Tempestade de Primavera escrita por Val-sensei, André Tornado


Capítulo 5
Movendo céus e terra.




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Na manhã seguinte, Chichi terminava o café da manhã e preparava-se para uma viagem até à metrópole do Ocidente para visitar a amiga que lhe parecera tão aflita no telefonema da madrugada. Nem fixara as horas em que tinha atendido o telefone, mas era muito tarde e quando existem chamadas a horas tardias só podem significar pedidos de auxílio que não devem nunca ser ignorados.

Começava mais uma semana, Gohan e Goten tomavam o café da manhã ao lado dela. Espreitou-os carinhosamente. Tinha dispensado o tutor do filho mais velho, indicando para vir no dia seguinte, e pedira a Gohan que aproveitasse o dia a rever as matérias, enquanto ela ia fazer a tal viagem com Goten. O adolescente concordara com a mudança de planos, não se importava de passar um dia enfiado nos livros, mesmo que o tutor não estivesse ali para o orientar. Depois Chichi acrescentara com meiguice que o avô, Gyumao, haveria de aparecer por lá para lhe fazer companhia.

Goten, por seu lado, estava excitado com a viagem para ver o amigo e remexia-se na cadeira, pelo que ela já o tinha admoestado para se concentrar na refeição e que em breve iriam partir. Mas só o fariam depois de ele comer tudo, pois precisava de crescer e tornar-se num rapaz bonito como o irmão e como o pai.

Nii-chan, a okaasan deixou-me ir ver as cegonhas com o Trunks-kun.

– Ver as cegonhas? – perguntou Gohan admirado, segurando o hashi entre a tigela e a boca, o ramen enrolado nas pontas.

Hai. Vamos ver os bebês.

– Bebês? – Gohan perguntou à mãe: – Cegonhas e bebês…? O que é que se passa?

– Não sabes, nii-chan?! – E Goten ergueu uma sobrancelha com ares de sabedoria. – São as cegonhas que trazem os bebês!

Na-nani?

Gohan recordou-se do que diziam os livros de ciências e corou. Olhou para a mãe, que exibia um sorriso plácido. Acenou ligeiramente com a cabeça e gaguejou outra vez, dirigindo-se ao irmão:

– P-pois sim… As cegonhas. São as cegonhas que trazem os bebês… Mas por que razão esse interesse agora por bebês e por cegonhas?

– Apareceu um bebê abandonado na porta da Capsule Corporation, dentro de um cesto – explicou Chichi. – Vamos hoje conhecer a garotinha e… conversar com Bulma. Esse acontecimento tem causado alguma confusão, Gohan-kun, mas nada de importante. Não te apoquentes. Tens de pensar nos teus estudos!... Bem, quanto ao bebê deixado num cesto na Capsule Corporation… Trunks-kun e Goten-kun têm conversado sobre isso e a explicação que encontraram para o sucedido foi que a cegonha deixou esse cesto.

– Foi a cegonha, sim, ‘kaasan! – exclamou Goten empurrando a malga indicando que tinha acabado o café da manhã e que estava pronto para a viagem.

– Claro que sim, querido – confirmou Chichi passando-lhe uma mão pelos cabelos.

– Ah… Já estou a perceber – disse Gohan bebendo o caldo e acabando também o seu café da manhã.

Chichi recolheu a loiça, deixando os dois rapazes sozinhos na mesa da sala onde tomavam as refeições diárias. Gohan retirou os óculos e pôs-se a limpá-los a uma ponta da blusa branca que vestia naquele dia.

Nii-chan?

Hai, Goten-kun.

– Queres ter uma mana?

