The Prince Of My Ballerina escrita por Isabelle Masen


Capítulo 2
Capítulo 1 - Angústia


Notas iniciais do capítulo

Oi, primeiro capítulo fresquinho! Quero agradecer aos reviews do capítulo anterior, foram o empurrão que faltava para eu postar hoje, pois estou sem internet desde a quinta :

Desculpem a demora, nos vemos lá em baixo!



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Essa última semana em que pendurei as minhas sapatilhas de cetim foi, definitivamente, a pior de toda minha vida; precisei ficar em casa com a perna engessada, e necessitava de cuidados o tempo todo - como um bebê. Então minha mãe me empurrou inúmeros cremes estrangeiros, trouxe uma loja inteira de roupas pra mim, seguiu à risca uma dieta apenas de legumes e até me mostrou uma linha de estampas para colocar em meu gesso. Um pesadelo total.



 

Sei que deveria ser grata por ter nascido em um berço de ouro, mas não consigo.


 

Meus pais eram ótimas pessoas quando ainda morávamos na Califórnia, mas quando nos mudamos pra Nova York quando eu tinha sete anos meu pai deu início à sua carreira política e passou a receber um punhado de dólares por semana, tornando-o rico. E eu tive o desprazer de assistir sua transformação de bom homem para executivo ambicioso e egoísta. Passou a ter preconceito com pessoas de baixa renda, não vive sem seus super carros e se não tiver ao menos meio milhão de dólares no bolso nem cogita na ideia de sair de casa. Com minha mãe não fora diferente; tornou-se mesquinha e uma Barbie, pois grande parte de seu corpo é do jeito que é graças à alterações cirúrgicas e plásticas que faz por mês. Eu vi meus pais, aqueles que me criaram desde pequena e me educaram para ajudar o próximo se transformarem nos animais mais monstruosos da humanidade. É cortante saber que eles estão aqui, mas não são mais eles. Viraram verdadeiros escravos do dinheiro. E continuar vendo a notável mudança é ainda mais deprimente, por isso estou odiando passar tanto tempo em casa.



 

Nunca gostei muito de sair de minha casa. Quando era pequena sonhava em ter um quarto bem grande onde eu pudesse dançar, sonhar, desenhar, brincar, enfim, tudo que eu quisesse usando minha ingênua imaginação infantil. E agora eu tenho isso, mas é desagradável ficar presa naquele lugar. Como se fosse algo roubado, ou como se eu não merecesse esse feito. Por isso passo quase todo o meu dia na Juilliard, na casa de Alice ou na de Rosalie - minhas únicas e melhores amigas - ou no shopping quando sou arrastada pelas mesmas. Eu poderia ir ao Central Park e ler um livro, me apresentar em algum evento beneficente ou até andar de bicicleta pelas movimentadas ruas de NY, mas nem isso posso fazer, pois estamos em época de votação e a imprensa caiu em cima de mim e de minha família como uma pedra sendo atirada, pois para que Charlie possa seguir algum cargo executivo precisa ter - ou passar - uma boa imagem pro povo. E essa privacidade é uma das causas de nossas brigas diárias.



 

Meus pais impregnaram correntes em mim, e elas me privam de um outro mundo que, sinceramente, julgo ser melhor que esse. Serei liberta um dia?


 

--- Filha! O dr. Laurent veio tirar o seu gesso - minha mãe gritou com sua voz comprada pelo instituto de Plástica Computadorizada, que ganhou há alguns dias. Agora sua voz é fina e como a de uma águia.


 

Romperam porta adentro. Inicialmente eu achei que fosse a própria por ter me gritado, mas quando eu vi eram apenas as empregadas; Bufei.



 

Eu não estava frustrada, mas pensei que agora que preciso de cuidados minha mãe iria passar o dia inteiro comigo, pois seu instinto maternal de proteção deveria estar aguçado ou algo do tipo. Mas tudo bem, sou perfeitamente cuidada pelas empregadas, que aliás cuidam até melhor de mim.


