Giovana chegou em casa correndo: tinha esquecido o caderno em que anotara a letra da nova música que queria mostrar para seus melhores amigos. Não queria atrasar o ensaio mais ainda, mas precisava daquelas anotações urgentemente. Após alguns segundos de angústia tentando encontrar a chave na mochila, a roqueira abriu a porta com pressa. Ainda assim, não foi muito longe. Congelou no meio da sala assim que viu uma cena inesperada na cozinha: seu irmão mais velho e Sofia se beijando passionalmente, ele sem camisa e ela com uma alça da blusa já caída. Esfregou os olhos algumas vezes esperando estar tendo apenas um pesadelo, mas a imagem seguia à sua frente e piorando.

– LARGA O MEU IRMÃO! - Gritou para Sofia, que se afastou de Ben subitamente.

–Giovana?! - O casal olhou surpreso para a pequena ruiva paralisada em frente à porta.

–Por favor, eu sei que você me odeia, mas não conta pra ninguém que viu essa cena! - Sofia implorou enquanto ajeitava sua roupa e Ben vestia a camisa.

–Como se não bastasse tentar separar os nossos pais, quer seduzir o meu irmão também? Você não presta, Sofia! - Gritou a ruiva, avançando em direção a Sofia, que tentou desviar. Quando a roqueira estava a ponto de atacar a irmã postiça, seu irmão mais velho a afastou.

–Ei! A Sofia não seduziu ninguém, eu que a beijei! - Ben defendeu a loira.

–Por que essa louca te seduziu! Ou então por que você estaria beijando essa megera? Hein? Isso não tem nada a ver com você, Ben!

–Porque eu sou naturalmente linda e irresistível? - Sofia respondeu irônica.

Giovana transpareceu fúria por um momento, mas algo lhe veio à mente que a acalmou.

–E você está satisfeita com isso? Com ser apenas um objeto pro meu irmão enquanto a única que ele leva a sério é a Anita?

Sofia sentiu o baque da frase da ruiva, mas disfarçou como pôde. Sabia que não fazia o tipo de Ben, que o que ele sentia não chegaria a ser mais que desejo, que era de Anita que ele gostava e não precisava ser lembrada disso justo por Giovana, era humilhante demais. Já pensava em alguma resposta ácida quando Benjamin se pronunciou.

–Infelizmente, por mais que eu não consiga acreditar 100% na Sofia, por mais que ela não preste, nem seja o meu tipo, eu gosto dela mais do que isso, Giovana. - Ben confessou. Não sabia como havia juntado coragem para assumir o que sentia assim, aquele sentimento que o envergonhava, mas não podia deixar a irmã falar assim com a loira. Esse não era ele, jamais usaria alguém.

Sofia não acreditava no que ouvira. Então Ben não a havia trocado por Anita? Ele ainda sentia algo por ela que não raiva ou desprezo? E ao mesmo tempo... Percebeu o semblante incômodo de Benjamin, como se se sentisse culpado pelo que sentia. Conhecia tão bem por também ela desejar não gostar tanto dele quanto gostava.

–Ela está te enganando, Ben, acorda! Ela quer te usar pra tentar separar o papai e a Vera de novo!

–Se eu estivesse usando o Ben pra isso, não teria te pedido silêncio. Se toca, garota! - Sofia se defendeu.

–Sofia! - Ben a olhou incrédulo, mas fazia sentido o que a garota dissera.

–Que foi? Ela pode me acusar assim e eu não posso me defender? Cansei de ser a única sem direito a defesa nessa casa! - Sofia caminhou em direção às escadas inconformada. Ben a seguiu e a puxou pelo braço. Ambos se encararam, seus rostos próximos demais. Raiva, impotência contra seus próprios corpos e mentes, atração.

–Eu esperava mais de você, Ben.

O garoto ouviu a irmã reclamar e seus passos em direção à porta. A música nova podia esperar, não tinha mais ânimo para tocá-la. Voltou-se para a porta.

–Giovana! - Gritou, mas ninguém respondeu. Apenas os passos de Sofia, voltando a subir a escada para seu quarto. Frustrado, Ben sentou na escada, com a cabeça apoiada sobre o punho.

No quarto, as palavras de Benjamin ecoavam na mente de Sofia, que sentia raiva de sua própria fraqueza. Sempre soube que não devia gostar de Ben, que ele só lhe faria mal, que não era bom para ela. Agora, no entanto, sabia que ele a via da mesma forma e, sabendo o quanto desprezava seu sentimento, podia entender que para Ben gostar dela era tão horrível quanto ela considerava gostar dele. E por mais que tentasse ignorá-lo, a dor que sentia era real. Ardia cada célula sua, resultando em mais raiva crescente. Pouco a pouco, a adrenalina do beijo era substituída pelo choro, pelo desespero de perceber que era tarde demais, que a indiferença de Ben já a incomodava mais que seus sentimentos por ele. Por perceber que era um caminho sem volta, que estava perdidamente apaixonada pelo garoto que tanto tentara desprezar, por sentir tanta falta daqueles lábios, daquela pele, daquele corpo. Precisava de Ben assim como precisava se afastar dele.

Não percebeu Pedro entrar em seu quarto, apenas ouviu a voz do caçula sentando ao seu lado na cama.

–Por que você está assim? - Perguntou preocupado.

Sofia abraçou o irmão.

–O que seria de mim nessa casa sem você?

–Você ainda seria a Sofia, só que um pouco mais sozinha.

–Pela primeira vez você errou uma resposta... - Suspirou. - Sem você eu já tinha surtado aqui, maninho, você é o único que me entende.

O menino secou uma lágrima do rosto da irmã com seus pequenos dedos.

–O Ben vai te perdoar.

–Que?! - Sofia respondeu de sobressalto. - D-do que você tá falando, pirralho?

–Que você está triste porque brigou com o Ben. De novo. Mas ele gosta de você e vai voltar atrás, você vai ver.

Pedro reparou no semblante confuso da irmã.

–Como você mesma disse, eu sou o único que te conhece de verdade aqui e eu andei reparando. Você e o Ben sempre mudam quando estão perto um do outro.

Sofia tentou raciocinar diante da confissão do irmão. Pensava saber disfarçar... Não sabia se ficava preocupada com o que o irmão sabia ou aliviada pelo que o pequeno dissera sobre os sentimentos de Ben. Abraçou o irmão com mais força, preferindo o apoio de seu caçula às dúvidas. Era bom se sentir mais acolhida, ainda que fosse só pelo irmão mais novo em uma casa de oito habitantes. Nove, com a presença de sua tia.