Desci todos os andares e cheguei novamente na rua. Lá estava eu, assim como toda aquela multidão. A cidade inteira tomada pelo silêncio perturbador enquanto todos olhavam para o Sol que se deitava no horizonte. A mãe que respondia à pergunta inocente de seu filho, o casal de idosos que permaneciam abraçados enquanto observavam assim como todos, os pais e seus dois filhos cheio de bagagens em seu carro... Todos ali estavam vivos. Todos sentiam-se vivos.

Aquele silêncio me ajudou a entrar em um estado de hipnose, visões do meu passado constantemente eram revistas em minha mente, todas aquelas lembranças... Todas seriam jogadas fora. Tudo o que nós vivenciamos... Tudo o que nós fizemos... Tudo isso passará a não existir. O que para nós será um grande evento, o Universo nem mesmo notará.

A noite seria perigosa e por isso, tratei de correr. Veio-me em minha mente uma ideia de onde ela estava, eu só queria que eu estivesse certo. Atravessei o quarteirão com pressa, desviando de todas as pessoas que encontravam-se paralisadas olhando para o horizonte como se fossem manequins ou estátuas de cera. Dei a volta pelo prédio, porém eu era grande demais para passar pela janela. Havia uma porta de madeira e por isso corri até o prédio ao lado, com certeza haveria algo com que eu pudesse bater para quebrá-la.

Cheguei no térreo, a recepção estava vazia e o prédio abandonado. Peguei o extintor de incêndio na parede do corredor e corri, cheguei até a porta de madeira e continuei batendo aquele extintor na maçaneta de metal. Tentei por oito vezes até que finalmente parte da madeira e a fechadura em si quebraram-se.

Entrei e subi as escadas o mais rápido que podia. Chutei a porta do terraço e finalmente encontrei o que procurava, além de ganhar a visão mais bela desde aquele dia em seu aniversário: Eu via a silhueta de uma garota contra o por do sol, seu vestido juntamente com seus cabelos compridos balançavam ao vento. Andei calmamente, finalmente aliviado. Aproximei de seu corpo por trás e a envolvi em meus braços.

– Finalmente te encontrei... – Sussurrei em seu ouvido.

Ela virou-se para mim e encostou a ponta de seu nariz no meu, chegando perto de uma forma suave e serena até que nossos lábios se encontraram. Dei alguns passos até ficar exatamente ao seu lado, estendi minha mão manchada de sangue devido aos estilhaços do acidente que tive mais cedo e ela agarrou com força.

Naquele momento a dor não importava. Ela era apenas uma consequência, um símbolo de tudo aquilo que sentíamos. Nossos olhos encontravam-se de forma bonita e tranquila enquanto notávamos um grande brilho mais potente que a luz do crepúsculo no canto de nossa visão.

De mãos dadas, nos viramos para o horizonte. A essa altura, aquilo já estava prestes a atingir a Terra. A estrela que fora fundamental para a nossa formação e nossa evolução agora decidira livrar-se de nós... E não havia nada que poderíamos fazer. Não eram apenas milhares de anos de História, mas um número incontável de vidas desperdiçadas até ali.

Seus olhos brilhavam ao refletir aquela luz no horizonte e eu nunca perderia a chance de vê-la em seu mais puro fascínio. Eu deixei de olhar para aquela luz que ficava cada vez mais forte e apenas olhei para os seus olhos, ela virou-se para mim, sorrindo como nunca antes sorriu.

De alguma forma, sinto como se nós nunca morreremos...

“Não há nada mais lindo do que os seus olhos.”