Its Just a Tragedy escrita por yunhotothejae


Capítulo 1
Capítulo único




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It's just a tragedy.

 

 

As folhas alaranjadas caiam sutilmente desde os topos das árvores até o chão, formando pilhas de folhas para que as crianças pudessem brincar de várias coisas, bastava usar a criatividade. O cheiro doce de maçãs estragadas invadia o quarto aquela tarde, e os raios fracos do pôr-do-sol adentravam pelas frestas da janela, dando o mínimo de claridade ao quarto. Iluminação esta que era completada por velas acesas, presas em candelabros dourados.

 

Deitado no leito, coberto por um lençol tão fino e branco, que chegava a ser quase transparente, Frank tremia de frio, entretanto, sua testa estava molhada de suor. Os pingos escorriam pela região, e o rapaz já não tinha total consciência do que estava se passando ali. Seus lábios estavam brancos extremamente rachados por conta do tempo seco.

- É a peste! – exclamou o médico, tentando demonstrar calmaria, ainda que a peste fosse algo que lhe assustasse realmente, por não ter uma cura que pudesse realizar. Guardou alguns de seus pertences de volta na maleta branca que carregava cuidadosamente por onde quer que andasse. – A praga está se espalhando cada vez mais depressa.


- Mas ele vai ficar bom, não vai, doutor? – a jovem camponesa que trabalhava para aquela família se ajoelhou no chão, ao lado da cadeira na qual o médico estava sentado. Usava um lenço branco nos cabelos loiros e compridos, feitos em tranças. A face delicada, estava levemente ruborizada por conta da temperatura alta do cômodo naquele fim de tarde.

A moça escondia um amor incondicional – e totalmente platônico - pelo patrão, e estar ali, assistindo-o morrer, era a pior coisa que poderia lhe acontecer. Ia muito além da sua capacidade de aceitação. Porém, não havia nada que podia fazer. Podia sequer demonstrar seus sentimentos.


Mas Charlotte não era a única que mantinha um amor secreto por Iero. O homem encostado na parede em um dos cantos do recinto, mantinha a expressão firme e séria no rosto, mas por dentro, estava gritando. Era isso que tinha vontade de fazer no momento. Sentia vontade de gritar até não ter mais forças nem voz para tal ato. Amava Frank mais do que amava a si próprio, e presenciar aquela cena sem ao menos poder demonstrar o que estava sentindo, o estava matando aos poucos, consumindo todos os seus pensamentos.

 

Contudo, o amor que ele e Charlotte sentiam por Frank, possuía uma grande diferença. O amor de Gerard era correspondido. Correspondido, porém, terminantemente proibido.
Eram dois homens. Dois amantes perdidamente apaixonados um pelo outro.

 

Mas aquele amor não era proibido apenas pelo fato de serem pessoas do mesmo sexo e viverem em uma época e em uma comunidade em que isso era inaceitável, mas também pelo fato de que Gerard era cunhado de Frank. Havia se casado com a irmã do menor, com o único objetivo de poder ficar mais perto do amado. E havia conseguido alcançar seu objetivo. Porém, agora, o estava perdendo.

- Infelizmente, creio que não haja mais nada que eu possa fazer. – desviou seu olhar para o chão por um segundo, voltando a guardar seus objetos na maleta branca com uma cruz vermelha em seu centro. – Agora, só lhes resta esperar. – o médico puxou um relógio do bolso e arqueou as sobrancelhas, deixando claro que se espantara com o tempo, que havia passado tão depressa. Guardou o objeto de volta no bolso de sua calça e tirou do outro bolso, um lenço branco, que lhe serviu para limpar algumas gotas de suor que escorriam por sua testa. Passou a mãos rapidamente pelos cabelos grisalhos e acenou levemente com a cabeça, deixando aquele cômodo da casa.


Recebeu como resposta apenas o choro desesperado da moça, que escondeu o rosto nas mãos em uma tentativa frustrada de abafar seus soluços, e em seguida, correu delicadamente para fora do quarto, provavelmente para acompanhar o doutor até a porta e tentar conseguir mais algumas respostas sobre o estado de Frank. Gerard e o outro ficaram a sós.

Entretanto, antes que Way pudesse sequer se aproximar da cama onde repousava o amado, ouviu o ranger da escada velha, denunciando que alguém estava prestes a entrar no quarto abafado.


Passados alguns poucos segundos, a mãe do doente entrou no quarto. Usava roupas compridas e pesadas, características da época, e tinha os cabelos acinzentados presos em um coque bem feito. Na mão esquerda, um lenço que usava constantemente para enxugar as lágrimas, e na direita, um terço que vinha sendo rezado fervorosamente há horas, mas suas preces não pareciam serem ouvidas.


-Oh! Meu filho... Meu bebê. – Frank, obviamente deixara de ser criança há tempos, mas ainda era carinhosamente chamado de bebê pela mãe. A mulher andou até o rapaz que tinha os olhos fortemente cerrados e balançava a cabeça de um lado para o outro repetidas vezes, murmurando algumas palavras que não faziam sentido algum aos ouvidos dos presentes, nem mesmo aos seus. Estava tendo alucinações.