Gohan arregalou os olhos, os óculos suspensos a caminho do rosto admirado com aquela pergunta do irmão. Goten saltou da cadeira, acercou-se dele e sussurrou, como se fosse um enorme segredo que não podia ser escutado por mais ninguém que não fosse Gohan, nem mesmo a mãe que lavava a loiça murmurando uma cantiga, nem sequer as paredes redondas da casa:

– Sabes? Eu e Trunks vamos encontrar os ninhos das cegonhas para descobrir onde estão escondidos, para que Bulma-san não possa devolver a Panty. A Panty é a irmãzinha do Trunks-kun e Bulma-san quer mandá-la de volta porque… não sei porquê, nii-chan. Então, eu disse a Trunks-kun que também queria ter uma mana, pois deve ser muito engraçado ter um bebê para nós cuidarmos e para brincar e disse-lhe que te ia perguntar. Queres ter uma mana?

Com um gesto rápido, Gohan recolocou os óculos.

– Goten, os bebês… Os bebês…

Por momentos, considerou contar a verdade para o irmão, mas a expressão ingénua naquela cara redonda demoveu-o. E depois, como explicaria a física e a mecânica do ato de gerar um bebê a uma criança de quatro anos que ainda caçava borboletas, nadava atrás dos peixes gigantes no rio e acreditava em espíritos mágicos escondidos debaixo das pedras? Sorriu-lhe, assentou-lhe as mãos nos ombros e respondeu-lhe:

– Não me importava nada de ter uma mana, Goten-kun.

O garotinho sorriu e acenou com a cabeça.

Hai! Vou trazer uma mana quando voltar.

O sorriso esmoreceu, espreitando para a porta da cozinha, atrás da cadeira onde se sentava Gohan.

– Achas que a ‘kaasan não se importava de termos um bebê cá em casa, nii-chan?

– Acho que não! – riu-se Gohan.

– Bulma-san importa-se…

– Mas a ‘kaasan não é como Bulma-san.

Goten abanou a cabeça.

– Pois não, pois não.

Minutos depois, Chichi saiu com Goten num aerocarro que acionou no terreno relvado que se estendia diante da casa, antes deixando Gohan com os mesmos conselhos que já tinha debitado no café da manhã, repetindo-os, pelo menos, umas três vezes. Deixou-o com a última indicação de que deveria esperar pelo avô.

No caminho, Goten ia muito calado. Chichi espreitou-o. Cruzava os bracitos, colava o queixo ao peito e tinha as sobrancelhas unidas sobre os olhos fixos num ponto invisível do horizonte. Estava a matutar em algum problema para o qual considerava não haver uma resolução que se adequava às suas expetativas de menino. Não lhe perguntou nada, sabia que, mais cedo ou mais tarde, haveria de surgir a frase retumbante que quebraria a máscara cerrada que resolvera colocar naquela viagem.

E que veio inesperadamente, quando Chichi acabava de ligar o piloto automático do aerocarro depois de ter definido a rota até West City.

Okaasan

E quando utilizava a palavra inteira, okaasan, com todas as letras, sem a resumir num apelo mais carinhoso, significava que vinha aí uma bomba. Chichi sentiu os cabelos da nuca eriçarem-se com um calafrio.

– Eu também quero ter uma mana!

Ao escutar aquela declaração a seco, Chichi julgou ter escutado mal. Piscou os olhos várias vezes, como se tivesse a necessidade de clarear a visão e visionar melhor o inimigo invisível que a atacava inesperadamente.

Mas era apenas o seu filho mais novo, Son Goten, que tinha acabado de completar quatro anos, que lhe falava.

Rodou o pescoço lentamente e que ficara rígido para encarar o miúdo. Saiu-lhe um sorriso amarelo, a mostrar os dentes todos e suspendeu a respiração.

– Queres… ter uma mana?

Ai, meu kami! Estes meninos têm com cada uma!”, pensou aflita.

Goten insistiu assertivo:

Hai, quero ter uma mana.

– Mas… uma mana?

Hai, o Trunks também tem uma mana.

