Eu estava sentada no canto do cômodo, sobre um puf, com os braços cruzados, segurando minhas pernas, enquanto os outros conversavam animadamente antes de um novo ensaio do the GazettE.

Toda aquela situação era muito estranha pra mim... Como se fosse uma realidade paralela... Meus olhos acompanhavam cada gesto da minha irmã e o vocalista da banda com atenção, sem que eles percebessem. Claro que não perceberiam! Estavam tão concentrados em si mesmos que eu me surpreendia de Takanori não se esquecer de todas as letras das músicas... Talvez isso não acontecesse porque todas as últimas músicas que ele escrevera eram pra ela...

Apesar da diferença de idade (que me incomodava tanto quanto aos meus pais), os dois se entendiam com a magia dos contos de fadas... Não que ele fosse um príncipe encantado... Mas não era um sapo! Sabia ser charmoso, sedutor e atencioso... E ninguém podia negar que estava completamente apaixonado!

Eu acompanhava a irmã para os ensaios da banda talvez com a esperança vã de que o feitiço se partisse e ela voltasse a si... Queria estar presente no momento em que tivesse Carolina de volta e tudo aquilo acabasse...

Mas essa esperança era apenas um grão de areia diante de todas as demonstrações de afeto do rapaz... Nem mesmo eu podia negar que ele era um namorado do que jeito que toda garota sempre sonhou...

Por isso, eu ficava encolhida em meu canto, silenciosa e sozinha, só assistindo a felicidade alheia para fugir da realidade que via em minha vida...

Monique também já estava bastante enturmada e tinha sido muito bem acolhida pelo moreno galanteador, o guitarrista Yuu. Ele já agia com ela da mesma maneira que os outros companheiros agiam com suas namoradas...

Eu gostava de ficar vendo como os dois casais já formados naquele grupo agiam... Sempre tivera uma imagem sobre relacionamentos de músicos que não podia ser aplicada àquela situação...

Yutaka era o exemplo perfeito de namorado companheiro! Ele e Mariana tinham uma harmonia perfeita e sempre estavam planejando alguma coisa juntos! Eram com certeza os mais discretos em seu relacionamento.

Akira não era nem um pouco contido, apesar de Ana tentar ser... Ele não ligava pra opinião dos outros e ela parecia se esquecer um pouco quando ele a beijava...

— Não quer se enturmar mais não? – alguém se jogou no puf ao meu lado, rindo baixinho. – Nós ficamos constrangidos ao sermos analisados dessa forma...

— O que você quer, Kouyou? – eu bufei.

— O mesmo que você... – ele respondeu, malicioso e eu o encarei, inexpressiva. – A pergunta é... Você quer ir pra um lugar mais reservado?

— Com você, eu não quero ir pra lugar nenhum! – eu desviei os olhos dos dele, fazendo-o gargalhar.

— Você não gosta mesmo de mim, não é, Sereny? – ele se aproximou mais, me puxando pela cintura e me prendendo contra seu corpo, tornando qualquer resistência completamente inútil.

— Por que será? – eu tornei a bufar, desistindo de me debater.

— Porque você é boba! Porque eu sou doidinho por você!

— É... Eu sou conhecida mesmo por ser boba... Não acho que exista uma maneira de me melhorar...

— Você me deixaria tentar?

— Não – ele deu risada.

— Tem razão... Eu não quero mudar nada em você! Você me deixa ser bobo com você?

— Você faz o que você quiser da sua vida, Kouyou! Eu não me importo!

— Então, eu posso enroscar minha vida na sua como um novelo de lã?

— Que frase mais... Estranha... Por que a ideia do novelo de lã?

— Porque é como eu vejo nossa Akai Ito – ele deu um beijo no meu rosto.

— Tire de sua cabeça essa história de Akai Ito! – eu respondi, enfurecida.

— Já ouviu a nova música que Taka compôs pra sua irmã? – ele disse, ignorando minha raiva.

— Red? – ele assentiu. – Pra ser honesta, ela não fez sentido algum pra mim...

— É porque sua mente não está aberta para a ideia de estar predestinada alguém... A ideia de o seu destino estar amarrado ao de outra pessoa!

— E por que é que você acredita nisso?

— Eu não acreditava também... – Kouyou jogou a cabeça para trás, tirando a franja dos olhos.