 

Com a ajuda de Brigitte, consegui chegar a sala principal, que mais parecia a sala do rei de um grande castelo imperial.


 

Sentei na grande poltrona dourada em frente à lareira e a TV e me acomodei quando Brigitte colocou um puff de veludo para apoiar meu pé.


 

--- Olá denovo, senhorita Bella - o dr. Laurent me cumprimentou enquanto buscava algo em sua extensa pasta branca com o símbolo do hospital.


 

Laurent tinha uns quarenta e poucos anos, mas estava em uma forma típica de trinta. De longe poderia ser facilmente confundido com um psicopata por ter sempre a fisionomia séria, mas de perto era dócil, mesmo que ganancioso.


 

--- Antes de começarmos, quero garantir a minha parte do pagamento, pois a bolsa de valores congelou todo salário que o hospital dá aos funcionários esse mês - miseravelmente ganancioso. Mal sabia ele que logo na primeira pagina do New York Times que meu pai está lendo discorda de seu argumento.


 

--- Receio que a bolsa aumentou em 60% a taxa de pagamento nesse mês para os funcionários dos hospitais - meu pai baixou o jornal e ouvi o dr. Laurent balbuciar um palavrão baixo.


 

--- Acho que preciso me atualizar com as manchetes - deu um sorriso e voltou sua atenção para o gesso em minha perna.


 

Ele conversava com minha mãe e meu pai estava se servindo com Brigitte enquanto o dr. desenrolava cuidadosamente o gesso de minha perna. Todo cuidado era pouco, pois o que ele queria mesmo eram os dois mil dólares da consulta. Eu sei que é um total absurdo um médico cobrar este preço, mas Laurent era realmente o melhor médico particular de Nova York.


 

Me perguntou umas quatro vezes se eu estava bem e me atirou perguntas sobre a escola. Se mostrou surpreso quando meu pai admitiu que eu estudava com uma professora particular. “Me dei bem” deve ter pensado.


 

Minha mãe mal me deixa responder uma pergunta.


 

--- E o seu namorado? - perguntou e minha mãe se virou pra mim, a curiosidade pairando no ar.


 

--- Namorado? Pra que diabos eu iria querer um namorado?


 

--- Bem - disse cortando um pedaço de esparadrapo em meu joelho - achei que fosse uma garota que tivesse tudo.


 

Dei de ombros, indiferente enquanto ele voltava a fazer seu trabalho. Meus pais trocaram um olhar pensativo.


 

A longa e interminável conversa se estendeu até 12h, então quando o dr. Laurent se retirou - com seu salário dos próximos seis meses em mãos -, levantei e fu pro quarto vestir meu collant.


 

--- Bella… - minha mãe apareceu na soleira da porta - você poderia acompanhar seu pai amanhã à noite na reunião de pais e filhos da elite?


 

Virei-me lentamente pra ela e uni as sobrancelhas. Ela sabe que eu odeio e nunca compareço à qualquer debate da maldita elite.


 

--- Não, eu não poderia - respondi simplesmente e amarrei meu collant atrás, colocando agora um short e um cardigã vermelho dobrado até os cotovelos.

--- Você precisa ir, Isabella - usou um tom ameaçador e eu peguei minhas sapatilhas juntamente com um rolo de fita adesiva prateada, como se ela nem estivesse lá - eu estou falando com você! - falou ainda mais alto, bloqueando a saída do quarto. Olhei pra ela.


 

--- Você sabe que eu tenho desprezo pela elite - cuspi as palavras e ela trincou a mandíbula.


 

--- Grande ingrata que você é! Nós te damos tudo e você dá as costas pra tudo isso!


 

--- Vocês é que deram as costas pra mim! - elevei um pouco o tom de voz - por acaso sabem em que posição eu estou no balé? - ela se calou e eu passei direto pela porta com minha bolsa.


 

--- Não fale assim com a sua mãe - meu pai apareceu a ponta da escada me encarando. Ele estava bem mais calmo que minha mãe e eu o entendia, por que ele prezava o respeito familiar.


