam de líder, do meu ponto de vista ele era um covarde. Talvez eu estivesse errada, tudo aquilo parecia ter sido arquitetado, o sumiço de Gregory não era por medo, ele tinha algo em mente, estava pondo aquilo em prática. Enquanto caminhava, tentei pensar no que dizer, eu ainda não fazia a mínima ideia de como abordá-lo. Meu principal objetivo era saber o que estava acontecendo, precisava ouvir da boca dele. Eu também pretendia estudá-lo, para, possivelmente, convencê-lo a mudar de ideia, mesmo que apelar para o sentimentalismo estivesse praticamente fora de questão.

Kal parecia inseguro, pude constatar isso ao me voltar para trás. A lança que o homem trazia poderia dar um aspecto imponente, no entanto suas mãos diziam o contrário, já que não paravam de tremer. Talvez fosse por Avery, os dois se tornaram muito amigos enquanto trabalhavam nos muros. Por outro lado, os demais pareciam certos do que faziam, deveriam ser muito fieis a Gregory.

Finalmente chegamos ao saguão, ele estava completamente vazio. Os moradores do Alto do Morro deveriam estar trabalhando, sem suspeitar o que acontecia. A vida deles seguia sem ao menos suspeitar o que ocorria pelas paredes do hotel. Fomos até a sala que usávamos para fazer as reuniões, abri a porta lentamente e observei seu interior antes de entrar.

Era um local amplo, preenchido por dois sofás longos e uma mesa de escritório, atrás dela havia uma janela, que se encontrava coberta pelas cortinas brancas, do mesmo tom das paredes. A decoração combinava bem com a sala, quadros pouco chamativos e alguns adornos compunham o ambiente. A cadeira de couro preto que ficava atrás da mesa estava de lado, e girou em nossa direção assim que entramos. Gregory parecia calmo e pensativo, porém seu olhar demonstrou surpresa ao nos ver. O homem se preparou para dizer algo, provavelmente uma advertência ao guarda ou algo do tipo.

– Ela exigiu falar com você – Kal o interrompeu. Gregory ficou em silêncio, eu esperava uma posição mais rígida do líder do Alto do Morro.

– Por que você fez isso? – indaguei antes que ele falasse algo. – Está nos prendendo?

– Eu não fiz isso, estou apenas cumprindo ordens – o homem se explicou num tom ofendido.

– Não foi o que pareceu, já que você mandou seus guardas nos sequestrarem. Eu quero saber o motivo. Temos um inimigo em comum, então agora não é hora de conflitos internos, deveríamos nos unir para acabar com isso. Se você quer tanto governar esse lugar, deveria ser mais presente. Quando as pessoas mais precisaram de alguém, você se escondeu, nos abandonou. Agora eu entendi tudo, você só estava esperando pelo momento certo para nos apunhalar pelas costas – ataquei dizendo tudo de uma vez, o que fez com que a expressão do homem mudasse rapidamente.

– Basta! – Gregory se exaltou batendo a mão direita contra a mesa, o que me assustou. – Sente-se – obedeci enquanto ele voltava ao seu estado normal. – Se estamos tão frágeis assim, é por causa do seu grupo. Tínhamos uma boa comunidade, organizada, as pessoas viviam tranquilas, estávamos sobrevivendo. Não precisávamos sujar as mãos, tínhamos os Salvadores e eles nos davam segurança por um preço justo – se não estivesse na situação em que me encontrava, com minha família sendo ameaçada por homens armados e eu com uma lança nas costas, certamente teria rido e feito algum comentário irônico ao estilo da Avery. O preço de Negan estava bem longe de ser justo, se não fosse escravidão, eu não encontraria outra palavra para definir. – Eu não quero mortes, só quero proteger o Alto do Morro, quero o bem dessas pessoas. Por esse motivo estou fazendo isso, Negan prometeu que nos pouparia...

– E você acha mesmo que ele irá poupar todos aqui? Eu duvido que tal pensamento tenha passado pela cabeça dele!

