Ficar uma tarde se divertindo com um amigo ou um familiar é sempre bom, mas às vezes acontece de você sentir que algo está faltando. Pode ser um gesto de carinho, uma palavra de incentivo, uma brincadeira que sempre acontece e ali não aconteceu ou pode ser uma pessoa. Sentir que algo está faltando é extremamente perturbador. Foi assim que eu me senti naquela tarde. Eu havia passado várias horas na companhia de Dakota e Sophia. Ouve conversas e risadas, mas aquela impressão de que alguma coisa estava faltando não saía de minha cabeça. Vários momentos eu me pegava tentando descobrir o que era, mas essas tentativas eram em vão.

Quando fui para casa senti aquele clima pesado. Minha avó estava sentada no sofá lendo uma revista, quando me viu tentou não olhar em meus olhos. Sentei ao seu lado, mas ela imediatamente se levantou e foi para cozinha. Avó Maria estava me evitando. Fui para cozinha para tentar conversar com ela.

– O que tem para o janta vó? – Perguntei –

Minha avó estava preparando um chá para ela.

– Já jantamos há um bom tempo. – Respondeu – Se você não ficasse na rua o tempo todo poderia ter jantado conosco. Mas você prefere os outros a sua própria família. – Completou –

Revirei os olhos.

– Vó, não vamos começar a brigar novamente. Eu estou perguntando na boa. – Falei enquanto abria a geladeira para ver o que havia lá. – A senhora está sendo muito egoísta e dramática.

Ela deu um risinho irônico.

– Egoísta? Dramática? - Perguntou e eu confirmei acenando com a com a cabeça – Ta, eu posso até estar sendo egoísta e dramática, mas você está sendo ingrato com o seu avô e comigo. Nós te criamos desde que você nasceu e você agradece querendo uma família nova.

– Eu não estou querendo uma família nova. Eu nunca disse isso. Você está tirando conclusões precipitadas.

Minha avó não disse mais nenhuma palavra. Ela tomou seu chá e foi para o seu quarto me deixando ali sozinho.

– E agora o que eu vou comer? – Falei –

Abri novamente a geladeira e peguei alguns ovos.

Eu nunca me interessei em aprender a cozinhar, mas depois do ovo mexido com pão que fiz, acho que levo jeito para coisa. Comi aquele “sanduíche” e fui para o meu quarto. Aquele dia havia sido bastante movimentado e tenso. Eu precisava de uma boa noite de sono para compensar toda aquela confusão em que eu estava envolvido.

...

Acordei e me levantei. Era sábado e o dia havia amanhecido chuvoso. Não parecia ser apenas uma garoa passageira, o dia estava escuro e parecia que ia ficar o dia inteiro chovendo. Como no sábado não tem aula, eu teria o tempo todo para fazer o que eu quisesse. Poderia ir ao cinema, ou ao parque, ou ao zoológico que ficava no centro da cidade. Mas com quem eu iria? Kari estava afastada de mim e eu queria dar um espaço a ela. Minha avó estava com raiva de mim e meu avô é muito ocupado para perder tempo comigo. Sobrara Sophia e Dakota, mas eu já passava tanto tempo com elas que prometi a mim mesmo dar um tempo para as duas ficarem a sós e se curtirem. Não havia mais ninguém. Eu não tinha mais amigos, nem familiares que morassem perto de mim. Então decidi ficar no meu quarto lendo livros, mexendo na internet e assistindo TV.

O dia passou-se muito devagar. Por mais que eu fizesse várias coisas para ocupar meu tempo parecia que ele não passava. No final do dia, quando eu estava lendo um dos meus livros preferidos que era As vantagens de ser invisível consegui avistar Sophia pela janela de seu quarto. Ela estava novamente com as folhas de desenhos em suas mãos. Ao seu lado estava um violão. Eu sempre gostei de tocar musicas no violão, só que nunca tive um. Minha avó dizia que a lembrava muito a minha mãe e ela não queria lembrar-se disso. Por mais que eu tivesse feito uma promessa de deixar Sophia e Dakota sozinhas naquele dia, a vontade de tocar violão era maior do que qualquer promessa feita. Fui correndo até a casa das duas e bati na porta. Dakota abriu a porta sorridente.

– Por onde você se enfiou o dia todo? – Dakota me perguntou quando me viu –

– Eu estava na minha casa. – Respondi –

– Porque você não veio aqui passar um tempo com a Sophia e comigo?

– Eu queria... quero dar um tempo para vocês duas ficarem sozinhas. Eu já passo tanto tempo com vocês e não dou muita privacidade às duas. Eu não quero atrapalhar nada.

– E quem disse que você atrapalha Charlie? É um prazer te ter por perto. – Dakota colocou seus braços sobre meus ombros me abraçando. –

– Obrigado! – Sorri enquanto dizia – Minha avó não quer que eu fique muito tempo fora de casa. Ela anda dizendo que eu passo mais tempo com os outros do que com a própria família. De certo modo, ela está certa. Não quero que o clima fique pesado lá em casa, então vou tentar passar o máximo de tempo com meu avô e com minha avó.

– Entendo! Bom, você que sabe. Mas saiba que não é nenhum incomodo você frequentar minha casa. – Dakota sentou-se no sofá –

– Mais uma vez obrigado! É... vi que tem um violão lá no quarto de Sophia. Será que eu poderia tocar umas musicas para ela?

– Você sabe tocar?

– Sim! – Respondi –

– Ganhei esse violão lá na empresa que trabalho e como eu não sei tocar, deixei ele lá em cima.

– Posso subir?

– Claro! Vai lá!

Subi correndo as escadas e entrei no quarto de Sophia.

– Oi Sophia! – Falei indo em direção a ela e depositando um beijo em sua bochecha. Isso a fez sorrir. – Posso pegar esse violão emprestado por um tempo?

Ela acenou que sim e eu peguei o violão. Sentei na beirada da cama de Sophia e posicionei o violão sobre minhas pernas. Comecei a tocar e percebi que Sophia começou a me olhar naquele exato momento. Ela sorria. Percebi também que Dakota estava me olhando e me acompanhando. Eu estava um pouco fora do ritmo, mas isso não importava. Comecei a tocar uma das musicas mais lindas que eu já havia escutado. Ela se chama Inesquecível da banda Promisses. Acho que você devia ouvi-la depois, tenho certeza que irá gostar muito. Empolguei-me e comecei a tocar e cantar.

“É inesquecível para mim

Esse seu sorriso tão bonito.

Tua voz tão doce aos meus ouvidos

Eu desejo ter por toda vida.

Quando estou contigo eu sou tão feliz

Todo esse carinho me faz bem

Vou agradecer eternamente a Deus por ter me dado você.”

Ver o sorriso de Sophia era algo extremamente bom e ter momentos como aquele na minha vida era realmente inesquecível.