Linda não agüentou ver a figura sofredora do filho, cujos punhos estavam fortemente agarrados aos lençóis, como se precisasse desesperadamente apertar algo. Assim como Charlotte, a mãe de Frank precisou deixar o quarto o mais rápido possível, por não querer presenciar algo tão forte como aquela imagem, e logo Gerard se viu a sós com Frank novamente, podendo assim, chegar mais próximo de seu pequeno.

 

Way sentou-se vagarosamente na mesma cadeira que há pouco, fora usada pelo médico, pegando um pano branco que jazia no criado mudo ao lado da cama e o mergulhando em uma pequena bacia com água fria. Espremeu o pano e o levou até a testa de Frank, limpando algumas gotículas que ainda insistiam em brotarem de sua testa.

- Não me deixe, pequeno. Por favor, não me abandone. – implorou em uma prece baixa, quase silenciosa, sentindo a visão embargar.

- G-Gerard? – Iero tentou inutilmente abrir os olhos, mas os raios fracos de sol que adentravam pela janela não o permitiram realizar tal ato, ainda que já estivesse quase anoitecendo.


- Shhh. Não fale nada. – Pediu, tomando uma das mãos extremamente gélidas de Frank entre as suas, em uma tentativa falha de aquecê-las. – Eu estou aqui. – disse em um sussurro.


- E-eu... Acho que preciso ir, Gerard. – Frank pronunciou a sentença com certa dificuldade, gaguejando. Engoliu em seco, sentindo um incômodo enorme na garganta. A voz falha e levemente rouca denunciava seu estado de cansaço e exaustão. Tentou ainda, apertar a mão de Gerard que envolvia a sua, mas não possuía mais forças para fazê-lo.

Gerard levantou da cadeira, sentando-se na cama. Delicadamente, levantou a cabeça leve do amante, repousando-a em seu colo e segurando-a em seus braços, inclinando-se na direção do menor – uma mecha do cabelo minimamente comprido caindo-lhe aos olhos, mas não se importou de fato -, entreabrindo os lábios e deixando um beijo demorado em sua testa.

- Não, Frank. Não pode ir. Eu te amo. – afagou os cabelos úmidos de Frank, sentindo o cheiro extremamente agradável de lavanda que os fios exalavam. Ao ouvir as últimas três palavras de Gerard, o menor pôde desfazer o punho e soltar o lençol que antes segurava firmemente, deixando o mesmo amarrotado.

Ouviu-se um ofego baixo da parte de Iero, que finalmente conseguiu semiabrir os olhos. Não totalmente, mas o suficiente para enxergar a figura perfeita – mas desesperada – do homem que era dono de todo o seu amor. Way se curvou mais ainda, para que então, pudesse alcançar os lábios doces e bem desenhados do outro, e assim que os alcançou, um beijo cheio de desejo, carinho, sofreguidão e amor iniciou.


A fraqueza que Frank sentia não o deixou corresponder o beijo com a mesma intensidade do maior, mas ainda assim, ambos se sentiram próximos ao paraíso. Queriam aproveitar cada segundo. Queriam que fosse eterno. O mais novo levou com dificuldade a mão trêmula até o rosto do maior e acariciou levemente a pele macia do mesmo.

 

Frank não queria, mas precisou finalizar o por conta da necessidade de deixar que o ar adentrasse seus pulmões. Ao término do beijo, Iero sentiu um enorme desconforto no peito e uma dificuldade para respirar se fez presente, mesmo que já tivesse todo o ar necessário à sua volta. Precisou de um esforço maior do que o normal para conseguir puxar oxigênio para seus pulmões. Estava ofegante. Seu peito subia e descia com uma velocidade impressionante. A garganta ficando cada vez mais seca e a visão escurecendo e embaçando aos poucos, e logo não enxergava mais o homem à sua frente, e sim um borrão. A caixa torácica parecia estar se comprimindo, quase esmagando-lhe o coração, o que lhe proporcionava um enorme aperto no peito. Era isso. Seu tempo estava acabando.

 

Gerard congelou. Foi como se todo o sangue de seu corpo parasse de circular repentinamente. O coração acelerado era a prova de que sabia – e temia - o que estava prestes a acontecer ali. Precisava fazer algo, mas sabia que não podia. Sentiu-se paralisar. O medo invadindo cada fibra de seu ser. Não conseguia nem mesmo formular um raciocínio.

- Prometa... Pro-prometa que vai... cuidar bem dela. – disse com ainda mais dificuldade do que antes, referindo-se a sua irmã e mulher de Gerard. Frank buscou algum tipo de conforto na mão do amante, entrelaçando-a na sua e apertando sem força.  


Aquele pedido era algo que não tinha certeza se poderia realizar, mas ainda assim, Gerard meneou a cabeça, assentindo. Estava tomado em desespero. Não queria que aquele momento chegasse. Como poderia assistir o seu grande amor morrer assim? Como ele poderia estar sendo tirado de si, assim, tão de repente?


