"Meu coração clamava pelo perdão, mesmo que fosse impossível conseguir. Mesmo assim, clamava. Lembro-me das noites mal dormidas, do suor frio em minha camisa, dos gritos de perdão que abafava inquietamente dentro de mim, para que ninguém me ouvisse. Não tinha ninguém para dividir aquele sentimento. Não, tinha Reiner. Sempre tive e terei Reiner para tudo o que precisar.

Ah, como seria bom voltar naquele tempo em que tudo era, de certa maneira, fácil para mim e para ele, quando éramos soldados. Não, não somos soldados...somos guerreiros. Às vezes me pergunto se a humanidade tem alguma chance. Não acho que tenha. É por isso que luto, é por isso que lutamos.

Meus olhos lacrimejam, meu corpo dói por inteiro, minhas mãos ardem, a cabeça lateja. Como eu gostaria de oferecer o melhor aos meus amigos, mas quem poderia entender? Ninguém. Ninguém é capaz de entender os verdadeiros motivos para esta minha luta. 

Ainda me lembro das palavras dolorosas de Armin: Annie estava sendo cruelmente torturada. Estremeci, meu coração apertou, senti minhas lágrimas correndo. Ah querida Annie, eu batalhei tanto para que você ficasse bem, para que voltasse livre e segura à nossa cidade natal. Meu maior desejo. 

Eu já imaginei tantas vezes como você reagiria quando eu contasse que te amo. Sim, eu te amo,desde a primeira vez que a vi. Seus olhos azuis, seus cabelos claros, seu jeito genioso e irresistível. Eu sei, sou tolo, mas eu te amo mesmo, como jamais amei ninguém. Afinal, eu sou um monstro. Você me aceitaria como sou?

Todas as vezes que te olhei, procurava interpretar o vazio no teu olhar, interpretar aquela frieza com que tratava quase todo mundo. Annie, por incrível que pareça, eu e Reiner não te julgamos. Eu sei como ninguém o que passou e sei que não és uma má pessoa, não fez aquilo tudo por prazer...você não domina os seus poderes completamente e eu te entendo.

Para todos os efeitos, eu sempre quis que acabássemos juntos. Parece meio careta e extremamente sonhador, mas eu constantemente imaginei o quanto seríamos felizes em nossa cidade natal, construindo uma família: eu, você, Reiner...e talvez Christa, quem sabe ela aceitaria vir com a gente. Quem sabe teríamos filhos? Você veria algum problema? Apesar de ser um sonho, algo impossível, eu sempre tive falta disso, de uma família, e acho que você também.

É só nisso que penso quando olho para frente e imagino o meu futuro. O nosso futuro."

Annie levantou os olhos da carta. Estavam arregalados. Seu coração não sabia o que fazer, mas parece que suas pernas sabiam muito bem aonde iam, passando sorrateiramente dentre os corredores desertos da prisão onde estavam, apertando contra si a carta que dizia tantas vezes o seu nome. Suas pernas tremiam, mas andavam resistentes e rapidamente, em direção à "cela" aonde se encontrava o autor daquele documento.

Parou na porta do quarto, que estava aberta, e hesitou por um momento. Estava confusa, mas sabia o que tinha de fazer. Respirou fundo, estava decidida a falar, ou pelo menos olhar nos olhos daquele que tinha escrito a carta. Andou suavemente até chegar à figura pensativa que olhava fixamente para às árvores pela janela do quarto, tentando não fazer barulho. Não sabia o porque, mas ao mesmo tempo não queria manisfestar a sua presença.

Tarde demais, o olhar dele já havia avistado os dela pelo reflexo da janela. Seus olhos castanhos brilharam e seu corpo se encolheu ao ver que a loira segurava uma carta contra o peito e o encarava.

- Como ela chegou até você? - perguntou o legítimo titã colossal.

- Reiner...ele deixou isso no meu quarto. -respondeu a titã feminina.

O garoto simplesmente fechou os olhos e suspirou, afirmando a cabeça e sorrindo a seguir.

-"Reiner...-pensou. - Este é o melhor amigo que eu já tive".

Somente abriu os olhos quando a garota, que agora encontrava-se a seu lado, aproximou-se e segurou sua mão.

- Se nada nos acontecer...eu ainda tenho esperanças que este seja o nosso futuro...Bertholdt. - sussurrou Annie, mostrando a carta e olhando sincera para o rapaz. Este, por sua vez, a olhou ternamente e acariciou seus cabelos e seu rosto. Podia sentir seu corpo formigar e seu rosto ficar vermelho, mas não podia parar, era mais forte que ele. Era mais forte do que ele era.

Selaram aquela promessa com um beijo desesperado e ao mesmo tempo calmo, que procurava tirar, ou pelo menos aliviar, todo aquele sofrimento que sentiam.

- Eu nunca deixarei nada te acontecer. - disse Bertholdt ofegante, após partirem o beijo e a abraçou.

Do outro lado, na porta aberta do quarto, encontrava-se um Reiner de braços cruzados e com um sorriso triunfante.

-"Ainda seremos uma família, como merecemos ser". - pensou o titã encouraçado. 

"A verdadeira família é aquela unida pelo espírito e não pelo sangue".

Luiz Gasparetto