O pensamento seguinte, eivado de cinismo, torceu-lhe o sorriso numa careta, Bem, isso é o que vamos comprovar, pelo menos como uma primeira observação, se o Trunks tem mesmo uma mana ou não.

Pigarreou, agarrou-se aos comandos do aerocarro, mesmo que não necessitasse de o fazer, pois o veículo voava sozinho auxiliado pelo piloto automático, mas precisava de se segurar em alguma coisa.

A resolução seria mais fácil do que se supunha. Afinal, tratava-se do seu filho com quatro anos acabados de completar. A declaração do menino não tinha as implicações que ela tinha imaginado num primeiro momento, aflita e desesperada, enredada no raciocínio intricado de uma mulher adulta para quem a magia já se tinha esfumado na banalidade de todos os dias, mesmo que se tivesse casado com um guerreiro alienígena e de todas as aventuras já passadas e inscritas a letras douradas no livro interior das suas memórias.

Depois de pigarrear, respirou fundo, relaxando os músculos da face.

– E vais encontrar uma mana… no ninho das cegonhas?

Ao perceber que a mãe estava a compreendê-lo, a falar a mesma linguagem dele, Goten abriu um sorriso sincero e luminoso.

Hai, ‘kaasan!

Chichi sorriu-lhe de volta.

– Posso ir buscar uma mana ao ninho das cegonhas?

Disputava com Trunks o privilégio de ter uma irmã bebê, assim como disputaria um qualquer brinquedo apetecível, sonhado e imensamente desejado.

E Chichi respondeu-lhe maternal:

– Claro que sim, Goten-kun. Podes ir buscar uma mana ao ninho das cegonhas.

***

O átrio do edifício municipal enxameava-se de gente que vinha para iniciar o seu dia de trabalho, para tratar de assuntos que necessitavam de alguma aprovação ou certificado do município, de visitantes que se propunham a visitar a galeria de arte adjacente onde se expunham, de forma gratuita e recorrente, obras de artistas locais.

Apresentava a costumeira agitação que ele sempre conhecera do local e cruzou a porta dupla com imponência, queixo espetado para diante, olhos negros semicerrados, carrancudo, mãos fechadas em dois punhos, a mesma porta que, no dia anterior, tinha estado encerrada de uma forma tão determinada quanto a sua vontade de esclarecer aquele assunto do raio da cria humana.

Parou no centro do átrio, observando o lugar com atenção, absorvendo todos os detalhes com o instinto assassino e sobrevivente que lhe era próprio, coisa incutida na sua aprendizagem inicial de guerreiro. Descobriu um balcão que formava um meio círculo onde uma mulher e um homem vestidos com o mesmo casaco justo azul-escuro, apenas com um corte diferente para se adaptar às formas feminina e masculina, atendiam de uma forma profissional e irrepreensível quem se aproximava. Seria aquele o primeiro passo a dar naquele labirinto humano e que o levaria à solução pretendida: descobrir a identidade do homem da foto, acrescentando o endereço e o contacto telefónico do miserável, pois agora que tinha posto um pé dentro do edifício municipal, só de lá sairia com essa gloriosa informação.

Vegeta afastou sem cerimónias um casal com mochilas às costas, indicando tratar-se de um casal de forasteiros, e encarou a mulher, que tinha a cara exageradamente pintada. A mulher não desfez o sorriso modelado nos lábios vermelhos, mas os olhos perderam o brilho simpático. Vegeta assentou as mãos no balcão e retribuiu o olhar intenso. A mulher censurava-o com aquela cara dura, sorriso fingido e olhos dardejantes, por ter passado à frente de quem estava a atender.

– Ei… Não sabe esperar a sua vez, senhor?

E o rapaz de mochila às costas ousara fazer mais: censurava-o de viva voz. Vegeta ignorou-o, pois apreciara o tratamento respeitoso. Ao menos, tratara-o por “senhor” e evitara, por uma nesga de sorte, um murro no meio do nariz.