-Frank, me escute. Você não vai morrer. – disse com a voz firme mais para si mesmo do que para o outro, porque era no que queria acreditar. Não era como se tivesse algum controle sobre o que iria acontecer, mas Gerard não queria enxergar a realidade. Simplesmente não podia aceitar. Gerard engoliu. A visão completamente turva por causa das lágrimas que logo começariam a cair, não o deixando enxergar o outro com clareza.

E foi com essa ultima frase de Gerard, que Iero deu o último suspiro. O maior sentiu que a mão de Frank já não apertava a sua e os olhos do corpo extremamente pálido e sem vida, permaneciam incrivelmente abertos, como se as pálpebras houvessem sido pregadas à parte exterior dos olhos.


Gerard tentou gritar. Tentou com todas as forças, mas nenhum som foi emitido, ainda que sua boca permanecesse aberta e a garganta sendo forçada. Um grito silencioso e interno, mas ensurdecedor ao mesmo tempo. A primeira lágrima caíra do olho direito de Way, escorrendo por sua bochecha em seguida, caindo entre os lábios rachados e sem cor de Frank.

O mais velho levou uma mão até o rosto do outro e as pontas de seus dedos fecharam delicadamente os olhos de Frank. Novamente, ele levantou a cabeça do pequeno, dessa vez, para que pudesse sair da cama. Andou até a porta antiga de madeira e passou o grande ferrolho por sua fechadura, trancando-a. Só assim poderia ter privacidade e tempo com o amado, agora sem vida.

 

O rapaz deixou que suas pernas o guiassem até a cama novamente. Deitou ao lado de Iero e abraçou fortemente o cadáver, como havia feito há alguns dias atrás, quando se tiveram por completo. Way selou seus lábios nos arroxeados de Frank. As lágrimas já rolavam livremente por suas bochechas, encharcando o travesseiro.

- Isso não é um adeus. – Arthur murmurou entre soluços, acariciando levemente o rosto do corpo ao seu lado. – Eu prometo, Frankie. Meu Frankie. Logo iremos nos encontrar novamente.

Gerard nunca sentira tanta dor. Acabara de perder a única pessoa que realmente amou em toda sua vida. Sentia-se completamente vazio, e sabia que só lhe restava uma coisa a fazer. Uma coisa que lhe requeria muita coragem. Não, o elo tão forte que tinham não podia ser desfeito somente pelo fato de um ter morrido. Gerard o faria por seu amado. Tiraria a própria vida por Frank.

He feels alone. His heart in his hand. He’s alone. He feels alone.*

 

Um sorriso cheio de ternura desponta em seus lábios ao que observa o corpo de Frank. Oh, como era belo. Perfeito, parecia ter sido esculpido por mãos divinas. Ele levanta com certa dificuldade da cama e caminha lentamente até a cômoda, abrindo a primeira gaveta e revirando algumas roupas que haviam ali.

 

Oh, ali estava seu objeto de mais precisão no momento. Prateada, reluzente, convidativa. A arma que serviria para unir Gerard e Frank novamente. Ele dedilhou o revólver. Parte por parte, como se quisesse certificar se o objeto era, de fato, bom o suficiente para executar a tarefa. A voz em sua mente dizia que sim. Dizia que estava na hora de encontrar o pequeno, que partira há poucos minutos atrás.

 

Gerard arregalou levemente os olhos ao ouvir um barulho vindo da porta. Alguém estava tentando abri-la. Precisava ser rápido. Ele levou a arma fria até a têmpora direita, sentindo as pernas fraquejarem e um arrepio estranho tomar conta de si. Não tardou muito até que as batidas na porta começassem a tornarem-se mais fortes e mais freqüentes, enquanto alguém – que Gerard não conseguiu distinguir a voz, tão atordoado que estava – gritava o nome de Frank e até mesmo o do maior.

 

Engoliu em seco, cerrando os olhos fortemente, o mais forte que conseguiu. Repetiu para si mesmo que era por uma boa causa. Para ele e seu amado ficarem juntos novamente, dessa vez, em paz. Precisava fazê-lo logo. Antes que a porta fosse arrombada.

 

Then on that last day he breaks. And he stood tall.*

 

Lançou um último olhar para o cadáver que jazia na cama, voltando a fechar os olhos e respirou fundo. Gerard tomou fôlego e finalmente, conseguiu gritar. Um grito ensurdecedor, que chegou a doer-lhe a garganta. Mas não havia o porquê se importar.

 

Ele apertou o gatilho. E não pôde sentir mais nada. O corpo já sem vida caiu no chão, fazendo um barulho assustador para os que estavam do lado de fora.

 

And he yelled… And takes his own life.*

 

Logo estaria junto de seu grande amor novamente.

 

Eternamente.


FIM

 


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Notas finais do capítulo

Obrigada a quem ler. :3
*Poetic Tragedy - The Used. A música serviu de inspiração pro título do ficition e pro final.
Se quiserem ler ouvindo, seria melhor ainda.