– Negan e eu temos ideias diferentes, eu não sou um cara violento... Mas de uma coisa eu sei, ele precisa de nós. Não, ele não vai nos matar, nós alimentamos os Salvadores – seu pensamento fazia sentido, porém não justificava em nada usas ações. – Tudo que preciso fazer é expulsar os traidores, começando pelos que estão lá dentro. A partir de hoje, todos que estiverem contra os Salvadores não pertencem mais ao Alto do Morro – ao concluir sua fala, Gregory se voltou para Kal. – A propósito, foi até bom ter trazido ela. Com certeza o seu grupo não vai sobreviver lá fora, eles só têm um grandalhão sem mão, ele não vai conseguir cuidar de quatro crianças e três adolescentes. O seu pessoal não vai durar muito, eles vão morrer.

No primeiro momento, a palavra expulsar não tivera tanta importância, mas depois da última frase fiquei completamente sem reação. Meu rosto deveria estar lívido e com uma expressão de choque. Eu não consegui acreditar, as palavras de Gregory não eram processadas em minha mente. Ele iria mesmo expulsá-los? Abandoná-los à própria sorte? Meu coração disparou só de pensar em meus dois filhos e as outras crianças desprotegidas do lado de fora, podendo contar apenas com Tyresse. Eles estavam no Alto do Morro para ficarem seguros, porém estavam sendo ameaçados. Eu precisava fazer algo, todavia tinha certeza que não conseguiria, eram muitos homens no último andar, não dava para arriscar as vidas dos outros.

– Você vai matá-los – balbuciei me sentindo tonta, meu coração estava apertado, mais do que exprimido pela preocupação que inundava meu corpo.

– Não, vou deixá-los para morrer – ele disse mais para si mesmo do que para mim. – É completamente diferente, eu não poderia matá-los. Quanto a você... O seu destino é o mesmo, mas a sua hora vai chegar antes. Isso vai ajudar, a sua morte vai garantir de exemplo, Negan vai confiar em mim e o seu grupo vai perceber que estou falando sério. Isso que estou fazendo é para o bem do Alto do Morro, as pessoas que ficaram não devem pagar pelos erros das outras. Quando tudo isso acabar, vamos apenas esquecer essa fase de trevas e tudo voltará ao normal, estaremos seguros novamente. Os moradores vão ver que essa guerra só vai trazer mortes, é o que vai acontecer com você e sua família – Gregory abriu uma gaveta na mesa e tirou de lá uma pistola. – O que me conforta em matar alguém é que vai ser indolor e você não irá reanimar.

– Eles não vão ver essas mortes como um exemplo, eles não irão aceitar isso novamente. Todos já perderam muitas pessoas, não só pelo Negan, em todo o apocalipse. Todos esses anos, eles passaram por muitas coisas, não foi fácil sobreviver, e o povo do Alto do Morro não teve que enfrentar tudo isso para se submeter. Agora, eles não precisam mais lutar para sobreviver, o Alto do Morro proporcionou aos moradores algo maior que isso, a liberdade. Se continuar do lado do Negan, eles não serão livres, você vai tirar dessas pessoas algo que elas batalharam para conquistar – assim que o homem destravou a arama, me levantei da cadeira para encará-lo de igual para igual. – A fagulha já foi acesa, e nada que você fizer pode apagá-la.

Se era por isso que eu iria morrer, naquele instante eu estava pronta. Gregory apontou a arma para mim e eu me aproximei para que o cano tocasse a minha testa. Por aquele metal frio passaria a bala responsável pela minha morte, entretanto tentei não pensar nisso. Era uma causa nobre, e morrer por isso valeria a pena.


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Notas finais do capítulo

Sobre o Gregory, temos pouco a dizer. Ele pensa que esse caminho é o certo para proteger o Alto do Morro, e não podemos culpá-lo. Odiamos o Gregory, não pelo que ele fez, e sim pelo que ele vai fazer...
Vamos tentar postar o próximo mais rápido, todo o nosso tempo livre será dedicado aos últimos capítulos da fic, porém ainda não começamos a escrever o 67 e ele não tem previsão.
Deixem a sua opinião! Até o próximo!