 

--- O que vai fazer se eu não for? Cortar minha mesada? Que cortem, eu não preciso de mais nada mesmo! - voltei a descer as escadas, ignorando meu pai.


 

--- Nós cancelaremos sua matrícula na Juilliard - minha mãe gritou quando eu toquei a maçaneta para o jardim da saída.


 

Não acreditei que ela seria tão persuasiva à esse ponto. Nunca envolveram nada meu para me obrigar a fazer qualquer coisa, então o caso deve ser sério. E, mesmo assim, eu não consigo aguentar as lamúrias dela sem minha dose diária de ballet. Algo deve estar errado.


 

Senti uma angústia imensa.


 

--- E então, o que você diz? - minha mãe disse e eu me virei pra dar de cara com seu sorriso vitorioso e suas mãos nos quadris. Ela sabia que tinha ganhado a discussão.


 

--- Eu digo que odeio vocês! - falei e bati a porta com força, marchando até a limousine que me esperava.


 

Garrett abriu a porta pra mim avaliando o meu rosto, mas estava tão sobrecarregada que mal o olhei.


 

--- Tudo bem, srta. Swan? - perguntou ms eu bati a porta sem responder o homem. Me senti mal fazendo isso, mas se eu falasse com ele provavelmente seria grossa, o que é infinitamente pior. Como diz Alice: se for pra falar merda, é melhor ficar calada.


 

Quando chegamos na Juilliard, não esperei Garrett abrir a porta. Entrei sem olhar pra quaisquer direção.


 

Entrei na sala e caminhei até onde avistara Rosalie.


 

--- Bella! Como anda a perna? - Rosalie disse com um sorriso enquanto se alongava no salão principal, o lugar das aulas. Ela usava um collant azul escuro e um short preto de malha, assim como a maioria das outras garotas, diferenciadas apenas pelas cores dos collants.


 

--- Melhor - sorri enquanto prendia um coque no cabelo - acho que essa perna nem chega perto dos outros problemas.


 

--- Seus pais novamente? - falou entediada - você tem 20 anos, pode muito bem se mudar e viver em um apartamento só seu.


 

--- Acha que eles deixariam? - falei sarcástica enquanto colocava o pé na barra de ferro, amarrando minhas sapatilhas. Ela torceu a boca em um sorriso.


 

--- Bom, dinheiro pra isso não falta - rimos.


 

--- Falando em dinheiro? - Alice se aproximou animada, usando uma legging azul escura e uma regata de malha preta, os cabelos presos por messis da cor dos tais, pois seus cabelos curtos e espetados não eram páreis para uma xuxa ou coque.


 

--- Também senti sua falta, Alice - falei bem humorada, indo para a primeira linha* junto com os outros dois melhores bailarinos. Alice se acomodou na segunda linha atrás de mim enquanto Rosalie fitava seu reflexo no espelho, também na segunda linha.



 

-


 

* Primeira linha: barra de ferro em que ficam os melhores bailarinos.

Segunda linha: barra que ficam os bailarinos médios.

Terceira linha: barra em que ficam os bailarinos menos ágeis, que se permanecerem por mais de três semanas na mesma barra são mandados embora.


 

-



 

--- Que isso Bella, sabe que eu te amo - falou piscando e vindo me abraçar - sabe, se eu fosse uma das melhores bailarinas daqui como você, ficaria na primeira linha, assim iria parecer menos baixinha - reclamou. Alice era mesmo muito baixinha pro ballet, então era sempre alvo de reclamações vindas da maître e dos outros funcionários da Juilliard. Vive se preocupando com a dança, tendo o dobro de trabalho que nós altas temos com os passos.


 

--- Deixa disso. Você é linda do jeito que você é - falei sincera partindo o abraço.


 

--- Se beleza contasse pra dança minha vida seria perfeita - falou suspirando, triste. Abri a boca pra responder, mas logo escutei o som da porta sendo aberta e me coloquei em meu lugar, assim como as outras bailarinas.