– Preciso de descobrir a identidade de alguém. Onde são os arquivos?

A mulher, nunca deixando de sorrir, respondeu-lhe:

– No segundo piso, senhor. Se apanhar os elevadores, deverá seguir para a sua esquerda e depois escolher a porta da direita, onde encontrará a sala de espera dos serviços do registo civil. Os arquivos encontram-se nesses serviços.

– Hum…

Achava que devia agradecer, era exigível segundo os padrões humanos, mas ele não era humano. Vegeta limitou-se a retirar as mãos do balcão e afastou-se.

– Tenha um bom dia, senhor.

– Que malcriado… Nem sequer agradeceu – observou a rapariga de mochila às costas.

– Há com cada um! – apontou o rapaz.

Seguiu as indicações da mulher, depois de sair do elevador e tomar os caminhos certos, alcançou a tal sala de espera. Contou vinte e duas pessoas distribuídas entre as cadeiras que se encontravam ali para proporcionar descanso a quem esperava e aquelas que estavam a ser atendidas nas cinco mesas individuais iluminadas propositadamente com lâmpadas brancas, onde os funcionários do município faziam o atendimento com o auxílio de computadores. Ao fundo existiam outras secretárias com outros funcionários, alguns a passar de um lado ao outro com papéis nos braços, e que tratariam dos processos relacionados com esse tal registo civil. Na parede mais afastada viu estantes com encadernações diversas e mais papéis, não lhe pareceu nada semelhante a um arquivo de cadastros de pessoas e começou a sentir-se nervoso.

Encaminhou-se para uma das mesas individuais, assentou uma mão no tampo e exigiu:

– Quero consultar os arquivos.

O funcionário olhou-o de forma fria e indicou a parede à sua direita com a esferográfica que tinha entre os dedos:

– Tem de tirar uma senha, senhor, se quiser ser atendido.

– Não vou tirar senha nenhuma. Quero consultar os arquivos.

– E esperar a sua vez, senhor – completou o funcionário a fingir que não o tinha escutado.

– Estás a ouvir-me, verme? Quero consultar os arquivos!

– Tem de tirar uma senha, senhor – repetiu o funcionário automaticamente, como se fosse um androide engasgado.

– Não vou tirar porcaria de senha nenhuma! – irritou-se, crescendo para cima do funcionário, do homem calvo que este atendia, da mesa e do computador, colocando-se em bicos de pés.

– Se quiser ser atendido, senhor…

– Já ouvi!

– Tem de tirar uma…

– Se me falares outra vez do raio da senha…

Mas o funcionário não se demoveu da sua lengalenga, mesmo ameaçado por um saiyajin que não tinha dormido nada na noite anterior, que tinha sido expulso da sua casa, que continuava sem perceber por que razão a sua vida fora estragada por uma insignificante cria humana.

– …senha, senhor.

Os olhos de Vegeta injetaram-se de sangue. E quando ia explodir num berro que haveria de fazer tremer aquele edifício todo, desde os alicerces até às telhas, sentiu um puxão suave, mas firme, no braço esquerdo. Descobriu uma mulher com óculos redondos, franja a roçar a parte de cima das armações, o cabelo apanhado num rabo-de-cavalo, vestida com um conjunto saia-casaco verde justo, que lhe acentuava as curvas de um corpo jovem. Vegeta mirou-a da cabeça aos pés, reparando ainda no detalhe de uns sapatos de salto verdes que combinavam com o que vestia.

– Venha comigo, senhor.

A voz era agradável, com um timbre imperioso que não admitiria qualquer espécie de argumentação, recusa ou interrogação. Então, Vegeta seguiu-a. Passaram pelas secretárias interiores, muitos olhos voltando-se discretamente na direção deles – ele sabia que o observavam, a sua truculenta interpelação com o colega deveria estar a criar animosidades e críticas entre aquela gente. Voltaram à esquerda, a mulher abriu uma porta estreita, com uma janela no cimo resguardada por um gradeamento de malha fina. Assim que ele entrou, a mulher fechou a porta atrás deles e as lâmpadas do teto acenderam-se automaticamente revelando um compartimento onde se alinhavam estantes altas pejadas de pastas pretas perfeitamente ordenadas. O cheiro adocicado do papel pairava no ar.