— E o que foi que o fez mudar de ideia? – eu perguntei, desinteressada.

— Sua irmã – ele respondeu, me pegando de surpresa.

— Minha irmã?

— Exatamente. Eu era tão cético quanto você para esses assuntos de destino, Akai Ito, amor predestinado e olha que eu curto Luna Sea... Depois de conhecer sua irmã, eu pude ver com meus próprios olhos que existe sim um destino traçado para cada um de nós e que existe sim uma linha vermelha ligando duas pessoas predestinadas!

— Hum... – eu respondi, incomodada.

— A maneira como ela e Takanori se conheceram... Como se apaixonaram... Acho que se eu não tivesse visto acontecer com meus próprios olhos, não acreditaria... Não acreditaria que é possível existirem duas pessoas tão perfeitas uma para a outra... Ainda agora, isso me surpreende...

— Isso ainda não me faz acreditar... – eu respondi.

— Eu não esperava mesmo que você acreditasse por isso – ele rebateu. – Só acontece quando você é pego de surpresa... E eu bem sei o quão é difícil te encontrar de guarda baixa, Rainha de Gelo!

— Gosto de prever os movimentos do adversário algumas jogadas à frente... – justifiquei, dando de ombros.

— E que graça tem viver assim?

— Não é pra ter graça! É pra estar sempre preparada para imprevistos!

— Acredite: imprevistos dão um sabor diferente à vida!

— Sempre detestei surpresas! – ele gargalhou, me deixando ainda mais furiosa.

— Você não tem ideia do que está perdendo!

— Viver perigosamente sempre me pareceu sadismo...

— Existe uma grande diferença entre viver perigosamente e ser aberto a novas experiências, Sereny! Mas você não tinha como saber disso ainda... Ainda lhe falta vivência...

— Não tem nada que eu deteste mais do que quando me dizem que eu não tenho como saber por ser muito nova! – esbravejei, fazendo-o rir.

— Eu sinto lhe informar, gatinha, que tem coisas das quais não dá pra aprender nos livros mesmo! – eu fechei a cara ao seu comentário. – Até brava, você me deixa apaixonado, acredita? Isso é tão...

— Doente? – arrisquei e ele sacudiu a cabeça, gargalhando.

— Você sempre chuta errado as coisas que eu vou dizer, Sereny... Por quê?

— Porque não sou sua Akai Ito – debochei.

— Acho que também gosta de me tirar do sério...

— Algum dia vai extrapolar os limites da minha paciência, Kouyou e vai ser um caminho sem volta! – ameacei.

— Algum dia você vai descobrir como é bom amar alguém como eu amo você, Sereny Kyle e também vai ser um caminho sem volta!

— Sabe o que aconteceria se eu me permitisse envolver pelos seus gracejos?

— Nós dois namoraríamos, seríamos um dos casais mais felizes do mundo, nos casaríamos, teríamos três filhos fofos e eu passaria o resto dos meus dias fazendo você feliz! – ele respondeu, prontamente, sorrindo como uma criança.

— Não! Nós ficaríamos juntos por um tempo, até uma das suas fãs loucas e afobadas fazer uma proposta indecente e irrecusável e eu terminaria a história sozinha, amargurada e sentindo pena de mim mesma! Se não percebeu, eu tenho muito mais a perder!

— Se não percebeu – ele mudou completamente o tom de voz doce – desde que eu a conheci, eu não namorei, beijei, peguei ou dormi com ninguém! Você fica me enrolando, me rejeitando todos os dias e mesmo assim eu sorrio cada vez que te vejo, como se não tivesse me dito nada! Já recusei muitas dessas propostas irrecusáveis que você disse desde que te conheci e pretendo recusar muitas mais com a mesma força de vontade! E você está errada! – Kouyou disse, se levantando. – Eu já entrei nessa história perdendo!

Antes que ele se afastasse, eu me levantei também e o segurei pelo braço, impedindo-o.

— Desculpe-me, Kouyou! Foi errado o que eu lhe disse! Não queria tê-lo ofendido! Desculpe-me de verdade!

Ele sorriu de canto e se virou para me encarar.

— Só se aprender a ser mais sociável! – ele brincou.

— Eu prometo me esforçar!