 

--- Bom dia, danseurs* - a maître cumprimentou enquanto tirava um pen drive de seu bolso, conectando-o nas caixas de som.


 

*danseurs = bailarinos


 

--- maître - Alec perguntou ao meu lado - onde está o pianista? - só então percebi que o piano permanecia fechado e Esme, a pianista, era sempre a primeira a chegar no salão espelhado. Meneei a cabeça, concordando com Alec, igualmente curiosa.



 

--- Esme Cullen - ela deu um longo suspiro - faleceu na tarde de ontem. Portanto, até acharmos um novo pianista, ficaremos ensaiando com som.


 

Todos se encontravam bestificados com o falecimento da mulher. Tão doce e com um espírito tão jovem… Ela tinha tanta paixão pelo que fazia que me fazia ter ainda mais amor pela dança e pela música clássica. É realmente lastimável que uma pessoa tão boa parta tão cedo.



 

--- Muito bem, bola pra frente. Todos comecem com bourrée - disse a maître enquanto colocava uma música de Beethoven pra tocar, mas o som vindo das caixas não se comparava com a melodia ao vivo de Esme Cullen. Algumas bailarinas dançavam, mas estavam intrigadas ainda pela morte da pianista.



 

A maître passou por todas as linhas avaliando cada passo dos bailarinos. Por mim passou com o sorriso de sempre; mas parou quando fitou um garoto ao lado de Alec.


 

--- Segunda linha - exclamou. O garoto seguiu cabisbaixo até o lado de Rosalie na segunda linha - développé.


 

Fiz o passo com graça enquanto a maître andava em círculos em volta de todas as linhas, avaliando com um olhar quase ameaçador. Alice passou a suavizar seus movimentos braçais quando a maître parou ao seu lado, com um olhar intrigante.


 

--- Terceira linha - disse simplesmente e a observou abaixar a cabeça e seguir em silêncio para a terceira linha. Senti pena de minha amiga, assim como Rosalie. Ela dançava perfeitamente bem, mas a maître insistia em castigá-la por seu tamanho - talvez se fosse mais alta seria mais habilidosa com os passos - esboçou um sorriso mínimo.



 

Alice tentou falar, mas a maître fechou os olhos e ergueu o dedo, pedindo silêncio. Minha amiga engoliu em seco enquanto continuava a dançar.


 

--- Não se importe - sussurrei pra ela quando a maître fora trocar a música.


 

--- Preciso me esforçar mais - falou com a voz carregada de tristeza e angústia.


 

--- Promenade - fiz o passo enquanto todas se desequilibravam ou ficavam paradas, pois não tinham equilíbrio para fazê-lo. A maître olhou-os de cara feia.


 

--- Bella venha cá - ela me chamou e eu prontamente fui até ela, que estava no centro da sala espelhada - repita o passo - pediu e assim o fiz, cuidadosamente - olhem pra ela: não é tão alta, torceu a perna e mesmo assim consegue executar todos os movimentos com elegância. Por isso não quero que ninguém vá para a superior dizer que estou implicando com as bailarinas menos capacitadas - olhou diretamente pra Alice, que baixou a cabeça - todos façam novamente o promenade. Pode voltar, Bella - disse com tom de orgulho e assim o fiz.


 

A aula se passou e, no final, consegui ouvir as outras garotas comentando sobre meu desempenho em frente ao espelho do vestiário. Troquei de roupa rapidamente e guardei minhas sapatilhas.


 

--- Viu aquela garota?


 

--- Se acha a própria só por que é rica.


 

--- Ela é muito metida, por isso só tem a Rosalie e a Alice de amigas.


 

--- Ela é patética.



 

Suspirei e segurei firme a alça da bolsa, saindo de dentro do cubículo que estava para dar de cara com as garotas que papeavam sobre mim. Manti a cabeça baixa enquanto passava pela porta, ainda sentindo os olhares debochados sobre mim. Arfei quando voltei pra sala de espelhos e levantei o olhar, dando de cara com uma Alice molhada de suor fazendo inúmeros soutenus.