– Desculpe dizê-lo, senhor, mas não estava a ter um comportamento muito civilizado na sala de espera. Os outros utentes estavam a ficar incomodados. Nós estamos aqui para servi-lo, senhor, mas deverá compreender que não é o único que necessita ser atendido e deverá esperar pela sua vez. Cumprir regras é muito importante para mantermos um atendimento de qualidade.

Mas Vegeta, distraído com a visão ordeira das estantes, compreendendo que alcançara o sítio certo naquele edifício confuso e barulhento, perguntou seco:

– Aqui é o arquivo onde está o cadastro individual dos habitantes de West City?

O silêncio da mulher fê-lo encará-la com um olhar negro exigente. Ela empurrou os óculos com a ponta do dedo e que tinham escorregado por ação de uma fina película de suor que se formava sobre a pele do rosto. Ela estava, de algum modo, nervosa. Ele jogou com isso. Cruzou os braços e repetiu:

– Aqui é o arquivo onde está o cadastro individual dos habitantes de West City?

A mulher era astuta e inteligente, contudo, mesmo que fosse jovem, pois não aparentava mais do que vinte e cinco anos. Facilmente manobrável se ele utilizasse alguns truques de sedução que funcionavam em Bulma, mas orgulhosa o suficiente para fingir que lhe resistia quando ele esgrimisse esses truques. Teria de ir com cuidado, não queria perder a vantagem que acabava de conquistar. Ela contornou a pergunta dele com outra pergunta:

– O senhor quer consultar os arquivos?

Hai.

Ela inclinou-se ligeiramente, os óculos tornaram a deslizar pela cana do nariz revelando uns olhos bonitos de cor violeta e perguntou num sopro:

– O senhor é agente da polícia?

– Não.

A resposta dele fê-la endireitar imediatamente as costas, sentenciando:

– Senhor, se não é agente da polícia, não poderei ajudá-lo.

Enfastiado, Vegeta arqueou uma sobrancelha e ela prosseguiu no mesmo tom profissional, decalcado daquele utilizado pelo funcionário que lhe exigia o raio de uma senha, imitando um androide engasgado:

– E teremos de abandonar este local imediatamente. Os arquivos do cadastro individual dos habitantes de West City estão protegidos pelas leis de proteção de dados e só estão acessíveis para consulta em situações especiais. Se pretender, ainda assim, fazer a sua consulta, sugiro que se dirija ao balcão 1L ponto 20 e que preencha um requerimento indicando o que pretende, deixando os seus contactos para recebimento da nossa resposta, que dependerá de despacho superior.

– Ah cala-te, mulher! – exclamou Vegeta sem paciência.

A mulher indignou-se, mas ele percebeu que estremecia com um ligeiro odor de excitação. Gostara do tratamento brusco que lhe dirigira e Vegeta mostrou um sorriso enviesado. Com o estômago às voltas por desempenhar aquele papel degradante, deu um passo em frente, encurralando a mulher que se encostou à parede adjacente à porta estreita. Apoiou uma mão na mesma parede, junto à cara da mulher.

– Tu não me vais negar acesso aos arquivos, pois não?

Ela inspirou uma grande porção de ar e começou a gaguejar:

– Senhor, os arquivos do cadastro individual dos habitantes de West City estão protegidos pelas leis de proteção…

– Já me disseste isso. Anda, preciso da tua ajuda.