— E parar de me maltratar!

— Tem minha palavra!

— E sair comigo!

— Kouyou! – eu disse, brava. – Eu estou pedindo desculpas! Não abusa!

— Eu disse sair e não dormir, Sereny! – eu senti minhas faces coradas. – Não que eu não tenha pensado no assunto...

— Idiota! – desviei meus olhos. – Não abusa!

— Você, por outro lado, pode abusar de mim o quanto você quiser... – ele disse malicioso, sendo ainda mais constrangedor.

— Pare de dizer essas coisas pra mim!

— Eu quero que vá se acostumando comigo... Vai me aturar pro resto da vida!

— Você tem mesmo certeza de que eu sou sua Akai Ito, não tem?

— Certeza absoluta! – ele respondeu sorrindo, segurando minha mãe entre as dele e trazendo-as para os seus lábios.

— Então me responda uma coisa, senhor “especialista”... O que acontece se a sua Akai Ito se apaixonar por outra pessoa?

— Isso é mais comum do que você pensa – ele respondeu, sério, voltando a se sentar ao meu lado. – É raro você conseguir encontrar a pessoa do seu destino... Acho que é a coisa mais difícil no mundo! As pessoas costumam se contentar apenas com cuidar de outra, querer bem... Esperar o... Amor sublime e prometido pode levar uma vida inteira... E isso significa ficar sozinho... Então, não esperam...

— E tem como a pessoa do seu destino deixar de estar ligada a você? – eu perguntei, curiosa e Kouyou sorriu.

— A Akai Ito é uma linha inquebrável, Ny... Sempre haverá duas pessoas ligadas entre si por ela!

— Mas tem como estar ligada a duas pessoas diferentes?

— Eu acredito que sim... Seu destino se unirá ao de muitas pessoas ao longo da vida... Você pode pensar numa teia vermelha – ele brincou. – Mas acho que quanto ao amor sublime, talvez não... Você pode não encontrar sua Akai Ito e se casar com uma pessoa por quem sinta um carinho quase infinito, construir uma vida e uma família com ela e você estará ligada a essa pessoa de alguma forma também, mas não pela Akai Ito... Não sei o que aconteceria nessa situação se você encontrasse então a pessoa do seu destino depois...

— Esse conceito de Akai Ito é muito intenso... É difícil acreditar que exista esse tipo de ligação hoje em dia... Ou no mundo real... Parece coisa de livro...

— Mas foi o que eu te falei, Ny... Encontrar sua Akai Ito é uma coisa muito rara! Nessas raras ocasiões em que acontece é realmente irreal! E é sobre essas histórias de amor que os livros tratam mesmo! É sobre esse tipo de amor que as canções falam – ele gesticulou para Takanori e Carolina do outro lado do cômodo.

— E por que acha que sua Akai Ito está ligada a mim? – eu perguntei, mas não era como se fosse uma garota perguntando acanhada por que um garoto a ama... Eu soei muito mais como alguém que lhe perguntava por que Kouyou acreditava mais no Criacionismo do que no Evolucionismo... Uma pergunta sempre complexa de responder e sempre aberta a debate.

— Porque eu me sinto ligado a você desde o momento em que a vi... Não como “amor à primeira vista”... É um sentimento que vai crescendo e ficando mais forte a cada dia... Eu sinto que faria qualquer coisa por você, Sereny! Eu quero estar ao seu lado, não importa o que aconteça ou quanto tempo passe... É como se eu tivesse nascido pra esperar pelo momento em que nos conhecemos... Como se você fosse a resposta para todas as perguntas que eu me fiz a vida inteira!

— Mas, se eu fosse sua Akai Ito, eu não me sentiria exatamente assim também? – perguntei, ignorando completamente todo o romantismo da resposta dele.

— Eu já me perguntei isso também... Acho que você realmente é bastante relutante nessa situação e isso a impede de sentir tudo o que tem pra sentir... Talvez porque alguém a magoou muito no passado... Acho que você precisa de alguma coisa que a faça mudar por dentro, como se você se criasse de novo... Talvez aconteça alguma coisa que desperte isso em você...

— Ou você esteja errado... – eu disse, mas pela primeira vez, não era apenas para discordar dele.

— Ou... Talvez... Eu esteja mesmo errado...