 

--- Quer carona para casa? - perguntei a ela gentilmente enquanto me aproximava. Ela não parou com os passos.


 

--- Não, preciso praticar mais. Obrigada, Bella - agradeceu e eu suspirei pesadamente.


 

--- Olha, você não precisa prestar atenção no que a maître diz. Ela faz isso apenas pra te incentivar a dançar melhor, não tem nada ver com sua altura. Ela precisa ser durona para que aprendamos a aprofundar nossa dança - falei com sinceridade e ela suspirou, então notei que ela chorava.


 

--- Acorda, Bella. Isso é coisa de filmes de TV, estamos na vida real - falou com mágoa na voz - se eu tivesse só um pouco do talento que você tem não seria tão discriminada pela minha altura.


 

--- Mas…


 

-- Não precisa dizer mais nada, Bella. Amanhã nós conversamos - falou e vi uma lágrima solitária correr por sua bochecha. Coitada da minha amiga…


 

Olhei para o relógio constatando que faltavam alguns minutos para o motorista chegar. Mas não poderia deixá-la assim, tão frágil. Com um suspiro, soltei a bolsa e fui em sua direção.



 

(...)



 

Com muito esforço consegui deixá-la depois de duas horas consolando-a. por que apesar de eu dizer o tempo todo que ela era boa ela persistia em continuar se desgastando. Tiirar uma coisa daquela cabecinha é tão difícil quanto ficar na ponta do dedão.


 

Saí da Juilliard e desci as escadas de mármore branco, mas não consegui avistar o carro do motorista. Droga. Sentei-me na escada e liguei rapidamente pra meu pai para que ele pudesse mandar alguém vir me buscar, e fiquei esperando por alguns minutos até notar um homem sentado uns 8 degraus abaixo de mim.


 

Tinha belos cabelos revoltos em um tom cobre e trajava uma blusa xadrez azul dobrada até os cotovelos por fora de uma blusa branca dobrada com uma calça jeans preta e um par de tênis converse surrados. Tinha uma mochila preta desgastada ao seu lado e alguns papéis com notas musicais em cima de seu joelho, enquanto ele tentava acender um cigarro com um isqueiro prateado. Tinha uma postura ereta e pelos contornos que a blusa fazia em seu corpo dava pra perceber que ele tinha um corpo esbelto e musculoso. A visão de um anjo de costas.


 

Quando finalmente conseguiu acender o cigarro, levou os dedos finos e largos até os lábios, tragando calmamente. Prendi a respiração, pois se minha rinite alérgica começasse iria parecer algum tipo de retardada mental.


 

Quando consegui desviar os olhos da bela silhueta masculina, vasculhei minha bolsa em busca de meus fones. Ouvir uma sinfonia de Clair de Lune certamente me prepararia o suficiente para chegar em casa e enfrentar meus pais novamente. A angústia infelizmente preencheria todo meu dia.


 

Antes que percebesse, deixei meu celular cair e ele foi rolando escada abaixo, até bater nas costas do bonitão musculoso. Engoli em seco.


 

O homem se virou e eu pude finalmente ver seu rosto incrivelmente másculo. A barba por fazer e as sobrancelhas grossas eram em um tom mais escuro que seus revoltos cabelos de cor cobre, com um par de olhos azuis tão hipnotizantes quanto os de um domador de feras selvagens. Seus lábios finos embora carnudos eram arroxeados por causa da nicotina do cigarro e sua fisionomia era cansada. Na verdade ele parecia exausto.




 

--- Acho que deixou isto cair - seus lábios esboçaram um sorriso torto e eu não consegui reagir. Ele era lindo!


 

Quando consegui estender a mão pra pegar meu celular novamente, ele fitou o visor tirando o cigarro da boca e unindo as sobrancelhas pra ler o nome da música.