Fez roçar a mão devagar pela parede, provocando um barulho mínimo captado pelo ouvido esquerdo da mulher, que entreabriu os lábios pintados. Os óculos moravam na ponta do nariz e ela não fazia nada para os empurrar para cima. Provavelmente já nem conseguia coordenar os membros com o próprio corpo que tremia e que se contorcia indelevelmente, lançando aquele odor peculiar. A vitória era dele e Vegeta acentuou o sorriso travesso, semicerrando os olhos.

Retirou a mão da parede, tocando ao de leve e de propósito no ombro da mulher. Levou-a ao bolso e retirou a foto rasgada com o principal suspeito do crime que ele, mesmo sem ser agente da polícia, andava a investigar. Prendendo o pedaço de papel fotográfico entre dois dedos, mostrou o rosto do indivíduo à mulher, explicando:

– Preciso saber quem é ele.

A garganta dela moveu-se indicando que tentava engolir e restabelecer as funções vitais. Disse-lhe:

– Não vai ser fácil…

Vegeta afastou-se para o lado e indicou um computador que zunia sobre uma pequena secretária, indicando que estava ligado, apesar de o monitor estar negro.

– Pesquisa nos ficheiros informáticos por homens residentes em West City, entre os vinte e os trinta e cinco anos de idade, cabelos castanho-claro e olhos cor de mel ou castanhos.

– E diz que não é… agente da polícia, senhor?

Vegeta não lhe respondeu. Ela sentou-se e ativou o computador dando um ligeiro toque no rato posto junto do teclado, para retirá-lo do modo adormecido. Perguntou interessada, à medida que surgia um ecrã da aplicação informática que fazia a gestão das pastas arquivadas ali:

– Faz as perguntas certas e sabe o que quer… É algum detetive particular?

Ele cruzou os braços e postou-se atrás da cadeira giratória exigindo:

– Faz o que te peço e rápido. Se estás a fazer uma coisa ilegal, não queres ser apanhada, pois não?

Uma interjeição indignada saiu dos lábios da mulher, que teclou rapidamente um login e uma password, os dedos súbitos sobre as teclas a revelar que se zangara. Nunca mais falou com ele. Fez a pesquisa pedida e o computador, ao fim de quinze segundos de uma espera inquietante, devolveu um total de seis linhas com um código específico que, decifrado, apontava para as pastas certas da prateleira certa.

Vegeta deixou a mulher seguir os respetivos códigos, levando a foto rasgada para compará-la com a imagem existente nos registos. Na quarta pasta, ela demorou-se mais do que fizera com as anteriores. Olhou com mais cuidado para a foto rasgada e para o registo que tinha em mãos e depois decidiu-se que a procura tinha terminado. Levou a pasta entre os braços e mostrou-a a Vegeta, em silêncio.

– Hum… Encontrei-te, miserável! – exclamou o príncipe.

O homem de cabelos castanho-claro, olhos cor de mel, chamava-se Miruku-iri Kohi e morava no bairro sul de West City, uma zona exclusiva de novos-ricos, que gostavam de exibir as suas fortunas em grandes moradias e em automóveis luxuosos, que jogavam ténis e nadavam na piscina olímpica de um clube exclusivo da mesma zona – assim tinha uma vez ouvido Bulma contar à loira. Uma inutilidade que escutara na ocasião, que descartara por não constituir assunto de interesse para o príncipe dos saiyajin, mas que agora regressava à sua mente, rebuscada das funduras da memória, como algo tão indispensável para a sua vida quanto o ato de respirar.

Vegeta saiu do edifício municipal triunfante.

Iria mover céu e terra para devolver a cria humana àquele idiota chamado Miruku. Depois faria o tal exame de DNA que Kakarotto lhe tinha falado no sonho daquela noite e obrigaria o idiota a fazer o mesmo exame. E depois…

Depois pensou em Bulma e sentiu-se enfurecer.


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Notas finais do capítulo

O nome Miruku-iri Kohi significa café com leite em Japonês.

Próximo capítulo:
Perto da verdade.



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