 

--- Claire de Lune… Está triste com algo? - falou levantando os olhos pra mim novamente e eu suspirei, fitando os joelhos. Logo ele estava sentado ao meu lado.


 

--- É só que algumas pessoas não respeitam as decisões das outras, e isso me deixa intrigada - até eu me surpreendi com minha sinceridade, afinal não devia contar minha vida pessoal a um estranho, mesmo que ele seja a visão de um anjo.


 

--- O único poder que você tem é o poder de suas decisões. Use-o à vontade, por que quem escolherá seu futuro é você e mais ninguém - falou e eu franzi o cenho, pensando nas palavras que me atingiram como uma pedrada. O estranho bonitão estava absolutamente certo.


 

--- Mas eles tem o poder de interferir no meu futuro.


 

--- Mas você tem o de mudar. O futuro é seu - deu de ombros e eu mordi o lábio inferior, pensativa, enquanto ele dava uma tragada profunda em seu cigarro. Ele conseguiu me fazer compreender em alguns segundos o que levei meses pra processar, e de repente me senti obrigada a aliviar sua aflição.


 

--- Mas e você? O que tem? - olhei em seus olhos e ele me fitou novamente, os olhos cansados enquanto esboçava um sorriso ainda com o cigarro na boca.


 

--- Não é nada que se possa resolver. Aconteceu, não dá mais pra voltar no tempo - falou como se fosse pra si mesmo e eu suspirei olhando pros meus joelhos, sem saber o que fazer. Uni toda minha solidariedade e, em uma atitude simples, peguei um de meus fones e o coloquei em sua mão. Ele me olhou confuso e eu dei um sorriso sincero.


 

--- Isso pode não ser uma máquina do tempo, mas ajuda a curar as aflições - falei e ele tirou o cigarro da boca e o apagou com o pé, colocando o fone na orelha enquanto eu fazia o mesmo.


 

Ficamos longos minutos fitando uma árvore no parque que tinha na praça a frente de nós. Não sei em que ele estava pensando, mas o tom verde das folhas me fizeram refletir um pouco. Meus pais realmente poderiam interferir em meu futuro no ballet, isso estava mais do que comprovado, visto que eles pagam minha matrícula e eu não tenho dinheiro algum. Eu sempre tinha que aceitar as coisas de cabeça baixa por respeito à autoridade familiar que eles impunham, mas aquilo era apenas um impasse. Quem disse que realizar os sonhos é fácil? Oras, tenho vinte anos, posso fazer o que quiser e responder por meus atos legalmente. Porém ainda sinto que devo algum tipo de favor à meus pais, especialmente a Charlie. Com minha mãe é… diferente.


 

Eu penso assim como se fosse realmente fácil tomar uma atitude radical diante dos que me educaram e nunca me viram agir de modo diferente. Não tenho tamanha moral, e minha mãe certamente me mandaria pra algum internato de freiras caro fora do país. Suspirei com a ideia.


 

Queria ser uma folha dessa árvore: poder rumar livre por onde o vento soprar, sem decisões para tomar ou pessoas para impressionar. Apenas eu contra os ventos do mundo, que me guiariam ao infinito.


 

Despertei com o som estridente da buzina da limousine, sobressaltando. O homem olhou pro veículo, mas ainda estava com o pensamento longe.


 

--- Acho que tenho que ir - falei meio vacilante enquanto levantava. O lindo homem ainda estava parado fitando a árvore, certamente envolvido pela doce melodia da música clássica. Como ele era belo pensativo…

Com um sorriso, tirei o fone de meu ouvido e deixei meu celular em sua mão, fazendo-o continuar em seu mundo de pensamentos. E com uma despedida silenciosa, deixei a Juilliard e quando fechei a porta da limousine o homem me fitou novamente com os olhos cheios de dúvidas, como se dissessem “obrigada”.


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Notas finais do capítulo

O que acharam? Deixem seus comentários!
Ah, não deixem de assistir o trailer da fic: http://www.youtube.com/watch?v=-hHHDdQtglY

Até o próximo cap!